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2.3.1 – A VISÃO PROSPECTIVA DO PLANEAMENTO E A APROXIMAÇÃO ÀS DINÂMICAS TERRITORIAIS.

A visão prospectiva de planeamento implica incorporar nos programas e projectos dos planos uma visão estruturante e de longo prazo. À semelhança do que se prevê na Carta Europeia de Ordenamento do Território, a característica prospectiva que o ordenamento do território deve integrar consiste no «dever de analisar as tendências e os desenvolvimentos a longo prazo dos fenómenos e intervenções, ecológicas, sociais, culturais e ambientais tendo em conta a sua aplicação»95, não esquecendo que a concepção e execução dos planos é sempre um processo

contínuo de aprendizagem e avaliação crítica da realidade municipal.

Segundo Valente Pereira, «o planeamento local é essencialmente uma actividade de comunicação, a qual se estabelece entre os agentes sociais formais e informais com interesses na área do planeamento»96. Esta postura permite efectuar uma avaliação da realidade local, indo ao encontro

das pretensões dos intervenientes que efectivam os programas de execução dos planos. Daqui resulta que planear é prever mais que um plano de acção o qual não é puramente passivo, mas o resultado de um processo de interacção e reajuste. É neste sentido que Pereira de Oliveira considera que «um plano nunca poderá ser correctamente um resultado de uma expressão tecnocrata, um resultado feito à margem dos grupos humanos e das intenções que o justificam»97.

A sistematização de estratégias comuns em instrumentos, que regulam a actividade dos diversos intervenientes (públicos ou privados) no território, afigura-se essencial num processo de consistência de planeamento mas com capacidade de ajuste a novas dinâmicas territoriais. Este ajuste requer uma visão prospectiva, o que significa a necessidade de valorizar a dimensão

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Alexandre, A. (2003), p. 201

95

Direcção Geral do Ordenamento (1984), p. 7.

96

Pereira, V. (1995), p. 1.

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estratégica do plano permitindo inflexões e cenários alternativos de desenvolvimento. Assim partilha-se a opinião daqueles que consideram «que a inflexão estratégica só pode ocorrer num plano que contenha mais do que uma alternativa de desenvolvimento»98. A definição de várias alternativas possíveis traduz a possibilidade de, perante desenvolvimentos futuros não previsíveis no presente, se criar margem necessária para se optar pela melhor alternativa no momento da concretização do plano. Esta postura coloca uma clara ênfase na execução, traduzindo a preocupação de criar mecanismos que a garantam logo aquando a elaboração do plano. A estratégia alternativa apresenta-se como um meio de gerir a mudança visando tornar aceitáveis e convenientes novas formas de actuação, as quais podem não ser previsíveis à partida.

Numa visão prospectiva de plano também se podem efectuar juízos de prognose, mas será difícil considerar todas as variáveis em causa. Em qualquer dos casos enfrentam-se sempre os desafios conceptuais e operativos decorrentes da incerteza criada pelos dinamismos do exterior, a crescente complexidade dos processos urbanos e da diversidade de interesses e agentes que estão implicados99.

Quando se fala em PMOT, designadamente no caso dos PDM, há que ter em conta a vertente estratégica desta figura de plano que, para além da sua função de ordenamento, deve também representar um consenso relativamente às opções estratégicas onde a comunidade se revê em termos futuros. Nuno Portas denuncia a ausência de programa e estratégia do PDM, para os quais sugere uma regulação variável, podendo ter um elevado grau de determinismo em algumas áreas do território e muito pouco noutras. A «regulação de escala variável»100 no mesmo plano não foi a

opção seguida pelo RJIGT e em qualquer dos casos a necessidade da componente estratégica no PDM parece essencial. Neste sentido Biencard Cruz, faz apelo ao carácter estratégico da figura do PDM, que a par da sua função de instrumento de ocupação do solo, deve estabelecer um modelo de desenvolvimento a adoptar para o município, traduzindo um futuro desejável e consensualizado de decisões e medidas concretas.101 Tal só será possível se estiverem balizados os limites de actuação

da Administração e criadas as condições para uma efectiva participação dos cidadãos.

98

Hall, P. (1980), p. 8. Na mesma linha Juan Busquets considera que o plano deve ser visto como um processo de reflexão com grande capacidade para expressar alternativas (Juan Busquets (1998), p. 135). Entre outros também Paulo Correia realça a importância da dimensão estratégica das acções formalizadas pelos planos, designadamente no que respeita à «capacidade tática de inflexão a nível operacional para ir superando desvios e minimizando incertezas» (Correia P. (2000), p. 156).

