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Das sugestões à ação: modelos reais de comunicação climática

7. Resultados e Discussão

7.4. Por onde seguir?

7.4.8. Das sugestões à ação: modelos reais de comunicação climática

As propostas de caminhos possíveis apresentadas até agora para alcançar uma 10

comunicação climática efetiva vieram de diferentes disparadores que se fizeram presentes durante as entrevistas. Ao responderem a estes disparadores, os entrevistados pensavam em suas experiências, suas motivações, as formas de atuação das suas ONGs e as pautas que defendiam, mirando um cenário de comunicação ideal – em um certo “plano das ideias”. Entretanto, os participantes foram provocados também a sair deste campo das ideias e partir 15

para um pensamento pragmático, baseados em experiências práticas.

Como apresentado no capítulo de Método, fez parte deste estudo um momento no qual solicitei aos participantes que me indicassem peças comunicacionais que eles considerassem como um “modelo ideal” de uma boa comunicação sobre MCs. Os participantes tinham liberdade em escolher o formato desta peça e poderiam me indicar mais de um material, se 20

assim achassem pertinente. Também foi aberta a possibilidade para que as peças indicadas pudessem ser resultado de seus trabalhos ou de suas ONGs, ou que fossem fruto da atuação de outras organizações, grupos, instituições ou indivíduos. Nesse sentido, outras ONGs que não fizeram parte do escopo das organizações participantes poderiam ter seus trabalhos indicados e, assim, analisados.

Das onze entrevistas realizadas, 20 materiais retornaram dos entrevistados como exemplos de uma comunicação climática eficaz. Por terem escolha livre quanto às indicações, o conjunto de materiais se caracterizou por uma diversidade de formatos, sendo eles: campanhas (7), artigos jornalísticos/ reportagens (4), vídeos (4), ações de rua (2), filmes (2) e imagem conceito (1). Um sumário destes materiais pode ser encontrado no Apêndice C. 5

Uma análise inicial importante destes materiais diz respeito ao tema central a que se dedicavam: dos 20 materiais, treze deles não falavam diretamente ou tinham como foco central o tema das mudanças climáticas. Nestes, o direcionamento central variou entre os temas de mobilidade e transporte, sustentabilidade, desigualdade social, gênero, combustíveis fósseis/ fontes renováveis de energia e acesso à água. Entretanto, não ter as MCs como tema 10

central dos materiais não implica dizer que as indicações fugiram ao que foi solicitado por mim; na verdade, todas tocavam na questão de alguma forma, se conectando com as MCs a partir de suas diferentes facetas. Para exemplificar esta noção, uma das campanhas intitulada “Mais Ônibus, Menos Diesel” tinha como foco a transição energética para uma matriz de combustível mais limpo no que se refere ao transporte público (mais especificamente às frotas 15

de ônibus). Ainda tendo como foco a questão dos combustíveis fósseis, o documentário Disobedience (traduzido no Brasil como Desobediência Civil) se dedica a registrar e discutir movimentos de resistência comunitária em quatro países que vivenciam os impactos da exploração de combustíveis fósseis em seus territórios. Ainda, a intervenção “Mulheres Tapajônicas” lança luz aos movimentos de resistência protagonizado por mulheres dos povos 20

do Rio Tapajós, em suas vivências cotidianas em meio aos grandes projetos de infraestrutura e ao extrativismo em larga escala.

Essa variedade de temas traz um importante diálogo com a proposta de construir pontes concretas, pegando carona em diferentes temas que se articulam com as MCs, desta forma promovendo discussões e impulsionando ações de enfrentamento que tragam 25

benefícios colaterais. Somando-se a isso, é ampliado o escopo de espaços em que a questão climática se insere, aumentando também o contato com diferentes públicos e setores. A articulação das MCs com esta variedade de temas condiz com a importância indicada pela literatura de comunicar a questão de forma que ecoe com demandas já existentes para a população, com seus valores e suas crenças (CRED, 2009; Moser & Dilling, 2004).

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Dos materiais indicados, dois deles foram textos jornalísticos que falavam diretamente sobre as falhas na comunicação de questões ambientais, quais pontos deveriam ser melhorados ou potencializados e quais formatos deveriam ser adotados (itens 2.1 e 2.2 do Apêndice C).

