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O papel das ONGS ambientalistas na comunicação das mudanças climáticas: um caminho para o engajamento

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

O PAPEL DAS ONGS AMBIENTALISTAS NA COMUNICAÇÃO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS: UM CAMINHO PARA O ENGAJAMENTO?

Giselli Raisa da Cruz Cavalcanti

Natal 2019

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Giselli Raisa da Cruz Cavalcanti

O PAPEL DAS ONGS AMBIENTALISTAS NA COMUNICAÇÃO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS: UM CAMINHO PARA O ENGAJAMENTO?

Dissertação elaborada sob orientação do Prof. Dr. José Q. Pinheiro e apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Psicologia.

Orientador: Prof. Dr. José Q. Pinheiro

Natal 2019

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Ficha catalográfica

Cavalcanti, Giselli Raisa da Cruz.

O papel das ONGS ambientalistas na comunicação das mudanças climáticas: um caminho para o engajamento / Giselli Raisa da Cruz Cavalcanti. - 2019.

177f.: il.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-graduação em Psicologia. Natal, RN, 2019.

Orientador: Prof. Dr. José Q. Pinheiro.

1. Organizações não-governamentais - Dissertação. 2. Mudanças Climáticas - Dissertação. 3. Engajamento - Dissertação. 4. Comunicação - Dissertação. I. Pinheiro, José Q. II. Título. RN/UF/BS-CCHLA CDU 061.2:502/504

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Cambiar el mundo, amigo Sancho, No es locura ni utopía Sino justicia (Autoria desconhecida – e um tanto controversa)

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Aos meus avós, Edson e Anaide, e a toda a minha família, por tudo o que sou A Zé, pela confiança, por me impulsionar a ser mais, por seguir apostando em mim Ao Engajamundo, por me ensinar a ter sempre aquele cuidado para não ir longe de menos

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Agradecimentos

Nasceu comigo e vou levar, carrego em mim cada lugar Sigo e sei que não vou só, vejo a vida ao meu redor

(Fukai – Um Rio) A trajetória que me levou a este mestrado não diz apenas desses anos dentro do universo da pós-graduação. Diz de muito antes e de muito além: é retrato de onde nasci e cresci, das minhas memórias e afetos, dos espaços que conheci e ocupei, das pessoas que com tanto amor e gratidão carrego comigo. Por toda esta constelação de fatores, falar de gratidão (ainda que não seja simples ou pouca coisa) se torna uma tarefa repleta de uma grata facilidade.

À minha família, a quem minha gratidão se estende tão longe quanto a minha memória e que tem raízes tão fortes e profundas como aquela minha tão querida goiabeira no meio do quintal dos meus avós. Pela minha infância de pés enfiados na terra no jardim, pelo amor regado a cafés da minha vó, pelo carinho tão puro do meu avô que me ensinou o amor pelos livros e pela natureza, pelo cuidado de toda a minha família diz tanto de quem eu sou. Àqueles que são minha casa, eu só agradeço.

A Zé, que se faz presente na minha vida desde antes mesmo da ideia de fazer um mestrado ser real, que sorte a minha ter te encontrado lá no início desse caminho! Agradeço por ter feito com que eu enxergasse a Psicologia de novos jeitos e por ter me mostrado a todo o universo da Psicologia Ambiental, hoje tão parte de quem sou. Agradeço por ter apostado em mim, por ter apoiado minhas ideias, por ter reconhecido potenciais que muitas vezes não me eram visíveis, por todos os nossos momentos de orientações terapêuticas que iam sempre muito além das questões de pesquisa. Agradeço, ainda, por sempre me lembrar que isso aqui é só um mestrado.

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Por extensão, minha gratidão se volta a todo o GEPA, grupo que durante esses anos me ensinou tanto: muito aprendi com vocês sobre pesquisa, outra parte ainda maior vocês me ensinaram sobre suporte, companheirismo e um sentido real do que é o mundo acadêmico. Neste espaço, dedico um agradecimento especial a Alexandra, Raquel, Hellen e Cláudia, vocês que me foram modelo, guia e orientação sobre como ser pesquisadora, professora, mulher dentro da academia. Com muito gratidão, dedico também meu carinho especial a Pedro Rafael e a essa nossa amizade adubada com tanto amor, respeito, grandes doses de incentivos mútuas e ocasionais fatias de brownies.

Ao Engajamundo, minha gratidão não se mede em palavras. Das minhas vivências na rede encontrei o ponto de partida para este trabalho e o sentido também pessoal e afetivo para agregar a ele. Mais do que uma organização ou um espaço de trabalho, somos rede no mais profundo sentido da palavra: daquele significado que diz de juntar, estabelecer vínculos, entrelaçar. Agradeço por serem essa rede que me dá tanto suporte e é construída de tanta potência, agradeço por alimentarem minhas utopias cotidianas, por me permitir seguir cercada de tanta gente com gana de mudar o que existe de errado por aí, por serem meu ecossistema de afetos. Minha gratidão profunda e cotidiana por todas as partes de mim que afloraram desde me que descobri Engajamundo.

Agradeço às relações que construí neste percurso e que me foram essenciais para chegar aqui, cada uma e cada um contribuindo de sua forma particular. A Letícia, Larissa e Juliana, agradeço por estarem sempre presentes na minha vida, por compartilharem comigo momentos tão importantes e transformadores, por me apoiarem nas grandes decisões e por serem suporte sempre que precisei. Agradeço pela sorte que tenho ao ter ao meu lado uma amiga como Gabi Baesse, com quem compartilhar das missões mais variadas dessa vida: seja na universidade, nos treinos, no ativismo, na criação de projetos, nas expedições, nos planos futuros, nas crises existenciais. A Pey, por me mostrar um mundo novo cheio de tanto afeto,

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por me fazer descobrir lados meus que não conhecia, por me mostrar que sair da rota às vezes é o melhor caminho. A Bruno, que tanto compartilhou deste meu caminho, agradeço por sempre estar presente, por participar, por me apoiar, me incentivar, me ouvir, por me fazer rir e me fazer bem. Minha enorme gratidão ainda por te ter como o melhor parceiro que poderia existir para dividir comigo a missão de co-coordenar nosso tão querido projeto. A Mari, agradeço pelo carinho, pelas conversas, pelas nossas tradicionais fugas da rotina como duas jovens idosas.

Aos 11 participantes que compartilharam comigo suas histórias, rotinas, motivações, frustrações e expectativas nas jornadas futuras. Tenho enorme gratidão por ter tido a oportunidade de ouvir suas histórias e ver o mundo a partir dos seus pontos de vista; agradeço pelas inestimáveis contribuições e pelo respeito ao meu estudo.

Por fim, agradeço ao PPgPsi da UFRN por possibilitar a realização deste trabalho e à CAPES pela concessão da bolsa de estudos. Que nosso futuro possa seguir tendo uma educação pública e de qualidade para todas e todos.