99 Guerra, I. (2000), p. 42. 100 Portas, N. (1998a), pp. 83-84. 101 Cruz, B. (2003), p. 4.

A visão prospectiva do plano assume um papel de relevo na sua execução. Esta deve ser entendida como a maneira de continuamente concretizar o plano,102 com capacidade de ajustamento à

realidade. Deve conter a possibilidade, no momento da sua concretização, de ponderar novos elementos não existentes à data da elaboração do instrumento de gestão territorial. Tal como sublinha Nuno Portas após o plano continuam a julgar-se os novos dados, as novas situações face à estratégia e não à conformidade com as disposições traçadas.103 Ao pretender-se que o plano tenha

uma execução efectiva, não se pode acreditar que os programas a realizar se mantenham inalterados no tempo, mas antes dotar o instrumento da flexibilidade necessária para se adaptar às novas circunstâncias. É nesta linha que Sidónio Pardal, Paulo Correia e Costa Lobo apelam à «necessidade de se procurarem processos de planeamento diferenciado, incrementalista e sensível às alterações significativas no curto e médio prazo»104.

Por outro lado, as intervenções no território não podem estar circunscritas a divisões administrativas, tem de haver coerência nas estratégias e a noção do impacto das propostas no ordenamento. O PDM tem de enquadrar os desafios globais que se colocam ao concelho e desenvolver mecanismos de resposta, ainda que estes remetam para formas de resolução em instrumentos mais detalhados. Nas figuras de plano com escala de mais pormenor que o PDM, designadamente os PU e PP, é essencial ter em conta a capacidade das infra-estruturas e equipamentos existentes e a possibilidade de execução dos que estão programados no plano. Assegura-se fundamental ponderar o crescimento previsto com tais infra-estruturas, evitando rupturas ou saturações e indo ao encontro das dinâmicas demográficas, sociais e económicas preconizadas. O sucesso da execução dos planos será tanto mais conseguido quanto maior for a capacidade destes integrarem dinâmicas territoriais coerentes com os territórios que lhe são adjacentes (por exemplo preservação de recursos naturais que integram dois ou mais municípios ou rede viária que responda a movimentos pendulares). A dimensão regional pode ser fundamental na resposta a problemas que só farão sentido se tratados em conjunto.

Para que o plano possa passar do papel para a acção, é necessário ser selectivo nos objectivos e nas apostas de desenvolvimento. A sua execução depende ainda da capacidade de promoção e comunicação de novas propostas e da aproximação destas às dinâmicas territoriais. Esta ideia é realçada por Sousa Lobo quando sublinha a importância de desenvolver uma maior adequação das

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Jorgen Amdam reportando-se ao planeamento estratégico considera-o um processo de aprendizagem que nunca está terminado (Amdam, J. (1999), pp. 66 e ss.).

103

Portas, N. (1998a), p. 84.

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soluções ao seu contexto, através do aproveitamento eficaz dos recursos locais com formas de diálogo e negociação.105

Neste sentido, Nuno Portas propõe que os PDM ou os PU contenham mecanismos susceptíveis de ser adaptados às novas realidades, entretanto surgidas, sem que seja necessária a abertura de procedimentos formais de revisão do plano.106 A capacidade de desenvolver uma análise que capte

as características da realidade sócio-territorial da esfera de intervenção do plano, bem como os mecanismos para a efectivar e negociar em tempo útil revela-se fundamental. Sendo assim, os planos não podem opor-se às realidades locais, gerando conflitos e colidindo com os interesses vitais das populações que directamente estão envolvidas. Patsy Healey chama a atenção para a importância do planeamento estar embebido no contexto das relações sociais e na prática do quotidiano, «has a capacity to challenge and change these relations through the approach to these practíces»107. Na mesma linha, Valente Pereira considera «que planear não é encomendar/produzir

planos é desenvolver uma actividade contínua que permita tomar decisões ajustadas à prossecução dos interesses da população e definir como proceder à sua implementação»108.

Os factores que intervêm no maior ou menor sucesso de implementação dos planos têm inevitavelmente que ser cruzados com os processos regulamentares que os informam. Os novos desafios que se levantam à actividade de planeamento, nomeadamente os que estão relacionados com o desenvolvimento de mecanismos capazes de balizar a discricionariedade administrativa, flexibilizar os instrumentos de gestão territorial e responder a necessidades de política fundiária, têm que ser analisados numa perspectiva de actuação da Administração que permita o ajuste às dinâmicas territoriais.

2.4 – O CARACTER POLÍTICO DO PLANEAMENTO E O PODER

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