rev bras ortop.2017;52(5):535–537
SOCIEDADE BRASILEIRA DE ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA
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Artigo
Original
Síndrome
da
embolia
gordurosa
na
fratura
diafisária
de
fêmur:
o
tratamento
provisório
faz
diferenc¸a?
夽
Jânio
José
Alves
Bezerra
Silva
∗,
Diogo
de
Almeida
Diana,
Victor
Eduardo
Roman
Salas,
Caio
Zamboni,
José
Soares
Hungria
Neto
e
Ralph
Walter
Christian
IrmandadedaSantaCasadeMisericóridiadeSãoPaulo,SãoPaulo,SP,Brasil
informações
sobre
o
artigo
Históricodoartigo:
Recebidoem29dejulhode2016 Aceitoem30deagostode2016 On-lineem19dejaneirode2017
Palavras-chave: Fraturasdofêmur Fixac¸ãodefratura Traumatismomúltiplo Emboliagordurosa
r
e
s
u
m
o
Objetivo:Identificarosfatoresderiscoecorrelacioná-loscomotratamentoinicial. Métodos:Estudoretrospectivoqueenvolveu272pacientescomdiagnósticodefratura dia-fisáriadefêmur;14%permaneceramemrepousoatéotratamentocirúrgico,52%foram submetidosafixac¸ãoexterna,10%fizeramotratamentodefinitivoimediatoe23% perma-neceramcomtrac¸ãoesqueléticaatéotratamentodefinitivo.
Resultados: Foramseiscasosdesíndromeda emboliagordurosa(SEG), nosquaisse evi-denciouqueopolitraumaéoprincipalfatorderiscoparaseudesenvolvimentoequeo tratamentoinicialinstituídonãooinfluenciou.
Conclusão:Pacientespolitraumatizadosapresentaramumamaiorchancededesenvolver SEGenãohouveinfluênciadotratamentoinicialinstituído.
©2016SociedadeBrasileiradeOrtopediaeTraumatologia.PublicadoporElsevierEditora Ltda.Este ´eumartigoOpenAccesssobumalicenc¸aCCBY-NC-ND(http:// creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/).
Fat
embolism
syndrome
in
femoral
shaft
fractures:
does
the
initial
treatment
make
a
difference?
Keywords: Femoralfractures Fracturefixation Multipletrauma Fatembolism
a
b
s
t
r
a
c
t
Objective:Toidentifytheriskfactorscorrelatedwiththeinitialtreatmentperformed. Methods:Thisisaretrospectivestudyinvolvingatotalof272patientsdiagnosedwith femo-ralshaft fractures.Ofthepatients, 14%werekeptatrestuntil thesurgical treatment, 52%underwentexternalfixation,10%receivedimmediatedefinitivetreatment,and23% remainedinskeletaltraction(23%)untildefinitivetreatment.
Results:ThereweresixcasesofFatEmbolismSyndrome(FES),whichshowedthat poly-traumaisthemainriskfactorforitsdevelopmentandthatinitialtherapywasnotimportant.
夽
TrabalhodesenvolvidonaSantaCasadeSãoPaulo,DepartamentodeOrtopediaeTraumatologia,GrupodeCirurgiadoTrauma,São Paulo,SP,Brasil.
∗ Autorparacorrespondência.
E-mail:janioalves@gmail.com(J.J.Silva). http://dx.doi.org/10.1016/j.rbo.2016.08.011
536
rev bras ortop.2017;52(5):535–537Conclusion: PolytraumapatientshaveagreaterchanceofdevelopingFESandtherewasno influencefromtheinitialtreatment.
©2016SociedadeBrasileiradeOrtopediaeTraumatologia.PublishedbyElsevierEditora Ltda.ThisisanopenaccessarticleundertheCCBY-NC-NDlicense(http:// creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/).
