• Nenhum resultado encontrado

Workaholism: O que sabemos a respeito

SUBJETIVIDADE DOS INDIVÍDUOS NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO

1. Workaholism: O que sabemos a respeito

Apesar de soar como um neologismo, a palavra Workaholic já faz parte do dicionário Oxford de Inglês como substantivo utilizado para definir “uma pessoa que trabalhe de forma compulsiva e excessiva por longas horas”1. A literatura aponta o psicólogo americano Wayne Oates como um dos primeiros nomes a explorar a situação de vício em relação ao trabalho em sua obra Confessions of a Workaholic, de 1971.

Embora o debate tenha se expandido de lá pra cá, no Brasil muito do que se encontra em termos de informação sobre o tema é difundido de forma superficial pela mídia popular tal como salientado por Carlotto (2011) ao dizer que “o que se verifica, hoje, é uma grande quantidade de informações com definições gerais e orientações voltadas para a autoajuda, geralmente, executadas por sites comerciais”. Em revistas especializadas em gestão de carreiras, por exemplo, não é rara a presença de matérias intituladas com dizeres do tipo “Workaholic, o herói que virou vilão” e recheadas de definições superficiais que povoam o senso comum corporativo, tais como “o workaholic é o profissional moralmente manco, que penaliza os demais pela sua própria falta de planejamento, má gestão do tempo, incapacidade de trabalhar em equipe e, quem sabe, distúrbios psicológicos” (Revista Exame, 2011).

Enquanto isso a produção acadêmica que norteia a compreensão científica do fenômeno Workaholic em si, bem como suas causas e efeitos, ainda é, majoritariamente, oriunda de campos específicos do conhecimento, mais precisamente de profissionais europeus e norte-americanos de áreas como psicologia e administração.

Dentre os autores dedicados ao entendimento do Workaholism, Patrícia Almeida cita além de Oates, outros como Killinger (1991); Salomone (1994); e Porter (2005); “que demonstram que essa ligação excessiva ao trabalho, além de ser efeito de alguma disfunção psíquica anterior, leva o trabalhador a outras perturbações, sejam elas físicas ou mentais” (DOS SANTOS, 2010, p. 16).

2430 É possível identificar como recorrente as referências feitas ao trabalho de Wilmar Schaufelli pelos demais autores que compõem a revisão desta literatura. Segundo Mazzetti, Schaufeli e Gugliemi (2014) o Workaholism é uma síndrome caracterizada pelo comportamento obsessivo do indivíduo em relação ao trabalho, o levando a dedicar extraordinária parte de seu tempo a longas jornadas de trabalho que se estendem para além das horas previstas pelo contrato de trabalho. Alguns dos indicadores mais associados a este quadro são o cumprimento de extensas jornadas de trabalho no próprio escritório, seguidas do hábito de levar trabalho para casa nos finais de semana e feriados e o incontrolável impulso de pensar em trabalho mesmo quando fora do ambiente laboral, como em momentos de férias ou de lazer com família e amigos.

Ainda segundo Schaufeli, o quadro de Workaholism é composto pela combinação de duas dimensões presentes no Workaholic, a dimensão comportamental e a dimensão cognitiva. Respectivamente, a primeira é nomeada como uma categoria de trabalho excessivo e se refere a indicadores objetivos como a mensuração de horas trabalhadas e a redistribuição de tempo feita entre trabalho e lazer, através dos quais, geralmente, é constatado que o indivíduo Workaholic trabalha além do necessário para cumprir as demandas organizacionais e econômicas. Já a segunda, é nomeada como categoria de trabalho compulsivo, associada ao impulso para o trabalho que deflagra um quadro de obsessão em relação ao trabalho. Este quadro, geralmente, é analisado após avaliação de características e traços de personalidade como perfeccionismo, ultradetalismo, autoeficácia, centralização de tarefas entre outras.

A partir da convergência de características como as acima mencionadas, o perfil workaholic traçado é o do profissional orientado para o sucesso, de personalidade competitiva, com autoimposição de metas que acarretam efeitos negativos que vão além da exaustão física ou psicológica, mas que também comprometem relações afetivas no âmbito corporativo e familiar (SCHAUFELI, 2014; SCOTT et al., 1997). Segundo conceito elaborado por Spence e Robbins (1992) o vício em trabalho é constituído por um alto envolvimento com o trabalho por meio de forte impulso e baixa satisfação com o mesmo.

