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A educação ambiental e as ecologias do saber

3 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO UM PARADIGMA EMERGENTE DA

3.3 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SUAS RELAÇÕES COM AS ECOLOGIAS

3.3.2 A educação ambiental e as ecologias do saber

Após estudar a teoria das monoculturas que produzem as denominadas ausências, o objetivo do estudo a ser desenvolvido neste subtítulo da tese está

familiar. De um total de 65,7 mil explorações familiares, 82,6% declararam renda: média anual de R$ 22 mil, ou R$ 1.836,54 mensais”. “[...] A certificação, que é a apuração refere-se a produtores por organismos de controle social ou avaliados segundo os critérios de conformidade, com os sem certificado. Os pequenos agricultores que vendem em feiras orgânicas em uma relação direta com consumidores dispensam certificado. A certificação direta, que consiste em auditoria da lavoura e concessão do Selo Brasil Orgânico para identificação dos produtos é feita por pelo menos oito empresas acreditadas pelo Inmetro e cadastradas no Mapa”. Importa ressaltar que o setor de produção e consumo de alimentos orgânicos é uma realidade que vem crescendo significativamente nos últimos anos no Brasil. Mas, ainda precisa de uma ampla política governamental de apoio a produção e consumo, que é a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), para que o setor possa crescer ainda mais e popularizar o consumo a medida que a produção cresce.

189A Lei nº 10.831 de 2003 regulamenta o sistema orgânico de produção. Seu artigo 1º “Considera

sistema orgânico de produção agropecuária todo aquele em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo por objetivo a sua sustentabilidade econômica e ecológica, a maximização dos benefícios sociais, a minimização da dependência de energia não renovável, empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes, em qualquer fase do processo de produção, processamento, armazenagem, distribuição e comercialização, e a proteção do meio ambiente” (COLEÇÃO, 2013, p. 660).

relacionado aos mecanismos de enfrentamento destas ausências, através da substituição das monoculturas pelas ecologias do saber. Por esta razão, tudo aquilo que está ausente, de acordo Sousa Santos (2011, p. 32), “[...] esteja presente, que as experiências que já existem, mas são invisíveis e não críveis estejam disponíveis; ou seja, transformar os objetos ausentes em objetos presentes, [...] mediante uma sociologia insurgente”.

Para o autor mencionado (2011, p. 28), boa parte daquilo que é construído pelas experiências locais e as suas diversidades culturais “[...] é produzido ativamente como não existente e, por isso, a armadilha maior para nós é reduzir a realidade ao que existe. Assim, de imediato compartimos essa racionalidade preguiçosa, que realmente produz como ausente muita realidade que poderia estar presente” por uma sociologia insurgente.

Neste viés, o papel a ser exercido pela Sociologia Insurgente, de acordo com o pensamento de Sousa Santos (2011, p. 32), é “[...] substituir as monoculturas pelas ecologias, e o que lhes proponho são cinco ecologias, em que podemos inverter essa situação e criar a possibilidade de que essas experiências se tornem presentes”. Sendo assim, as cinco ecologias propostas pelo autor são: a ecologia dos saberes, a ecologia das temporalidades, a ecologia do reconhecimento, a ecologia da transescala e a ecologia das produtividades, assunto que será abordado a seguir.

Então, a primeira ecologia a ser tratada neste estudo é a ecologia dos saberes. Segundo Sousa Santos (2011, p. 32), “[...] não se trata de „descredibilizar‟ as ciências nem de um fundamentalismo essencialista „anticiência‟, pois não é um papel a ser exercido pelos cientistas de um modo em geral”. O que o autor propõe é uma forma de uso,

[...] contra-hegemônico da ciência hegemônica. Ou seja, a possibilidade de que a ciência entre, não como monocultura, mas como parte de uma sociologia mais ampla de saberes, em que o saber científico possa dialogar com um saber laico, como um saber popular, como um saber dos indígenas, com o saber das populações urbanas marginais, com o saber camponês (SOUSA SANTOS, 2011, pp. 32-33).

Esta ecologia desafia o agricultor a utilizar uma forma alternativa de adubação dos solos destinados às suas plantações, ao invés de adotar somente a adubação com base em fertilizantes solúveis produzidos por meio de fórmulas laboratoriais.

