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O ENQUADRAMENTO DO BÓIA-FRIA NO ORDENAMENTO PÁTRIO – A BUSCA DA CLASSIFICAÇÃO COMO SEGURADO DA PREVIDENCIA SOCIAL

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Aroldo José Washington

O ENQUADRAMENTO DO BÓIA-FRIA NO ORDENAMENTO PÁTRIO – A

BUSCA DA CLASSIFICAÇÃO COMO SEGURADO DA PREVIDENCIA SOCIAL

MESTRADO EM DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

SÃO PAULO

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Aroldo José Washington

O ENQUADRAMENTO DO BÓIA-FRIA NO ORDENAMENTO PÁTRIO – A

BUSCA DA CLASSIFICAÇÃO COMO SEGURADO DA PREVIDENCIA SOCIAL

MESTRADO EM DIREITO PREVIDENCIÁRIO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para a obtenção de título de Mestre em Direito Previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação do Professor Doutor Miguel Hovart Júnior.

SÃO PAULO

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BANCA EXAMINADORA

Dr. Miguel Horvath Júnior (PUC/SP)

Dr. Otacílio Pedro de Macedo (USCS)

(4)

Dedico este trabalho à Violeta, em memória.

(5)

AGRADECIMENTOS

A Deus, pela bondade e misericórdia que me acompanham todos os dias.

À minha esposa Eliane, pela compreensão, carinho, dedicação e ajuda em todas as horas.

(6)

RESUMO

O presente trabalho será analisado à luz da Teoria da Argumentação Jurídica, da ponderação de princípios constitucionais, atinentes ao Direito Previdenciário. O objetivo será demonstrar que o trabalhador rural volante, denominado também de “bóia–fria”, é segurado da Previdência Social; buscar-se-á sua classificação como segurado da Previdência Social: consequentemente, tem o trabalhador, direito ao Seguro Social, apesar de não haver expressa previsão legal, pois o mesmo não se enquadra na definição de empregado, na definição dada pelo Direito do Trabalho, por se tratar de trabalhador eventual. Na prática cotidiana, o trabalhador volante não recolhe a contribuição previdenciária; diante dessa realidade, não estaria enquadrado como segurado da Previdência Social. Demonstrar-se-á que este encargo é de atribuição do tomador de serviços; portanto, enquadra-se o trabalhador volante, como segurado, com fundamentos de princípios e regras constitucionais que regem a matéria entendimento acatado em âmbito administrativo e judicial. O método de investigação é trabalhado de maneira descritiva, e será desenvolvido com a pesquisa das doutrinas trabalhista e previdenciária, com visão dogmática organizada, e ainda pesquisa da Jurisprudência dos Tribunais que tratam desta matéria, pretendendo trazer clareza à lacuna legislativa que rege a matéria.

(7)

ABSTRACT

This work will be examined in the light of the Theory of Legal Argumentation , the weighting of constitutional principles relating to the Social Security Law . The goal will be to demonstrate that the rural worker flywheel , also called " float - cold ," Social Security is insured , and will seek classification as held Social Security therefore has the worker entitled to Social Security , despite there is no express legal provision , because it does not fit the definition of employee in the definition given by the Labor Law , as it is possible worker . In everyday practice , the employee steering wheel does not collect social security contributions , and consequently face this fact would not be insured framed as Social Security . Will demonstrate that this task is the assignment of borrower services , and therefore fits the employee steering wheel, as insured , with foundations of constitutional principles and rules governing the matter in understanding complied with the administrative and judicial . The research method is worked in a descriptive way , and will be developed with the research of labor and social security doctrines , organized with dogmatic and even search the Jurisprudence of the Courts dealing with this matter, which will bring clarity to the legal loophole which governs the matter .

(8)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 11

2 HISTÓRIA E EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DO TRABALHO RURAL ... 13

2.1 História do trabalho rural ... 13

2.2 Evolução Legislativa do Trabalho Rural ... 17

3 PRINCÍPIOS E REGRAS CONSTITUCIONAIS E O TRABALHADOR RURAL ... 23

3.1 Definição de Princípios e Regras ... 23

3.2 Princípio da solidariedade ... 29

3.3 Princípio da obrigatoriedade da filiação ... 31

3.4 Princípio da uniformidade entre trabalhadores rurais e urbanos ... 34

3.5 Princípio da equidade nas fontes de custeio ... 35

3.6 Princípio in dubio pro operário (ou in dubio pro-misero) ... 37

3.7 A Regra do mínimo existencial ... 38

3.8 Regra da Contrapartida ... 43

4 DA DIFICULDADE DO ENQUADRAMENTO DO BÓIA-FRIA ENQUANTO SEGURADO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL ... 45

4.1 Aspectos diferenciais na conceituação do trabalhador rural no Direito Trabalhista e Previdenciário ... 51

4.1.1 Definição do trabalhador rural sob a perspectiva do Direito Trabalhista ... 52

4.1.2 Definição do trabalhador rural, sob a ótica do Direito Previdenciário ... 54

4.1.3 Definição de trabalhador rural na legislação ... 56

4.2 Conceito de trabalhador rural volante na doutrina ... 59

4.3 Conceito de trabalhador rural volante na Jurisprudência ... 64

4.3.1 Conceito de trabalhador rural volante na Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ... 65

4.3.2 Conceito de trabalhador rural volante na Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ... 65

4.3.3 Conceito de trabalhador rural volante na Jurisprudência dos Tribunais Regionais Federais ... 68

4.3.4 Conceito de trabalhador rural volante na Jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização ... 72

4.3.5 Conceito de trabalhador rural volante na Jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho e dos Tribunais Regionais do Trabalho ... 74

4.4 Conceito de trabalhador rural volante no âmbito administrativo. A autarquia previdenciária ... 76

5 ENQUADRAMENTO DO BÓIA-FRIA DENTRO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO 79 5.1 Classificação dos segurados ... 79

5.2 Seguridade Social ... 81

5.2 Classificação dos segurados - Posicionamento da doutrina e da jurisprudência ... 86

(9)

CONCLUSÕES ... 94

(10)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Seguridade Social ... 81

Figura 2: Filiados da Previdência Social ... 82

Figura 3: Conjunto dos integrantes da Previdência Social ... 83

Figura 4:Classificação dos segurados da Previdência Social ... 84

(11)

1 INTRODUÇÃO

Passados quase 200 anos de independência, o Brasil, país de dimensão Continental, de vasta área agrícola, tem muito ainda a proteger sua população rural, em termos de Previdência Social. Grande avanço ocorreu, em termos legislativos, com a Constituição de 1988, quando houve a equiparação entre trabalhadores urbanos e rurais no que diz respeito aos direitos previdenciários. Antes disso, a Previdência Rural, estava imersa em um grande sistema de assistência social. Com a Constituição Federal, esta migrou, definitivamente, para a Previdência Social, igualando os trabalhares rurais e urbanos, em benefícios e prestações. Em contrapartida, determinou que, a partir de 1988, “deve o trabalhador rural contribuir para o custeio da previdência social.”

De toda a gama de trabalhador rural, estuda-se, na presente dissertação, as condições específicas do trabalhador rural chamado volante: figura que faz parte da própria formação cultural do Brasil, antiga e esquecida pelos donos do poder. Em relação a esse trabalhador, há um vazio legislativo.

Será adotada, neste trabalho, a nomenclatura de trabalhador rural volante, sinônimo de bóia-fria. Esses são eventuais, exercendo sua atividade num pequeno período de tempo para os pequenos proprietários rurais, arrendatários, sitiantes, sem vínculo de continuidade, ganhando pouco, na condição de diaristas. Essa atividade é sua única fonte de renda: a venda do seu trabalho braçal. Via de regra possuem um grau bastante baixo de escolaridade, já´que foram excluídos do acesso à educação formal e vivem de propriedade rural em propriedade rural, em busca de trabalho para seu sustento e o de sua família. De todo o cipoal legislativo, nada o ampara em relação à proteção previdenciária.

