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A persuasão por meio da comunicação corporal

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1.1. O corpo como imagem e a sua educação

1.1.3. A persuasão por meio da comunicação corporal

O corpo é educado em diferentes culturas para persuadir. Seu poder de persuasão é tão antigo quanto a existência humana em sociedade. Nela o sujeito age com o intuito de levar o outro a crer ou a aceitar uma dada proposta. A voz, a simpatia, a energia e o entusiasmo, além do vestuário e dos acessórios aplicados no corpo de quem intenta persuadir, são determinantes para que se obtenha sucesso numa ação persuasiva, uma vez que o êxito da persuasão vai além da força dos argumentos pronunciados, encontrando um eixo na atitude corporal. Para Rui Grácio78 existe, no limiar da discussão da persuasão, uma nítida distinção entre os domínios da teoria e os da prática e o implícito reconhecimento das dificuldades na interação tem relação com a questão de articular a razão com a ação.

77

SPRITZER, Nelson. Ler pessoas: o que as pessoas dizem sem falar. São Paulo: DolphinTech, 2006.

78

Chaim Perelman79, analisando as características do raciocínio prático, propôs estudar as maneiras como a razão é capaz de lidar com valores, ordenar as preferências ou certezas humanas, determinando as escolhas. Para ele, isso está relacionado com a retórica, entendida como a predisposição persuasiva de um ser humano, que consiste, naturalmente, na ordenação de suas preferências ou incertezas, pois é por meio da inquietação ou do questionamento que o sujeito estará propenso à persuasão. Nesse caso, a linguagem não- verbal serve como um elemento igualmente importante na arte de persuadir. Propomos aqui mencionar que não é apenas o raciocínio analítico que compõe a persuasão; muito pelo contrário, ela se estende por outras vias, ao corpo, por exemplo, a fim de complementar a indução.

Se Perelman estiver correto em sua forma de analisar a persuasão pelo saber, pode-se então afirmar que a retórica se manifesta na mente (raciocínios analíticos), encontrando na linguagem corporal e ou não-verbal (raciocínios dialéticos) a exteriorização dos seus argumentos, daí nossa afirmação de que o corpo é um elemento importante para o saber persuasivo e isso é muito explorado pelos líderes neopentecostais. Mas, não é somente isso, deve-se levar em conta o ambiente e a condição do público receptor, bem como a retórica empregada na ação persuasiva. Michel Meyer afirma que “a retórica não fala de uma tese, de uma resposta-premissa que não corresponde a nada, mas da problematicidade que afeta a condição humana, tanto nas suas paixões como na sua razão e no seu discurso”.80 Esse elemento retórico é uma forma de levar o outro à ação.

A persuasão, nesse caso, possui uma relação direta com a retórica. Santo Agostinho aconselha que a ação só será persuasiva:

Se conduzido pelas vossas promessas e aterrorizado pelas vossas ameaças, se rejeita o que condenais e abraça o que recomendais; se ele se lamenta diante do que apresentais como lamentável e se rejubila com o que apresentais como rejubilante; se se apieda diante daqueles que apresentais como dignos de piedade e se afasta daqueles que apresentais como homens a temer e a evitar.81

79

PERELMAN, Chaim. O império retórico. Porto: Asa, 1993.

80

MEYER, Michel. Questões de retórica: linguagem, razão e sedução. Lisboa: Edições 70, 1998, p. 31.

81

SANTO AGOSTINHO. Apud: MEYER, Michel. Questões de retórica: linguagem, razão e sedução. Lisboa: Edições 70, 1998, p. 32.

A persuasão age, portanto, também na dimensão emocional do indivíduo e o desperta para a realização de algo e não o leva simplesmente a concordar fielmente com alguma coisa, pois quando a mente é de fato persuadida, o corpo responde em seu comportamento verbal ou não-verbal, agindo assim com gestos, como o ato de ofertar dinheiro nos gazofilácios de uma igreja, ou demais atitudes advindas do caráter persuasivo.

Weil e Tompakow82 esclarecem que, numa ação persuasiva, o indivíduo tende a inclinar o corpo em direção ao receptor, tornando em muitos casos a atitude, se não observada, um tanto quanto agressiva. Esse comportamento ilustra que a suposta agressão no gesto corporal é uma forma que o corpo encontra para sanar a preocupação mental de tentar comunicar de forma persuasiva. Quando a mente capta que o recebedor está distante de seus argumentos, ela desperta o corpo e o inclina, colocando-o mais perto do indivíduo. Porém, exige-se cuidado para a discussão dessa questão, porque o ato de inclinação corporal no momento da atitude persuasiva é complexo e precisa ser avaliado junto à realidade cultural do ser humano. Os escritos de Rui Grácio são complementares nesse sentido: "(...) estamos sempre, irremediavelmente in media res, inseridos em contextos e situações, apegados a valores, convicções e normas ou (...) indissociavelmente ligados a uma ordem prévia determinante das possibilidades de sentido para a nossa ação".83

Notamos que persuadir é levar alguém ao convencimento de alguma coisa pela ação. Reconhecemos que a mente usa os dispositivos do corpo para conferir o convencimento dos argumentos, mas o discurso argumentativo só será eficaz se ele combinar com a expressão corporal do comunicador. Assim reserva-se ao auditório “o papel principal para determinar a qualidade da argumentação e o comportamento dos oradores”.84 Em qualquer tipo de representação persuasiva será preciso existir uma interação entre o orador e o público, pois o principal objetivo de um comunicador é conseguir a adesão às suas propostas, por isso ele deve, antes de qualquer coisa, saber adaptar-se ao seu público, caso contrário poderá ter a eficácia do seu discurso afetada, o que repercutirá na sua imagem pessoal. Conclui-se, então, que a persuasão se estende ao

82 Op. Cit. p.155. 83 Op. Cit. p. 18. 84

PERELMAN, C. e OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da argumentação, São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 27.

comportamento corporal, justamente porque um corpo bem treinado auxilia o comunicador na ação de persuadir.

Na obra de Weil e Tompakow, o corpo fala numa linguagem silenciosa da comunicação não-verbal, sendo treinado ao longo do tempo com a missão de comunicar-se de forma atraente. Em algumas instâncias da interação, o corpo pode determinar a compra simbólica daquilo que se comunica. Perelman analisou a questão do ser humano preferir uma idéia a outra, assumindo que isso já é um fator, em si, que abre um espaço próprio para a arte de persuadir. Para ele, o miolo da persuasão consiste na retórica que flui das palavras e do corpo. Nesse caso, apresentamos aqui o conceito de retórica como sendo “a antiga arte de persuadir e de convencer”.85 Um corpo bem preparado, nesse caso, sustenta uma argumentação, colaborando com o processo de persuasão na dramaturgia social, uma vez que a interação dos indivíduos ultrapassa o limite verbal e recebe contorno expressivo no comportamento corporal. No próximo item se discutirá sobre o interacionismo simbólico em que o corpo é envolvido na representação cotidiana.

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