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CAPÍTULO 2 DIREITOS HUMANOS

3.2 A PROTEÇÃO REGIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

3.2.1 O Sistema Regional Europeu

3.2.1.2 A Convenção Europeia dos Direitos do Homem de 1950

A Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais foi elaborada no âmbito do Conselho da Europa. Aberta a assinaturas em 4 de novembro de 1950, em Roma, veio a entrar em vigor apenas em setembro de 1953.

Valoriza-se o fato de que fora essa Convenção o primeiro tratado, propriamente dito, de direitos humanos, uma vez que a Declaração Universal de Direitos do Homem e do Cidadão, da ONU, de 1948, não contava com a coercitividade e obrigatoriedade próprias de um tratado, sendo ela, apenas, uma declaração sobre os direitos humanos.

233HART, James W. The European Human Rights System, p.538.

234HUMAN RIGHTS EDUCATION ASSOCIATES. Disponível em: <http://www.hrea.org/index.

A Convenção veio a consagrar uma série de direitos e liberdades civis e políticas e, também, um sistema que visava garantir o respeito das obrigações assumidas pelos Estados contratantes, por intermédio de três instituições: a Comissão Europeia dos Direitos do Homem (criada em 1954), o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (instituído em 1959) e o Comitê de Ministros do Conselho da Europa.

Em seu preâmbulo, previa-se, claramente, que seu objetivo na região repousava em dar "os primeiros passos para a garantia coletiva de certo número de direitos enunciados na Declaração Universal".

Esquematicamente, a primeira seção da Convenção versa sobre os direitos humanos individuais e sobre as liberdades fundamentais que devem ser protegidas, impedindo que os governos oprimam seus povos235. Na sequência, previu-se a

possibilidade de recurso individual de queixas contra os Estados, por violação dos direitos garantidos pela Convenção, à Comissão.

Nesse sentido, a estrutura jurisdicional prevista na Convenção, ao longo dos tempos, teve duas significativas mudanças desde sua criação.236

Em um primeiro momento, entres os anos de 1953 a 1998, a Comissão, prevista pela Convenção como obrigatória a todos os seus Estados contratantes, poderia receber queixas de quaisquer pessoas, organizações não-governamentais ou grupos de indivíduos, de acordo com o art. 25 da Convenção. Este contexto trouxe uma grande inovação ao sistema internacional, uma vez que, até o final da Segunda Guerra Mundial, o direito internacional não restringia o modo que um Estado soberano poderia tratar seus cidadãos.237

Ainda de acordo com o art. 25 da Convenção, cada um de seus Estados membros teria que redigir uma declaração de concordância com o sistema previsto no referido diploma legal.

235No que tange aos direitos civis e às liberdades fundamentais, a Convenção Europeia prevê:

direito à vida; proibição da tortura e tratamento desumano ou degradante; liberdade da escravidão ou servidão; direito à liberdade e à segurança; direito ao respeito à vida familiar e privada; liberdade de pensamento, consciência e religião; liberdade de expressão; direito à educação; liberdade da prisão por dívida; abolição da pena capital em tempos de paz; direito ao devido processo legal quando da expulsão do estrangeiro; igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.

236HART, James W. The European Human Rights System, p.539. 237Id.

Segundo o referido sistema de queixas à Comissão, determinados requisitos, previstos no art. 27 da Convenção, deveriam ser preenchidos e, em concordância com o art. 35, as queixas seriam inadmissíveis quando: fossem anônimas; os assuntos já tivessem sido examinados pela Comissão ou por outra corte ou, ainda, por outra organização internacional; temas que não tivessem esgotados todos os recursos internos e que teriam sido arquivados por seis meses após a última decisão em instituições nacionais; fossem incompatíveis com a extensão da Convenção.

Caso a queixa fosse admitida pela Comissão, ocorreria tentativas de conciliação e, restando infrutíferas, o referido órgão redigiria um relatório que seria encaminhado ao Conselho de Ministros. Se o Estado aceitasse a jurisdição obrigatória do Tribunal Europeu, a Comissão e/ou qualquer outro Estado contratante, dispunha de três meses, a contar da transmissão do relatório ao Comitê de Ministros, para o envio do caso ao Tribunal. Cabe ressaltar que, nesse momento, os particulares não poderiam solicitar, diretamente, a intervenção do Tribunal na questão.

Se a situação não fosse levada ao conhecimento do Tribunal, a incumbência de decidir se existia ou não uma violação da Convenção era do próprio Comitê de Ministros, cujo qual era igualmente responsável pela vigilância da execução dos acórdãos do Tribunal.

Com o passar dos tempos, a Convenção viu-se na necessidade de mudar, especialmente por conta do aumento imenso do número de queixas individuais e pela demora na sua solução. A referida situação foi resultado da mudança cultural da Comissão e da dissolução da União Soviética

Nesse cenário, vários Protocolos vieram entrar em vigor, sendo necessária uma atenção especial do Protocolo n.o 11, de primeiro de novembro de 1998. Permanecendo

em vigor até primeiro de julho de 2010 (data em que o Protocolo n.o 14 entrou em

vigor), o referido documento previu algumas mudanças: o fim da Comissão; transformou o Tribunal Europeu de Direitos Humanos permanente; proporcionou ao Tribunal a responsabilidade de propor conciliações; aboliu a possibilidade do Comitê de Ministros julgar casos individuais; tornou a decisão da Corte como decisão final nos casos à ela apresentados; reestruturou a Corte entre comitês e câmaras, incluindo uma câmara superior; e estabeleceu um sistema de registros para a Corte.238

Valoriza-se que, nesse momento, ocorrera, no sistema europeu, uma alteração jamais vista nos sistemas de proteção dos direitos humanos: a possibilidade do próprio indivíduo reclamar, em uma corte internacional de direitos humanos, seus direitos violados pelo Estado.

Após, no ano de 2010, a entrada em vigor do Protocolo n.o 14 objetivou

trazer soluções ao fato da apresentação de um número estrondoso de casos à Corte. Em números, o seu relatório anual de 2003 estimou que 27.281 casos foram admitidos, 16.724 inadmitidos e 548 casos foram levados ao julgamento de mérito naquele ano.

Por conta dessa situação caótica, o Protocolo n.o 14 previu algumas situações para que se realizasse um crivo ao caso, anteriormente à demanda na Corte. Ocorre que, até hoje, o Protocolo não fora satisfatoriamente implementado e, por conta de tal situação, um dos principais desafios do sistema de proteção dos direitos humanos europeu é lidar com o irrestrito acesso e o consequente elevado número de petições em seu sistema que faz com que, muitas vezes, direitos humanos realmente violados não sejam reparados em tempo hábil.

De tal forma, nesse ponto, tendo em vista toda a evolução do poder jurisdicional referente aos direitos humanos na Europa, valem ser feitas algumas considerações acerca do Tribunal Europeu de Direitos Humanos.