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I NTRODUÇÃO G ERAL AOS M ICROSPORIDIA

ESPÉCIES REFERÊNCIAS

6. TRATAMENTO DA MICROSPORIDIOSE HUMANA

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6. TRATAMENTO DA MICROSPORIDIOSE HUMANA

Actualmente, não existe tratamento eficaz contra as infecções por microsporídios. A dificuldade de penetração dos fármacos, na espessa parede do esporo do parasita, constitui um dos principais obstáculos, dado que, mesmo que outros estádios vegetativos sejam destruidos e a morfogénese dos esporos seja perturbada, existe sempre, a possibilidade do restabelecimento da infecção através dos esporos maduros, quando a terapêutica é interrompida [Canning & Hollister 1992a; Kotler & Orenstein 1999].

Os poucos estudos publicados sobre a terapêutica das microsporidioses, inserem- se sempre no contexto de abordagem terapêutica às infecções oportunistas em doentes infectados por VIH. A terapêutica anti-retrovírica utilizada presentemente, no tratamento de doentes com sida, resultou num aumento dos níveis dos linfócitos T CD4+ que, com a concomitante redução da carga viral de VIH, conduziu a um decréscimo na prevalência da maioria das infecções oportunistas, incluindo da microsporidiose [Goguel et al. 1997; Conteas et al. 1998b; Maggi et al. 2000; Didier et

al. 2005; Wiwanitkit 2006; Morpeth & Thielman 2006]. Num estudo recente sugere-se

que os inibidores da aspartil protease do VIH, inibem directamente o crescimento de E.

intestinalis em culturas de tecidos [Menotti et al. 2005]. No entanto, a eficácia da

terapêutica anti-retrovírica é variável, devido a alguma toxicidade e a resistência viral, que se podem registar. É, então, possível que, no futuro, se venha a verificar um novo acréscimo na prevalência das infecções oportunistas, em particular em regiões em vias de desenvolvimento [Stark et al. 2009].

No Quadro V, apresentam-se os princípios activos e respectivas doses, encontrados na literatura.

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Quadro V- Terapêutica das microsporidioses.Adaptado de [Kotler & Orenstein 1999].

Microsporídios Princípio activo Dose

Enterocytozoon bieneusi Não existe terapêutica eficaz;

melhoria clínica em alguns doentes com albendazol

Infecções sistémicas por

Encephalitozoon spp.

Albendazol 400 mg BID

Infecções oculares por

Encephalitozoon spp.

Fumagilina (Fumidil b, 3 mg/ml; terapêutica com albendazol, também deve ser considerada

2 gotas em cada 2 horas, nos primeiros 4 dias, a partir do 5º dia, 2 gotas 4 vezes ao dia.

Trachipleistophora hominis Albendazol 400 mg BID Anncaliia vesicularum Albendazol e itraconazol 400 mg BID e QD,

respectivamente BID= duas vezes por dia; QD= uma vez por dia.

6.1.TRATAMENTO DA INFECÇÃO INTESTINAL

Na identificação de fármacos potenciais para o tratamento da microsporidiose, têm sido utilizadas culturas celulares e modelos animais [Snowden et al., 1999]. Em hospedeiros invertebrados, existem fármacos eficientes no combate à microsporidiose, nomeadamente a fumagilina (um antibiótico produzido pelo fungo Aspergillus

fumegatus) [Katznelson & Jamiesin 1952; Franzen 2008] ou o itraconazol no controlo

de Nosema apis em abelhas e noutros microsporidia em gorgulhos [Canning & Hollister 1991].

Ensaios clínicos, confirmaram a erradicação selectiva das espécies do género

Encephalitozoon, pelo albendazol [Molina et al. 1995]. Ensaios, in vitro, demonstraram

alterações no desenvolvimento de E. cuniculi [Beauvais et al. 1994]. O albendazol produz um desarranjo microtubular, inibindo a formação dos fusos mitóticos e bloqueando a divisão nuclear do parasita [Kotler & Orenstein 1999].

Na actualidade, o albendazol (benzimidazol) é o fármaco mais eficiente no tratamento das infecções causadas pela maioria das espécies de microsporidia no homem, embora a sua eficácia seja reduzida ou mesmo nula em E. bieneusi [Molina et

al. 1997; Conteas et al. 1998b].

