Cap. 1º
Resões de se ordenarem missões perpetuas intra Prouintiam
1. A larga experiencia tem mostrado a todos, o muyto fruito que os nossos neste Reyno fazem com as missoẽs onde quer que chegão: e iuntamente a muyta necessidade que ha dellas, e quanta parte do Reyno carece ainda deste beneficio, que com os olhos longos está esperando, como os Prelados, Uillas, e Cidades delle por cartas suas tantas uezes tem sinificado, e de presente com mais instancia sinificão.
2. Considerandose tambem estes annos como se poderia em parte comprir dentro deste Reyno com a obrigação das Missões tam proprias dos Professos, tratada ultimamente a cousa com os Padres consultores, e outros da Prouincia, depois de encomendada de proposito a Nosso Senhor pareceo, que a tudo isto se satisfaria em parte, se nos 3 Collegios de Braga, Euora, e Coimbra, e na Casa de S. Roque ouuesse 4 Padres professos, que assi como outros tem por officio serem prefeitos Spirituaes, Lentes, pregadores, ettc. assi elles missionarios.
3. E ainda que por ora parece começar por este pequeno numero, ao diante se deue ir acrecentando, assi pera partir e aliuiar o trabalho, como pera estender mais o fruito, esperando que Deos Nosso Senhor pois nos chamou a este instituto, nos dara obreiros zelosos desta obra tão propria delle, e que fique esta Prouincia dando neste particular de missões perpetuas ao perto, e exemplo que dá nas que faz ao longe.
4. Por este meyo tambem podemos esperar da bondade diuina que auemos de uer ainda em nossos dias sua boa reformação de costumes neste Reyno, e hum abalo e moção grande na gente pera a uirtude; que tudo isto se acha nas terras a que as missões da Companhia abraniem.
5. Pera isto pareceo fazerse hum sumario das instrucções assi da 5ª, como da 6ª Congregação Pro concionatoribus, et missionibus, e daremse alguãs outras aduertencias mais necessarias pera as missões particulares desta Prouincia.
6. Lembrese o Superior da missão de pedir ao Padre Prouincial os poderes e priuilegios que se costumão conceder aos Superiores locaes, pera o tempo que durar a missão; e os mesmos pera quem lhe socedesse na uiagem.
Cap. 2º
Sumario das instrucções pro Concionatoribus et Missionibus
1. Lembremse os que andão em missões que o fim dellas he aiudar a saluar as almas que por não saberem o que lhes importa pera saluação, estão em perigo de a perder: e que esta he nossa particular uocação, na qual nossos primeiros Padres com tanto fruito e tão exemplar mente se exercitarão.
2. Pera fazerem seu officio com mais proueito das almas lembremse da regra 2ª dos pregadores: Memores sint uocatos se esse ad reducendas animas suo Creatori ettc. e com toda a diligencia procurem que todos ueião nelles o zelo dellas, charidade, e deseio de as aiudar.
3. Em nenhum modo deixem de ter a oração pela menhã, e exame da noyte, e assy nella, como em todas as mais cousas procurem intima união com Deos, de quem depende toda a efficacia de nossas obras e ministerios.
4. Procurem de atalhar o trato demasiado, e nimia familiaridade com seculares, as uisitas e presentes dos mesmos, mais principalmente de molheres.
5. Pera sua sustentação, antes aceitem esmolas das cousas necessarias pera ella, que de dinheiro, a qual deue sempre ser com toda a parsimonia, e em casa de algum eclesiastico, ou outro secular honesto, quando no hospital não ouuesse lugar Religiosa mente comodo.
6. Tanto que chegarem a algum lugar, antes de tudo se uão à Igreia Matriz, e depois de fazerem oração ao Senhor, tratem com o parocho, ou prelado delle, apresentemlhe sua patente, declaremlhe que seu intento he ensinar a doutrina, confessar, tirar odios, etc. e em particular aiudalo a elle, e aos mais Sacerdotes em tudo o que poderem; e guardemse de lhe darem ocasião de poder cuidar, que uão pera inquirir de sua uida, ou emendar sua uida.
7. Tambem lhes declarem que trasem auiso particular de seus Superiores, que a ninguem seião molestos por causa de sua sustentação, e que assi hão de procurar de o comprir, e que so lhe sera necessario algum aposento em que não aia trato com molheres, e em que religiosamente se possão recolher.