Na dicção do artigo 11, da Lei 8.213/91, que preceitua quem são os segurados obrigatórios da Previdência Social, em uma leitura singela, sem se ater aos princípios e regras que regem a matéria, o mesmo está excluído. Excluído porque não é empregado, não exerce seu labor de forma contínua, sim eventual em relação ao empregador. Exerce atividade laborativa de forma contínua, mas para diversos tomadores de serviços; assim, não fica caracterizada a relação de emprego, nos termos do Direito de Trabalho.

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da Lei de Custeio (Lei.8.212/91), nem na equiparação prevista no parágrafo único deste malsinado dispositivo legal.

Apesar da lacuna legislativa, demonstra-se que todos aqueles que exercem atividade laborativa no meio rural tem assegurada a obrigatoriedade de estar sob a Previdência Social, considerando que a ordem social tem como o primado o trabalho, e como objetivo o bem estar social. Aliam-se a isso os princípio da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, com o que se tenta construir uma sociedade solidária: um dos objetivos fundamentais da República.

Inicia-se a dissertação na busca de subsídios históricos e evolução do trabalho rural, no Capitulo 2.

A seguir, estuda-se os Princípios e as Regras Constitucionais aplicados em relação ao trabalhador rural volante, na busca da classificação do bóia-fria como segurado da Previdência Social: princípios da solidariedade, obrigatoriedade da filiação, uniformidade entre trabalhadores rurais e urbanos, equidade nas fontes de custeio, princípio in dubio pro misero. Finalmente, neste capítulo, as regras do mínimo existencial e contrapartida.

Salienta-se a dificuldade do enquadramento do bóia-fria enquanto segurado da Previdência Social face à ausência normativa que rege a atividade do trabalhador volante. Acrescem-se os aspectos diferenciais da conceituação do trabalhador rural no Direito Trabalhista e Previdenciário e estuda-se a definição do trabalhador rural na perspectiva do Direito Trabalhista e Previdenciário. Dando prosseguimento, analisa-se o conceito de trabalhador rural volante na doutrina e Jurisprudência dos Tribunais que julgam a matéria. Finalmente, da análise destes conceitos, dá-se o enquadramento do bóia-fria e a sua classificação dentro do contexto do Direito Previdenciáro.

(13)

2 HISTÓRIA E EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DO TRABALHO RURAL

É importante estudar a historia e evolução legislativa do trabalho rural no Brasil, subsidios fundamentais para saber o motivo de tanto abandono e falta de capacidade politica, deste importante segmento da sociedade brasileira, os trabalhadores rurais volantes, também alcunhados de bóia fria, “pau de arara”, trabalhador independente rural.

A dificuldade do trabalho rural, seu esquecimento remota priscas eras.

A legislação é o espelho da história, e a sua evolução demonstra toda a característica de nossa sociedade, em sua constate mutação no tempo.

2.1 História do trabalho rural

Desde o início da civilização, o homem retira o seu sustento por meio da interação do seu trabalho com a terra, produzindo alimentos para a sua própria sobrevivência. Se for levada em conta o tempo, nestes últimos 2000 anos, constatamos que o fenômeno da industrialização é recente: praticamente nos últimos 250 anos.

Quando se pensa na origem do Direito para iluminar essa questão, surge logo a ideia de buscar subsídios nas origens no Direito Romano, como era a vida em Roma antiga e como aquele povo, em sua visão pragmática do Direito, fez em prol destes trabalhadores.

Jerzy Kolendo, em seu estudo sobre o trabalhador rural romano, traz importante esclarecimento, para termos a noção de como era em Roma antiga, em suas várias fases de desenvolvimento, o trato e a vida do rurícula.

Aduz que:

[...] tradicionalmente, os camponeses viviam no fechado mundo da auto-suficiência. Eles se colocavam às margens da economia mercantil, limitando-se a vender os produtos de seu sítio, nos mercados locais e nas pequenas cidades, muito numerosas, da Itália Central. (...) Proverbiais eram a pobreza dos trabalhadores rurais e o seu modo de vida primitivo. No obra “Moretum”, atribuída a Virgilio, se extrai um camponês que se levanta muito cedo, perto de um fogo apagado, se veste com um casaco de pele de cabara e começa o seu trabalho fatigante, em torno de um moinho de pedra. Para aliviar o seu trabalho , entorna cantos campestres.1

1KOLENDO, Jerzy. “Il Contadino”. In:

L´uomo Romano – a cura di Andrea Giardina. Roma: Editori Laterza,

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Feijó Coimbra leciona que:

[...] inicialmente, o povo romano no amanho da terra, pelo trabalho do conjunto familiar, em granjas de vinte geiras, onde criavam gado, com auxilio de escravos. Posteriormente, as guerras arruinaram os cidadãos que abandonavam as lavouras durante as campanhas. Os campos, despovoados, foram sendo absorvidos pelos grandes proprietários, dando azo à formação de latifúndios que, explorados com métodos de avançada técnica, ao menos para à época, e com o emprego maciço de mão de obra servil, atingiram notável produtividade2.

E continua,

[...] essa propriedade alicerçada no braço escravo teve seu ocaso quando a paz, assegurada pelo Império, fez escassear a oferta de cativos, mais frequentemente recrutados entre os prisioneiros de guerra.” E Finaliza; ao lado do retrocesso econômico decorrente do abandono da cultura em grande extensão e realizada com métodos que facultavam uma produtividade maior, nenhum foi o progresso social. O proletariado, chamado a condição de arrendatário, acabou fixado a terra, em condição semelhante ao elemento servil que viera substituir.3

Pode-se comparar, a grosso modo, o que aconteceu em Roma com o que aconteceu no Brasil, desde o seu descobrimento. A história se repete.

Jacob Corender, escreve sobre o modo de economia do escravismo colonial, durante o Brasil Colônia, a economia com base no trabalho escravo4, e sua extinção, com a abolição

da escravatura, em 1888, com a Edição da Lei Aurea, promulgada pela Princesa Isabel. Observa Laura Vasconcelos Neves da Silva que:

[...] trabalho rural, quase tão antigo quanto o homem, não deu ensejo ao surgimento de um direito que protegesse os trabalhadores do campo. A explicação para isso é que, sendo escravos, os trabalhadores rurais lutavam pelo bem maior da liberdade e, ademais, não possuíam força política para reivindicações de direitos. Assim sendo, depreende-se que a formação da massa trabalhadora nas cidades ocorreu porque se tratava de homens livres. Já a disciplina do Direito do Trabalho Rural surgiu no meio intelectual e político, como um reflexo natural do avanço do direito social surgido após a Segunda Guerra Mundial.5

O surgimento dos trabalhadores rurais, comumente denominados boias-frias, trabalhadores volantes, está ligado à própria transformação do Estado brasileiro, na libertação

2 COIMBRA, J.R. Feijó. O Trabalhador Rural e a Previdência Social. Rio de Janeiro: Editora José Konfino.

1968, p.8.

3 IDEM, p.9.

4 GORENDER, Jacob. O Escravismo Colonial. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo. 5ª edição, 2011.

5 SILVA, Laura Vasconcelos Neves da. “Os Direitos Fundamentais dos Trabalhadores Rurais da

Cana-de-Açúcar”. In: Revista Magister de Direito Trabalhista e Previdenciário. Ano V, Número 26, Setembro –

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dos escravos e com o desamparo total dessa grande camada da população, em uma sociedade rural, com o início do desenvolvimento urbano.

