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4. A LEI GERAL DA COPA E SEUS IMPACTOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO E

4.2. A Lei Geral da Copa e o ordenamento jurídico brasileiro

4.2.2. Disposições sobre direito público contidas na Lei Geral da Copa

4.2.2.2. A concessão dos vistos de entrada e das permissões de trabalho

O Brasil, ao se candidatar a país-sede do mundial de 2014, assumiu com a FIFA diversas garantias internacionais que, após passarem pelo devido processo legislativo, foram normatizadas na Lei nº 12.663/2012. Na Garantia nº 01, que tratou dos vistos de entrada e de saída, assinada pelo Ministro de Relações Exteriores, cujo texto integral se encontra contido no Anexo B do presente trabalho, o Estado Brasileiro se comprometeu a

[...] desenvolver uma estratégia para a implementação dos objetivos da FIFA em relação ao processamento expresso de indivíduos da Delegação da FIFA ingressando no Brasil, incluindo objetivos relacionados à provisão de hierarquias e de tratamento

apropriadas para membros sênior da Delegação da FIFA. (BRASIL, 2007).

Tal fato comprova a influência da poderosa organização internacional nas instituições brasileiras, com mais um impactos na soberania do Brasil, país que chega ao limite de, para atender aos objetivos da FIFA, modificar até mesmo os critérios seletivos de entrada de estrangeiros no território nacional e a conferir especiais formas de tratamento a determinados membros da delegação da FIFA, como se fossem chefes de Estado, de Governo ou representantes diplomáticos que justificassem esse diferenciado tratamento.

113 Segundo o Plano de Segurança para a Copa das Confederações FIFA 2013 em Fortaleza, 42 órgãos municipais,

estaduais e federais foi mobilizado nos dias de Competições na cidade-sede de Fortaleza. As Polícias Civil, Militar, Federal, Rodoviária Federal, Coordenadoria de Inteligência (COIN), Guarda Municipal de Fortaleza, Corpo de Bombeiros Militar, AMC, Agência Brasileira de Inteligência (Abin), além do Exército, Marinha e Aeronáutica foram utilizados no entorno do estádio Arena Castelão e da área de recreação FIFA Fan Fest montada na Praia de Iracema. Ao todo, mais de 8.000 (oito mil) agentes participaram da operação. SEGURANÇA para a Copa vai mobilizar oito mil agentes. Diário do Nordeste, Fortaleza, 05 de maio de 2013. Disponível em: <http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp? codigo=1269527>. Acesso em: 08 de novembro de 2013.

Assim, foram privilegiados, no sentido da obtenção de forma facilitada de vistos de entrada e de permissões de trabalho, determinados indivíduos que para tanto somente dispunham de ingressos para os jogos de futebol FIFA, em detrimento de inúmeras pessoas residentes em diversos países que, apesar de objetivarem vir ao Brasil em busca de melhores empregos e oportunidades de vida, muitas vezes, têm seus requerimentos de vistos negados diante de inúmeras exigências que lhes são impostas pelas autoridades diplomáticas brasileiras.

Dessa forma, os compromissos firmados pelo governo brasileiro com a FIFA foram normatizados com a edição da Lei nº 12.663/2012, que também estabeleceu especiais regras sobre a emissão de requisitos para a concessão de vistos de entrada (art. 19) e permissões de trabalho (art. 20) no território nacional.

Com as inovações trazidas pelo artigo 19 da Lei Geral da Copa, a concessão de vistos passou a ter que ser realizada “sem qualquer restrição” para membros das delegações da FIFA (I), de funcionários das Confederações FIFA (II), funcionários de associações estrangeiras ligadas à FIFA (III), árbitros e profissionais esportivos (IV), membros das delegações das seleções participantes nos torneios (V), parceiros comerciais da FIFA, (VI), equipes da emissora fonte da FIFA, de emissoras e agências de direitos de transmissão (VII), prestadores de serviço à FIFA (VIII), clientes de serviços comerciais da FIFA (IX), representantes da imprensa (X) e a espectadores munidos de ingressos (XI).

Excetuando-se apenas os espectadores dos eventos, o artigo 20 determinou a emissão de permissões de trabalho para os grupos de pessoas retro mencionados, para tanto somente sendo exigidos um documento expedido pela FIFA (ou por terceiro por ela indicado), e que o trabalho a ser realizado fosse ligado aos eventos organizados pela entidade no Brasil.

As modificações nos procedimentos de emissão de vistos de trabalho, que aconteceram de acordo com as determinações anteriormente impostas pela FIFA como requisito para a realização no Brasil de seus principais eventos esportivos, foram prontamente realizadas pelo governo brasileiro, que firmou os compromissos determinados na Garantia nº 2, conforme analisamos no Capítulo anterior do presente trabalho.

Em seu artigo 20, §4º, a Lei Geral da Copa estabelece como documentos válidos para a obtenção de visto de entrada ou para o ingresso no território brasileiro apenas um passaporte válido ou documento a ele equivalente, e qualquer outro documento que pudesse comprovar a vinculação do titular com a Copa do Mundo FIFA ou com a Copa das Confederações FIFA.

No entanto, a título de exemplo, a Embaixada do Brasil em Luanda, capital da República de Angola, exige atualmente para a obtenção de um visto comum como o de turista, a apresentação de uma série de documentos, pagamentos de taxas e até uma entrevista no Consulado brasileiro114, algo bem diferente do que se exige para os turistas-espectadores da Copa

do Mundo FIFA 2014 e Copa das Confederações FIFA 2013, de quem somente se requer a apresentação do passaporte e de um ingresso da competição. Com o exemplo, percebemos que a dispensa de diversos requisitos feitos para a obtenção de vistos brasileiros, passando a ser suficiente um passaporte válido e o ticket de um jogo de futebol, revela mais um impacto da Copa do Mundo FIFA na soberania brasileira, impactando até mesmo nos procedimentos adotados por uma organização tão respeitada mundialmente como o Itamaraty.

Por sua vez, artigo 20, §6º da lei em comento, dispõe que a concessão de vistos de entrada, quando concedidos no exterior, pelas autoridades diplomáticas brasileiras, devem ter caráter prioritário na sua emissão. O artigo 21, também reforçando essa prioridade na concessão dos vistos e das permissões de trabalho relacionados aos eventos FIFA realizados no Brasil, determina que a emissão de tais documentos deve ocorrer sem quaisquer tipos de custos para os requerentes, o que revela o tratamento anti-isonômico conferido entre os estrangeiros-FIFA e os estrangeiros não-FIFA pelo governo brasileiro, em mais uma interferência do megaevento de 2014 nas instituições brasileiras.

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