Introduc¸ão
A liberac¸ão de êmbolosgordurosos na corrente sanguínea pode ocasionar lesão e disfunc¸ão de um ou mais órgãos, definidascomosíndromedaemboliagordurosa(SEG), princi-palmentepelamobilidadenofocodafratura,1mas,apesarde
novosprotocoloscomtratamentosagressivosdeapoioe tera-piaintensiva,permaneceumasdaspreocupac¸õesnasfraturas diafisáriasdeossoslongos.2–4Sabendodisso,aestabilizac¸ão
esqueléticaprecoceésugeridaparapreveniressasíndrome.1
Noentanto,adecisãodequalabordagemseráfeitadependedo quadroclínicodopacienteedadisponibilidadederecursos.5
Opresenteestudobuscaidentificarosfatoresderiscopara asíndromedaemboliagordurosaecorrelacioná-locomo tra-tamentoinicialinstituído.
Casuística
e
método
Estudo retrospectivo observacional baseado em dados de prontuáriosdospacientesdoDepartamentodeOrtopediae Traumatologia,atendidosentrejaneirode2011edezembro de2015.Foramcoletadasinformac¸õesqueincluemdados epi-demiológicos,mecanismodetrauma,classificac¸ãodafratura segundoaClassificac¸ãoAO,6tratamentofeito,desfechoclínico
quantoàpresenc¸aounãodaSEG.
Foramincluídosospacientescomdiagnósticodefratura da diáfisedofêmur deambos osgêneros, commínimo de 16 anos, e excluídos os pacientes com fratura em osso patológico.
Foram considerados dois grupos: politraumatizados e não politraumatizados. No primeiro eram consideradosos comlesõesmúltiplasqueexcediamumagravidadedefinida (ISS≥17).6
Em relac¸ão ao tratamento inicial, foram divididos em: repouso(pacientesqueforammantidosemrepousonoleito com coxins), trac¸ãoesquelética transtibial;fixac¸ão externa paracontrolededanosetratamentocirúrgicodefinitivo,seja comhaste intramedularoufixac¸ãocom placa eparafusos.
Tabela1–Distribuic¸ãodospacientesportratamento inicial
Tratamentoinicial n %
Repouso 39 14,3%
Fixac¸ãoexterna 144 52,9%
Definitivo 27 9,9%
Trac¸ãoesquelética 62 22,8%
n=númerodepacientes.
Fonte:Dadosobtidosdosprontuáriosavaliados.SAME,ISCMSPe HEFR.
Tabela2–Distribuic¸ãodospacientesporfaixaetária
Faixaetária n %
16-30anos 172 63,2%
31-40anos 48 17,6%
41-50anos 19 7,0%
51-60anos 10 3,7%
>61anos 23 8,5%
n=númerodepacientes.
Fonte:Dadosobtidosdosprontuáriosavaliados.SAME,ISCMSPe HEFR.
Nenhum paciente foi tratado definitivamente com fixac¸ão externa(tabela1).
Cumpriam os critérios de inclusão 272 pacientes cujos prontuários foram revisados. Foram 43 (16%) pacientes do gênero femininoe229(84%) domasculino. Quanto àfaixa etária, foram predominantemente entre 16-30 anos (63%) (tabela2).FoievidenciadaSEGemseiscasos(2,2%).
Emrelac¸ãoaomecanismodetrauma,houveuma predomi-nânciadevítimasdeacidentesmotociclísticos(57%),seguidos porautomobilísticos(17%)equedas(14%).
Usamos aclassificac¸ão dogrupo AO6 paraas fraturase
obtivemosaseguintedistribuic¸ãoconformefigura1.
Foram consideradospolitraumatizados (ISS>17)43 paci-entes (16%)e67 (25%)apresentavam exposic¸ão nofoco de fratura.
Resultados
Dos229pacientesdogêneromasculino,cinco(2,2%) desen-volveramSEGenogrupodas43pacientesdogênerofeminino observamosapenasum(2,3%)(p=0,954).
0,0% 6,6%
13,6% 34,9%
6,3% 18,4%
9,9%
2,6% 2,2%
5,5%
32-A1 32-A2 32-A3 32-B1 32-B2 32-B3 32-C1 32-C2 32-C3 5,0%
10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0% 40,0%
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Houve prevalência de SEG nos adultos, principalmente abaixodos30anos(83,3%),porémsemsignificânciaestatística (p=0,302).
Considerandocomovariávelapenasofatodeopaciente serpolitraumatizado,em43,cinco(12%)desenvolveramSEG enogrupodenãopolitraumatizadossomenteum(p<0,001).