Evaristo de Moraes Filho, em nota introdutória ao clássico Apontamentos de Direito Operário, de Evaristo de Moraes, escreveu que

Os primeiros anos da República foram de grande agitação neste país. E a explicação é fácil. 1888 significou, por si só, a primeira grande lei social entre nós, acabando com a escravidão e instituindo o regime do trabalho livre. As conseqüências que acarretou já foram minuciosamente estudadas por um sem-número de historiadores, economistas e sociólogos. Faltou-lhe uma complementação necessária, como já à época se haviam dado conta alguns espíritos mais atentos, convindo destacar, entre êles, Silva Jardim, Joaquim Nabuco e Rui Barbosa. Pregavam uma lei de reforma agrária, que fixasse o homem à terra, lhe tornasse proprietário, dividisse os latifúndios, com radical alteração do sistema rural até então vigente, a fim de que, com o nôvo regime, não se desorganizasse a produção dos campos.”6

Conclui o mestre:

Os fazendeiros — o que equivale dizer, os políticos que apoiavam o Imperador — voltaram-se contra êle, aderindo à República. Por isso mesmo, coube a essa, infelizmente, herdar todos os problemas oriundos da Abolição: campo desorganizado; quebra da produção; ausência de braço livre para substituir, de repente, o trabalho escravo; migração para os centros urbanos dessa mão- de-obra desempregada e faminta, quando não se deixava ficar pelos próprios campos, como fantasmas a perambular em tôrno das antigas fazendas. Tudo isso se transformou em fator sociopático nas cidades, principalmente na Capital Federal: mendigos, vagabundos, prostitutas, desabrigados; mão-de-obra despreparada e desqualificada, sem aprendizado nem formação profissional para os novos trabalhos mecânicos que iam surgindo. Empregavam-se por qualquer salário e para todo o serviço.7

Estes fantasmas, no dizer de Evaristo de Moraes Filho, pode ser considerada a origem remota dos atuais trabalhadores boias frias ou volante. Como bem observado por Júlio Barata:

[...] a situação social do homem do campo, sua integração real, pela produtividade, na força do trabalho do País, o atendimento de suas necessidades básicas, as garantias exigidas para a segurança da população rural e sua fixação na terra, o controle das migrações para a cidade, a proteção à saúde, e o direito à tranquilidade na velhice para os que mourejam na lavoura constituem, desde 13 de maio de 1888, o mais velho,

6MORAES, Evaristo de. Apontamentos de Direito Operario. 2ª edição Comemorativa do Centenário do

nascimento do autor, acompanhada de introdução feita por Evaristo de Moraes Filho. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, LTr, 1971, p. XXXII.

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o mais constante, e, talvez, o mais sério desafio à clarividência do estadista e do legislador.8

A situação descrita acima se perdura até hoje em relação aos trabalhadores volantes, comumente chamados boias-frias, o vácuo legislativo que impera nesta matéria. Mas a vida no campo, no seu cotidiano, ainda é de penúria, em sua grande maioria, existindo trabalhadores à margem da Previdência Social, verdadeiros excluídos, como é o caso dos trabalhadores boias-frias ou volantes que, mesmo tendo direito — é essa nossa tese — estão excluídos dentro da proteção previdenciária, como será visto mais adiante.

A realidade social, o contexto em que vivem esses rurícolas é de extrema miséria, e quando atingem a idade avançada, incapazes de exercer atividade laboral, encontram mecanismos de proteção, como aposentadoria por idade rural, e outros benefícios previdenciários, desde que se possa classificá-los como segurado obrigatório da previdência social.

Em situação assim, considerando a idade avançada como uma etapa da vida, encontra-se o fundamento da proteção a todo trabalhador, no risco e na contingência e, na situação de necessidade, tendo em conta os valores sociais, culturais e éticos da República, bem como, utilizando-se do instrumental da Teoria da Argumentação Jurídica, dentro de todos os princípios e de todas as regras que regem a Previdência Social, são segurados obrigatórios da Previdência Social.

A necessidade de proteção do rural, em idade avançada, sobressai considerando os princípios magnos da Carta da República, em especial o princípio da dignidade da pessoa humana, e o mínimo existencial.

Em termos históricos, Mary del Priore e Renato Venâncio9 fazem um quadro realista

da vida rural no Brasil, descrevendo as mudanças que ocorreram desde a época do descobrimento até os dias atuais. Mostram a influência das alterações de paradigmas, do modelo escravista para a liberdade de mão de obra, a necessidade de uma reforma agrária, o surgimento da mecanização agrícola no século xx, com a migração do trabalho rural para o urbano e o efeito nefasto desta mecanização. A forma como essa se deu resultou em crescente onda de desemprego no campo e aumento dos trabalhadores volantes, fato este constatado por Luiz Sérgio Pires Guimarães, Ney Rodrigues Innocencio, Sebastiana

8BARATA, Júlio. Apresentação Barros Jr, Cássio de Mesquita Previdência Social- Urbana e Rural. 1981,

São Paulo: Editora Saraiva, p. XI.

9 DEL PRIORE, Mary; VENÂNCIO, Renato. Uma História da Vida Rural no Brasil.Rio de Janeiro: Ediouro.

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Rodrigues de Brito10, em estudo estatístico do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística(IBGE), realizado em 1984.

A mecanização da agricultura, em especial, na indústria canavieira, ocasiona uma enorme onda de desemprego, conforme constata André Cabette Fábio, em reportagem publicada em 29 de novembro de 2013, no site da UOL11. Nessa reportagem, é dada uma

ideia falsa de que o trabalhador volante só exerce suas atividades na indústria canavieira; ao contrário, se esta utiliza o trabalhador volante, no corte manual da cana, sob sua supervisão, o mesmo deixa de ser bóia-fria, e passa a ser empregado.

Mas, um argumento é correto: o uso da tecnologia e maquinário extingue mão de obra braçal. Uma máquina agrícola substitui muitos obreiros, mas faltam estatísticas sobre o assunto, como reconhecido nesta reportagem.

O problema do aumento do número dos trabalhadores volantes é extremamente complexo, envolvendo a economia nacional, a mecanização da agricultura, o desemprego que ocasiona esta mecanização, face à dispensa de mão de obra não qualificada, com a consequente informalidade desta mão de obra.

2.2 EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DO TRABALHO RURAL

A evolução legislativa, visando à proteção e integração do trabalhador rural à Previdência Social, está intimamente ligada à economia nacional, envolvendo todo um problema de modelo econômico, atrelado ao movimento político de cada período vivido por nossa sociedade.

Em termos legislativos, a atenção a esse trabalhador é recente: da segunda metade do Seculo XX. Nesse trabalho, será dada ênfase a partir da década de 40, no século passado. Para tanto, foram colecionadas os preceitos normativos que dizem respeito à Previdência Social do Trabalhador Rural, e temas correlatos, em especial sobre as fontes de custeio.

10 GUIMARÃES, Luiz Sérgio Pires; INNOCENCIO, Ney Rodrigues; BRITO, Sebastiana Rodrigues de. O

Trabalhador Volante na agricultura” R. br as. Geo gr., Rio de Janeiro, 46(1) :5-78 jan./mar. 1984. Disponível

em:

<http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/monografias/GEBIS%20%20RJ/RBG/RBG%201984%20v46_n1.p df> Acesso em 18 de abril de 2013.

11

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Em plena II Guerra Mundial, surge a Consolidação das Leis do Trabalho, de nítida tendência fascista, quando Getúlio Vargas exclui do campo de aplicação os trabalhadores rurais, de um modo geral.

1. O DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 7º, letra b, exclui do campo de incidência os preceitos constantes nessa lei, salvo quando for expressamente determinado em contrário

[...] aos trabalhadores rurais, assim considerados aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividades que, pelos métodos de execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas operações, se classifiquem como industriais ou comerciais.