No México, o fenômeno é designado pela expressão Trabajolismo, contudo, a definição de workaholism – ou vício laboral, como nós pretendemos utilizar – utilizada por autores latinos consiste na mesma cunhada por autores como Schaufeli que leem o vício laboral como uma tendência do sujeito a investir muito no trabalho, em termos de esforço e

2431 tempo, preso a um compromisso emocional e uma incapacidade de desconectar-se do trabalho que não se deriva de necessidades ou circunstancias externas (ROCÍO e POZO, 2010).

Um estudo piloto feito baseado na Dutch Work Addiction Scale (DUWAS)2, desenvolvida por Schaufeli, dividiu e classificou trabalhadores em dois grupos, Executivos/Administradores e Operacionais. De acordo com os resultados divulgados, características da categoria Trabalho Compulsivo (TC) foram identificadas em níveis equivalentes em ambos os grupos, enquanto o número de profissionais com níveis de Trabalho Excessivo (TE) acima da média foi maior no grupo de Executivos/Administradores. Com isso, o estudo identificou que a presença de níveis acima da média em ambas as categorias, TC e TE, era maior entre os profissionais do grupo de Executivos/Administradores, apontando maior grau de vulnerabilidade destes profissionais a um quadro de vício laboral do que em profissionais com funções operacionais (CASTILLO e GOMEZ, 2012). Já com uma abordagem de perspectiva econômica, Hamermesh (2005) aponta evidências de que pessoas com maior escolaridade e renda sofrem mais com o vício laboral e estão mais dispostas a adiar os planos de aposentadoria.

Acreditamos que os resultados e conclusões das pesquisas mencionadas se corroborem, o que nos permite sugerir que o campo social no qual estes indivíduos estão inseridos seja explorado como variável preponderante para a manifestação do Workaholism. Distinguir um profissional viciado de um profissional engajado, comprometido, com o trabalho não é tarefa fácil por ser tênue a linha que diferencia o vício do comprometimento. Para especialistas (VAN BEEK et al.,2012) ambas são formas de relação de bem estar com o trabalho, entretanto, estas podem ser classificadas em boas ou ruins.

Diferentemente do Workaholism, o Engajamento é considerado uma forma positiva de comprometimento com o trabalho onde o indivíduo engajado é proativo e mostra maior satisfação com o seu próprio trabalho e com a empresa, o que lhe proporciona melhores performances sem que haja comprometimento de aspectos psicológicos, fisiológicos ou afetivos. Este tipo de relação seria aquela vivenciada pelos apaixonados pelo trabalho – ou como as mídias populares os vem chamando, Worklovers – que através de uma experiência sadia de trabalho se realizam enquanto indivíduos.

Isto é justificado com a afirmação de que este tipo de relação é baseada em um estado mental de vigor, dedicação e absorção. O trabalhador engajado é altamente resiliente, possui muita energia e persistência para investir no trabalho que está realizando, isto é, vigor. A

2432 dedicação ocorre através do profundo envolvimento com o trabalho e a experiência de viver algo significante e transformador que inspire, entusiasme e orgulhe o sujeito. Quanto à absorção, esta corresponde ao fato do sujeito estar completamente concentrado em sua atividade, capaz de passar longas horas concentrado sem se sentir cansado ou desgastado pelo esforço empenhado. Até aqui já foi dito que as motivações que orientam os sujeitos viciados e os comprometidos com o trabalho são de ordens distintas, pois o workaholic é guiado por um impulso obsessivo já o profissional engajado é guiado pela paixão realizadora que o trabalho lhe proporciona. Contudo, faz-se necessário esclarecer que embora workaholism e síndrome de burnout estejam associadas a uma série de resultados negativos ambos não são a mesma coisa.

O Burnout é comumente definido como uma crise de esgotamento profissional desenvolvendo-se de forma cumulativa e paulatinamente no indivíduo. Três dimensões da síndrome são a exaustão emocional, despersonalização e diminuição da realização pessoal no trabalho. Geralmente, devido ao stress, pessoas que até então nunca haviam apresentado diagnóstico de problemas psicopatológicos começam a sofrer com sintomas como a depressão (Carlotto, 2002). O trabalhador que sofre com este tipo de síndrome adota um comportamento de indiferença com o trabalho, “ele desenvolve um bloqueio mental em relação ao seu trabalho” (VAN BEEK et al., p. 32).

2. Metodologia

Foi utilizada como metodologia para este trabalho uma revisão bibliográfica de artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais, especificamente, sobre o Fenômeno Workaholic. Em seguida, a análise e proposta de reflexão do fenômeno foram feitas com base no referencial teórico trabalhado em sala pela disciplina Teoria Antropológica do PPGCSO/UFES, bem como através de leituras complementares de outros autores das Ciências Sociais.