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Parte VI – Conclusões, contributos e recomendações

2. Turismo e transportes: evidências e referências conceptuais 1 Introdução

2.2. Turismo e transportes – enquadramento conceptual

No relatório lançado pela Organização Mundial de Turismo (UNWTO, 2012a), já anteriormente referido, o Secretário-geral da OMT realça o crescimento do turismo internacional das últimas décadas e, acima de tudo, o crescimento esperado nos anos

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futuros onde “(…) a OMT prevê mais 23 milhões de turistas por ano a usarem os céus desde hoje até 2030” (p. 4).

No entanto, desde sempre a OMT enalteceu o papel que o transporte aéreo tem tido para o desenvolvimento do turismo, ao considerar que “o transporte aéreo e o turismo são parte integrante de um mesmo âmbito de produção, tráfego e consumo (...)”, sendo que considerava, já nessa data, que “(...) o setor dos transportes e do turismo é difícil de definir e de medir, porque é uma amálgama de atividades que estão associadas com muitos outros setores económicos.” (Wheatcroft & WTO, 1994, p. 8).

Também Gee e Fayos-Sola (1997) reforçam que o setor das viagens e turismo é uma indústria multifacetada, com muitas componentes, incluindo a distribuição turística, transportes e infraestruturas, as instalações turísticas tais como, alojamento, estabelecimentos de restauração e os serviços de apoio. Veal (2006) introduz uma abordagem diferente ao considerar que a base da investigação em turismo assenta num leque diferenciado de disciplinas e paradigmas e na inter-relacão entre estas.

Como mencionado em Abrantes (2012), o evento internacional Routes, como reunião profissional de negócios focada inteiramente no desenvolvimento de rotas para as companhias aéreas (em www.routesonline.com), é demonstrativo de como os tempos mudaram e da interligação existente entre companhias aéreas/aeroportos e entidades turísticas. Em 2000, não havia qualquer entidade de turismo presente no Routes. No entanto, na edição de 2011 do Routes, em Berlim (Alemanha), havia mais entidades de turismo a participar com os aeroportos como “destination teams” do que em qualquer evento anterior, na medida em que as autoridades de turismo e os aeroportos já perceberam da necessidade de levar mais visitantes para um determinado destino. (ASM, 2012b).

O 20º aniversário do Routes, ocorrido em Chicago (E.U.A), em setembro de 2014, representou um crescimento de 10% face ao evento de Las Vegas (E.U.A) realizado no ano anterior e onde todos os recordes tinham sido batidos. De acordo com o diretor do Routes (Katie Bland), mais de 3000 delegados de mais de 120 países, 300 companhias aéreas e mais de 1000 aeroportos (dos quais 92 pela primeira vez) estavam presentes neste evento mundial (Airline Business Daily@Routes, 2014). Jones (2014) descreve que o ano de 2014 foi um ano de recordes que espera se mantenha em 2015 e anos seguintes. No total, ao longo de 2014, foram realizados seis eventos (incluindo o World

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Routes, o evento mundial) que contaram com um total de 630 companhias aéreas, 1500 aeroportos e 300 autoridades de turismo.

Assim sendo, a relação com a companhia aérea é agora aceite como o ponto de partida para o crescimento da capacidade de um destino e é também aceite que as organizações de turismo, como atores principais, devem assumir responsabilidades para o desenvolvimento de uma rota para um destino (ASM, 2012b, p. 17)2.

Duval (2007) advoga que o crescimento dos sistemas de transportes, pela sua importância para o transporte de pessoas (e carga), cria sinergias com o crescimento do turismo e vice-versa, pelo aumento da acessibilidade a destinos turísticos e pela popularidade das férias nas economias ocidentais. Esse ponto é realçado pelo Secretário-Geral da OMT (Rifai, 2015) ao considerar que o “crescimento do turismo tem sido marcado por uma significativa mudança de paradigma, à medida que o turismo se transforma rapidamente sob influência dos novos desenvolvimentos globais. Os comboios da Revolução Industrial foram substituídos por aviões, quando a indústria da aviação disparou.

Também Page e Connell (2006) salientam que, ao longo da história, as pessoas têm viajado por muitas diversas razões e que, por isso, o turismo é tão antigo quanto a atividade humana (p. 22).

Westlake e Robbins (2005) enumeram os vários fatores decisivos na escolha de um meio de transporte, como sendo, o tempo de transporte, a distância, a tipologia, o conforto, a segurança, os benefícios, o preço, a posição geográfica e a concorrência. Estes atributos têm contribuído para que, segundo os autores, alguns meios de transporte se tenham tornado, eles próprios, como elementos de atração turística, como é o caso, dos cruzeiros, dos comboios Orient Express, entre outros (do ponto de vista do transporte aéreo, também o avião supersónico Concorde terá atingido este estatuto, como o atingirá o projeto de turismo espacial da Virgin Galactic, embora

2 Portugal viu revalidado o seu programa de captação de novas rotas/companhias aéreas (Initiative.pt

2.0), visando apoiar 50 rotas e 1,5 milhões de passageiros adicionais (Publituris, 2012). De acordo com o art. 6º do regulamento do programa Iniative.pt 2.0, o financiamento do programa é feito entre a ANA (50%), o Turismo de Portugal (TP) (30%) e as Entidades Regionais de Turismo (ERT) com 20%. O programa mantem-se ativo entre abril 2012 e outubro 2015 (ANA, 2012a).

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momentaneamente suspenso após o acidente com a nave SpaceShipTwo, em novembro de 2014).