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Sumário

Lista de Tabelas ... 11 Lista de Siglas ... 12 Resumo ... 13 Abstract ... 14 1. Apresentação ... 15

2. Terceiro setor e organizações não-governamentais como agentes comunicadores ... 22

2.1. Adentrando o terreno: como definir “ONG”? ... 22

2.2. O movimento ambientalista e as organizações não-governamentais: o terreno aos tons de verde ... 26

3. Um recorte da questão ambiental: as mudanças climáticas ... 30

3.1. Mudanças Climáticas ... 31

3.3 O fator humano das Mudanças Climáticas: do macro ao micro ... 35

4. A comunicação como construção do engajamento? ... 41

4.1. Criando raízes: das teorias de base ao diálogo com a(s) Psicologia(s) ... 41

4.2. Ramificando: a comunicação ambiental e a atuação de ONGs ... 44

4.3 A comunicação das mudanças climáticas como ponto de partida ... 49

5. Proposta de estudo ... 54

6. Método ... 57

6.1. Participantes ... 58

6.1.1. Análise de saturação teórica ... 59

6.1.2. Caracterização dos participantes ... 61

6.2. Instrumentos e procedimentos ... 62

6.2.1. Estudo piloto ... 67

6.2.2. Entrevistas em ambiente virtual ... 68

6.3. Análise de dados ... 69

7. Resultados e Discussão ... 72

7.1. Dando história às vozes do estudo ... 72

7.2. Conceituando “mudanças climáticas”: uma visão especializada? ... 77

7.2.1. Das hesitações, surpresas e risos ... 79

7.2.2. “Mudanças Climáticas para mim são...”... 81

7.3. Desafios da comunicação climática ... 89

7.3.1. Complexidade ... 93

7.3.2. Distanciamento ... 96

7.3.3. Exigências em concorrência ... 99

7.3.4. Iconografia do desastre ... 102

7.3.5. Negação ... 104

7.3.6. O que dizem os desafios apresentados? ... 106

7.4. Por onde seguir? ... 107

7.4.1. Comunique com credibilidade ... 110

7.4.2. Construa pontes concretas ... 112

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7.4.4. Fale fora da bolha ... 120

7.4.5. Humanize a comunicação ... 122

7.4.6. Trabalhe em rede ... 124

7.4.7. Aponte soluções ... 127

7.4.8. Das sugestões à ação: modelos reais de comunicação climática ... 130

8. Considerações finais ... 135

Referências ... 145

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Lista de Tabelas

Tabela Página

1. Saturação teórica das respostas coletadas 61

2. Ocorrência das categorias de desafios durante as entrevistas 93 3. Ocorrência das categorias de soluções durante as entrevistas 110

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Lista de Siglas

COP Conferência of the Parties/ Conferência das Partes

GEEs Gases de Efeito Estufa

IPCC Intergovernmental Panel on Climate Change

MCs Mudanças Climáticas

ONGs Organizações Não-Governamentais ONU Organização das Nações Unidas

PBMC Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas

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Resumo

Como potencializar o engajamento do(s) público(s) com a temática das mudanças climáticas (MCs)? O presente estudo se soma aos vários outros que buscam responder a esta questão adotando diferentes perspectivas. Como parte deste cenário, o trabalho buscou investigar a forma pela qual as MCs são comunicadas a partir da atuação de organizações não-governamentais (ONGs) brasileiras. Este ponto de partida tem como base dois disparadores: (1) a crescente participação da sociedade civil organizada (aqui representadas na forma de ONGs) nas discussões, elaborações e execuções de políticas públicas direcionadas às mudanças climáticas; e (2) compreender a comunicação como um dos pontos de partida para o engajamento, o qual carrega um grande potencial de mobilização pública. Isto posto, o presente estudo adotou uma abordagem qualitativa e exploratória, envolvendo a realização de entrevistas semiestruturadas com 11 participantes que atuam na temática, representando as ONGs das quais fazem parte. Como parte das entrevistas, solicitei indicações de materiais de uma comunicação climática “ideal”, etapa que se somou ao conteúdo das entrevistas, conjunto que foi posteriormente submetido à análise de conteúdo. Como resultado, percebe-se que definir e comunicar o que são as MCs não é tarefa simples, mesmo para um público com alto nível de especialidade, e que esta dificuldade diz de uma série de desafios que englobam a natureza do fenômeno, as formas pelas quais ele tradicionalmente vem sendo comunicado e os vários fatores sociais envolvidos. As soluções apresentadas pelos participantes, somando-se aos materiais indicados apontam possíveis caminhos que podem contornar e superar estas diferentes naturezas dos desafios encontrados, fornecendo subsídios para potencializar a comunicação climática.

Palavras-chave: organizações não-governamentais, mudanças climáticas, engajamento,

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Abstract

How can we improve the engagement of the (different kind of) public with the climate change (CC) issue? The present study joins several others that seek to answer this question by adopting different perspectives. As part of this scenario, the work sought to investigate the way CC is communicated through the work of Brazilian nongovernmental organizations’ (NGOs) practice. This starting point is based on two triggers: (1) the increasing participation of organized civil society (represented here in the form of NGOs) in the discussions, elaboration and execution of public policies directed to CC; and (2) understanding communication as one of the starting points for engagement, which carries a great potential for public mobilization. Thus, the present study study adopted a qualitative and exploratory approach, involving semi-structured interviews with 11 participants who work on the theme, representing the NGOs of which they are part. As part of the interviews, I requested indications of materials of an "ideal" climate communication, a step that was added to the content of the interviews, a set that was later submitted to content analysis. As a result, it is perceived that defining and communicating MCs is not a simple task, even for a high-level audience, and that this difficulty tells of a series of challenges that encompass the nature of the phenomenon, the ways which it has traditionally been communicated and the various social factors involved. The solutions presented by the participants, adding to the indicated materials, point out possible ways that can circumvent and overcome these different natures of the challenges encountered, providing subsidies to enhance the climate communication.

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1. Apresentação

Ao pararmos para pensar nos grandes problemas da humanidade atualmente, facilmente chegamos às questões ambientais como um dos nossos grandes desafios, afinal, elas assumem diversas facetas e impactam a todos, sem preferências ou exceções, mesmo que de maneiras diferentes. Dentre estas grandes questões, as Mudanças Climáticas (MCs) se 5

destacam como sendo um dos maiores, mais graves e mais complexos (Clayton et al., 2016; Farias, 2017; PBMC, 2014). Apesar de ser também conhecido como Aquecimento Global, esta denominação restringe toda a complexidade do fenômeno a um aumento de temperatura (Farias, 2017), por isso sendo cada vez menos utilizada nos diferentes meios. O fenômeno originalmente foco das ciências naturais, hoje se coloca como discussão de forte interesse 10

político-econômico-ambiental, compondo tema central de inúmeros debates contemporâneos (Casagrande, Silva Júnior, & Mendonça, 2011), atingindo também parte da população mundial, que entra em contato com o tema de diferentes formas: pela mídia, pela escola, pelo trabalho, etc. (Barros & Pinheiro, 2013).

O crescente interesse acerca da temática das MCs se demonstra claramente no cenário 15

político, com debates ocorrendo de forma cada vez mais frequente e intensa tanto nas esferas internacionais como nacional, sendo pauta de diversas agendas, como é o caso da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC).

A COP (Conferência das Partes, da sigla em inglês Conferência of the Parties) 21 trouxe um impacto globalizado e uma discussão a nível internacional sobre a importância e a 20

urgência de se olhar para as mudanças que estão ocorrendo com o clima. O Brasil, sendo um país emergente e grande emissor de gases de efeito estufa, se apresenta como importante ator neste contexto (Araújo, 2016) e é visto como exemplo nessas negociações, tendo agora o desafio de transpor para a esfera nacional o que foi pactuado – tarefa reafirmada com a assinatura do Acordo de Paris, no dia 12 de setembro de 2016. Assim, especulações vêm 25

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sendo formuladas sobre os possíveis impactos que este acordo pode vir a ter na realidade nacional, considerando especialmente o contexto instável e vulnerável do país no que se refere às políticas ambientais.

Nesse enquadre, é imprescindível destacar a participação humana para a definição do cenário atual: apesar das controvérsias que se colocam ao discutirmos as MCs, o papel 5

determinante das ações humanas como intensificadoras do problema se torna cada vez mais marcado. Paradoxalmente, fica evidente que o fator antrópico surge também como elemento fundamental nas medidas de enfrentamento ao fenômeno, seja pela tentativa de amenizar suas consequências, seja pelas estratégias de adaptação a serem adotadas pelas consequências que já se fazem presentes no nosso cotidiano.

10

Para além disso, o ser humano se coloca também, junto aos demais seres vivos habitantes do planeta, como aqueles que irão sofrer (e já estão sofrendo, em alguns contextos) as consequências das mudanças climáticas. Sendo assim, o papel da população neste problema se apresenta de três formas: como intensificador do fenômeno, como potencial agente de transformação e como vítima dos impactos. Fica evidente, então, que as mudanças 15

climáticas, para além de um problema estritamente ambiental, se apresentam como um problema humano-ambiental (Clayton et al., 2016; Pinheiro, 1997). Considerando isso, seria mais do que esperável a predisposição das pessoas a cuidarem do seu ambiente, certo?

