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A DOUTRINA NACIONAL NO CÓDIGO CIVIL DE 1916.

No documento O abuso e o novo direito civil brasileiro (páginas 38-42)

A aceitação do abuso é a regra, em nossa doutrina, que geralmente o via no art. 160, I, interpretado "a contrario sensu". Não constituindo atos ilícitos "os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido", o exercício irregular configuraria o abuso – cuja natureza, então, só poderia ser a de ato ilícito, como terminou por prever o Código Civil atual.

RUBENS LIMONGI FRANÇA32 o vê no artigo citado e também, de modo

implícito, no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, ao estabelecer que "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige". Do mesmo sentir

é SÍLVIO RODRIGUES33, que enfatiza a necessidade de exercício de direitos de

acordo com sua finalidade social, já que, citando JOSSERAND, "os direitos são conferidos ao homem para serem usados de uma forma que se acomode ao interesse coletivo, obedecendo à sua finalidade, segundo o espírito da instituição".

PONTES DE MIRANDA aponta o abuso igualmente no art. 160, I, do Código Civil de 1916, afirmando ainda que a prova da regularidade do ato cabe a quem o pratica, ao contrário do direito alemão: "A regra jurídica brasileira impõe-se ao intérprete como regra jurídica pré-excludente: se há dano, o que exercia direito comete ato ilícito, salvo se "regularmente" o exercia, donde o ônus da prova, no direito brasileiro, ir ao culpado do dano, e não ao que sofreu, pois a esse momento incumbe

32

Revista do Advogado nº 19, p. 43, São Paulo.

33

provar o dano e a culpa, apontando a contrariedade a direito". E mais: "O que alega ter sido o ato praticado no exercício regular de direito é que tem de provar esse exercício e essa regularidade. É exatamente o contrário do que ocorre no direito alemão: nesse, o que prova ter exercido direito, causando dano (ao lesado prová-lo, como em direito brasileiro), não precisa provar que tal exercício foi regular”. 34

Pede-se vênia de aproveitamento de pesquisa utilizada em artigo nosso

contido em RT 667/47 35, no qual identificados autores nacionais clássicos que

trataram da matéria sob diferentes matizes, sob o Código Civil revogado:

“Washington de Barros Monteiro e Carvalho Santos admitem o abuso de direito apenas quando haja a intenção maléfica do autor do ato danoso. Exigem a emulação para caracterização do ato como abusivo, filiando-se pois à teoria subjetiva”.

“Clóvis Beviláqua entende que a lei brasileira acolheu a doutrina de Saleilles, do abuso de direito como exercício anormal de um direito, não se indagando, pois, do elemento subjetivo. Filia-se à teoria objetiva e cita o reconhecimento do abuso, na lei civil, nos arts. 160, I, e 100 do Código Civil”.

“Everardo da Cunha Luna, em sua monografia sobre a matéria, só admite o abuso de direito quando derivado de culpa ou dolo. Embora seja mais flexível do que aqueles que exigem sempre a intenção dolosa, não se filia também à teoria objetiva de conteúdo social e econômico”.

“Pedro Baptista Martins, igualmente em monografia sobre a matéria, demonstra tendência em aceitar o critério econômico de Brèthe, filiando-se, pois à teoria objetiva, posto que abusivo todo ato que contrarie os fins econômicos e sociais do direito”.

34

"Tratado de Direito Privado", vol. 2, § 185, p. 291.

35

“Para Adroaldo Leão, e conforme a definição de Josserand, abuso do direito é a relação de contrariedade entre a conduta do homem e o fim pretendido pela ordem jurídica; filia-se à teoria objetiva”.

“Também Sílvio Rodrigues filia-se à teoria objetiva, em aceitação ao critério finalista defendido por Josserand, argumentando que a lei brasileira admitiu o abuso de direito no art. 5º da LICC”.

“Haroldo Valladão, embora condene o abuso de direito, defende que seu reconhecimento atual é de lege ferenda, pois não o reconhece no inc. I do art. 160 do Código Civil e não analisa o cabimento em face do art.5º da LICC; propõe mudanças para que seja coibido o exercício anti-social, egoísta ou excessivo do direito”.

“Por fim, o mestre Carlos Alberto Bittar, após frisar tratar-se de matéria muito discutida entre nós, filia-se à teoria objetiva, segundo o critério finalista, defendendo a configuração do abuso pelo excesso, no exercício de direito, aos limites impostos pelos fins econômicos ou sociais, pela boa-fé ou pelos bons costumes, consoante a redação do art. 185 do projeto de Código Civil. Afirma a aplicação da teoria jurisprudencialmente, em que pese à dissensão doutrinária existente”.

“Ainda professando a teoria finalista podem ser citados Eduardo Espínola e José Olímpio de Castro Filho, este em obra clássica sobre o abuso do direito processual (Abuso do direito no Processo Civil, Rio, Forense, 1960, p.21), além de Alvino Lima, que destaca a necessidade de atendimento aos princípios superiores da moral, vencendo os limites imprecisos e incompletos da norma positiva”.

Nosso posicionamento doutrinário sobre o abuso, à época (1990), não mudou, substancialmente, ao que será aqui defendido.

Dizíamos:

“Como se constata, a maior parte de nossa doutrina admite, implícita ou explicitamente, o reconhecimento do abuso de direito no ordenamento jurídico. Variam, porém, e grandemente, os critérios de aceitação da teoria, alguns baseando-se nos critérios de ordem subjetiva, outros defendendo os critérios teleológicos da norma jurídica. Como exposto, filiamo-nos a estes últimos, por considerarmos que o abuso de direito se configura na ocorrência de um dano,

objetivamente injusto, decorrente de um ato praticado am contrariedade às finalidades sociais da norma jurídica”.

Como percebido, à época dizíamos “abuso de direito”, mas, nosso convencimento atual é o de que o abuso se dá no exercício do direito. Exercício excessivo e anti-finalístico do direito. “Abuso do direito”, portanto, é a expressão utilizada no presente trabalho.

10. ASPECTOS HISTÓRICOS DO ABUSO EM

No documento O abuso e o novo direito civil brasileiro (páginas 38-42)