Hall (2005) afirma que os desenvolvimentos nos transportes têm um enorme impacto na mobilidade, motivação e procura, ou seja, impactos no modo como as pessoas viajam, sendo que, a introdução de novas tecnologias nos transportes teve consequências diretas no aumento da procura por viagens (Hall refere-se mais especificamente à introdução do avião com “cabine superior” que permitiu quase duplicar a capacidade oferecida face ao Jumbo Jet, numa referência ao atual Airbus A380).

Para Butler (1980), como citado em Duval (2007), existem cinco aspetos em que a inovação dos transportes teve impacto no turismo:

 Redução do tempo (de viagem);  Redução do custo (financeiro);

 Aumento do conforto e segurança dos passageiros;

 Aumento da conveniência (aumento da conectividade dos destinos);  Aumento da acessibilidade aos destinos (p. 10).

Duval (2007) reitera que as redes de exploração determinam fluxos e que esses fluxos justificam as redes, ou seja, o modo como uma companhia aérea oferece os seus voos para um determinado destino tem um importante papel para o desenvolvimento do turismo enquanto meio que possibilita o acesso e a conectividade necessárias para que esses turistas possam chegar a esses destinos.

Duval (2007), referindo-se a Kaul (1985, citado em Prideaux, 2000) enalteceu a formulação de alguns postulados sobre a ligação entre transportes e turismo, salientando que:

∆ A evolução do turismo está grandemente influenciada por e é função do desenvolvimento dos meios de transporte;

∆ O turismo é um fenómeno de massas, assim como uma atividade individual que precisa de transportes condizentes à sua categoria;

∆ As facilidades de transportes são uma necessidade do turismo e ambos operam como um fator delimitador ou expansionista dos fluxos de tráfego, cuja

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qualidade do tipo de turista pode depender da qualidade do meio de transporte oferecido;

∆ O desenvolvimento, manutenção e operação planeada das infraestruturas de transportes, numa política de transportes que enquadre as necessidades tecnológicas e de procura atual e futura, são a chave para o sucesso do sistema de transportes e do seu contributo para o crescimento do turismo;

∆ O preço e a diversidade da estrutura tarifária dos transportes influencia a elasticidade da procura, tal como, a competitividade leva a reduções tarifárias e aumentos da qualidade entre meios de transporte, com benefício para o turismo; ∆ A integração de sistemas de transportes internacionais e domésticos e,

paralelamente, a coordenação entre outros países, contribui para o aumento dos fluxos e o crescimento do turismo doméstico e internacional;

∆ Os desenvolvimentos tecnológicos nos transportes devem exercer uma influência nos meios e padrões de transporte que resultem em sistemas de transporte mais eficientes, rápidos e seguros, beneficiando o crescimento e expansão do turismo;

∆ O alojamento, como ingrediente essencial para o desenvolvimento e sucesso do turismo, deve manter níveis de crescimento que acompanhem a procura e expansão dos transportes;

∆ O desenvolvimento das infraestruturas, a incorporação de novas tecnologias e a utilização de técnicas de mass marketing nos transportes terão um efeito direto no continuado crescimento futuro do turismo mundial.

Elamiri (2001) destaca o papel indutor do transporte aéreo no turismo, salientando que ambos têm tido um desenvolvimento paralelo na procura nos dois setores de atividade, embora, se tenha vindo a verificar um maior crescimento no transporte aéreo. Mesmo assim, enaltece a necessidade de criação de sinergias para promover um desenvolvimento turístico sustentável com base em desafios e soluções que potenciem os pontos fortes de ambos os setores.

Bieger e Wittmer (2006), além de considerarem quatro etapas distintas na relação entre transporte aéreo e turismo, advogam, no seu segmento de lazer, que a interdependência entre transporte aéreo e turismo é bastante forte, condicionando o seu estudo que deve ser considerado integrado (e não numa visão unilateral).

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No entanto, olhando para muita da investigação recente em turismo e transportes, esta tem versado, com maior premência, nas problemáticas ambientais e de sustentabilidade, em grande parte, devido ao aumento do tráfego, maior pressão nos meios de transportes e infraestruturas e respetivos efeitos adversos. Como referem Goeldner e Ritchie (2012), alguns desses efeitos adversos têm a ver com os congestionamentos, com perdas de tempo e energéticas, em especial durante os períodos de maior procura; com segurança, garantindo que os meios de transporte sejam seguros para uso turístico; com o meio ambiente, não só pela capacidade de carga dos destinos como pelos efeitos daí decorrentes; e, com a sazonalidade, a saturação, a sobreutilização e o desequilíbrio dos destinos em determinadas épocas (p. 96).

Para Valente e Cury (2004) “(...) as atividades do turismo e do transporte aéreo têm tido uma evolução muito próxima uma da outra. A história do turismo se funde à dos transportes, sendo que uma exerce relação de causa e efeito sobre a outra. Essa aproximação das atividades permite ampliar o conceito de empresa aérea como uma empresa turística (...)” (p. 42), o que leva a que, segundo os autores, seja necessário uma reorganização de toda a cadeia de valor da atividade turística, onde os destinos turísticos, os transportes turísticos e os polos emissores de turistas estejam integrados numa “rede” de valores e objetivos comuns.

Globalmente verifica-se uma sintonia nas posições dos diferentes autores ao realçarem o papel fundamental que os transportes têm tido para o desenvolvimento do turismo, seja por razões de planeamento, temporalidade, económicas, tecnológicas e infraestruturais. Mesmo assim, os efeitos adversos relacionados com a utilização exaustiva dos meios e infraestruturas deixam alguns alertas para os congestionamentos, elevada capacidade de carga, efeitos ambientais e desequilíbrios nos destinos, não deixando de ser uma preocupação para outros investigadores.