Pensando na relação intrínseca entre nós e nosso ambiente, ao nos construirmos mutuamente, a reflexão lógica nos leva a pensar que o que faz mal ao nosso meio, faz mal a 20

nós também. Nessa mesma lógica, cuidar do meu ambiente seria cuidar de mim também. Entretanto, alguns fatores se interpõem na lógica direta desse pensamento: primeiro, a distância temporal e espacial (seja concreta, seja psicológica) do problema, que obstrui uma visão clara de como este fenômeno irá impactar a vida humana (Barros & Pinheiro, 2013; Gifford, 2011; Uzzell, 2000); e segundo, o crescente distanciamento entre o ser humano e o 25

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ambiente, no qual tradicionalmente são colocados como realidades separadas e independentes. Ambas as questões contribuem para que nós, como sociedade, não tenhamos a proximidade e relação direta com o meio ambiente como prática comum. Mas por que as pessoas não se engajam nestas questões?

De maneiras diferentes, essa pergunta me acompanha desde muito antes do meu 5

planejamento para o mestrado, bem antes da minha entrada para a Psicologia e contato com a Psicologia Ambiental, na verdade. Quando criança, minha realidade de tempo livre se resumia a pé no chão, escalada de árvores no quintal dos meus avós e mãos sujas de terra. Desde pequena pude entender, então, que o ambiente estava em mim tanto quanto eu estava nele – e falo de um entendimento que não é sinônimo de compreensão, no sentido cognitivo da 10

palavra, mas que vai muito além disso: um entendimento que se refletia em um sentimento de pertencimento, de complementariedade, de relação, de afeto. Esse sentimento, uma vez estabelecido, passou a se refletir no meu modo de ser e na minha relação com o mundo ao meu redor.

Durante a graduação, vi na Psicologia Ambiental o lugar de encontro entre a área 15

profissional/ acadêmica que havia escolhido e os princípios de cuidado com o ambiente que me eram tão evidentes e caros desde cedo. Na minha inserção no GEPA (Grupo de Estudos Inter-Ações Pessoa-Ambiente), tive a possibilidade de atuar como bolsista de Iniciação Científica (IC) em trabalhos que investigavam a temática das mudanças climáticas e das fontes renováveis de energia, direcionando o olhar para diferentes públicos: universitários, 20

publicitários, adolescentes, crianças (Cavalcanti, 2014; Cavalcanti, 2015; Cavalcanti, Pinheiro & Barros, 2016; Cavalcanti, 2016). Foi no contato com as pesquisas que tive uma noção mais concreta de que não, a relação com o meio ambiente não é algo dado e comum para todos, nem tampouco isso se reflete em uma “culpa” individual, em uma falta de cuidado intencional e consciente ou em interesses pessoais e individuais. A questão vai muito além disso: é 25

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reflexo do nosso modo de funcionamento como sociedade, de questões culturais, de decisões políticas, de interesses econômicos, etc.

Em 2015, meu segundo ano como bolsista IC, pude realizar meu plano de trabalho como parte integrante da pesquisa de doutorado de uma colega do mesmo grupo de pesquisa e apresentá-lo no XXVI Congresso de Iniciação Científica e Tecnológica da UFRN. Por essa 5

apresentação, tive meu trabalho selecionado e premiado, o que me possibilitou participar no ano seguinte do II Congreso Latinoamericano de Psicología Rural (em Seropédica, RJ). Lá, me deparei com a importância de a Psicologia Ambiental direcionar sua atenção para pontos tradicionalmente não levados em consideração, como o ambiente rural, a questão de classe, a discussão de gênero.

10

Mais uma vez, tive a percepção de que as questões ambientais vão muito além de reflexos de escolhas individuais e que há uma questão social importante que não costuma ser foco das discussões: as mudanças climáticas não atingem a todos da mesma forma. Ainda, costumam impactar de forma maior aqueles que menos contribuem para o problema; é preciso, então, inclinar nossas discussões para um aspecto social mais abrangente.

15

Paralelamente à minha vida acadêmica, meu interesse pelas temáticas ambientais encontrou outro ponto de reflexão: a atuação em organizações não-governamentais. Em 2016, conheci o Engajamundo (http://www.engajamundo.org/) e vi aí uma oportunidade de trabalhar também as questões climáticas, por meio de um caminho diferente. Vi a potencialidade do contato direto com a população, de como uma ação consegue despertar o 20

interesse e engajamento das pessoas e do quão importante é o papel da sociedade civil dentro dessa discussão. Mais ainda, compreendi que é importante saber como comunicar sobre as mudanças climáticas, considerando toda a sua complexidade.

No final de 2017 participei de um dos encontros anuais e presenciais da rede do Engajamundo, que reúne representantes de todas as cidades onde temos núcleos. Nesses oito 25

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dias que passamos navegando pelo Rio Tapajós e num contato direto com a floresta Amazônica, discutimos bastante sobre como não se pode continuar criando projetos e campanhas que tenham um foco único e isolado, como um recorte: um recorte falando sobre gênero, um recorte falando sobre biodiversidade, um recorte falando sobre clima. Para que os discursos e práticas façam sentido, é preciso que dialoguem entre si, como uma linha 5

transversal que atravesse todas essas esferas e mantenha uma base comum.

Foi com essa percepção que, no início de 2018, surgiu como possibilidade a participação no Fórum Social Mundial. Imaginando o impacto que este espaço poderia ter para mim, e por consequência, para este trabalho, podendo trazer não apenas novos horizontes de discussão a serem incluídos, mas também mudanças nos aspectos metodológicos e 10

possibilidade de contato com futuros participantes, resolvi dar uma pausa nos avanços dos aspectos metodológicos que estava fazendo até então. E como imaginava, frutos vieram desse momento.

O Fórum, que ocorreu em Salvador/BA, entre os dias 13 e 17 de março, foi muito marcado pelo ideal da importância e necessidade dessa linha transversal que pudesse 15

estabelecer um diálogo entre as diferentes frentes de atuação dos movimentos sociais, para que pudesse trazer uma maior aproximação e, por consequência, um maior fortalecimento das pautas. Para além disso, trouxe também como marca importante a discussão sobre o cenário político e social da América latina e como esses fatores impactam diretamente os movimentos sociais, desde aqueles que tratam mais diretamente das questões sociais, até os movimentos 20

ambientalistas. Como esperar que as pessoas tenham como uma das prioridades o cuidado com o meio ambiente, quando muitas delas não sabem como vão alimentar sua família no dia seguinte?

Por essas minhas vivências, entendi que falar de mudanças climáticas vai muito além de falar sobre a emissão de gases de efeito estufa (GEE), sobre a o buraco na camada de 25

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ozônio, ou do aumento na temperatura média do planeta. Falar sobre mudanças climáticas é falar sobre o que consumo, como me transporto, o que visto, minhas decisões políticas... E mais, é falar sobre essas questões como retratos de grupos sociais diferentes, de realidades sociais e espaciais diversas, e com um atravessamento de aspectos maiores que muitas vezes vão se sobressair às questões ambientais. A sociedade não é um bloco único e homogêneo, 5

assim como não são uniformes os modos de interação com o meio ambiente e, consequentemente, seus impactos. As mudanças climáticas, então, não podem ser discutidas como um aspecto recortado da esfera social e, sendo assim, sua comunicação também não.

Dessa forma, os questionamentos que me guiam nesse trabalho foram surgindo aos poucos, de forma complementar e encadeada, cada um nascendo de pontos diferentes da 10

minha história de vida. Lidando com as mudanças climáticas na área acadêmica e também dentro dos movimentos sociais, e percebendo a diferença nesses discursos, me surge a curiosidade: haveria uma diferença no impacto de quem recebe a informação, a depender de como é comunicado? Os discursos são pensados para serem direcionados a pessoas, em sua individualidade? À sociedade, como um todo? Os fatores sociais são levados em conta no 15

planejamento dessa comunicação?

