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Encontros, desencontros, reencontros dos feminismos da América Latina e Caribe

No documento FEMINISMO E EVANGELIZAÇÃO (páginas 102-128)

101 Mais explicitamente: por serem de caráter extraoficiais, os Encontros são instâncias críticas transnacionais, nos quais as ativistas locais negociam, renegociam e definem as ações específicas dos feminismos da região. Sem dúvida, são instâncias privilegiadas de diálogo, troca de idéias e reflexão crítica feminista, com acirrados debates e controvérsias.

Mas são também espaços de formação de alianças entre as diferentes correntes de pensamento feminista, de compartilhamento de projetos e perspectivas, bem como da articulação de solidariedades e do fortalecimento de utopias.

As participantes desses encontros são mulheres que se identificam com o feminismo, vindas de diferentes países, classes sociais, faixas etárias, opções sexuais, grupos étnico-raciais e religiosos, apresentando trajetórias políticas múltiplas e experiências diversas de atuação numa rica variedade de espaços. As analistas56 definem esses encontros como “marcos históricos” que destacam os debates intrarregionais mais importantes permitindo que as militantes compartilhem suas diferentes perspectivas, questionem as diversas formas de opressão, reorientem os discursos e as práticas feministas e construam significados políticos e culturais alternativos, que são contextualizados conforme as distintas realidades locais e nacionais como se pode ver nas páginas seguintes.

2.1 Encontros, desencontros, reencontros dos feminismos da América Latina e

102 organizações feministas; a relação do feminismo com o Estado e com as instituições políticas nacionais e internacionais; os efeitos do terrorismo e dos fundamentalismos para as mulheres. Essas e outras discussões que marcaram os Encontros dos anos de 1990, alicerçaram a participação ativa das feministas latino-americanas e caribenhas em diversas mobilizações do final daquela década e no início deste século, como as jornadas de Seattle, em 1999, as várias rodadas de negociações da Organização Mundial do Comércio, as campanhas contra os fundamentalismos, lançada pela Articulação Feminista MarcoSul, em 2002, para enfrentar a explosão do terror e da guerra detonados por Bin Laden e Busch.

Sem dúvida, a realização dos Encontros em diferentes países também tem sido uma oportunidade ímpar para se enfatizar abordagens específicas de cada microrregião. Suas observadoras notaram que enquanto os feminismos da região fincaram suas raízes numa grande diversidade de espaços sociais e lutas políticas, os Encontros, por sua vez, permitem a partilha de novas e diferentes perspectivas e a construção de significados políticos e culturais alternativos.

Observa Alvarez que, embora às vezes estejam politicamente isoladas em seus países, as participantes dos Encontros se articulam com outras, cujos feminismos surgem de condições sociopolíticas e históricas semelhantes58. É importante assinalar também que na medida em que essas novas militantes, de idades e origens geográficas, sociais e étnico- culturais diversificadas se encontram, a compreensão do feminismo e as modalidades das lutas feministas são salutarmente questionadas, revisadas e remodeladas.

Assim, os Encontros – e também os “desencontros” que por vezes ocorreram59 – têm proporcionado fecundos diálogos que favorecem a rearticulação de alianças intrarregionais, fundamentadas na solidariedade política entre mulheres. A esse respeito Gina Vargas, em sua análise dos Encontros da região nessa década, ao destacar alguns dos novos significantes que o feminismo colocou no centro dos debates democráticos, assinala que essa ação coletiva transnacional foi orientada fundamentalmente para a recriação de práticas coletivas, fazendo uso de novas categorias analíticas, novas visibilidades, e até mesmo de novas linguagens inventadas pelos feminismos em nível nacional, nomeando

58 ALVAREZ, S. E. et al. Encontrando os feminismos latinos..., p. 543.

59 ALVAREZ, S. E. et al. Encontrando os feminismos latinos..., p. 545 e 554.

103 aquilo que até então não tinha nome: sexualidade, violência doméstica, assédio sexual, estupro conjugal, feminização da pobreza60.