Para desenvolver uma adubação que preserve a flora e a fauna natural dos solos e, ao mesmo tempo, manter o equilíbrio natural dos solos agrícolas, ele poderá adotar uma adubação orgânica que pode ser elaborada com materiais oriundos da própria propriedade, sem custos de patenteamento e de fabricação, pois são adubos fornecidos pela própria natureza. Na afirmativa de Pinheiro (1985, p. 47), “São várias as formas básicas de adubação orgânica que normalmente utilizadas: é o composto orgânico, os biofertilizantes, o adubo verde e o chorume”.

No entanto, o autor (1985) alerta para o caso da utilização dos adubos minerais a base de fertilizantes solúveis. Essa forma de adubação pode ser apenas para complementar a adubação orgânica, pois do contrário, poderá prejudicar o desenvolvimento da flora e da fauna microbiana do solo. Sempre que possível deve- se evitar a adubação mineral em alta escala à base de nitrogênio, pois ele pode ser fornecido pela matéria orgânica oriunda dos compostos orgânicos190, dos biofertilizantes, do adubo verde incorporado ao solo e do chorume de animais.

Com essa prática, alia-se uma forma de adubação alternativa produzida na propriedade, mas com uma complementação de adubação mineral cuidadosamente dosada, para não desequilibrar o ambiente natural do solo agrícola. Com isso, pode- se desafiar a tecnologia hegemônica da fabricação dos fertilizantes solúveis com a tecnologia advinda das horizontalidades191 da adubação orgânica, não no sentido de extinguir a primeira, mas contrabalançar seus domínios absolutos com a segunda.

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A adubação orgânica é uma tecnologia de adubação que leva em consideração um saber popular já adotado pelos pequenos agricultores, especialmente os familiares, desde o tempo em que os escravos organizavam suas pequenas lavouras de subsistência e as pequenas lavouras dos primeiros agricultores familiares advindos da imigração para o Brasil.

191No pensamento de Santos (2010, pp. 160-111) “É muito difundido a ideia segundo a qual o

processo e as formas atuais da globalização seriam irreversíveis, Isso também tem a ver com a força com a qual o fenômeno se revela e instala em todos os lugares e em todas as esferas da vida, levando a pensar que não há alternativas para o presente estado de coisas. [...] No entanto, um mundo verdadeiro se definirá a partir da lista completa de possibilidades presentes em certa data e que incluem não só o que já existe sobre a face da Terra, como também o que ainda não existe, mas é empiricamente factível. Tais possibilidades, ainda não realizadas, já estão presentes como tendência ou como promessa de realização. [...] Por isso, é lícito dizer que o futuro são muitos; e resultarão de arranjos diferentes, segundo nosso grau de consciência, entre o reino das possibilidades e o reino da vontade. É assim que iniciativas serão articuladas e obstáculos serão superados, permitindo contrariar a força das estruturas dominantes, sejam elas presentes ou herdadas. A identificação das etapas e os ajustamentos a empreender durante o caminho dependerão da necessária clareza do projeto. [...] As horizontalidades, pois, além das racionalidades típicas das verticalidades que as atravessam, admitem a presença de outras racionalidades (chamadas de irracionalidades pelos que desejariam ver como única a racionalidade hegemônica). [...] Na verdade, são contrarracionalidades, isto é, formas de convivência e de regulação criadas a partir do próprio território e que se mantém nesse território a despeito da vontade de unificação e homogeinização, características da racionalidade hegemônica típicas das verticalidades”.

Outra prática a ser adotada pelo agricultor é a rotação de culturas na sua propriedade. De acordo com Pinheiro (1985, p. 49), “Esta prática consiste no cultivo de diferentes grupos de plantas192 sobre uma mesma área alternadamente. Como consequência, têm-se a melhora da fertilidade do solo e o controle da erosão, de pragas e de inços”. Exemplo disso é política da integração lavoura-pecuária-floresta regulamentada pela Lei nº 12.805 de 2013193.

Tanto a adubação orgânica quanto a rotação de culturas194 se constituem em duas ecologias do saber que resgatam uma forma ecológica de adubação e de cultivos adotadas desde a realização das pequenas lavouras de subsistência dos escravos e dos primeiros imigrantes vindos ao Brasil e que, de maneira geral, ainda são utilizadas nos dias atuais, principalmente em propriedades da agricultura familiar.