A determinação em contrário, na própria CLT, prevê na aplicação do salário mínimo ao trabalhador rural, nos termos do artigo 76, na definição do salário mínimo:

Art. 76. Salário mínimo é a contraprestação mínima devida e paga diretamente pelo empregador a todo trabalhador, inclusive ao trabalhador rural sem distinção de sexo, por dia normal de serviço, e capaz de satisfazer, em determinada época e região do País, as suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte.

Passados 13 anos, em período de grande turbulência histórica, com o surgimento da Guerra Fria entre União Soviética e Estados Unidos - as duas grandes superpotências - o avanço do Comunismo, surge a Lei 3.807, de 26 de agosto de 1960. Trata-se da Lei Orgânica de Previdência Social que, já em seu artigo 3º, II, excluiu os trabalhadores rurais do campo de sua incidência.

Já antecedendo a Revolução de 1964, foi promulgada a Lei nº. 4.214 de dois de março de 1963 que dispôs sobre o Estatuto do Trabalhador Rural, criou o Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural, em seu artigo 158 e seguintes. Esse Estatuto, na realidade, nunca chegou a ser efetivo, devido à edição do Decreto 61.554, de 17 de outubro de 1967, a seguir transcrito. O Decreto Lei nº 286, de 28 de fevereiro, de 1967, criou fonte de custeio para tentar implementar a Lei 4214/63, já em pleno Regime Militar.

5. DECRETO Nº 61.554, DE 17 DE OUTUBRO DE 1967.

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O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o item II do art. 83 da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 6º do Decreto-lei nº 276 de fevereiro de 1967.

DECRETA:

Art. 1º Fica aprovado, sob a denominação de Regulamento do Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural , o Regulamento que a este acompanha, assinado pelo Ministro do Trabalho e Previdência Social. Art. 2º A concessão das prestações a que se referem os arts. 55, alínea b e § 2º, e 164, alíneas b, c, d, e f, da Lei nº 4.214, de 2 de março de 1963, fica sustada até que o Poder competente disponha sôbre sua fonte de custeio.

O primeiro Estatuto do Trabalhador Rural, promulgado no Governo de João Belchior Goulart criou benefícios sem a correspondente fonte de custeio, e teve seus efeitos sustados, pelo Decreto 61.554/67; portanto, nunca deu efeito prático algum.

O Decreto-lei 564, de 1º de maio de 1969, criou o Plano Básico de Previdência Social, visando aos trabalhadores não abrangidos pelo LOPS, incluindo nele os trabalhadores rurais do setor canavieiro.

Efetivamente, a proteção ao trabalhador rural começou a partir da LC 11, de 25 de maio de 1971, lei esta que criou o Prorural. Esse deu a definição do que a lei considerou trabalhador rural e, desta definição, deixou de fora o trabalhador volante.

O PRORURAL, criado pela LC 11, foi regulamentado pelo Decreto 69.919, de 11 de janeiro de 1972. É interessante observar a função didática que exerce este Decreto, definindo o conceito de trabalhador rural, com maior precisão, porém, também deixou de normatizar o trabalhador volante, deixando-o fora da previdência rural.

Da dicção da lei, constata-se que o trabalhador volante não foi contemplado na proteção previdenciária, por exercer atividade agrícola, em caráter eventual, para proprietários e arrendatários rurais.

A Lei Complementar 11/71 foi alterada pelo LC 16/71, dando a definição legislativa de produtor rural.

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Lei 6195, de 19 de dezembro de 1974, institui a concessão de prestações devidas, em decorrência do acidente do trabalho rural. O Decreto 73.617, de 12 de fevereiro de 1974, regulamentou o PRORURAL.

Com a criação do Funrural, autarquia, com personalidade jurídica de direito público, foi dado um passo fundamental para a criação de uma Previdência Social Rural, desfeito na Constituição de 1988, com a equiparação de trabalhadores rurais e urbanos. Esse Órgão possuía, na realidade, nítida natureza assistencialista, e seus benefícios ficaram aquém do esperado, pois excluíam os direitos da mulher à aposentadoria rural. A Constituição de 1988 fez Justiça, eliminando esta desigualdade.

Dando continuidade à legislação infraconstitucional, o Decreto 76.022, regulamentou a Lei 6.195.

A Lei 6260, de 06 de novembro de 1975, por sua vez, institui benefícios da previdência e assistência social aos empregadores rurais, regulamentada pelo Decreto 77.514, de 29 de abril de 1976.

Por fim, o grande divisor de águas do direito dos trabalhadores rurais, foi a Constituição de 1988, que equiparou trabalhadores rurais e urbanos.

A Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, em suas sucessivas modificações, é o que hoje rege a matéria, em conjunto com a Lei de Custeio, Lei 8.212, da mesma data.

Finalmente, a Lei 11.718, que acrescentou artigo à Lei 5.889, de 08 de junho de 1973, já descrita acima, mas que não contemplou a atividade de trabalhador volante.

Assim, lenta foi a legislação visando à proteção do trabalhador rural.

Constata-se que, nesta perspectiva legislativa, a Lei 4.214/61 foi a primeira a elaborar, sistematicamente, os direitos do homem do campo, mas não teve alcance prático, no mundo fenomênico, em virtude da não previsão da fonte de custeio.

O Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, a Lei Complementar 11/71, em pleno Regime Militar, iniciou uma programa de proteção a esse trabalhador, dando um caráter híbrido, assistencialista e, ao mesmo tempo, contributivo ao trabalhador, prevendo aposentadoria apenas ao arrimo de família por idade, face às atividades desenvolvidas pelo mesmo e excluindo a mulher do benefício de aposentadoria por idade, caso o marido já fosse aposentado ou o arrimo de família, dando ênfase ao caráter assistêncial da previdência rural. Deixou de fora grande parte dos trabalhadores rurais, destacando-se os trabalhadores volantes.

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Ela unificou a Previdência Social Urbana e Rural e equiparou os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, estando assim normatizado em seu artigo 7ª, em sua redação original: “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais além de outros que visem à melhoria de sua condição social:”12

...

Em nível de organização da Seguridade Social, o Constituinte de 1988, em consonância com o artigo 7º, preceituou que:

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao poder público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I - universalidade da cobertura e do atendimento;

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; [grifo do autor]

III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - eqüidade na forma de participação no custeio; VI - diversidade da base de financiamento;

VII - caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados.13 (Grifo meu)

No subnível previdenciário, destacou a aposentadoria diferenciada por idade dos trabalhadores rurais e reconheceu, pela primeira vez, em nível constitucional, o regime de economia familiar, normatizado na legislação infraconstitucional, incluindo o pequeno produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória [grifei], observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial (...)14

Neste contexto de nivelamento constitucional é que todas as normas de hierarquia inferior devem ser interpretadas. Sobressai o princípio da dignidade da pessoa humana em consideração à natureza diferenciada da atividade desenvolvida pelo trabalhador rural,

12 BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil, art. 7º, caput. Vade Mecum.

7. Ed. São Paulo: RT, 2012.

13 BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil, art. 194 e incisos. Vade

Mecum. 7. Ed. São Paulo: RT, 2012.

14 BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil, art. 201, caput. Vade Mecum.

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destaca-se, neste sentido, o trabalhador volante e a dificuldade cultural de arrecadação das contribuições previdenciárias, decorrentes da atividade laborativa exercida por ele, em relação à fonte de custeio da previdência social.

Em termos legislativos, de legislação infraconstitucional, frisa-se a Lei 11.718, de 20 de junho de 2008, que acrescentou artigo à Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973, criando o contrato de trabalhador rural por pequeno prazo. A Lei 5.889 define trabalhador rural e empregador rural.