Dentreos144casossubmetidos àfixac¸ãoexternacomo tratamentoinicial,seis(4%)desenvolveramSEG,cinco poli-traumatizados.
Nogrupodos43politraumatizados,30foramsubmetidos àfixac¸ãoexternaedessescinco(17%)desenvolveramSEG.No restantedogrupo(13pacientes),quatroforamsubmetidosa repousonoleito,quatroatratamentodefinitivonaurgência, cincoatrac¸ãoesquelética;emnenhumdesseshouvecasosde SEG.
Em relac¸ão à classificac¸ão AO,6 os pacientes com SEG
distribuíram-seentre32-B2(50%);32-A2(33%)e32-A3(17%). NãoencontramoscasosdeSEGentreospacientescom fratu-rasclassificadascomo32-C.
Discussão
A SEGé relacionada amúltiplos fatores, como energia do trauma,predisposic¸ãodopaciente eressuscitac¸ãoinicial1,7
Pinneyetal.8descreveramqueháumarelac¸ãodeSEGnos
paci-entesadultosjovens,poisessessãocapazesdesobrevivera traumasdealtaenergia,oquefavoreceessasíndrome.Nosso estudoevidenciouqueentreosseispacientescomSEG,cinco apresentavam-secommenosde 30anos, porémessa tam-bémfoiaidadenaqualessafraturafoimaisprevalente,com 172pacientes(63%).Dessaforma,háumapredominânciade SEGnogrupodeadultosjovens,porémsemsignificância esta-tística(p=0,302).Omesmofoiobservadoemrelac¸ãoaogênero masculino,noqualasfraturasdiafisáriasdofêmurforammais comuns(84%)erespondempor83%dospacientescomSEG.
Omanejoinicialdeumpacientecomfraturadiafisáriado fêmurdependedascondic¸õesclínicasdesuaadmissão hospi-talar,levam-seemconsiderac¸ãoosconceitosjáestabelecidos naliteratura,deEarlyTotalCareeDamageControl.Nos pacien-tessubmetidosaotratamentodefinitivoprimário,nãohouve SEG,o que corrobora estudosde Bone etal.9 eLasanianos etal.7 Eles demonstraram queafixac¸ão precoceda fratura
diafisária de fêmur isoladanos paciente estáveis pode ser benéfica.
Jánogrupo depacientes com indicac¸ãode fixac¸ão pro-visória, Brian et al. demonstraram não haver diferenc¸a de desfechosclínicosnospacientessubmetidostantoafixac¸ão externa(FE)quantoatrac¸ãoesquelética.10Emnossoestudo,
houveumamaiorprevalênciadeSEGnospacientes subme-tidosàFE(p<0,02)enenhumcasodeSEGnossubmetidosà trac¸ãoesqueléticaourepousonoleito.Noentanto,dentreos pacientessubmetidosàFE,em144(seiscomSEG),30foram politraumatizados (cinco com SEG), esse foi consideradoo fatormaisimportante(p=0,016).
Quantoàclassificac¸ãodasfraturas(classificac¸ãoAO6),que
levaemcontaaenergiadotrauma,eradeseesperaruma pre-valênciamaiordefraturasdotipoCnospacientescomSEG, poissetratadefraturascommaiorinstabilidadeecommaior mobilidadenofoco,logo,éesperadaumamaiorliberac¸ãode êmbolosdegordura.1,6Entretanto,emnossoestudo,as
fratu-rasdotipoB2foramasmaisprevalentesnogrupodepaciente com SEG(50%),masdentre esses50 pacientescom fratura classificac¸ãoAO32-B2,oitoeramtambémpolitraumatizados (dois com SEG) e42 não politraumatizados (um com SEG). Seformosmedirarelac¸ãoentreemboliaepolitraumanesse grupo de fraturas,nãohouve significânciaestatísticaentre essasvariáveis(p=0,098).
Conclusão
O paciente politraumatizado tem uma maior chance de desenvolver SEGeemnossacasuísticaotratamentoinicial instituídonãoinfluenciounoseudesenvolvimento.
Conflitos
de
interesse
Osautoresdeclaramnãohaverconflitosdeinteresse.
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a
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