Por fim, é importante ainda notar que mesmo sendo especificamente de âmbito regional, os Encontros também têm acolhido diversas expressões do feminismo intercontinental; no decorrer das onze edições realizadas registrou-se um número significativo de participantes de vários continentes, sobretudo da Europa e América do Norte, cada uma trazendo seus desafios, mas também suas perspectivas, experiências e utopias. Com certeza, esse intercâmbio enriquece os feminismos latino-americanos e caribenhos abrindo-os sempre mais para novos questionamentos, novas perspectivas e novas práticas. Isto se pode verificar olhando mais de perto cada um dos encontros bienais ou trienais, realizados a partir da década de 1980 em diferentes países da região. O quadro que apresentaremos nas páginas seguintes, ainda que de forma sintética, possibilita termos uma visão mais específica de cada um dos encontros realizados em nível de América Latina e Caribe61.

60 VARGAS, G. Encuentros feministas: énfasis y estratégias. Feminismos plurales..., p. 30.

61 Por razões metodológicas, apresentamos aqui toda a bibliografia utilizada na elaboração do resumo-esquema dos Encontros que constam nas páginas seguintes. Além destas, outras obras foram consultadas, mas não utilizadas e por isso não as mencionamos aqui. ALVAREZ, S. E. et al. Feministas na América Latina: de Bogotá a São Bernardo. Estudos Feministas, v. 2, n. 2, p. 264-295, jul.-dez. 1994; ALVAREZ, S. E. et al. Encontrando os feminismos latino-americanos e caribenhos. Estudos Feministas, v. 11, n. 2, p. 541-575, jul.-dez. 2003;

CENTRAL DE MOVIMENTOS POPULARES. Boletim Informativo, Ano 1, n. 4, p. 2, jan. 2000; COMITÉ CENTROAMERICANO. Memorias del VI Encuentro Feminista Latinoamericano y del Caribe. Managua:

Imprenta Universidad Centroamericana, 1993, p. 12, 71-80; CORTÊS I. R. VIII Encontro Feminista da América Latina e Caribe, Brasília, Jornal Fêmea, Centro Feminista de Estudos e Assessoria, Ano 7, n. 83, p. 8, dez. 1999;

COLECTIVO DE MUJERES PANCHA CARRASCO/LAS MALINCHES/MUJERES POR LA DIGNIDAD Y LA VIDA/COLECTIVO DE MUJERES MATAGALGA/AGRUPACIÓN DE MUJERES TIERRA VIVA. Lo que siempre quisiste saber sobre feminismo en centroamérica y no te atreviste a preguntar. El Salvador- Nicaragua-Costa Rica: Centro Editorial de la mujer, 1994; FISCHER A. P. Los Encuentros Feministas: en busca del rumbo perdido o de uno nuevo. In: BEDREGAL, X. et al. Feminismos cómplices: gestos para una cultura tendenciosamente diferente. México-Santiago de Chile: Pre libro de La Correa Feminista, 1993, p. 27-46;

GÓMEZ, J. B. Mulheres católicas e feminismo: um estudo de trajetórias de vida. [Dissertação], São Paulo:

Pontifícia Universidade Católica, 1998, p. 93-137; STERNBACH, N. S. et. al. Feminismo(s) na América Latina:

de Bogotá a San Bernardo. Estudos Feministas, v. 2, n. 2, p. 393-434, jul.-dez. 1994; SEMPREVIVA ORGANIZAÇÃO FEMINISTA. BOLETIM MULHER E SAÚDE, n. 20, p. 15, abr. 1999; VARGAS, V.

Encuentros feministas: énfasis y estrategias. In: Feminismos plurales: VII Encuentro Feminista Latinoamericano y del Caribe. Aportes para el 7º debate de la Agencia Lationamericana de Información (ALAI), p. 30-32, nov.

1999; VIEZZER, M. Somando forças contra o patriarcado. In: ALVAREZ, S., VIEZZER, M. Feminismos na América Latina. Publicação especial. São Paulo: Rede Mulher, 1990, p. 46-59; VV.AA. Tomando fuerzas para volar con fíbra: memória de los encuentros feministas del Ecuador. Ballenita: CAM-CIAM, 1987; COSTA, A.