De especial importância é o artigo 11, da Lei 8.213/91, que possibilita a realização cientifíca de uma classificação dos segurados da previdência social. Tendo como ponto de partida a legislação, em vigor, em especial o artigo 11, da Lei 8.213/91, é possível estabelecer e classificar os vários tipos de trabalho rural, para um melhor enquadramento, em relação aos benefícios que os mesmos fazem jus, bem com delimitar a proteção previdenciária que o ordenamento jurídico lhes deferem.

Estabelece o artigo 11, da Lei 8.213, quem são os filiados obrigatórios da Previdência Social e, neste preceito normativo, devemos alocar o trabalhador volante para fins de classificação e sistematização.

Na evolução legislativa, dentro de contexto histórico, depreende-se que, apesar da evolução no sentido de proteção previdenciária, o trabalhador volante ficou à margem; no entanto, contextualizando a aplicação dos princípios e das regras constitucionais, infere-se que, em decorrência da atividade laborativa exercida, são segurados obrigatórios da Previdência Social, pois quem trabalha, goza do seguro social obrigatório.

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3 PRINCÍPIOS E REGRAS CONSTITUCIONAIS E O TRABALHADOR RURAL

3.1 Definição de Princípios e Regras

A palavra princípio é carregada de ambiguidade. Tem múltiplos significados, conforme assevera Nicola Abbagnamo.15

Far-se-á um corte metodológico, delimitando o significado de princípio, de que este é norma do sistema jurídico, que, ao lado das regras, formam o sistema normativo.

Adota-se a lição de Humberto Ávila16, de que princípios são normas.

Sérgio Sérvulo da Cunha, em acurado estudo sobre o tema, observa que:

[...] de uns tempos para cá na doutrina e no foro em tudo se veem princípios, aos quais — como na descoberta de terra ignota — se vão dando nomes, que na sua profusão se sobrepõem. No Dicionário Compacto do Direito (doravante citado como DCD)listei parcimoniosamente 135 “princípios” que freqüentam as páginas da literatura jurídica nacional, enquanto nos sessenta volumes do seu Tratado de Direito Privado, desde (em ordem alfabética) o princípio “civiliter uti” (§ 2.202,5, tomo 18) até o “princípio de moralidade” (§ 3.658, 2, tomo 32), Pontes de Miranda nomina, aplica, ou estuda 576 dos mais variados princípios.17

O estudo sobre princípios é um dos mais complexos dentro do panorama da Teoria Geral do Direito.

Em uma visão tradicional sobre a definição de princípio, partindo de linha metodológica de que princípio aparece como linha diretiva que ilumina a compreensão e interpretação, doutrina Celso Antonio Bandeira de Mello, para delinear o conceito de princípio, diz:

Princípio é, pois, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tónica que lhe dá

sentido harmónico”. Eis porque: “violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao principio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. E a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade,

15 ABBAGNAMO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Editora Martins Fontes, 5ª ed. 2007, p.928.

16 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo:

Malheiros Editores, 13ª edição, 2012, p. 203.

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conforme o escalão do principio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.”18

Esta definição tradicional, repetida milhares de vezes, não traz a essência de princípio e de regra, servindo mais como vetor de interpretação.

Assim, na esteira do pensamento de Roque Antonio Carraza19, que completando as

lições de Celso Antonio Bandeira de Mello, que, de forma concisa , afirmou generalidade, de que princípio ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com ele se conectam.

Adverte Carraza que:

os princípios são encontrados em todos os escalões da pirâmide jurídica, havendo princípios constitucionais , legais, e ate infralegais,, e dentro da pirâmide jurídica, os mais importantes são os constitucionais, que irradiam sobre todo os sistema jurídico.20

Paulo de Barros Carvalho, dentro da Teoria do Construtivismo Lógico Semântico, traz a definição perfeita sob o ponto de vista lógico. Assevera o mestre:

Princípio é palavra que frequenta com intensidade o discurso filosófico, expressando o “início”, o "ponto de origem”, o “ponto de partida”, a “hipótese-limite” escolhida como proposta de trabalho. Exprime também as formas de síntese com que se movimentam as meditações filosóficas (“ser”, “não-ser”, “vir-a-ser” e “dever-ser”), além do que tem presença obrigatória ali onde qualquer teoria nutrir pretensões científicas, pois toda ciência repousa em um ou mais axiomas (postulados). Cada “princípio”, seja ele um simples termo ou um enunciado mais complexo, é sempre susceptível de expressão em forma proposicional, descritiva ou prescritiva.21

Assim, na esteira de pensamento de Canotilho, chega-se à conclusão de que “princípios são normas do sistema jurídico, que convivem ao lado das regras, sendo a

18 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso do de direito administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 29.

ed. 2012, p. 54.

19 CARRAZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros Editores. 26

ed., 2010, p. 44/45.

20 CARRAZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros Editores. 26

ed., 2010, p. 46.

21 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário linguagem e método. São Paulo: Editora Noeses. 2011,

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Constituição um sistema aberto de regras e princípios”22, acrescentando-se a doutrina de

Paulo de Barros Carvalho, de que princípios iluminam e direcionam a compreensão do aspecto de todo o ordenamento jurídico.

Neste sentido, doutrina Wagner Balera:

[...] princípios são normas que descrevem o que se poderia chamar o estado ideal a ser alcançado pelo sistema. Deles derivam as regras que concretizarão, a partir das concretas situações da vida, os plano de programas tracejados pela Lei Suprema.[...]

As regras, por seu turno, comandam comportamentos humanos. Estão dirigidas de modo imperativo a alguém. Impõem , proíbem ou permitem determinada conduta. São concretizações do querer do direito.23

Assim, a Constituição se vale de princípios e regras. Ambos são conteúdos de normas constitucionais. A esse respeio, interessante é a lição de Tercio Sampaio Ferraz, ao lecionar que, teoricamente, pode-se dizer o seguinte:

[...] princípios são pautas de segundo grau que presidem a elaboração de regras de primeiro grau. Isto é, princípios são prescrições genéricas, que se especificam em regras. Essa distinção, formulada em tese, não é fácil, porém, de ser sustentada na análise do texto constitucional. A terminologia, mesmo teoricamente, não é pacífica - o que exige um esclarecimento terminológico24.

E o preclaro mestre reconhece que não é fácil sustentar teoricamente a distinção entre princípios e regras, de maneira que propõe os seguintes critérios para auxiliar o intérprete:

1. os princípios não exigem um comportamento específico, isto é, estabelecem ou pontos de partida ou metas genéricas; as regras, ao contrário, são específicas em suas pautas;

2. os princípios não são aplicáveis à maneira de um “tudo ou

nada”, pois enunciam uma ou algumas razões para decidir em determinado sentido sem obrigar a uma decisão particular; já as regras enunciam pautas dicotômicas, isto é, estabelecem condições que tornam necessária sua aplicação (conseqüências que se seguem automaticamente);

3. os princípios têm um peso ou importância relativa, ao passo que as regras têm uma imponibilidade mais estrita; assim, princípios comportam avaliação sem que a substituição de um por outro de maior peso

22 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Portugal: Almedina Coimbra, 7.

ed., 2007, p. 1160 e ss.

23 BALERA, Wagner. Noções Preliminares de Direito Previdenciário. São Paulo: Quartier Latin., 2. ed., 2010,

p. 103.

