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A estigmatização da imagem de liderança

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3.1. A construção da imagem da liderança

3.1.3. A estigmatização da imagem de liderança

O marketing pessoal pode criar uma espécie de estigma ou ícone, representando um rótulo promocional que sintetiza a composição das ações do eu expressa na linguagem corporal. Pierre Weil e Roland Tompakow consideram que “nossa linguagem corporal almeja por afirmar o nosso eu”.284 Portanto, em relação a estigmatização da imagem da liderança iurdiana, o “eu” individual cede lugar a um “eu coletivo”, partindo da matriz imagética do “eu” do bispo Macedo. Acreditamos que até o título que a liderança recebe em relação ao cargo que lhe é atribuído pode ser uma forma de estigmatização e manipulação do eu. Erving Goffman285 estudou as micro-interações que acontecem nas instituições totais. Para Goffman286, a microssociologia é também um espaço de acontecimento das representações mais particularizadas do indivíduo. Isso porque a microssociologia dos

283

Op. Cit,, p. 72-73.

284

WEIL, Pierre; TOMPAKOW, Roland. O corpo fala: a linguagem silenciosa da comunicação não-verbal. Petrópolis: Vozes, 1986.

285

GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Perspectiva, 1974.

286

manicômios, das prisões e dos conventos passa por uma “osmose cultural” e reconhece que as barreiras colocadas entre o internado e o mundo externo assinalam uma primeira mutilação do eu, assim como a perda do nome é uma grande mutilação do eu. Ora, uma imagem sofisticada e institucionalizada pode passar por uma estigmatização ou uma rotulação, seja no campo religioso, executivo ou político. Ainda segundo Goffman, “a manipulação do estigma é uma ramificação de algo básico na sociedade, ou seja, a estereotipia ou o perfil de nossas expectativas normativas em relação à conduta”.287

Trabalhamos com a idéia de estigma dentro da noção daquilo que marca, que assinala e não num sentido pejorativo. Encontramos no Dicionário Globo288 que estigma significa cicatriz, marca ou sinal. Ora, os bispos, os pastores, os obreiros e as obreiras ganham uma marca ou um estilo iurdiano ao assumirem suas funções no cenário da Igreja. Suas imagens compõem o quadro institucional e o estilo próprio da IURD. Por isso, entendemos que a estigmatização dessa liderança ganha uma forma própria de representação social. Por sua vez, a liderança iurdiana ativa o imaginário coletivo, trazendo à tona uma noção de estigma ligada a um projeto de ascensão social, o que acaba por fortalecer a imagem da liderança o que tem tudo a haver com as estratégias de marketing pessoal, no sentido de promover uma imagem de sucesso, criada para o meio social. Ainda segundo Goffman289, a estigmatização acontece dentro de um contexto de socialização.

A representação social da liderança iurdiana ilustra uma idéia de poder e sucesso. Nesse sentido, sua representação social, transmitida pela interação da liderança com o auditório, passa uma idéia de poder legitimado pelo sucesso. Goffman considera que “a informação social transmitida por qualquer símbolo particular pode simplesmente confirmar aquilo que outros signos nos dizem sobre o indivíduo, completando a imagem que temos dele de forma redundante e segura”.290 Para nós, a questão da estigmatização ou da rotulação da imagem da liderança é uma maneira de institucionalizar os valores simbólicos que a Igreja Universal apresenta por meio de seus líderes e a partir da marca de representação desses guias religiosos. Isso pode ser pensado, principalmente, se levarmos

287

GOFFMAN, Erving. Estigma... p. 61.

288

FERNANDES, Francisco. Dicionário brasileiro Globo. São Paulo: Globo, 1992.

289

GOFFMAN, Erving. Estigma...

290

em consideração que a IURD pode ser vista como uma instituição voraz. Segundo Lewis A. Coser, “as instituições vorazes se caracterizam pela pressão que exercem sobre seus componentes para debilitar seus vínculos e impedir que estabeleçam outros com distintas instituições e pessoas com as quais as demandas de lealdade podem entrar em conflito com suas próprias demandas”.291

Já para Tom Peters292, a marca de uma imagem pessoal é uma embalagem que serve como instrumento para acelerar decisões mercadológicas. Peters esclarece ainda que uma marca pessoal tem de ser criada de acordo com o empreendimento a que o indivíduo está associado, porque o ser humano deve entrar num negócio que lhe cause uma certa identificação. Com base nisso, afirmamos que entrar para um determinado negócio é criar um estilo de vida e ao mesmo tempo receber uma marca, inserindo-se num universo cultural. Em relação aos líderes iurdianos, o empreendimento religioso em que eles estão envolvidos parece expressar o seu próprio estilo de vida, o que favorece a construção e a manutenção de uma marca condizente com as informações sociais disseminadas pela pregação da própria Igreja. Nesse contexto, conforme Peters293, todo indivíduo que pretende se tornar uma marca precisa ter e declarar sua missão.

Nessa questão sobre a forma de rotulação dos líderes iurdianos, é bom ressaltar que eles não são agentes passivos da marca que lhes é adjudicada. Isto porque, até onde percebemos, essa marca os diferencia e os destaca no seu cenário interativo. Logo, essa marca atribuída à imagem dos líderes é um meio simbólico de criar uma identificação entre a instituição e o representante institucional. Para Goffman, “o indivíduo estigmatizado se define como não-diferente de qualquer outro ser humano, embora ao mesmo tempo ele e as pessoas próximas o definam como alguém estigmatizado”.294 Talvez, possamos imaginar que essa seja uma estratégia da IURD para trabalhar a imagem dos seus líderes de maneira estigmatizada e forjar um modelo único de imagem ideal, dentro dos limites de sua cultura e de sua estrutura religiosa.

291

COSER, Lewis A. Las instituciones voraces. México: Fundo de Cultura Econômica, 1978, p. 16. [tradução nossa].

292

PETERS, Tom. A marca você. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

293

Id. Ibid. p. 60.

294

Mas, se estamos certos em nossa observação, podemos acrescentar que a imagem estigmatizada é uma estratégia de marketing pessoal, na qual o líder é levado a moldar seus recursos naturais nos limites de uma imagem considerada ideal para a representação social. Assim, de acordo com os escritos de Karnal, “a representação (...) não é apenas um reflexo, imagem distorcida ou ‘fingimento’ sobre uma pretensa base real, ela é parte do real, criada e criadora do mundo”.295 Ora, a imagem da liderança aqui estudada pode ter sido construída num formato estigmatizado justamente para aparecer no palco/altar e nos meios de comunicação de massa como sendo uma imagem sofisticada, que represente a instituição e o discurso intra-mundano padronizado.

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