A. O movimento feminista no Brasil: dinâmicas de uma intervenção política. Revista Gênero, v. 5, n. 2, p. 31-32, 1º sem. 2005.

104 2.2 VISÃO SINTÉTICA DOS ENCONTROS FEMINISTAS DA AMÉRICA LATINA E CARIBE

Lugar/Ano Participantes Temática, Objetivos, Resultados, Desafios...

Bogotá (Colômbia)

Julho de 1981

200 participantes, sendo a maioria mulheres brancas e de classe média:

universitárias, profissionais liberais, funcionárias públicas e artistas.

Em menor proporção trabalhadoras urbanas das favelas e trabalhadoras rurais do Movimento dos Sem-terra também participaram.

Países:

12 da AL, além dos EUA e Canadá, da Suíça, Itália, França, Espanha, Alemanha e Holanda.

I Encontro: “As feministas, as políticas e a dupla militância”.

Objetivos

Criar espaço para: troca de experiências, identificação de problemas, avaliação das diferentes práticas e definição de tarefas e projetos para o futuro.

Organizar e articular as mulheres em torno de direitos específicos como:

- fim da dupla jornada de trabalho;

- salário igual para trabalho igual;

- direito à maternidade livre e voluntária.

Eixo: O encontro girou em torno do conflito das feministas com a Esquerda revolucionária masculina e da autonomia do movimento.

Esperava-se que as mulheres participassem do evento enquanto indivíduos e não como representantes ou delegadas de partidos, sindicatos ou de outras organizações.

Concepções diferentes

Confronto entre aquelas que se proclamavam “feministas” e aquelas, consideradas pelas primeiras como “políticas”.

Decepcionadas com as práticas manipuladoras da Esquerda e com sua concepção androcêntrica da Revolução, as “feministas”

tomaram consciência de que nem o capitalismo, nem o socialismo dão conta de eliminar a opressão das mulheres. Considerou-se, naquele momento, impossível criar um espaço para a política feminista dentro das instituições partidárias, de cunho eminentemente patriarcais, e contrárias às transformações culturais e éticas implícitas nas lutas feministas.

Os movimentos feministas não deveriam trazer slogans, agendas e objetivos políticos que não expressassem os interesses das mulheres. Os objetivos do feminismo não deveriam ser confundidos com aqueles da classe operária. O feminismo é, por si mesmo, um projeto revolucionário; por isso deveria ter autonomia em relação aos sindicatos e partidos. Não se aceita a dupla militância: no movimento e no partido.

– Proposta: articular-se num movimento independente dos partidos políticos.

105 Para as “políticas” o feminismo nem sempre era concebido como um projeto revolucionário. Elas sugerem fazer alianças

estratégicas com partidos de esquerda por meio de metas específicas. Só se conseguiria atingir a “massa” de mulheres mediante a organização partidária. Se aceita a dupla militância (no movimento e no partido), embora se reconheça que isto é difícil.

Resultados

– Foi um Encontro de reconhecimentos, de descobertas, de intercâmbios e de afetividades.

Confirmou-se a existência de um vasto e diversificado movimento feminista de proporções continentais.

Constatou-se um amplo processo de mobilização entre as latino-americanas e caribenhas, informado e orientado pelos dois enfoques distintos que vimos acima.

As contradições, a tensão e os conflitos foram enfrentados mediante o diálogo e a partilha de experiências, o que favoreceu uma maior articulação continental.

As feministas poderiam continuar sendo “autônomas” e ao mesmo tempo manter vínculos com outras lutas por justiça social.

Foi declarado o dia 25/11 como o Dia Internacional da Não-Violência contra as Mulheres.

Lima

(Peru) Julho

de 1983

600 participantes de todos os países da América do Sul e de alguns países da América Central e Caribe, exceto Cuba.

Pesquisadoras acadêmicas, profissionais de diversas áreas, funcionárias públicas da área da saúde, sindicalistas,

II Encontro: Tema: “O patriarcado no centro dos debates e a reafirmação do status teórico do feminismo”.

Objetivo: Analisar o patriarcado latino-americano e suas expressões materiais, ideológicas, culturais e institucionais.