A segunda ecologia é a ecologia das temporalidades. De acordo com Sousa Santos (2011), esta ecologia estabelece que se, porventura, existe um tempo linear, também vão existir outros tempos que devem ser levados em consideração, como por exemplo: o tempo dos camponeses com relação às suas plantações e colheitas, o tempo que certas comunidades africanas levam em consideração quando estão reunidas em celebração aos seus antepassados195.

Sousa Santos (2011) exemplifica esta ecologia com o projeto de exploração de petróleo nas terras da tribo do u‟was da Colômbia por parte do governo. Os

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Assim, o agricultor constituirá um rodízio de diferentes culturas na sua propriedade, adotando uma forma de policultivos de acordo com a vocação agrícola das glebas que integram sua propriedade, fazendo rodízio do plantio e das criações nas diferentes glebas. A repetição do plantio da mesma cultura será após um rodízio de três a quatro anos com outras espécies. O rodízio permite uma eliminação natural de ácaros, fungos, bactérias e vírus causadores de doenças e larvas de insetos causadores de danos às plantações, bem como evita o esgotamento de certos minerais existentes no solo e necessários ao desenvolvimento das plantas (PINHEIRO, 1985).

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O artigo 1º § 2º estabelece que: “I - Integração Lavoura-Pecuária ou Agropastoril: sistema que integra os componentes agrícola e pecuário, em rotação, consórcio ou sucessão, na mesma área, em um mesmo ano agrícola ou por múltiplos anos; II - Integração Lavoura-Pecuária-Floresta os Agrossilvopastoril: sistema que integra os componentes agrícola, pecuário e florestal, em rotação, consórcio e sucessão, na mesma área; III - integração Pecuária-Floresta ou Silvopastoril: sistema que integra os componentes pecuário e florestal em consórcio; IV - integração lavoura-floresta ou Silvoagrícola: sistema que integra os componentes florestal e agrícola, pela consorciação de espécies arbóreas com cultivos agrícolas, anuais ou perenes” (COLEÇÂO, 2013, p. 461).

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Elas são práticas de adubação e de utilização do solo agrícola que se contrapõem à tecnologia hegemônica da produção agrícola das grandes monoculturas da cana de açúcar, do café e da criação do gado em grandes áreas desde o período colonial, imperial e republicano no Brasil e que ainda persistem nos dias atuais, sobretudo nas grandes propriedades brasileiras que cultivam o café, o arroz e a soja, bem como a adoção da adubação das lavouras com base em fertilizantes solúveis, sobretudo, a partir dos anos de 1950.

nativos ameaçaram suicidar-se coletivamente caso o projeto fosse desenvolvido, pois o petróleo existente nas suas terras era considerado sangue da terra. Tal episódio chamou atenção do Ministro do Meio Ambiente daquele País. Em viagem aérea até o local da tribo em Sierra Nevada, o Ministro reuniu-se com os chefes indígenas para conversar a respeito do assunto. Todos eles mantiveram-se calados durante a reunião, até que um deles manifestou-se dizendo que, antes de falar a respeito do assunto, teriam que consultar os antepassados. O ministro quis saber qual o tempo necessário e um deles lhe respondeu que dependeria da lua. A resposta eles só obteriam à noite, quando do aparecimento da lua, fato que não permitiu a permanência do Ministro em território da tribo.

Seguindo a abordagem do exemplo acima mencionado, Sousa Santos (2011) explica que no dia seguinte os jornais de Bogotá publicaram notícia afirmando que os indígenas se recusaram a conversar com o Ministro a respeito do projeto de exploração do petróleo nas suas terras. No entanto, os chefes da tribo não se omitiram ao debate. Eles respeitaram a vontade dos seus antepassados e para saber qual seria essa vontade, precisavam consultar a lua. Trata-se do respeito a uma temporalidade para, posteriormente, falar sobre a questão. Essa temporalidade não foi levada em consideração pelo representante do Governo Colombiano, pois seu tempo não permitia esperar a orientação dos antepassados da tribo196.