O albendazol tem sido aplicado, com sucesso, na microsporidiose por

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ainda, erradicação dos parasitas nas fezes [Weber & Bryan 1994; Sobottka et al. 1995; Didier et al. 1996a; Gatti et al. 1997; Fournier et al. 2000b]. No entanto, dado que se observam recaídas nalguns doentes, a manutenção da terapia, pode ser necessária nestes doentes. Por vezes, após tratamento e melhoria da sintomatologia, podem ser detectados, ainda, esporos na urina. A persistência do parasita, em determinados focos infecciosos, pode justificar as recaídas, nestes doentes imunocomprometidos, apesar da manutenção do fármaco administrado [Molina et al. 1995].

A terapêutica com talidomida, um inibidor relativamente específico da citoquina TNF-, em doentes com sida, infectados por E. bieneusi, levou à diminuição dos sintomas, embora não se tenham verificado alterações significativas nos níveis elevados de TNF- nas fezes [Sharpstone et al. 1995; Sharpstone et al. 1997].

O TNP-470, um composto sintético, análogo da fumagilina, usado em ensaios clínicos do cancro da mama, é muito menos tóxico que esta última e, de igual modo, eficaz contra várias espécies de microsporidia (E. intestinalis, E. hellem, E. cuniculi e V.

corneae), em estudos quer in vitro quer in vivo. No futuro, este composto poderá

constituir-se como promissor agente antimicrosporidiano [Coyle et al. 1998; Curry & Smith 1998; Didier et al. 2006].

As infecções devidas a Enterocytozoon são muito difíceis de tratar, não existindo actualmente um tratamento consensual. O facto de não se conseguir cultivar E. bieneusi em culturas de células, dificulta ainda mais os ensaios farmacológicos in vitro nesta espécie. Alguns estudos iniciais, referiam o albendazol como tendo sido eficaz em seropositivos para VIH infectados por E. bieneusi, observando-se uma diminuição dos movimentos peristálticos e aumento de peso destes doentes. Ainda, verificou-se, um decréscimo da carga parasitária ao nível do intestino, e danos consideráveis nos diversos estádios de desenvolvimento do parasita que conduziam a inibição parcial da sua reprodução [Kotler & Orenstein 1999]. Todavia, em nenhum dos estudos ocorreu erradicação do parasita no intestino.

Outros fármacos têm sido utilizados no tratamento da microsporidiose, com resultados variáveis [Brasil et al. 1996; Bacchi et al. 2004; Didier et al. 2005; Zhang et

al. 2005; Didier & Weiss 2006], necessitando de ser confirmados os seus efeitos em

ensaios controlados, entre os quais se encontram o metronidazol, a furazolidona, a sinefungina, atovaquona, azitromicina e as sulfamidas.

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Por outro lado, refira-se, que uma dieta rica em triglicéridos de cadeia média, em detrimento de uma que contenha triglicéridos de cadeia longa, parece contribuir para uma melhoria da clínica dos doentes infectados por VIH, com diarreia e malabsorção associada à microsporidiose [Didier 1998].

Visto que ainda não se encontra disponível, um tratamento eficaz para as infecções por E. bieneusi, enquanto que as provocadas por Encephalitozoon spp., respondem, na maioria dos casos, ao albendazol, torna-se necessária uma diferenciação exacta dos géneros de microsporidia envolvidos na infecção dos doentes com microsporidiose.

6.2.TRATAMENTO DA INFECÇÃO OCULAR

Os primeiros casos de queratoconjuntivite por microsporídios em doentes com sida, não encontraram qualquer resposta terapêutica. A tentativa para tratar a queratite com uma lubrificação intensa, ou antibioterapia tópica revelou-se ineficaz (Friedberg, 1990)

A aplicação tópica da fumagilina permitiu a redução dos sinais clínicos, em doentes com sida com queratoconjuntivite microsporidial, devida a espécies do género

Encephalitozoon [Diesenhouse et al. 1993; Rosberger et al. 1993; Didier et al. 1996a;

Friedberg & Ritterband 1999]. Este fármaco, quando administrado por via sistémica (20 mg, três tomas diárias) é bastante eficaz contra E. bieneusi. No entanto, para além de apresentar toxicidade, causa neutropenia e trombocitopenia nos doentes, após duas a três semanas de tratamento [Molina et al. 1997]. O isetionato de propamidina e o itraconazol foram também descritos como eficazes no alívio sintomático da queratoconjuntivite por microsporídios do género Encephalitozoon [Yee et al. 1991; Metcalfe et al. 1992], embora após cessação da terapia ocorresse recorrência da infecção.