8. Do mesmo parocho procurarão saber, que pecados são mais ordinarios na terra pera que enderecem as pregações a elles: e que tempo sera mais comodo pera se poder aiuntar a gente a ellas e às doutrinas.
9. Na primeira exortação que fizerem tratem da necessidade da doutrina christam, e dos males que comsigo tras o pecado mortal, pera que dahi se tire a necessidade do remedio da confissão. Tambem se declare nella o fim pera que uem, o consentimento e licença que tem do Ordinario pera exercitarem os Ministerios da Companhia, o poder que tem de absolver, o iubileo que trazem de sua Santidade; como pelas menhãs se hão de ocupar em confessar, depois de iantar em ensinar a doutrina aos meninos e molheres, depois das Aue Marias aos homens, e como tudo isto he, segundo o Instituto da Companhia, sem esperança de algum interesse temporal.
10. Procurem conciliar alguãs pessoas mais honradas, e da melhor fama e reputação que ouuer na terra, das quaes se aiudem pera acabar com as outras o que ouuer de mor seruiço diuino.
11. Uisitem as escolas, se as ouuer, e procurem ganhar as uontades aos Mestres dellas, e introduzir nos discipulos algum algum exercicio de deuação, e pera os atrahir
a sy, ordenarão com elles alguãs procissões publicas, e principalmente em dias de festa, nas quaes uão com algum ornato exterior da capellas, cantando boas cantigas ettc.
12. À tarde antes das Aue Marias, ou quando pola menhã não ouuer confissões deuem aiuntar os Sacerdotes que ouuer na terra, e dar lhes huã breue noticia dos principaes mysterios da Santissima Trindade, da Encarnação ettc. praticar lhes as materias, formas, e uso dos Sacramentos, o exercicio e proueito delles, e instruillos principalmente no modo de confessar, e doutrinar a gente do pouo.
13. As confissões das molheres, e dos moços pequenos hão de ouuir sempre nas Igreias publicas, e em lugar que tenha luz bastante pera serem uistos; e procuremse despedir com brevidade das pessoas em que pode auer alguã nota e nas doutrinas que fizerem depois das Aue Marias, não admittão molher alguã.
14. Nas pregações usem frequente mente de exemplos, acomodados à gente a que pregão, nellas exhortem o pouo à obseruancia do culto diuino, e à reuerencia aos Eclesiasticos.
15. Aonde quer que se encontrarem com Religiosos, lhe mostrem toda a beneuolencia, e os procurem ganhar e ter por sy: e se ouuesse comodidade de dar a algum delles, ou a outros Sacerdotes os exercicios Spirituaes, não deixem de o fazer que sera de seruiço de Deos.
16. Auendo de dar alguã esmola de dinheiro a alguã pessoa necessitada, dem na com muyta cautella, e em segredo, pera que não acuda numero de pobres a pedir a mesma, e negando selhe, tomem ocasião de se queixar.
17. Apontarão tudo o que acharem digno, assi de dar conta e auisar ao Prelado quando uierem, como de se mandar pera as cartas annuas.
18. O que na patente for nomeado no primeiro lugar, ha de ser Superior, o outro seu admonitor.
Cap. 3º
O que toca ao Spiritual dos Missionarios
1. Pera ficarem desembaraçados entre dia procurem não entrar pola menhã em ocupação e negoceo sem primeiro comprirem com a obrigação da oração, reza e missa saluo fosse em alguã urgencia, e em quanto isto não tiuesse feito, não deuião
dar entrada à gente, pois allem de se poderem edificar, tem iusta escusa pera isso, e não no fazem por se furtar ao trabalho auendose todo o mais tempo de ocupar em seu seruiço.
2. Leuarão com sigo o Iubileo das Missões, o qual sopoem a Santa Cruzada, as regras dos pregadores e missionários, este sumario, e aduertencias, e tudo antes de partir praticarão e conferirão pera melhor as entender.
3. Terão licença pera usar dos priuilegios, que os Superiores ordinariamente costumão a conceder aos que uão a missões.
4. Chegando a qualquer terra, antes de pregarem ou se ocuparem em outras obras mais lustrosas, uão uisitar os carceres, e enfermos, offerecendose pera os aiudar e consolar no que poderem, e exercitando com elles algum acto de humildade, seguindo nisto o concelho de Nosso B. Padre que assi encomendou o executassem aos Padres que forão a uarias missões, e ao Concilio Tridentino, ut humilitate et contemptione sui, (como se diz em sua uida) uiam sibi ad ardua atque excelsa munirent.