Por sua vez, a terceira ecologia é a do reconhecimento. No entender de Sousa Santos (2011), esta ecologia está centrada na proposta de descolonizar as mentes humanas com a finalidade de produzir algo que seja distinto da hierarquia, ou seja, daquilo que não é produto da distinção hierárquica. As diferenças devem ser aceitas somente após a eliminação das hierarquias estabelecidas. Por conseguinte, as diferenças serão aceitas como válidas somente quando serão descartadas as hierarquias, frutos das determinações hegemônicas. Trata-se de levar em consideração o princípio da igualdade e o princípio da diferença, que estão previstos no artigo 5º da Constituição Brasileira de 1988.

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Tais temporalidades não serão levadas em consideração pela ótica do pensamento produtivista ocidental, pois são imprescindíveis ao tempo de cada cultura como forma de manifestação das suas vontades.

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No entanto, o importante é que todas as culturas tenham a sua própria temporalidade e que todos os povos sejam respeitados no seu tempo e lugar de acordo com a sua cultura, suas crenças e suas relações com seus antepassados. Dessa forma, a ecologia das temporalidades se fará presente de acordo com tempo estabelecido pelas diversas culturas, e não se reduza a um único tempo linear àquele estabelecido pelo produtivismo capitalista.

A ecologia do reconhecimento fundamenta-se no princípio da igualdade e no princípio da diferença, que caracteriza cada um na sua essencialidade. Esta ecologia não se fez presente no momento da elaboração da Constituição Imperial do Brasil de 1824. Seu texto previa o princípio da igualdade entre os brasileiros e os estrangeiros na forma da lei. No entanto, a Constituição não extinguiu a mão de obra escrava realizada pelos africanos, pois os proprietários da terra, os membros da família real, os militares e os funcionários do Império eram considerados hierarquicamente superiores e diferentes dos africanos escravizados no Brasil.

O segundo fato digno de nota é a lei que atribuiu a liberdade aos escravos no Brasil. Esta norma tornou-os iguais perante todos, pois agora não são mais cativos dos grandes fazendeiros. Por um lado, juridicamente são pessoas livres e donas da sua mão de obra. Por outro, nem a Lei que estabeleceu a liberdade nem a Constituição Republicana de 1891, promulgada logo após a sua libertação, previram alguma forma de distribuição de uma fração de terras para que pudessem produzir o seu sustento. Muitas famílias permaneceram na condição de cativas nas fazendas, trabalhando apenas por uma precária alimentação197.

O terceiro fato a ser mencionado diz respeito ao acesso à propriedade da terra no Brasil. Desde a chegada dos portugueses, o acesso à propriedade da terra realizava-se pelo instituto da doação por parte da coroa portuguesa ou pelo Império brasileiro a pessoas da confiança do soberano. Assim, durante toda a fase das Sesmarias, essas pessoas receberam gratuitamente extensas áreas de terras, a começar pelas capitanias hereditárias e posteriormente pelas sesmarias.

Quando a Lei das Posses de 1822 previu a doação de pequenos lotes de terras para as famílias dos imigrantes europeus explorarem com sua mão de obra, os grandes proprietários da terra, muito influentes no Congresso Brasileiro, sentindo que estes pequenos camponeses estavam se tornando proprietários da terra e da sua produção, razão pela qual, poderiam exercer influência na economia e na política, criaram a Lei n° 601 de 1850 denominada Lei de Terras198, que extinguiu a doação da terra no Brasil.

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Percebe-se que, mesmo libertos e iguais a todos os outros cidadãos brasileiros, hierarquicamente permanecem inferiores, pois não foram considerados dignos nem no tocante à alimentação básica para a sua sobrevivência, fator pelo qual não se fez presente a ecologia do reconhecimento, mesmo após a gratuidade da mão de obra por quase quatrocentos anos em favor da iniciativa privada e da economia brasileira.

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Como essa Lei determinou que o acesso à terra fosse mediante pagamento à vista, eliminou a possibilidade dos pequenos camponeses tornarem-se proprietários de uma pequena gleba, pois eram

Outro tema produzido que não é fruto da distinção hierárquica, é o caso da desapropriação da propriedade rural que não cumpre com a sua função social para fins de projetos de assentamento de reforma agrária. Como Locke (2011) preconizou já em 1690, a extensão de terras de um homem deveria ser a dimensão necessária ao que ele poderia lavrar, plantar e cultivar e cuja produção seria de sua propriedade199.