Saindo dos debates teóricos e pensando nas ações práticas, se fez presente também 10

durante as conversas com os entrevistados a necessidade de indicar uma peça que tivesse a capacidade de ser compreendida por uma grande variedade de públicos ou que pudesse ressoar para os grupos para os quais foram incialmente moldados, tanto no que se refere à linguagem utilizada quanto ao formato. Esta questão se apresentou também como justificativa dos participantes ao fazerem suas indicações. Nesse sentido, a ação da rua que utilizava o 15

balão gigante da 350.org (material 4.2, do Apêndice C) foi indicada por sua capacidade de chamar a atenção de diversos públicos: desde a população em geral que pudesse se deparar com a ação ao caminhar pelas ruas, até os representantes de espaços políticos e tomadores de decisão que tivessem seus espaços comuns de trabalho ocupados por essa atuação. Já no que se refere à capacidade de dialogar com públicos específicos, os materiais relacionados à 20

campanha #ClimaMuitoLoko (1.1) e à cobertura intitulada “Quicando na Conferência dos Jovens” (3.3), se apresentam como bons retratos desta proposta, ao adequarem sua linguagem, formato e meio de divulgação.

No conjunto dos materiais, foram indicados também dois filmes: Uma verdade inconveniente (5.1) e Avatar (5.2). Apesar de terem em comum o formato, a justificativa 25

atrelada às suas indicações divergiu. No que se refere ao primeiro, o filme foi indicado pelo impacto e repercussão que teve no contexto de seu lançamento, sendo ressaltada a capacidade que teve de marcar presença em debates de diferentes naturezas e públicos, repercutindo nas mídias e sendo hoje reconhecido como um marco nas discussões sobre MCs. Já o segundo, Avatar, teve sua indicação fundamentada principalmente no que se refere à linguagem 5

utilizada. Apesar de ser um dos materiais que não aborda diretamente ou tem como foco central a pauta climática, o filme dialoga com aspectos trazidos nas entrevistas, especialmente no que se refere à linguagem utilizada: a narrativa fantástica do filme consegue abarcar e se aprofundar em aspectos referentes à sustentabilidade e a relação dos seres com seu ambiente, transmitindo sua mensagem de uma forma facilmente apreendida por quem o assiste. Ambas 10

coincidem no que se refere a serem percebidas como estratégias eficazes de apresentar informações sem difícil acesso ou interpretação do público. Considerando o conjunto dos materiais em formatos de vídeo, tanto no formato de filme como documentários ou reportagens trazidos, reforça-se a noção da linguagem audiovisual como uma estratégia potencialmente eficaz na comunicação das MCs (Miranda, 2017).

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Esses modelos apresentam casos de sucesso (à vista dos participantes) no que se refere a um planejamento da comunicação climática que tenha sido feito pautado na noção de moldar a comunicação visando seus objetivos e seu(s) público(s). Reafirma-se, na prática, a discussão trazida pela teoria de que o planejamento da comunicação deve levar em conta os modelos mentais do público, sendo importante que se pensem estratégias para que o conteúdo 20

possa ser acomodado pelo modelo e que as mensagens transmitidas sejam claras, amplas e suficientemente fortes para que possam ser internalizadas de forma mais eficiente (CRED, 2009; Moser, 2010).

Uma visão geral dos materiais indicados demonstra, assim, como foi discutido nas seções anteriores deste capítulo, que as estratégias não possuem a capacidade de se mostrarem 25

eficazes de formas isoladas e de superar o desafio climático por si só; não há, então, uma resposta única, ou uma abordagem de formato único que solucione tudo (one-size-fits-all) (CRED, 2009). A associação das estratégias para contornar os desafios impostos pelas MCs demonstram assim que não há uma saída que possa dar conta de toda a complexidade e todos os obstáculos envolvidos na comunicação climática. O que acontece na prática é uma 5

combinação destas estratégias entre si (e possivelmente de outras que não foram trazidas pelos participantes, mas que existem na prática), no sentido de somarem forças e lidarem com os vários desafios implicados na comunicação das MCs, que se manifestam de diferentes formas, a depender do contexto. Dessa forma, a comunicação carrega um potencial de “deixar uma marca em mais de um lugar no cérebro” (CRED, 2009, p. 21).

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A combinação de estratégias e formatos diferentes contribui para que as mensagens formuladas na comunicação climática possam deixar repercutir na audiência por diferentes gêneros: pelo viés da informação, da emoção, do despertar para a ação, dos comprometimentos políticos e econômicos. Ao direcionar o olhar para práticas concretas de comunicação climática, percebe-se que faz parte da tarefa cercar o tema das MCs partindo de 15

diferentes lugares de fala que se complementam.