5. Uiuão de esmolas pedidas per sy, ou por outras pessoas; e escusem ser hospedados em casas particulares, assi pera se não fazerem custosos nas terras em que estiuerem, como pera que a gente tenha a elles mais facil recurso, e seião auidos por homẽs comũs, que igualmente pretendem a saluação de todos, e em quem ueião o do Apostolo, non quero uestra, sed uos.
6. Duas outras uezes no anno se recolherão aos Collegios donde sairam por espaço de hum mes em cada huã dellas, assi pera descancar hum pouco do trabalho, como pera refazer o Spirito com alguns dias de exercicios, confissões geraes, conta de consciencia ettc.
7. Aos Superiores dos Collegios donde sayem escreuão frequentemente do fruito que Nosso Senhor faz por seu meyo, como são aceites à gente, como se achão da saude ettc. e uenhão as cartas em forma que se possão comunicar, e que indo outros às mesmas terras, não possão uir em noticia das pessoas, de que nellas se falla, sendo cousas de que se possão sentir.
8. Tambem escreuerão alguãs uezes aos Bispos e Prelados que lhes derão licença pera fructificar, e discorrer por seus Bispados, dandolhe nouas do que por elles achão, do que se uay fazendo de seruiço diuino, e comunicandolhe alguãs duuidas sobre o que ocorre ettc. porque com isto os consolarão, e obrigarão os Superiores dos Collegios donde partem os Missionarios mandarão logo em se elles partindo fazer oração pelo bom sucesso das missões, e pelo discurso do anno, mandarão fazer outras uezes o mesmo, conforme o que Nosso B. Padre ordena nas Constituições,
parte 7ª, cap. 2º. E em particular quando no Refeitorio se ouuir alguã carta do fruito que nellas se faz o mandarão tambem lembrar pera que Deos Nosso Senhor concorra mais com elles, e disponha a gente das terras em que andão pera o que for de mor gloria sua.
Cap. 4º
O que toca ao corporal
1. Deuem proporcionar o trabalho as suas forças, não se deixando leuar do feruor do Spirito com perigo da saude, que deuem procurar pera o diuino seruiço, e por esse respeito sera bem que leuem a roupa necessaria pera se mudarem quando chegão suados ou acabão de pregar.
2. Quando alguã uez se não achassem em disposição pera ir de hum lugar a outro a pé, poder se hão aiudar de alguã caualgadura com a modestia que se espera de missionarios Apostolicos. E ordinariamente poderia tomar algum iumento pera lhes leuar os manteos, e algum alforie com seus papeis e abreuiarios.
3. Adoecendo algum procuremse recolher ao hospital da terra mais uezinha em que aia medico, e possa auer mais comodidade de cura, ou a algum outro gasalhado mais Religioso: e se parecer que o mal he de consideração auisem logo ao Superior do Collegio donde sairão.
4. Tenhão muyto resguardo em receber presentes, principalmente de alguã gente pelos muytos desastres que tem acontecido.
Tão pouco deuem aceitar cousas que mandem ou tragam pera os Collegios; nem dar esmolas à porta mas leualas ou mandalas às cadeias e hospitais: nam tira isto poderem dar alguã quando priuata mente lha pedissem.
5. Não mandem presentes, maxime a molheres de qualquer estado que seião: nem ainda a outros nossos que andassem uezinhos. E tendo o necessario pera sua sustentação, sera edificação darem a entender aos que lhe mandão algũs que o podem escusar. E se os não poderem deixar de aceitar pela qualidade das pessoas, he bem que entendão, que os gastão com os prezos, doentes, e miseraueis da terra. 6. As esmolas que ouuerem de pedir pera premios das doutrinas, seião a pessoas que possam e folguem de as fazer, ou as offereção, e não se lhe tomem senão muy moderadas. E os premios seião ordinarios, e não de preço, Rosarios, e Nominas de
pouco feitio, medalhas de latão, imagens de papel, e alguãs cartilhas: mas não as leuem dos Collegios com intento de pedirem o preço delles.
Cap. 5º
O que pertençe ao Proximo
1. Não tem obrigação de correr cada anno todo o districto que lhes está assinalado, mas em cada hum gastarão o tempo que iulgarem, pedem as necessidades das Uillas ou lugares: e geralmente se deuem mais ocupar nelles, que nas Cidades em que ha Religiosos, e são mais cultiuadas.