A psicologia ambiental, por se debruçar sobre a relação do ser humano com o ambiente, tem muito a contribuir nestas interrogações. Estudos da área indicam que há consequências diferentes, a depender do tom usado pelas estratégias de comunicação adotadas. O tom catastrófico tradicionalmente utilizado para comunicar sobre as MCs tem se 20

mostrado contraproducente, gerando medo e inércia ao invés de um real comprometimento (Manzo, 2009, 2010; O’Neil & Nicholson-Cole, 2009), sendo assim necessário que seja adotada uma abordagem mais positiva (Pinheiro & Farias, 2015). Compreende-se, então, que a forma como o assunto é comunicado se apresenta como um dos fatores que impacta e influencia o conhecimento e engajamento da população sobre o assunto.

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Considerando o cenário atual de um baixo envolvimento da população em geral sobre o tema, torna-se necessário que o aspecto comunicacional relativo às MCs seja investigado. Nesse sentido, a presente dissertação se propõe a investigar as estratégias de comunicação das mudanças climáticas, como um possível ponto de partida para a construção do conhecimento e engajamento da população acerca do tema. Para isso, o estudo terá como foco a atuação de 5

organizações não-governamentais (ONGs) que se debruçam sobre essa questão e as estratégias de comunicação utilizadas por elas, buscando compreender como estas estratégias são adotadas, bem como suas razões e possíveis impactos para a população.

Para isso, os seguintes capítulos se apresentam como embasamento teórico para esta discussão, abordando questões fundamentais para o debate que este trabalho se propõe a fazer, 10

trazendo conceitos como terceiro setor, organizações não-governamentais, comunicação, mudanças climáticas. Indo além da discussão dos conceitos em si, serão trabalhados aspectos importantes da relação com a Psicologia, de modo geral, e com a Psicologia Ambiental, mais especificamente. A construção da narrativa dos capítulos foi estruturada no sentido de traçar uma costura entre os temas que, apesar de apresentadas à parte, se encaminham para uma 15

associação; assim, são introduzidos e discutidos aspectos sobre a atuação de organizações não-governamentais ambientalistas, o universo da comunicação e as reflexões e debates acerca do fenômeno as mudanças climáticas. Na sequência, seguem os capítulos referentes à proposta de estudo e as estratégias metodológicas adotadas, culminando com a apresentação e discussão aprofundada dos achados do trabalho.

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2. Terceiro setor e organizações não-governamentais como agentes

comunicadores

Quando pensamos na sociedade civil, e mais especificamente no que se refere à articulação e mobilização desta, são várias as tonalidades adotadas pelas pautas de luta: debatendo sobre fome, violências aos diversos grupos sociais (mulheres e LGBTs, população 5

negra, população em situação de rua, povos tradicionais), direito a terras e sobre as várias outras facetas das desigualdades sociais. Nesse amplo cenário, se insere também o debate a respeito da questão ambiental e seus vários aspectos.

Como um recorte, o presente trabalho irá se referir à sociedade civil a partir da atuação das organizações não-governamentais (ONGs), escolha que será justificada e situada nas 10

próximas seções, buscando também indicar como a atuação dessas organizações se insere no âmbito da problemática ambiental.

2.1. Adentrando o terreno: como definir “ONG”?

Ao entrarmos em contato com termos como “terceiro setor” e “organizações não 15

governamentais”, certamente algumas definições, conceitos e exemplos nos veem à mente. Entretanto, chegar a um consenso sobre o que de fato esses termos significam, seus critérios de definição e fatores que os constituem, é ainda um trabalho em processo.

A partir das últimas três décadas do século XX, o uso da expressão “terceiro setor” vem se tornando cada vez mais comum (Paiva & Yamamoto, 2008). Diferenciando-se do 20

Estado (primeiro setor) e do mercado (segundo setor), o terceiro setor se caracteriza um setor de organizações privadas, mas com fins públicos, tendo uma atuação que dialoga com o Estado – seja de forma paralela, seja complementar (Carvalho, 2002). O terceiro setor se

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coloca, então, não como um espaço inteiramente novo, mas que traz também aspectos mesclados do primeiro e segundo setor.

A discussão sobre a definição de terceiro setor, bem como as diferentes correntes que vão teorizar sobre isso, não serão foco do presente trabalho. Entretanto, por ser um conceito guarda-chuva que engloba aspectos importantes que serão abordados nesta investigação, faz-5

se necessário um detalhamento do que se entende aqui por terceiro setor, ainda que de forma breve. Nesse sentido, de acordo com Carvalho (2002), esse espaço se caracteriza por ser não governamental, não lucrativo, organizado, independente e tendo uma marca importante no que se refere à atuação dos envolvidos: o trabalho voluntário. Ainda segundo a autora, incluem-se nesse campo: associações civis e sindicais, entidades assistenciais e fundações 10

sem fins lucrativos, filantropia empresarial, movimentos sociais, as organizações lucrativas, as governamentais e as sociais. Dentre eles, a noção de organizações não-governamentais (ou ONGs), detém destaque especial nesse trabalho.

O conceito de ONGs, assim como o de terceiro setor, não é preciso nem possui delimitações conceituais nitidamente definidas: de partida, o próprio termo leva a uma 15

tentativa de definição a partir de uma negação – ou seja, o foco se direciona para o fato de não serem governamentais, uma negação que, por si só, não define (Sobottka, 2002). Em adicional, dentre os múltiplos movimentos que se definem e se reconhecem como ONG, há uma grande variedade, no tocante à sua constituição, suas pautas e suas formas de atuação (Lamy, 2013).

20

Apesar da delimitação do conceito de ONGs não ser um terreno estável, é evidente que há um crescente reconhecimento do seu espaço, tanto em projeção pública como em discussões acadêmicas. De acordo, Lamy (2013) discute que o mundo passa atualmente por uma revolução nas áreas de educação, direitos humanos, política e meio ambiente, o que se

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deve principalmente à explosão do número, importância e diversidade desse tipo de organização, tendo uma incidência cada vez maior no âmbito público e político.

Estas organizações se apresentam, então, como representativas da voz da sociedade civil na construção de um espaço socialmente justo e ambientalmente sustentável, contribuindo para a inserção de uma série de novos elementos no campo da política e do 5

debate público, ampliando os espaços democráticos e atuando como importantes pontos nodais – acumulando e distribuindo informações, não apenas entre si mas também direcionado para a esfera pública (Carneiro & Caneparo, 2010; Lamy, 2013; Mazzarino & Miguel, 2017; Pinto, 2006). Somando-se a estes fatores, posicionamentos que se destacam em sua atuação são as mobilizações de pressão contra o governo e, na relação direta com a 10

sociedade civil, o desenvolvimento de projetos de empoderamento (Pinto, 2006), alcançando um papel proeminente como “catalisadoras dos movimentos e das aspirações sociais e políticas da população” (Mattos & Drummond, 2005, p. 178).

Entretanto, apesar do caráter atual da discussão em torno do conceito, atuação e grande projeção das ONGs, a definição do termo data de décadas atrás. Dando dois passos 15

para trás, para assumir uma lente historicamente contextualizada e melhor compreender o presente, um resgate do passado se faz necessário.

O contexto de nascimento do termo “organizações não-governamentais” se remete ao cenário do Pós-Guerra, conjuntura marcada pelos rastros dos anos anteriores e que via na cooperação internacional (com atuação fundamental da ONU) uma importante estratégia de 20

superação. Nesse contexto, a denominação fazia uma relação direta a organizações transnacionais independentes, ou seja, que não foram criadas nem mantinham vínculos com governos (Sobottka, 2002).