24 FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Sistema Tributário e princípio federativo”. In: Direito Constitucional. São

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signifique exclusão do primeiro; já as regras, embora admitam exceções, quando contraditadas provocam a exclusão do dispositivo colidente;

O conceito de validade cabe bem para as regras (que ou são válidas ou não o são), mas não para os princípios, que, por serem submetidos a avaliação de importância, mais bem se encaixam no conceito de legitimidade.25

Como leciona Luis Roberto Barroso:

Nos últimos anos, todavia, ganhou curso generalizado uma distinção qualitativa ou estrutural entre regra e princípio, que veio a se tornar um dos pilares da moderna dogmática constitucional, indispensável para a superação do positivismo legalista, onde as normas se cingiam a regras jurídicas. A Constituição passa a ser encarada como um sistema aberto de princípios e regras, permeável a valores jurídicos suprapositivos, no qual as ideias de justiça e de realização dos direitos fundamentais desempenham um papel central. A mudança de paradigma nessa matéria deve especial tributo às concepções de Ronald Dworkin e aos desenvolvimentos a ela dados por Robert Alexy. A conjugação das idéias desses dois autores dominou a teoria jurídica e passou a constituir o conhecimento convencional na matéria26

Assim, princípio é de espécie normativa, que contém relatos com maior grau de abstração, não especificam a conduta a ser seguida e se aplicam a um conjunto amplo de situações. Em uma democracia, os princípios frequentemente entram em colisão, apontando direções diversas. Por essa razão, sua aplicação deverá dar-se mediante ponderação: à vista do caso concreto, o intérprete irá aferir o peso que cada princípio deverá desempenhar na solução do caso concreto, mediante concessões recíprocas, e preservando o máximo de cada um, na medida do possível. Sua aplicação, portanto, não será no esquema tudo ou nada, mas graduada à vista das circunstâncias representadas por outras normas ou por situações de fato Por outro lado, Regras são normas jurídicas, relatos objetivos, descritivos de determinadas condutas e aplicáveis a um conjunto delimitado de situações. Ocorrendo a hipótese prevista no seu relato, a regra deve incidir, pelo mecanismo da subsunção: enquadram-se os fatos na previsão abstrata e produz-se uma conclusão. A aplicação de uma regra se opera na modalidade tudo ou nada: ou ela regula a matéria em sua inteireza ou é descumprida. Na hipótese do colisão entre duas regras, só uma será válida e irá prevalecer.

25 FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Sistema Tributário e princípio federativo”. In: Direito Constitucional. São

Paulo: Editora Manole. 2007, p. 338.

26 BARROSO, Luís Roberto. “O começo da História. A nova interpretação constitucional e o papel dos

princípios no direito brasileiro”. In: Temas de direito constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, Vol. III, 2 ed.,

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Feita esta digressão sobre princípios e regras, e partindo da premissa de que princípios são normas e, ao lado de regras, formam todo o arquétipo normativo de um sistema jurídico, será estudado e desenvolvido os princípios da obrigatoriedade da filiação, da solidariedade, da uniformidade entre trabalhadores rurais e urbanos, in dubio pro misero, a equidade nas fontes de custeio, as regras do mínimo existencial e regra da contrapartida em relação ao trabalhador volante, dando consistência jurídica ao enquadramento do bóia-fria no ordenamento jurídico

Todo o estudo do conceito de trabalhador rural denominado volante, ou bóia-fria, dentro do universo da Previdência Social, deve partir da irradiação desses princípios e regras.

Deve-se conciliar os princípios que regem a Previdência Social, em especial, os ditados pelo caput do artigo 201, da Constituição Federal, que diz que a Previdência Social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e filiação obrigatória, com os princípios previstos no artigo 194, II e V, da Constituição Federal, da uniformidade de tratamento entre os trabalhadores rurais e urbanos , e a equidade nas fontes de custeio da previdência social, tendo em consideração os princípios maiores, esculpidos na Carta Magna, em seus artigos 3º e 4º, que são o de construir uma sociedade solidária (art. 3º, I, e artigo 4º, II, da CF), tendo como prevalência os direitos humanos, para se buscar o enquadramento do trabalhador volante, como segurado da Previdência Social.

Delimitado o que se entende por princípio e regra constitucional, serão analisados doutrinadores da área de Direito Previdenciário que especificam os princípios previdenciários reconhecidos em relação à Previdência Social, a partir da Constituição de 1988.

Observa Miguel Hovarth Júnior:

Os sistemas de seguridade social têm por objetivo único a erradicação das necessidades sociais, assegurando a cada um dos integrantes da comunidade o mínimo essencial para a vida em comunidade, tendo seus recursos geridos por órgãos públicos. Sua legislação tem caráter cogente e natureza de ordem pública, posto que intimamente ligada à estrutura do Estado e aos direitos do indivíduo como meio de assegurar a paz social.27

Neste contexto, surge a necessidade de se preservar o mínimo existencial, ou mínimo vital, visando à preservação da dignidade da pessoa humana. Assim, complementando os princípios e as regras constitucionais, bem como a necessidade de ser preservar o mínimo existencial, aliado à posição da Jurisprudência dominante

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sobre a matéria, que reconhece o trabalhador volante como segurado da Previdência Social, far-se-á a classificação do trabalhador volante em relação à Previdência Social.

Dentre os princípios constitucionais, previstos no artigo 194, da Carta Magna, podemos aferir sete:

a) universalidade da cobertura e do atendimento;

b) uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

c) seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; d) irredutibilidade do valor dos benefícios;

e) equidade na forma de participação no custeio; f) princípio da diversidade da base de financiamento; g) caráter democrático da gestão do sistema.

Estes são aplicados em todas as relações jurídicas da Seguridade Social (Assistência Social, Saúde e Previdência Social).

Com enfoque no Direito Previdenciário, Miguel Horvath Júnior elenca oito princípios28:

1) Obrigatoriedade de filiação;

2) da solidariedade ou da compensação nacional; 3) da unicidade das prestações;

4) da compreensibilidade;

5) da automaticidade das prestações;

6) da imprescritibilidade do direito ao benefício; 7) da expansividade social;

8) princípio do in dubio pro operário.

Serão analisados os princípios da solidariedade, da obrigatoriedade da filiação, in dubio pro operário, também alcunhado, in dúbio pro misero, e, finalmente, o princípio da equidade nas fontes de custeio.

Em complementação, será esplanada a regra do mínimo existencial e a regra da contrapartida. São princípios e regras atinentes à própria gênese do trabalhador

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volante, em busca de sua classificação como segurado obrigatório da previdência social, independentemente dele, trabalhador volante, nestas condições, não recolher a devida contribuição previdenciária em decorrência de seu labor.

Não recolhe a contribuição previdenciária, face à miséria em que, comumente, vive; baixa escolaridade. Possui, como único meio para sobreviver e sustentar a sua família a venda de sua mão de obra braçal, considerada de baixa qualidade, pelos tomadores de serviços rurais, como os pequenos sitiantes, donos de pequenas propriedades rurais, fazendeiros que fazem uso de sua mão de obra, por pequenos períodos de tempo e para pequenas tarefas rurais.

No nosso entendimento, o trabalhador volante que trabalha na indústria canavieira que, segundo noticia André Cabette Fábio29, só no estado de São Paulo,

em 2007, havia 163 mil cortadores de cana, e que o mesmo denominou de bóia-fria, não pode ser assim enquadrado. Ele trabalha para empresa canaviera e, na pior das hipóstese, assim, seria contribuinte individual (art.11, V, g, da Lei 8213/91), mas, como exerce atividade subordinada, mesmo por pequeno período de tempo, adquire a condição de empregado, estando assim , enquadrado no artigo 11, letra a, da Lei 8.213/91.

Na aplicação destas normas constitucionais (princípios e regras), será deduzido que o trabalhador volante, por exercer atividade laborativa contínua para si, embora de forma eventual para o tomador de serviços, é segurado obrigatório da Previdência Social.

3.2 Princípio da solidariedade

Este é um dos princípios mais importantes, que deve nortear todo o Direito Previdenciário na sua aplicação e extensão. A solidariedade é a essência da humanidade. Ser solidário com o próximo, em um momento de necessidade. O princípio é abrangente e irradia sobre todo o sistema jurídico, encontrando guarida no Direito Previdenciário. Tem normatividade constitucional explícita, nos termos dos artigos 3º, I, da Constituição Federal, sendo um dos objetivos da República Federativa do Brasil.