Subtemas

Patriarcado e sexualidade

Patriarcado e a violência contra as mulheres Patriarcado e a saúde

Patriarcado e poder na Igreja Patriarcado e lesbianismo Patriarcado e racismo

Questões Metodológicas

As participações eram em nível pessoal e não por representatividade. Trabalharam em oficinas sobre os temas: saúde, Igreja, poder, sexualidade, pesquisa feminista e violência; todos os temas foram relacionados com o patriarcado.

106 exiladas políticas,

militantes de partidos, artistas e outras...

A questão metodológica, como mecanismo de promoção, ou não, da convivência entre as mulheres foi muito debatida. Percebeu-se que a estrutura metodológica do Encontro, em oficinas coordenadas e moderadas por feministas acadêmicas, promovia uma hierarquia e elitismo que não facilitava a discussão ampla, o intercâmbio e a espontaneidade.

A discussão sobre o patriarcado era demasiado teórica e metodologicamente distante da linguagem das mulheres da região.

Espontaneamente se organizaram outras atividades menos hierárquicas e mais participativas. Um grupo de mulheres negras e indígenas organizou uma oficina sobre o racismo e criticou a coordenação por não prever uma discussão sobre essa questão.

Constatações e resultados

O envolvimento – no feminismo – de grande número de mulheres que, no decorrer do Encontro, se identificaram com o movimento feminista.

Progresso em relação aos debates políticos que haviam sido formulados e articulados no Encontro de Bogotá. A maioria rejeitou a criação do que se chamou “feministômetro”, como meio para aferir quem era mais ou menos feminista.

– Maior compreensão teórica do patriarcado latino-americano em todas as suas manifestações materiais, ideológicas, culturais, institucionais, sexuais, religiosas e lingüísticas.

O foco no patriarcado permitiu às feministas socialistas distinguirem melhor seu socialismo feminista da maneira como a Esquerda define, tradicionalmente, a “questão feminina”.

A compreensão e a insistência de que o sexismo não era resultado do capitalismo e do imperialismo, mas antes, modelado por um sistema “relativamente” autônomo e patriarcal, denominado como sistema de sexo/gênero.

A participação das que trabalhavam com mulheres, mas não se definiam como feministas, estabeleceu o campo para a futura conceituação do “movimento feminista” e do “movimento de mulheres”, e para a discussão sobre a identidade do movimento feminista frente ao crescente movimento de mulheres.

Avanço na discussão política feminista e necessidade de entender as peculiaridades do patriarcado na América Latina e no Caribe, e suas inter-relações com outras instituições sociais.

Bertioga (Brasil) Julho

de 1985

900 participantes de 23 países da América do Sul, da América Central, e de todos os

III Encontro: Tema: “O feminismo e a questão da inclusão”.

Objetivo: Um balanço da Década da Mulher no continente.

Impasses e desafios

– Neste Encontro vivenciou-se a resistência contra formas estruturadas de organização feminista e assumiu-se a subjetividade das

107 países caribenhos

de língua espanhola, inclusive de Cuba, expressando uma grande diversidade étnica, social, cultural e política.

Aumentou o número de participantes pobres e de operárias.

As brasileiras destacaram-se pela experiência partidária e pela visibilidade de ação.

mulheres como elemento fundamental de sua libertação. Sentiu-se a necessidade do movimento feminista lutar contra todas as formas de exclusão, tais como os privilégios de classe, raça e orientação heterossexual, os quais estruturam as relações de poder na sociedade e dentro do próprio feminismo.

O Encontro revelou o dilema da exclusão/inclusão dentro do próprio movimento, com a chegada de um ônibus lotado de mulheres das favelas do Rio de Janeiro (cortesia do Lions Club ou armadilha de partidos políticos?), as quais não haviam feito suas

inscrições, quebrando, assim, todas as regras de participação no evento

Suspeita de manipulação política pela Esquerda e tentativa de desacreditar o movimento, tachando-o de elitista, burguês, racista e divisor da luta de classes. (As feministas brasileiras já tinham experiências semelhantes). Tal fato criou um clima desagradável e foi causa de um polêmico debate interno entre as diferentes tendências, o que foi muito explorado pelos meios de comunicação.