Nos anos 80, especialmente nos países industrializados, as ONGs começaram a ganhar espaço tanto em projeção pública (por meio de ações públicas e crescente registro na 25

(25)

imprensa) como em debates acadêmicos. Seu conceito passa a agregar uma caracterização como “entidades civis ‘militantes’, de caráter não partidário, ligadas a movimentos sindicais ou outros movimentos sociais diversos” (Landim, 1993, p. 16), englobando também organizações ativas em um só país – e não apenas a entidades de atuação transnacional. Ainda, por terem nascido, em sua maioria, a partir de iniciativas de intelectuais e/ou 5

profissionais reconhecidamente capacitados, há uma tendência de maior credibilidade e reconhecimento público (Mattos & Drummond, 2005), contribuindo para a consolidação de seu espaço.

No Brasil, o processo de estabelecimento e crescimento das ONGs ocorreu no início dos anos 60, acompanhando o cenário de efervescência social, mas foi interrompido pelo 10

golpe militar de 1964 (Mattos, 2002). Anos mais tarde, com a promulgação da Constituição de 1988, a presença da sociedade civil como ator político vivencia um momento de crescimento e, dentro deste quadro, a posição das ONGs ganha destaque especial (Pinto, 2006).

No nosso contexto, o termo ONGs diz respeito a organizações que atuam tanto na 15

prestação de serviços como na formulação e análise de políticas públicas (Mattos, 2002). Com a promulgação da Lei do Terceiro Setor (Lei 9.790) e o artigo 16.I do Código Civil Brasileiro – no qual as ONGs são legalmente consideradas como sociedades civis sem fins lucrativos (Mattos, 2002) – a atuação dessas organizações no cenário nacional ganha um maior sustentáculo.

20

Nascendo com raízes nos movimentos sociais relativos a direitos civis e combate à pobreza, o papel das ONGs brasileiras está em transformação, buscando novas formas de sustentação financeira (um dos maiores obstáculos para uma atuação consolidada e a longo prazo), e se tornando um importante porta-voz em temas como direitos humanos, fome e meio ambiente (Carneiro, 2010; Sobottka, 2002). Dentro dessa esfera de temas, o trabalho das 25

(26)

chamadas ONGs ambientalistas ganha grande notoriedade (Carvalho, 2002), como será melhor discutido na seção seguinte.

2.2. O movimento ambientalista e as organizações não-governamentais: o terreno aos

tons de verde

5

O debate sobre a questão ambiental permeia atualmente diferentes espaços na vida cotidiana: sejam em espaços de trabalho, escolares, acadêmicos ou familiares, ideias como sustentabilidade, preservação da natureza, economia de recursos e cuidado ambiental, se manifestam de diferentes formas.

Como aponta Diniz (2015), nos anos finais do século XIX já começam a brotar 10

algumas raízes de movimentos em defesa do meio ambiente, sendo impulsionados após a Segunda Guerra Mundial – considerando diretamente o cenário de extenso incentivo ao desenvolvimento, que desemboca em um cenário igualmente extenso de degradação ambiental. Assim, à medida que cresce a adoção de estratégias de desenvolvimento que avançam a deteriorar o ambiente, cresce também, em número e em repercussão, o movimento 15

ambientalista.

Em meados dos anos 70, contexto marcado por fortes críticas à industrialização, o ambientalismo ganha um caráter institucionalizado nas sociedades norte americanas e europeias, vivenciando, décadas mais tarde, uma ampliação significativa com a realização da Eco 92 (Miguel, 2011). O ambientalismo, de acordo com Castells (2008) pode então, ser 20

compreendido como

todas as formas de comportamento coletivo que, tanto em seus discursos, como em sua prática, visam corrigir formas destrutivas de relacionamento entre homem e seu ambiente natural, contrariando a lógica estrutural e institucional atualmente predominante (p. 143)

(27)

De acordo com Miguel e Oliveira (2017), é nas ONGs dedicadas à defesa do meio ambiente que o movimento ambientalista tem maior força e papel de atuação, o que se fundamenta principalmente pela sua grande capacidade de inserção nos meios midiáticos – aspecto que contribui para sua legitimidade social e para a difusão da causa (Miguel, 2011). 5

Nesse sentido, as ONGs tornam-se referências em contextos em que o meio ambiente é tema de debate (Mazzarino & Miguel, 2017), incluindo nesse aspecto sua referência como fontes de informações frequentemente contatadas por jornalistas (Lamy, 2013). Segundo Carneiro e Caneparo (2010), as ONGs ambientalistas se apresentam como “um eficiente instrumento de planejamento e execução de políticas públicas na área ambiental ao promoverem o trabalho 10

voluntariado, ao despertarem o sentimento de cidadania e ao ajudarem na conscientização da população acerca da preservação do meio ambiente” (p. 126).

Agrupando-se a esta discussão, é importante destacar que as ONGs inseridas no debate da questão ambiental assumem um importante papel de rompimento com a hegemonia política, econômica e social estabelecida, no sentido de que: por se constituírem como um 15

espaço público fora do âmbito Estatal, movidos pela instituição de novos valores e padrões, se manifestam como atores potencialmente capazes de romper com a lógica individualista e predatória (Mattos, 2002).

No Brasil, o movimento ambientalista desperta como consequência do vasto processo de degradação ambiental, característico principalmente durante os anos 1930 e 1950, com os 20

projetos desenvolvimentistas da Era Vargas e de Juscelino Kubistchek, respectivamente (Diniz, 2015). Durante a ditadura militar, o processo de degradação ambiental permanece, sendo ainda justificado pela necessidade de manter um crescimento econômico acelerado; nesse contexto, considerando que os impactos sociais desse projeto desenvolvimentista não

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tinham espaço para serem discutidos e criticados, os impactos ambientais eram ainda menos considerados (Diniz, 2015).

É apenas a partir da década de 70 que o movimento ambientalista no país cria contornos mais definidos. De acordo com Alonso, Costa e Maciel (2007), o processo de redemocratização traz uma mudança na estrutura de oportunidades políticas, com uma maior 5

abertura de mobilização coletiva e o estabelecimento de um cenário propício para que questões sociais e ambientais pudessem ser criticadas e debatidas na esfera pública; soma-se a isto a criação de órgãos ambientais públicos que, ainda que tenham tido sua criação apenas para fins de cumprir exigências de organismos internacionais, representa também a abertura de postos de trabalho específicos para a questão ambiental, inseridos no setor público (Diniz, 10

2015). O ano de 1972 traz um marco importante para a histórica do movimento ambientalista brasileiro: a Conferência de Estocolmo – primeiro grande espaço político internacional destinado às discussões relacionadas à degradação do meio ambiente – abre a discussão pública nacional relativa à questão ambiental no país (Alonso, Costa & Maciel, 2007).

Após o processo de redemocratização, as ONGs encontram um solo fértil para se 15

proliferar. Este cenário propício para o crescimento traz consequências importantes para as décadas seguintes: nos anos 80, pela possibilidade de trabalho livre e aberto junto às comunidades, e na atuação no âmbito das políticas públicas; e nos anos 90, por um contexto de grande visibilidade em relação à atuação das ONGs, com organizações de vários tipos e tamanhos, sendo o grupo formado por entidades ambientalistas um dos mais fortes e 20

proeminentes (Mattos, 2002). É importante destacar também que o período entre as décadas de 80 e 90 foram anos importantes para a consolidação de organizações ambientalistas com grande impacto no país e reconhecimento público expressivo que se sustenta até hoje, como foram os casos da Fundação SOS Mata Atlântica, Greenpeace Brasil e WWF Brasil.

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Em 1992 o cenário brasileiro passa por uma nova mudança de perspectiva, com o país sediando a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável – a Eco 92. A conferência trazia consigo uma nova proposta de visão em relação à questão ambiental, sendo marcada pela concepção de desenvolvimento sustentável e por um movimento no sentido de conciliar o desenvolvimento com a conservação ambiental; para o 5

movimento ambientalista, isso significou também a construção de uma estrutura capaz de aglutinar os diferentes grupos ambientalistas (Alonso, Costa & Maciel, 2007; Diniz, 2015).