2. Deuem logo ao principio acudir ao mais remoto, e mais desemparado aonde se esperasse mayor seruiço diuino, e as partes a que a Companhia não tem chegado, ou ha mais tempo que não foy. E se em alguã Cidade lhe fizessem força, deuiamse despedir com bom modo: ainda que indo tomar a benção a algum Prelado, poderião fazer de passagem alguã pregação.
3. Antes de partir refrescarão alguãs materias moraes, que parecerem mais necessarias nas terras aonde uão, e leuarão resolutos as duuidas e pontos principaes dellas, pera com mais facilidade responderem e resoluerem os casos que se oferecerem.
4. Deuem leuar algum numero de pregações compostas com pontos moraes, acompanhados de algũs exemplos, ordenadas a arrancar uicios, abusos, e maos costumes, affeiçoar a uirtude, introduzir uso de sacramentos, estima das cousas de nossa Santa fee, obseruancia da lei de Deos, ueneração ao diuinissimo Sacramento, deuação à Uirgem Nossa Senhora, obediencia aos Prelados e pays Spirituaes, e aos que gouernão a Republica, respeito às Igreias, Reliquias, Imagens, e a todas as mais cousas sagradas; lembrança da eternidade, breuidade da uida, bens da gloria, castigo do inferno, e em fim se entenda que pregão o Reyno dos Ceos, e euangelização à imitação dos Apostolos de Christo.
5. Fundemse mais em doutrinas, confissões, fallar de Deos e tratar com o proximo e em lhe remediar suas necessidades Spirituaes, que em pregações, principalmente de aparato e estudo: e assi deuem attender principalmente atirar odios, euitar escandalos, desterrar abusos, atalhar brigas, em pedir demandas, fazer concertos com os que que as trouxerem alcançar perdão das partes, assistir aos que estão
pera morrer, procurar que se acuda a necessidades publicas; e o mais que se iulgar pertencer direita mente à saluação das almas, bem comum, e reformação Spiritual da Republica.
6. Nas doutrinas dos meninos persuadão e proponhão premios, não só aos que souberem as oraçoens, mas aos que as ensinarem a outros; aos que aiudão às missas; acompanharem o Santissimo sacramento; emendarem iuramentos; cantarem boas cantigas pelas ruas; lerem por algum liuro Spiritual, aos que não sabem ler; tirarem os chapeos às cruzes, e Igreias por onde passão; aos que são bem mandados a seus pays, e mays, que falam com cortesia aos mais uelhos; que não rogão pragas ou chamão nomes; que fazem deuação ao Anio custodio, e Santo do seu nome. E deuem os Padres leuar logo do Collegio historias acomodadas a cada huã destas cousas.
7. As reprehensões nas pregações e doutrinas seião sempre de cousas comũas, sem tocar nunca em modo algum em pessoas particulares, maxime eclesiasticas, ou de autoridade; às quaes deuem procurar mostrar respeito, e conseruar em beneuolencia pera mor seruiço diuino.
8. Quando ouuerem de passar de hũs lugares pera outros, mandarão sempre hum ou dous dias antes auisar os Parochos, Abades, ou Prelados delles; e antes de se passarem procurem antecipadamente ter noticia da gente que ha na terra pera onde uão, em que cousas poderão fazer mais seruiço de Deos, e aiudar melhor as almas, e de que pessoas e meyos usarão pera isso: às quaes procurem fazer participantes, e ainda principaes autores de tudo o que se fizer de seruiço diuino.
9. Nos lugares em que se detiuerem procurem deixar ordenado o ensino da Santa doutrina, de maneira que se continue, ou pellos Mestres das Escolas, ou pellos curas das Igreias, ou por alguã outra pessoa, que a isso tiuesse deuação, dandolhe instrucção, e deixandolhe cartilhas, pera por ellas o fazerem.
10. Como deuem louuar e animar a gente ao bom uso das confrarias, procissões, Romarias, e deuoções, ia recebidas e aprouadas, assi se deuem abster de ordenar alguãs nouidades ainda que seião pias; porque os Prelados folgão mais de se lhe aiudar a conseruar em perfeição, e leuar por diante, o que por elle foy instituido, e ia está introduzido em seus Bispados, que de lhe meterem cousas de nouo, de que não tenhão muyta satisfação, e sem ella he certo que nenhuã cousa que se principiar sera de dura.
11. Procurem que em todo o lugar se plante a deuoção da graça da Aue Maria, quando dá o relogio em memoria da hora e mysterio da Encarnação: e porque em