Constatações

As feministas da América Latina e do Caribe caracterizam-se por uma diversidade étnica, cultural e política que até então fora imaginada e desejada, mas ainda não constatada. Em contraste à face branca, mestiça e de classe média do feminismo nos seus primeiros tempos, emergia agora um amplo movimento de mulheres pobres, trabalhadoras, negras e indígenas.

As participantes tomaram consciência do crescimento do movimento e da concomitante diversidade que ele trazia. Tornara-se difícil construir pontes entre as várias expressões do movimento de mulheres e o movimento feminista. Era imprescindível enfrentar essas diferenças, marcadas por desigualdades estruturais e divergências políticas.

As mulheres se reuniram de diversas formas: por países, profissão, classe, raça, idade, religião, tempo de envolvimento no movimento e por outras características que sugerissem identificar um grupo. O dilema da inclusão tornou-se particularmente relevante em seus vários aspectos; houve questionamentos sobre o compromisso com a inclusão, especialmente em relação às questões de classe, raça, etnia e sexualidade.

A participação das mulheres das favelas do Rio de Janeiro desencadeou um importante debate sobre a inclusão e estimulou o crescimento e a diversidade que já começavam a caracterizar os feminismos latino-americanos.

Frente à opressão estatal e o crescente empobrecimento dos países latino-americanos sentiu-se a necessidade de criar um movimento feminista de bases mais amplas.

Percebeu-se que as feministas buscavam realizar suas metas numa ampla e variada rede de espaços institucionais e extra- institucionais, desde ministérios governamentais até sindicatos, centros alternativos de saúde e coletivos feministas.

As brasileiras deram-se conta de que haviam criado um dos maiores, mais diversificado e politicamente mais influente movimento feminista da América Latina até aquele momento.

108 Taxco

(México) Outubro

de 1987

Mais de 1500 participantes vindas de todos os países da América Latina e do Caribe de língua espanhola. Cuba também se fez presente.

Todas eram atuantes em diversas áreas:

da política, da educação, da saúde, da cultura, tanto em órgãos estatais quanto em outros, como sindicatos urbanos e rurais, coletivos feministas, centros de

documentação, centros de apoio a mulheres agredidas, além da presença de escritoras, poetisas, artistas, trabalhadoras rurais, sindicalistas e revolucionárias combatentes.

Grande número de mulheres pobres e operárias, e um menor número de indígenas e

IV Encontro: Tema: “A política feminista na América Latina”.

Objetivo: Fomentar um amplo e qualitativo movimento de mulheres na América Latina e Caribe.

Constatações e resultados

No Encontro expressou-se a diversidade e o enfrentamento entre os novos feminismos e as novas feministas.

Da percepção de que o Encontro de Taxco representava uma transição do pequeno grupo de feministas dedicadas, para um grande movimento de amplas bases, politicamente heterogêneo e multirracial, embora as mulheres estivessem em diferentes estágios de consciência feminista, evidenciou-se que o feminismo latino-americano enfrentava uma nova conjuntura política; o crescimento quantitativo e qualitativo e a diversidade de feminismos mostravam que ele tinha deixado de ser um grupo periférico.

De fato, o feminismo latino-americano e caribenho iniciara um processo de movimento de massa; a participação de centenas de mulheres do “movimento de mulheres”, assinalava que o “movimento feminista” alcançara seu objetivo de promover um Encontro com bases verdadeiramente amplas, diversificadas e populares. A participação maciça de mulheres pobres, indígenas, negras e operárias, mostrou que o feminismo não era monopólio de mulheres brancas da classe média; evidenciou-se, assim, o crescimento, a expansão e a diversificação das lutas das mulheres, imbuídas do feminismo.

Isso não agradou uma parte das feministas veteranas, as quais sentindo que o seu espaço feminista estava sendo usurpado pelo movimento de mulheres, alegavam que isso dificultaria a elaboração da agenda feminista, ou melhor, “da” agenda feminista como algumas desejavam. Muitas se cansaram de ficar ensaiando o “básico”, achando que os Encontros não deveriam ser uma “escola feminista” para as “massas”; isso atrapalharia o avanço do debate e da produção do conhecimento feminista.