Nos anos 2000, o cenário nacional fica caracterizado por uma maior abertura por via dos espaços já constituídos, indo além da mobilização social através da atuação das ONGs, como é exemplo a criação dos Conselhos Jovens de Meio Ambiente (CJs) (Diniz, 2015). 10

Atualmente, entretanto, o cenário político do país estabelece um terreno incerto para o movimento ambientalista: com políticas que trazem um evidente desinvestimento na preservação ambiental (como foi o caso da discussão acerca da proposição do Novo Código Florestal), há uma efervescência de pautas que embasam a atuação do movimento ambientalista, porém com uma previsão incerta em relação a um real resultado desta atuação. 15

Ao retomarmos este trajeto histórico, é possível compreender que o movimento ambientalista não surge abruptamente, mas que se dá como uma reação a uma conjuntura sócio-político-econômica do momento – tanto no do seu nascimento como nas diversas transformações que vão marcando sua história. Ainda, é importante destacar a influência determinante do modelo de desenvolvimento econômico hegemônico na problemática 20

ambiental, no qual o meio ambiente é visto apenas como fonte de recursos a serem utilizados e destinatário final dos resíduos gerados pelo processo (Lima et al, 2014). Assim, reforça-se a concepção de que as questões ambientais não existem isoladamente e que, para compreendê-las, é preciso uma visão panorâmica.

(30)

3. Um recorte da questão ambiental: as mudanças climáticas

A questão ambiental, apesar de tratada no singular, engloba uma série de fatores e se apresenta para nós assumindo diferentes facetas: desde um rio poluído ou áreas de preservação de uma comunidade local ameaçadas, até questões de ordem nacional e/ou planetária. As mudanças climáticas (MCs) assumem, nesse sentindo, uma posição distinta, se 5

destacando como um dos maiores, mais graves e mais complexos desafios com que temos que lidar (Clayton et al., 2015; Farias, 2017; PBMC, 2014).

O presente estudo se propõe, de modo transversal aos objetivos, a explorar as interfaces do debate ambiental com aspectos sociais, no momento em que adota como foco a atuação de organizações não-governamentais ambientalistas. Nesse sentido, a temática das 10

mudanças climáticas se apresenta como um importante recorte da questão ambiental: para além dos aspectos estritamente ambientais (como aumento da temperatura média do planeta e do nível do mar, como serão discutidos mais à frente), as mudanças climáticas trazem questões sociais muito importantes a serem destacadas.

O presente capítulo aborda as mudanças climáticas a partir dos seus fatores de base, 15

traçando um olhar histórico acerca da constituição do problema e abordando os aspectos técnicos que o definem. Somando-se a esta discussão, é destacado o papel da atuação humana na consolidação das mudanças climáticas e diferentes formas de compreender qual o sentido de “humano” dado a esta questão – nesse sentido, explicitam-se as potenciais contribuições ao debate das ciências humanas, de modo geral, e da Psicologia, mais especificamente. Por fim, é 20

discutido acerca da comunicação das mudanças climáticas, traçando um elo entre as questões discutidas nos capítulos anteriores e encaminhando para os objetivos do trabalho.

(31)

3.1. Mudanças Climáticas

As Mudanças Climáticas (MCs), fenômeno também conhecido por aquecimento global (AG), vêm se tornando assunto cada vez mais discutido em diferentes esferas. A Revolução Industrial pode ser colocada como o marco histórico que sinaliza o início das atividades que culminaram na atual conjuntura do planeta. Foi a partir daquele momento que a 5

sociedade começou a se organizar com base em um modelo de civilização do desenvolvimento que emprega o uso dos recursos de forma pouco solidária e pouco sustentável (Held, 2001).

Assim, com uma maior industrialização e maior exploração dos recursos naturais, vem à tona, gradativamente, a discussão acerca dos impactos dessas atividades – na qual se inclui a 10

discussão acerca das mudanças climáticas. Historicamente, o debate se deu em volta da conjunção de fatores que estariam gerando e agravando as mudanças climáticas, buscando responder: há uma interferência das ações humanas no quadro climático? Se sim, qual seria seu real peso? Ou se trata de um fenômeno estritamente natural e próprio da constituição do planeta – no qual não teríamos influência, seja para agravá-lo e/ ou para mitigá-lo?

15

Atualmente, apesar de não haver um consenso absoluto sobre as causas das mudanças climáticas, bem como do peso das ações humanas, essa polarização de ideias já não assume uma posição tão central nos debates. Com o desenvolvimento do fenômeno, assim como a progressiva realização de estudos e pesquisas na área, indica-se que 97% dos cientistas climáticos concordam que as mudanças climáticas são agravadas pelas ações humanas – o 20

chamado “aquecimento global antropogênico” (Cook et al., 2013; Australian Psychological Society, 2016); posição também defendida no presente trabalho. Tal concordância entre os cientistas da área se torna uma ferramenta fundamental na mitigação das mudanças climáticas, considerando que o grau de consenso é um elemento essencial para o apoio público a políticas direcionadas ao clima; ainda, comunicar esse consenso surge com uma via de acesso à 25

(32)

aceitação das pessoas em relação ao fenômeno (Cook et al., 2013). Em concordância com este posicionamento, o mais recente relatório do IPCC (o IPCC Special Report on Global Warming of 1.5°C) compreende as ações humanas como tendo uma parcela significativa de participação no aumento aproximado de 1ºC na temperatura média do planeta comparada aos níveis pré-industriais, com uma variação média de 0,8 a 1,2ºC, e com projeção de alcançar os 5

1,5ºC entre 2030 e 2052, caso se mantenha o ritmo de aumento.

De modo geral, então, as mudanças climáticas são compreendidas hoje como um fenômeno que vem como resultado de um conjunto de fatores, incluindo as variações climáticas naturais e próprias do planeta, mas que vem sendo agravada por fatores antropogênicos, especialmente após a Revolução Industrial. Tais elementos, em conjunto, 10

contribuem para o aumento do chamado Efeito Estufa – fenômeno de origem natural que permite o aquecimento da superfície terrestre e assim o desenvolvimento da vida (Casagrande et al., 2011) – que passa a ser agravado, especialmente pela maior concentração dos gases de efeito estufa (GEE), como o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4). O aumento da concentração dos GEE surge como resultado da intensificação das atividades humanas, 15

especialmente da indústria, transporte, mudança no uso da terra e exploração de combustíveis fósseis, o que deixa cada vez mais evidente a influência humana no problema.

Pelo aumento da temperatura e consequente aquecimento do planeta, as MCs passaram a ser conhecidas popularmente como aquecimento global (AG), termo que pode reduzir um fenômeno tão complexo e multifacetado como as mudanças climáticas ao simples aumento de 20

temperatura (Farias, 2017). Por esta redução, o uso dessa nomenclatura passa a ser cada vez menos hegemônico para se referir ao fenômeno.

Tendo como base a própria nomenclatura – mudanças climáticas – entende-se que seus impactos são globais, ou seja, atingem a todas as escalas espaciais indiscriminadamente, não existindo localidade que esteja imune aos seus efeitos, nem sendo possível um enfrentamento 25

(33)

de caráter exclusivo por qualquer país (PBMC, 2014). Considerando a abrangência e gravidade das MCs, é crescente o interesse de diversas áreas de conhecimento sobre o tema, merecendo a atenção das ciências humanas e sociais.

O fortalecimento da concordância em torno da influência do fator humano nas origens das mudanças climáticas coincide com uma transição no enquadramento dos debates: o que 5

antes era foco de uma discussão voltada para as ciências ambientais tradicionais (físicas e naturais), atualmente se põe como forte interesse de pautas políticas e econômicas (Casagrande et al., 2011), sendo recorrente em discussões inseridas nas agendas políticas, convenções internacionais e frequentemente abordado pela mídia (Barros & Pinheiro, 2013) e, portanto, também merecendo a atenção das ciências humanas e sociais. A centralidade da 10

pauta na agenda internacional ambiental demonstra um gradativo e urgente aumento no interesse pelo tema, que se justifica principalmente pelos impactos já vivenciados na atualidade (Lima & Layrargues, 2014).

