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AS CORONAVIROSES E SEUS IMPACTOS

No documento Layout Livro Covid (páginas 100-104)

EPIDEMIA DA COVID-19 E A INSERÇÃO DA SAÚDE ÚNICA NO BRASIL

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.2 AS CORONAVIROSES E SEUS IMPACTOS

Atualmente, o mundo enfrenta diversos problemas complexos, que envolvem o ambiente, questões sociais, aspectos econômicos, comportamentais e infecções emergentes. Mesmo com todo avanço científico, doenças causadas por infeções e resistências bacterianas, o aumento das infecções viróticas e o aparecimento de doenças zoonóticas emergentes desafiam os conhecimentos e mobilizam cientistas em diversas partes do mundo (WHO, 2015; DE KRAKER; STEWARDSON; HARBARTH, 2016; PEERI et al., 2020). Dentre as doenças e condições mencionadas, as coronaviroses que afetam humanos são ameaças à saúde coletiva e mundial.

Há 18 anos atrás foi identificado pela primeira vez uma coronavirose capaz de causar problemas respiratórios em humanos. O SARS-CoV foi isolado no ano de 2002 na província de Guangdong, na China (Figura 3). Este surto foi marcado por uma falta de transparência do Ministério da Saúde Chinês, com 8.096 casos da doença, 774 mortes e uma taxa de letalidade de 9,5% (SMITH, 2006). O vírus foi isolado no gato civeta asiático (Paguma larvata), um reservatório natural e bom amplificador do vírus (CHENG et al., 2007; PEERI et al., 2020). Além disso, variantes do SARS-CoV foram isoladas em outros reservatórios, como em morcegos-ferradura (CHENG et al., 2007). Sugeriram naquela época, que os focos de transmissão para o humano teriam relação com mercados abertos, uma vez que culturalmente alguns chineses têm o hábito de comer mamíferos exóticos (CHENG et al., 2007). Algo parecido também foi sugerido para a pandemia atual de COVID-19.

Após o surgimento da SARS-CoV, surgiu em 2012 o MERS, outro coronavírus capaz de causar problemas respiratórios, resultando em uma grande crise de saúde pública global.

O vírus surgiu pela primeira vez na Arábia Saudita (Figura 2), quando um homem de 60 anos apresentou pneumonia grave (MACKAY; ARDEN, 2015). A suspeita de transmissão do MERS se deu por meio do contato do homem com camelos, posteriormente o vírus foi identificado nesta espécie e também sugeriram sua presença em morcegos (BANERJEE et al., 2019). O SARS desapareceu, mas o MERS continuou a circular e, em novembro de 2019, causou 2.494 casos confirmados e 858 mortes, com uma taxa de letalidade de 34,4% (WHO, 2019).

Figura 2. Primeiros casos de coronaviroses humanas na China (2002-2003) e Arábia Saudita (2012).

Em dezembro de 2019, um novo coronavírus foi identificado causando problemas respiratórios na cidade de Wuhan na China. Esse coronavírus foi denominado (SARS CoV- 2), foi isolado pela primeira vez entre um grupo de pacientes que apresentavam uma forma não identificada de pneumonia viral com histórico compartilhado de visitas ao mercado de frutos do mar de Huanan (WANG et al., 2020). Ao contrário do SARS-CoV e MERS-CoV, as infecções humanas causadas pelo SARS-CoV-2 extrapolaram em muito as fronteiras de seu epicentro de transmissão, causando uma pandemia. O número de infecções devido ao SARS-CoV-2 continuou a crescer desde o seu surgimento, em dezembro de 2019. A disseminação do SARS CoV-2 causou uma crise de saúde pública por ter se espalhado rapidamente para mais de 215 países, infectando mais de 30 milhões pessoas, até o dia 19 de setembro de 2020 (WHO, 2020; WORLDOMETERS, 2020).

A pandemia pelo COVID-19 impôs às nações grandes desafios de enfrentar uma crise conjunta de saúde e economia de proporções sem precedentes na história mais recente do mundo. Um ponto marcante seria a capacidade dos sistemas de saúde em gerir a pandemia com uma política de supressão ou de mitigação.

Observa-se que no curto prazo, uma pandemia descontrolada sem nenhuma medida de saúde pública levaria a capacidade do sistema de saúde de qualquer país ao colapso (Figura 3). A capacidade das unidades de terapia intensiva, o número de leitos hospitalares, o número de profissionais de saúde qualificados, ventiladores mecânicos, medicamentos, diagnósticos, etc. - é finita. Isso impõe um limite superior ao número de pacientes que poderiam ser tratados adequadamente em qualquer momento.

Considerando os dados apresentados (WHO, 2020), temos uma taxa de letalidade próxima a 3%*. Caso ¼ da população fosse infectada pelo vírus, teríamos 1,95 bilhões de pessoas expostas. Como nem todas as pessoas ficam doentes teríamos 85% de assintomáticas ou com quadros leves e os demais 15% seriam de casos graves ou críticos (LAUER et al., 2020; LI et al., 2020; LIU et al., 2020). Conforme estes autores, o último grupo (casos graves ou críticos) a letalidade poderia chegar a 65% dos casos, portanto teríamos com base nas hipóteses mencionadas 190 milhões de mortes em todo mundo, caso nenhuma medida de saúde pública fosse realizada.

Figura 3. Impactos de uma pandemia sobre o sistema de saúde (GOURINCHAS, 2020).

*O porcentual de 3% é baseado nos dados notificados (WHO, 2020), talvez esse valor não reflita a realidade, pois há uma grande quantidade de pessoas que manifestaram sintomas leves ou ficaram assintomáticos para covid-19 e não chegaram a ser submetidas aos exames de diagnóstico.

Se a epidemia não fosse controlada, e dado o que sabemos da taxa de transmissão do coronavírus, a pandemia dominaria rapidamente qualquer sistema de saúde, deixando muitos pacientes infectados com doenças pulmonares em deterioração sem qualquer tratamento (GOURINCHAS, 2020). Tal situação elevaria a taxa de mortalidade e letalidade de cada país.

Políticas públicas de saúde podem achatar a curva impondo medidas de distanciamento social e promovendo práticas para reduzir a taxa de transmissão. O achatamento da curva espalharia a pandemia com o tempo, permitindo que mais pessoas recebessem tratamento de saúde adequado - em última análise, reduzindo a taxa de mortalidade, como mostrado na curva azul na Figura 4. Os países que adotaram medidas de contenção, como Taiwan, Cingapura ou as regiões chinesas fora de Hubei, viram o número de casos crescer lentamente e agora estão experimentando um declínio de casos

Considerando o cenário de interação entre a saúde humana, animal e ambiental, o conceito e aplicação de Saúde Única (One Health) é de extrema importância. Nessa perspectiva de Saúde Única, a transdisciplinaridade poderia contribuir na compreensão dos ciclos de transmissão, na busca por mecanismos de prevenção e mitigação da transmissão, além de produzir conhecimento para futuras doenças zoonóticas emergentes, incluindo coronaviroses como o caso de COVID- 19 (AHMAD et al., 2020; BONILLA-ALDANA;

DHAMA; RODRIGUEZ-MORALES, 2020).

Os programas de saúde que visam uma abordagem integrativa para as coronaviroses devem considerar o papel das iniciativas de Saúde Única. Desta forma, estudos e controles das doenças emergentes e zoonóticas podem requerer uma abordagem transdisciplinar que minimizem futuros impactos sobre as sociedades.

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