Outras, temendo que tal atitude ressuscitasse o “feministômetro”, refutaram a concepção de que as mulheres latino-americanas, indígenas, negras ou pobres não fossem feministas o suficiente para participarem dos Encontros. À proposta de no futuro se realizar dois encontros: um para as feministas e outro para o movimento de mulheres, um coro de centenas de vozes cantou: “Somos todas feministas”, expressando que o feminismo não é exclusividade de ninguém.

O discurso e as práticas feministas causaram impacto nos movimentos sociais e políticos (sindicatos, organizações camponesas e urbanas e o Estado) com reivindicações de melhorias nos serviços públicos, de melhor qualidade de vida para as famílias pobres e de direitos específicos de gênero: saúde, direitos sexuais e reprodutivos e proteção para as mulheres em situação de violência.

Os movimentos de mulheres nas bases haviam-se diversificado e se identificavam explicitamente com o feminismo, a partir de seus trabalhos nos grupos e comunidades, numa perspectiva política e de gênero amplas, além das questões específicas das mulheres.

Um movimento feminista de base, respondendo às novas democracias latino-americanas, começava a desenvolver novas críticas, novas idéias e estratégias inovadoras de fazer política, assegurando que as feministas que trabalham nos partidos e nos órgãos governamentais permaneçam honestas e responsáveis perante o eleitorado e o movimento.

109 afrodescendentes,

em relação ao encontro anterior no Brasil.

Pela primeira vez ativistas católicas declaradamente feministas também participaram.

Constatou-se que em países como o Brasil, o Peru e o México, as feministas conseguiram desenvolver um discurso alternativo sobre gênero e família, que influenciou tudo: desde a novela até os pronunciamentos políticos governamentais.

A participação de quatro cubanas, representantes da Federação de Mulheres Cubanas, demonstrava o reconhecimento da força do feminismo também no Caribe, fato que as forças progressistas e/ou revolucionárias não podiam mais ignorar.

Muitas mulheres católicas das CEBs participaram de uma oficina sobre O feminismo e as Igrejas, a qual resultou num documento em que as mulheres ressaltam a necessidade de se criar uma Teologia Feminista da Libertação.

San Bernardo (Argentina)

Novembro de 1990

3500 participantes de 38 países, entre os quais o Haiti, Cuba, a Etiópia e a Turquia.

A representação centroamericana foi pequena e a espanhola muito numerosa.

Participaram cerca de 650 brasileiras.

A representatividade foi muito rica, variada e abrangente.

V Encontro: “Balanço e prospectivas de dez anos de feminismo na América Latina e Caribe”.

Objetivo: Comemorar quase uma década de Encuentros Feministas, os quais permitiram acompanhar passo a passo o desenvolvimento do feminismo na América Latina e no Caribe, e refletir coletivamente sobre os obstáculos, conquistas ou descobertas dos feminismos da região na última década.

Tema: “O feminismo como um movimento transformador na América Latina e Caribe”.

Subtemas:

Construção das identidades coletivas e valores conflitantes.

Variantes organizacionais e espaços de desenvolvimento.

Relações entre feminismo e outras áreas sociais e setores políticos.

Propostas, estratégias políticas e prospectivas.

Diversidade e expressividade de participação feminista

Encontro pouco ideologizado, sem grandes teorias, preocupado em definir estratégias específicas para enfrentar problemáticas concretas.

Presença marcante de redes formais intra-regionais do movimento feminista, algumas nascendo e sendo registradas durante o Encontro; outras fazendo coalizões regionais, centradas na defesa e promoção de políticas nacionais e internacionais.

Participaram trinta e oito jornalistas feministas da grande mídia e de publicações alternativas que discutiram sua profissão e relação com o movimento feminista e o movimento de mulheres.

Pela primeira vez o grupo Católicas pelo Direito de Decidir apresentou suas idéias, propostas e publicações feministas.

Cerca de quarenta entidades de saúde mental fundaram uma Rede de Saúde de amplitude internacional.

No documento FEMINISMO E EVANGELIZAÇÃO (páginas 102-128)