Pensando nesses fatores de impacto, não há como desconsiderar o efeito que uma mudança dessa magnitude irá provocar na forma com que as pessoas ocupam e se relacionam 15

com o espaço (Casagrande et al., 2011). A vida no planeta (incluindo os seres humanos) já sente agora, e irá sentir com intensidade ainda maior no futuro, as consequências das MCs. Segundo o mais recente relatório do IPCC (o IPCC Special Report on Global Warming of 1.5°C), já estamos presenciando agora as consequências de um aumento de 1ºC na temperatura média global comparada aos níveis pré-industriais, como um clima mais extremo, 20

aumento do nível do mar, diminuição do gelo marítimo do Ártico. Em concordância com estas afirmações, a ocorrência de eventos climáticos extremos vem se tornando cada vez mais frequente e com maior intensidade, sendo compreendidas como eventos decorrentes de impacto das alterações climáticas; nesse sentido, o acontecimento de vários furacões em um intervalo de menos de um mês, com intensidades que atingiram as categorias 4 e 5 na escala 25

(34)

Saffir-Simpson, são possíveis exemplos extremamente atuais desses eventos (BBC, 2017; Felipe, 2017).

Como projeção futura, um aumento de temperatura global variando entre 1.5ºC e 2ºC traria impactos como aumento médio de temperatura na maior parte das regiões de terra e oceanos e calores extremos na maior parte das regiões inabitadas, fatores que interagem e se 5

somam com a perda de grandes áreas de plantio, um aumento no risco de extinção de espécies, mudanças nos padrões pluviais acarretando chuvas intensas e secas prolongadas, derretimento de geleiras com consequente aumento do nível do mar (IPCC, 2018; Nobre et al., 2016; PBMC, 2014). No que se refere à abrangência das consequências das MCs, até mesmo a geração de energia por fontes renováveis (importante estratégia de mitigação do 10

problema) pode ser impactada, por dependerem das condições climáticas do ambiente e estarem vulneráveis ao fenômeno (Rosa, 2008).

Para além dos impactos à fauna e flora, as mudanças climáticas ameaçam também a saúde e bem-estar humano: o fenômeno traz como consequência sérios impactos nos sistemas humanos, criando refugiados climáticos, aumentando a mortalidade e amplificando a 15

gravidade e frequência de problemas de saúde física e mental (Australian Psychological Society, 2016), como o efeito direto do estresse por calor e problemas respiratórios (Nobre et al., 2016; PBMC, 2014).

Nesse sentido, considerando a abrangência, gravidade e urgência do fenômeno, especialmente o que evolve o ser humano, é necessária uma abrangência do campo de visão, 20

levando em conta os impactos concretos e iminentes das mudanças climáticas aos sistemas humanos, mas também compreendendo seu papel e responsabilidade tanto no estabelecimento do fenômeno como no enfrentamento deste.

(35)

3.3 O fator humano das Mudanças Climáticas: do macro ao micro

Tanto quanto um “mega desastre” ambiental, as mudanças climáticas são também um problema psicológico e social (Australian Psychological Society, 2016); afinal, ao irem além de aspectos puramente físicos e ambientais, e englobarem questões sociais, políticas e econômicas, o fenômeno se define como uma questão humano-ambiental (Clayton et al., 5

2016; Pinheiro, 1997). Como ponto de partida para esta constatação e como já foi apresentado anteriormente, cada vez mais se ressalta o papel das ações humanas na determinação do quadro atual das mudanças climáticas, que vem intensificando as alterações climáticas do planeta e agravando suas consequências.

Allan e Hadden (2017) apontam que houve uma transição no enquadramento dos 10

debates acerca das mudanças climáticas: o viés mais técnico e científico característico das discussões iniciais tende a deixar de ser o foco único, num movimento de abarcar e tentar trazer para o círculo central dos debates os aspectos sociais do problema. Para além de considerar os riscos ambientais do fenômeno, a ampliação do foco no trato das mudanças climáticas incorpora preocupações adicionais ao entender que as consequências do fenômeno 15

não atingem a todos da mesma forma: na verdade, atingem mais direta e intensamente os setores mais vulneráveis da população e aqueles que menos contribuem para o agravamento das alterações climáticas (Lima & Layrargues, 2014). Ou seja, países com níveis irrisórios de emissão de GEEs, populações rurais, indígenas e quilombolas, e moradores de áreas costeiras são exemplos daqueles que mais sofrem os impactos das mudanças climáticas, sendo os 20

responsáveis por uma menor parcela na contribuição para o estabelecimento do problema. Considerando estes aspectos e um deslocamento no enquadramento dos debates no sentido de abarcar o viés da discussão relativa à justiça climática, se direciona uma maior atenção para as dimensões éticas e morais do problema (Allan & Hadden, 2017).

(36)

Ao se discutir estes aspectos sociais multifacetados envolvidos no fenômeno das mudanças climáticas, se faz importante adotar uma visão abrangente e compreender o problema em sua realidade histórica. Como foi explorado em seção anterior, as atividades humanas tiveram um importante papel na determinação da conjuntura da crise ambiental atual; entretanto, é importante que seja questionado: a que “papel humano” estamos nos 5

referindo? Ou ainda mais, em que conceito de “ser humano” se embasam estas afirmações? Assim como são complexas as várias faces das questões envolvidas nas mudanças climáticas, também é multifacetado o fator humano aqui presente – estando compreendidos em um espectro que vai desde aspectos macrossociais até outros de ordem mais restrita e pessoais.

Partindo de uma visão mais macro, torna-se importante ressaltar que elementos 10

políticos e econômicos possuem um papel fundamental na formação das mudanças climáticas, ao considerarmos que estes constituíram a base do modelo de desenvolvimento, produção e consumo das sociedades ocidentais, responsável por uma parcela considerável na mudança climática atual (Lima & Layrargues, 2014). Para além desta responsabilidade histórica, os mesmos fatores continuam sendo elementos determinantes, ou seja: é do núcleo político-15

econômico e de seus macroatores (grandes corporações produtivas e estados nacionais, especialmente os mais ricos) que geralmente saem decisões e estratégias relativas à mitigação das mudanças climáticas (Lima & Layrargues, 2014).

Desta forma, paradoxalmente ao mea culpa do ser humano no estabelecimento da perigosa situação ambiental atual, há também nas ações humanas o potencial para o 20

enfrentamento das mudanças climáticas, no planejamento e adoção de medidas de mitigação e adaptação. O Protocolo de Quioto e o recente Acordo de Paris, bem como as referentes Conferências da ONU, se mostram como marcos do esforço (ainda que insuficiente), para frear os efeitos do fenômeno. Entretanto, as ações de enfrentamento às mudanças climáticas tradicionalmente adotadas tendem ao reducionismo e estão aquém do desafio, não sendo 25

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proporcionais à realidade deste, adotando uma postura equivalente a um conservadorismo dinâmico, no qual há uma “tendência inercial do sistema para resistir à mudança, promovendo a aceitação do discurso transformador para garantir que nada mude”, trazendo uma posição danosa ao debate ao promover uma ilusão de que algo está sendo feito em relação ao problema e resultando em uma desmobilização e despolitização da questão (Lima & 5

Layrargues, 2014). Nesse contexto, propostas como a aposta na tecnologia como transformadora única do contexto climático, iniciativas de consumo verde e marketing ambiental, bem como o ambientalismo preservacionista por si só são algumas das que se enquadram no conservadorismo dinâmico ao se mostrarem, isoladamente, insuficientes e com chances de se colocarem como obstáculos no avanço de ações de maior impacto. Proposições 10

com este caráter conservador precisam ter seus limites discutidos com base na realidade concreta do fenômeno e de sua complexidade.