Neste aspecto, o princípio do Federalismo e do Governo Republicano vem contribuir no que tange o direito de propriedade aliado ao cumprimento da função social. Ocorre no sentido de haver um interesse coletivo que se sobrepõe ao interesse individual sobre a propriedade da terra. Quando o interesse individual sobre a terra não atender aos interesses coletivos, estes últimos prevalecerão sobre o primeiro. Assim, numa República, a propriedade da terra não pode ser utilizada apenas como forma de acúmulo de riquezas ao proprietário. Ela precisa atender aos interesses sociais200.

Para tanto, a ideia do direito individual de propriedade da terra é garantido pelo Estado àquele proprietário que cumpre com a função social na forma da Constituição, pois do contrário a União poderá desapropriá-la por interesse social. Não é resultado da vontade expressa dos proprietários da terra. Por sua vontade, este princípio não seria elevado à condição de norma constitucional, pois ele determina uma obrigação aos donos da terra. Passa ser fruto da ecologia do reconhecimento do interesse social que se sobrepõe ao interesse individual.

A quarta ecologia é da transescala. Sousa Santos (2011, p. 36) explica que “[...] ela permite articular em nossos projetos as escalas locais, nacionais e globais”. “Neste quadro, tudo o que é local será embrionário se puder conduzir ao nacional:

famílias que não possuíam recursos financeiros para sua aquisição. Esta Lei torna-os hierarquicamente inferiores aos demais proprietários, mesmo que a Constituição de 1824 determinou que o direito a propriedade seria extensivo a todos. Passa a ser um fato produzido pela distinção hierárquica da época, depondo contra a ecologia do reconhecimento estudada atualmente.

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Não seria lícito apropriar-se daquela área de terra, acima destas condições, sem o devido consentimento dos membros da comunidade. Da mesma forma, seria lícito domesticar tantos animais quantos se pudessem cuidar. No entanto, se a quantidade de pasto cercado fosse superior à quantidade de animais, essa área seria cedida a outra pessoa a fim de utilizá-la para pastoreio dos seus animais. Ressalta-se que o direito sobre a terra e as pastagens era reconhecido pelos membros da comunidade na quantidade relativa à capacidade de utilização e necessidade de cada um. Áreas superiores à capacidade de cultivar e de criar animais eram consideradas de interesse comum de todos e poderiam ser cedidas a outros interessados no seu cultivo.

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De todo esse debate a respeito do direito de propriedade sobre a terra, ser aliado ao cumprimento da sua função social, que vem desde o início da modernidade, numa república não poderá haver proprietário que utilize sua propriedade como fator de especulação imobiliária. Ela precisa atender

os movimentos locais são importantes se puderem tornar-se nacionais. Mas hoje temos que ser capazes de trabalhar entre as escalas e articular análises de escalas locais, globais e nacionais”.

Esta ecologia desafia as pessoas, os indivíduos, as lideranças comunitárias e os representantes da Federação Brasileira a trabalharem as questões de interesse comum a todos numa transescala, ou seja, entre a escala local, regional, nacional e a global. Denota-se que muitas questões são de interesse da população local, mas também de interesse regional, nacional e global, como por exemplo, as questões de meio ambiente.

Estamos diante da ocorrência de um fenômeno que se verifica nos dias atuais. É o fenômeno da “[...] enorme mistura de povos, raças, culturas e gostos, em todos os continentes. A isso se acrescenta, graças aos progressos da informação, a „mistura‟ de filosofias em detrimento do racionalismo europeu”. Por outro lado, surge o “[...] indicativo da possibilidade de mudanças: é a produção de uma população aglomerada em áreas cada vez menores, o que permite um ainda maior dinamismo àquela mistura entre pessoas e filosofias”. A par disso, “Junte-se a esses fatos a emergência de uma cultura popular que se serve dos meios técnicos antes exclusivos da cultura de massas [...]” (SANTOS, 2010, pp. 20-21).

Num primeiro exemplo, a ecologia da transescala se faz presente quando uma escola de um determinado bairro, mediante a participação da direção, dos professores, dos pais, do conselho escolar e dos alunos planeja e introduz a educação ambiental no currículo dos seus níveis e modalidades de ensino. Como