29Disponível em:

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Preceitua ainda o artigo 195, da Carta Magna que a Seguridade Social será financiada por toda a sociedade, e, dentro do sub sistema, está englobado a Previdência Social.

Conforme doutrina Wladimir Novaes Martinez:

A origem da solidariedade referida no seguro social provém da assistência

berço comum de quase todas as técnicas de proteção social. O mutualismo encampou a idéia e ela adquiriu funcionalidade. Contribuiu para isso a forma facultativa. A obrigatoriedade foi o passo seguinte na consolidação. No seguro privado, como no seguro social, a solidariedade é exigência lógica, técnica matemático-financeira. A Previdência Social surgiu no momento em que o homem compreendeu que, sozinho, ou mesmo em família, isoladamente, não poderia suportar o peso dos encargos produzidos pelos riscos sociais.30

Desde o surgimento da Previdência Social, o princípio da solidariedade aparece como direcionador de todo o sistema: princípio fundante. Superou o sistema mutualista e passou a ser gerido pelo Estado, na sua concretude, em busca da Justiça Social e banimento da miséria.

Ensina Mattia Persiani que:

[...] através desse sistema, efetiva-se, de fato, a solidariedade de todos que estão em condições de trabalhar e de todos que extraem do trabalho alheio uma utilidade no caso dos trabalhadores incapacitados de extrair do próprio trabalho os meios de sustento e que, de uma forma ou outra, encontram-se em situações de necessidade.

Essa solidariedade não pode ser expressa por uma estrutura mutualista, na qual também se efetiva, de fato, uma solidariedade, mas que é limitada, quer quantitativamente, no âmbito dos próprios expostos a um risco, quer qualitativamente, por força da essencial característica da reciprocidade. A solidariedade efetivada com a previdência social, ao contrário, supera essas limitações. Trata-se de uma solidariedade entre quem trabalha e quem, não podendo mais fazê-lo ou não tendo podido trabalhar, encontra-se em situação de necessidade; entre quem produz e quem contribuiu com seu trabalho para essa produção.31

Em relação ao trabalhador rural volante, comulmente chamado de bóia-fria, a solidariedade complementa sua integração à Previdência Social. Quem tem mais contribui com quem tem menos; no momento da contingência e risco social, este é dividido por todos.

Como doutrina Miguel Horvath Júnior:

[...] solidariedade social significa a contribuição do universo dos protegidos em benefício da minoria (...) o sistema protetivo visa a amparar necessidades sociais que acarretem a perda ou a diminuição de recursos, bem como em situações que provoquem aumento de gastos. No momento da contribuição, é a sociedade quem contribui, no momento da percepção

30 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de direito previdenciário. São Paulo: Editora LTr. 1983, pp.

57/58.

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quem usufrui. Daí vem o pacto de gerações ou princípio de solidariedade entre gerações. Os não necessitados de hoje, contribuintes, serão os necessitados de amanha, custeados por novos não necessitados que surgem.32

A solidariedade é a espinha dorsal do arquétipo da Previdência Social. Constata Jane Lucia Wilhelm Berwanger, em relação à Previdência Rural:

[...] o princípio que fundamenta com maior profundidade a Previdência Rural é o da solidariedade, na medida em que desvincula o acesso aos benefícios da contribuição, pois o direito é garantido ainda que não tenha havido qualquer contribuição durante toda a vida do segurado. Esse princípio assume maior relevância tendo em vista que está expresso na nossa Constituição e implícito ao determinar que a seguridade será financiada por toda sociedade.33

O trabalhador volante, exercendo sua atividade rural de forma contínua – ora para um tomador de serviços, por curto período de tempo, ora para outro – deveria, em tese, recolher sua contribuição previdenciária, ou alguém por ele. No caso da aplicação do princípio da solidariedade, em tese, se não houver o recolhimento, mas ocorrendo o exercício de atividade laborativa, na aplicação deste princípio, em conjunto com os demais princípios elencados acima, deve a sociedade dividir este ônus: quem contribui com mais ajuda o equilíbrio do sistema. Este princípio deve ser ponderado com os demais, principalmente com a fonte de custeio.

Esse é um problema de extrema importância e gravidade, pois é dever de todos contribuir para a seguridade social, e só se torna filiado, participante do seguro social, quem contribui. No caso dos trabalhadores volantes, em decorrência da solidariedade social, deve o mesmo ser enquadrado como segurado, fazendo jus à proteção previdenciária, à luz da conjugação deste princípios.

3.3 Princípio da obrigatoriedade da filiação

A origem da obrigatoriedade da filiação está no próprio surgimento do Seguro Social, que se deu na Alemanha, a seguir na Inglaterra; posteriormente, alastrou-se por todos os

32 HORVATH JÚNIOR, Miguel. Direito previdenciário, São Paulo: Quartier Latin, 8. Ed., 2010, pp. 81-82.

33 BERWANGER, Jane Lucia Wilhelm. Previdência rural: inclusão social. Curitiba: Juruá editora, 2. ed., 3ª

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países que têm um seguro social. Está ligada à própria origem da Previdência Social. Noticia Augusto Venturi que “Na Alemanha, e um pouco mais tarde, em proporções menores, na Inglaterra, foram constituídos, portando, os lugares de origem, da Previdência Social Obrigatória.”34

A obrigatoriedade é fundamental para a própria existência da Previdência Social, transferindo para o Estado a gestão e manutenção do sistema protetivo, levando-se em consideração que o trabalhador, que vende sua mão de obra, não tem, em sua maioria, possibilidade material de poupar, não prevendo as contingências, riscos e a necessidade futura. Vende sua mão de obra para a manutenção do dia a dia. Quando, na terceira idade, a saúde definha, o mesmo ficará desamparado se não contar com o seguro social.

Sobressai este fenômeno, em relação ao trabalhador rural volante.

Observa Miguel Horvath Júnior que o princípio da obrigatoriedade da filiação “fundamenta-se na necessidade do cálculo atuarial e do caráter cogente da relação jurídica previdenciária em relação aos segurados que desenvolvem relação de trabalho. A obrigatoriedade é essencial para caracterização do seguro social, que é custeado por contribuições dos trabalhadores, empregadores e Estado (fórmula tripartite de custeio). A adoção do princípio da obrigatoriedade de filiação ao sistema surge em decorrência da convicção de que as formas voluntárias de seguro resultaram inadequadas para a solução dos problemas decorrentes dos riscos fisiológi-cos e econômifisiológi-cos que atingiam os trabalhadores. A obrigatoriedade de filia-ção decorre da natureza do seguro social como forma de garantir a todos a proteção social no momento da ocorrência dos eventos geradores das neces-sidades sociais. É necessária a formação de um lastro contributivo que ga-ranta segurança ao sistema.35

Complementando a ideia de necessidade e da própria natureza humana, Daniel Machado da Rocha observa que:

[...] a maior parte das pessoas retira o necessário para a sua sobrevivência do seu trabalho. Como esses rendimentos são, em geral, consumidos na sua totalidade para a satisfação de necessidades materiais prementes, pouco sobra para ser poupado, não sendo possível a constituição de reservas para o enfrentamento dos riscos sociais. Outros, embora pudessem separar parte do salário para a constituição de um fundo, preferem consumir imediatamente tudo o que auferem. Caso as pessoas pudessem optar por se