Nesse sentido, existe então um fator tríplice do papel do ser humano nas mudanças climáticas: como espécie somos igualmente culpados pelo estabelecimento do problema, impactados pelas consequências atuais e ameaças futuras, e agentes com grande capacidade e 15

potencial de enfrentamento do fenômeno.

Nesse contexto, para além dos fatores de ordem macrossocial envolvidos na questão, outros a um nível mais individual e em menor escala – ainda que não em menor importância – devem ser considerados. Considerando esta complexidade intrínseca à questão das mudanças climáticas, a discussão adota, necessariamente, um caráter interdisciplinar, requerendo a 20

contribuição de diversos campos científicos (Barros & Pinheiro, 2013; Cavalcanti, Pinheiro, & Barros, 2016; Pinheiro & Farias, 2015; Swim et al., 2011). Assim, pensando no fator humano evidente delimitado na discussão, a Psicologia é convocada a contribuir para a discussão.

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São vários os estudos que se debruçam sobre os fatores psicológicos envolvidos no contexto das MCs, entre eles aqueles que sinalizam as barreiras psicológicas que impedem a real apropriação do problema pela população (Gifford, 2011; Gifford et al., 2009; Swim et al., 2011; Uzzell, 2000). Compreender a questão das mudanças climáticas tendo como base um viés psicológico deve, necessariamente, incluir os âmbitos locais e globais, tanto nas escalas 5

individuais como sociais mais amplas (Barros, 2018).

Diferente de um problema ambiental pontual – como é o caso de furacões ou enchentes, por exemplo – as consequências das MCs assumem um caráter multifacetado, o que dificulta sua real apreensão. O distanciamento espacial e temporal entre causa e efeito é um fator que influencia diretamente nessa percepção, já que as consequências 10

costumeiramente ocorrem em espaços e tempos diferentes daqueles em que podem se dar suas causas, não havendo um encadeamento rápido e claro entre as causas e consequências (Barros & Pinheiro, 2013; Pawlik, 1991; Uzzel, 2000). Assim, a impossibilidade de uma experiência de contato direto com os efeitos das MCs se coloca como uma barreira, sendo reforçada pela inviabilidade de se poder visualizar a relação causa-efeito, uma vez que esses elementos 15

podem estar distanciados no tempo e no espaço.

Ainda relacionado à escala espacial, estudos já indicaram que há uma tendência de que as pessoas avaliem de maneira mais positiva as partes do ambiente mais próximas de si, e por isso mais concretas, do que as localidades mais distantes e abstratas (Gifford et al., 2009; Pinheiro, Cavalcanti, & Barros, 2018). Ou seja, mesmo para aqueles que reconhecem a 20

ameaça das MCs, a tendência é de que esse reconhecimento só aconteça, ou se dê de maneira mais clara, nas escalas maiores; há uma resistência em reconhecer que essa ameaça de nível global também afeta os espaços mais pessoais.

Fator determinante também na dificuldade de apreensão do problema em suas reais dimensões é o afastamento que nós, como seres humanos, adotamos na nossa relação com o 25

(39)

meio natural. Estudos indicam que a conexão com a natureza é um componente chave para a adoção de um comportamento ecológico (Mayer & Frantz, 2004) e que o apego ao lugar é essencial para o estabelecimento de um sentimento de cuidado, já que as pessoas tendem a cuidar mais de lugares pelos quais se sentem apegadas (Gifford, 2011). Entretanto, a amplitude da escala espacial envolvida na questão é um ponto de conflito, já que estamos 5

falando de uma escala global e, por isso, não concreta para a experiência humana – experienciar o quintal da casa da minha vó ou as ruas da minha universidade não é a mesma experiência que a relação estabelecida com o planeta.

Gifford (2011) traz ainda vários outros fatores que podem agir como barreiras para o engajamento da população, tais como a incerteza, a crença numa salvação pela tecnologia, a 10

negação, etc. Entre estes, destaca-se a ignorância, no sentido de falta de conhecimento, como uma questão importante: seja no sentido de não se ter ciência sobre a existência do problema, seja por não saber o que fazer em relação a ele uma vez descoberta sua existência, a ignorância é uma barreira comum quando se fala sobre as mudanças climáticas – especialmente considerando a complexidade do problema. Essa questão traz também um dado 15

social que deve ser levado em consideração: os centros mais desenvolvidos (América do Norte, Japão e Europa) apresentam um índice de consciência (awareness) sobre a existência das MCs acima de 90% da população, enquanto que para a maior parte das sociedades em desenvolvimento (tais como no Egito, Bangladesh, Nigéria e Índia), mais de 65% dos respondentes indicaram nunca terem ouvido falar sobre as mudanças climáticas (Lee et al, 20

2015).

Nessa direção, estudos já realizados em nosso grupo de pesquisa indicam que há uma dificuldade na compreensão sobre o que são as MCs, fator comum em diferentes públicos pesquisados (Barros, 2013; Cavalcanti, 2014; Cavalcanti, Pinheiro, & Barros, 2016; Farias, 2012). Os resultados destes trabalhos podem ter como disparadores tanto a complexidade do 25

(40)

fenômeno em si, como já foi discutido anteriormente, mas também levando em consideração de que há uma inclinação das pessoas se afastarem e evitarem um assunto que seja desconfortável e desafiador – especialmente se ameaça a sua noção de quem seja (Psychology for a Safe Climate, 2016)

Nesse sentido, fica evidente que a dificuldade em compreender o fenômeno das 5

mudanças climáticas vai muito além de falta de conhecimento individual ou de interesse pessoal, além de ser diretamente influenciada por fatores de ordem macrossocial. É importante considerar, nesse contexto, quais as formas de contato que a população tem (se tem) com o tema, bem como da natureza e qualidade da informação que é comunicada sobre as MCs (Moser & Dilling, 2006), além de como e para quem esta comunicação está sendo 10

direcionada. Assim, compreende-se também que a via de acesso às informações é ponto de discussão igualmente importante. Para isso, um debate aprofundado acerca do universo da comunicação se faz necessário.

(41)

4. A comunicação como construção do engajamento?

A comunicação é uma atividade essencial no nosso dia a dia: seja no nosso espaço íntimo e pessoal, seja nas interações sociais informais, seja no âmbito do trabalho. Buscando interpretar algo, passar nossos sentidos a determinado fenômeno ou objeto e entender fatos do mundo, a comunicação se faz necessária. Apesar de não ser uma capacidade unicamente 5

humana (afinal outros animais também se comunicam), o ato de comunicar é um dos fatores primordiais que estão na base da nossa socialização e que detém um papel importante na nossa constituição. De acordo com Minini (2008), “dada sua natureza social, é impossível ao homem não comunicar”.

O presente capítulo pretende explorar a noção de comunicação, no que se refere à sua 10

conceituação e teorias que dão bases para melhor compreender esse processo, tanto de forma geral como dialogando com a psicologia. Será adotado também um recorte no que se refere à comunicação voltada para as questões ambientais, especialmente nos moldes de atuação de ONGs ambientalistas.

15

4.1. Criando raízes: das teorias de base ao diálogo com a(s) Psicologia(s)

Para que seja possível discutir sobre comunicação e explorar seu impacto em diferentes contextos, é preciso antes refletir: a que estou me referindo quando falo em comunicação? Dentro de seu próprio campo de estudo, se reconhece que tentar responder a esta questão pode ser uma tarefa complexa e até embaraçosa, já que dá a falsa impressão de 20

simplicidade por ser um conceito tão banal no nosso cotidiano, mas que na verdade traz um grande desacordo entre os especialistas. Apesar de árdua tarefa para os estudiosos da área de comunicação, não me proponho a explorar a fundo as teorias da comunicação, seu histórico ou diferentes escolas. Me detenho aqui a traçar os contornos que me permitam (e às leitoras e

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