34 VENTURI, Augusto. I Fondamenti Scientifici dela Sicurezza Sociale. Milano. Dott.A. Giuffrè Editore, 1954,

pp. 97/98: “la Germania e, se pure assai piü tardi e in proporzioni minori, l’lnghilterra, costituirono quindi i luoghi di origine dell’assicurazione sociale obbligatoria. Da questi paesi essa prese il cammino del suo

incessante sviluppo in tutto il resto del mondo e soprattutto il sistema tedesco acquistò, per la durata della sua esperienza e per l’accuratezza tecnica che lo caratterizzava, un immenso prestigio, cosicchè esercitò una

predominante, anche se non esclusiva, influenza sulle successive legislazioni straniere. Questo elemento comune

originário è rilevabile a qualsiasi esame dello svolgimento delia legislazione comparata dell’assicurazione

sociale, nella quale si riscontra nei diversi paesi 1’esistenza di una particolare identità di principí e di metodi,

anche quando i paesi stessi appartengono a sistemi giuridici difíerenti”

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filiarem ou não na previdência social, essa não teria se consolidado. Uma das razões que propiciou o êxito da iniciativa com os trabalhadores subordinados, indubitavelmente, foi a possibilidade de repassar o dever do desconto e do recolhimento das contribuições para os empresários - mediante o emprego da técnica da substituição tributária - pois seria materialmente impossível fiscalizar o cumprimento dessa obrigação por parte de cada um dos trabalhadores36

Destarte, visando à proteção do trabalho, em lenta evolução legislativa, mas desde sua origem, foi instituída a obrigatoriedade de filiação, direito cogente.

De acordo com toda a evolução histórica da Previdência Social, o único modo de tornar viável o gigantesco seguro social é pela compulsoriedade da filiação e, por ser seguro, o outro lado do binômio, o dever de contribuir que dela decorre, operada pela intervenção estatal, a qual permite a transferência dos riscos individuais para toda a coletividade.

Esse fato é confirmado pela análise da situação dos países europeus e latinos desde o final do Século XIX, sobressaindo a necessidade premente de ser obrigatório, a partir do término da Segunda Guerra Mundial.

Atualmente, de lege lata, o fundamento constitucional encontra-se no caput do artigo 201, da Constituição Federal:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial37

Se o regime é obrigatório, de caráter contributivo, sobressai que o trabalhador rural, denominado volante, é necessariamente filiado ao mesmo, em decorrência de sua atividade laborativa, e a falha ocorre justamente no recolhimento de sua contribuição. Cabe saleintar que, no binômio filiação obrigatória e caráter contributivo, reside, justamente, o ganho da qualidade de segurado, no caso de todos aqueles que exercem atividade laborativa.

No caso dos segurados facultativos – outro é o princípio atendido –, que é o da universalidade do seguro social e dá-se ênfase à contribuição previdenciária, para que a pessoa se torne segurado da Previdência, visando a universalidade do seguro social, sem se ater à atividade laborativa desenvolvida, como autônomos, e aqueles que não exercem tal atividade.

36 ROCHA, Daniel Machado. O direito fundamental à previdência social na perspectiva dos princípios

constitucionais diretivos do sistema previdenciário brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora,

2004, p. 152.

37 BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil, art. 201, caput.. São Paulo:

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Para atender ao caráter contributivo do Seguro Social, e face à pouca cultura do trabalhador rural volante ou bóia-fria, não tendo este consciência do dever de recolher a contribuição social, pois mal ganha para o seu sustento diário, estando mais assemelhado ao trabalhador empregado, caberia à pessoa que se beneficia do trabalho do mesmo, o tomador de serviços, o recolhimento da contribuição previdenciária, sendo, portanto, o trabalhador volante, face a obrigatoriedade de filiação, vinculado ao regime geral da Previdência Social. Essa é a posição majoritária da Jurisprudência dominante e o entendimento da autarquia previdenciária. Cabe, no aperfeiçoamento do sistema previdenciário, à autarquia previdenciária, por meio da Receita Federal do Brasil, aprimorar a fiscalização do recolhimento destas contribuições previdenciárias, como já tem decidido a jurisprudência.

Neste sentido, confira acórdão de lavra do Desembargador Sérgio Nascimento:

A trabalhadora designada “bóia-fria” deve ser equiparada à empregada rural, uma vez que enquadrá-la na condição de contribuinte individual seria imputar-lhe a responsabilidade contributiva conferida aos empregadores, os quais são responsáveis pelo recolhimento das contribuições daqueles que lhe prestam serviços . 38

O princípio da obrigatoriedade da filiação atende à universalidade de cobertura do seguro social. E sobressai, assim, a primeira classificação que se faz, entre os segurados da Previdência Social:

a) segurados obrigatórios – todos aqueles que trabalham, e, em tese, recolhem a contribuição previdenciária, incidindo o princípio da obrigatoriedade de filiação b) Segurados facultativos – dar-se ênfase a contribuição previdenciária, para que a

pessoa se torne segurado da Previdência, sem se ater a atividade laborativa desenvolvida, como autônomos, e aqueles que não exercem atividade laborativa, incidindo no caso o princípio da universalidade da cobertura.

3.4 Princípio da uniformidade entre trabalhadores rurais e urbanos

Somente com a Constituição de 1988 foi normatizada a igualdade entre trabalhadores rurais e urbanos, estando esses últimos sempre à frente na conquista de direitos sociais, em face de questões históricas e sociais. Esse princípio está expresso no art. 7º, da Constituição Federal: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria

(35)

de sua condição social...”39, que, combinado com o preceituado no artigo 194, II, da Carta Magna, dá a dimensão exata do significado e reconhecimento desta igualdade.

Com isso, a Constituição quis igualar todos os trabalhadores, fazendo um nivelamento normatizado de realidades díspares. Este princípio é corolário do princípio fundamental da igualdade, tendo em vista que, no regime precedente, as populações urbanas e rurais estavam sujeitas a regimes previdenciários/assistenciais distintos.

Asseveram Simone Barbisan Fortes e Leandro Pausen que:

[...] enquanto os trabalhadores urbanos estavam sujeitos ao regime previdenciário da CLPS, os trabalhadores rurais encontravam-se sujeitos a um regime mais propriamente assistencial do que previdenciário, o Regime do Prorural. Aos trabalhadores rurais garantia-se menor número de benefí-cios, e em valor menor do que aqueles prestados pela Previdência urbana.

Assim, com a vinda da Constituição Federal de 1988, determinou-se a unificação dos regimes previdenciários urbano e rural, o que, na legislação infraconstitucional, foi operacionalizado na Lei 8.213/91.

Unificados os regimes previdenciário urbano e assistencial rural, operou-se se a uniformidade enquanto igualdade sob o aspecto objetivo, isto

é, no que se refere aos eventos cobertos, e a equivalência enquanto

igualdade sob o aspecto econômico, isto é, quanto ao valor das prestações40

Esse princípio aplica-se ao trabalhador volante, estendendo ao mesmo todos os benefícios que recebem o trabalhador urbano, como auxílio doença, uma vez reconhecida a sua atividade, e cabe aquele que se beneficia do seu trabalho o recolhimento da contribuição previdenciária.

O fundamental é o reconhecimento da qualidade de segurado do trabalhador volante, que vive no meio rural; estendendo ao mesmo, todos os benefícios recebidos pelo trabalhador urbano.

3.5 Princípio da equidade nas fontes de custeio

É dever de toda a sociedade financiar a seguridade social, na medida de sua capacidade econômica.

É lição de Wagner Balera:

A equidade na forma de participação do custeio, prevista no art. 194, V, da Carta Magna, surge como corolário do princípio da isonomia,

39 BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil, art. 7º, caput. Vade Mecum.

7. Ed. São Paulo: RT, 2012.

40FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro.

Direito da seguridade social. Porto Alegre: Livraria do

Imagem

Figura 1:  Seguridade Social
Figura 2: Filiados da Previdência Social
Figura 3: Conjunto dos integrantes da Previdência Social
Figura 4: Classificação dos segurados da Previdência Social Empregados
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Referências

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