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A representação do eu na interação entre pessoas

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1.2. Corpo, representação social e interação

1.2.1. A representação do eu na interação entre pessoas

A representação do eu na interação entre pessoas nasce a partir de limites e regras, conforme Mauro Wolf90. A representação humana é enriquecida mediante as expressões corporais, submetendo o corpo ao sistema cultural em que ele está inserido, a fim de criar uma boa impressão. Sobre esse assunto, Goffman afirmou que, “na vida cotidiana, por certo, há uma clara compreensão de que as primeiras impressões são importantes (...)”.91 Segundo Goffman, a sociedade está organizada tendo por base o princípio de que qualquer indivíduo que possua certas características sociais tem o direito moral de esperar que os outros o valorizem e o tratem de maneira adequada. Essa pode ser a principal expectativa na interação entre pessoas, conquanto entender que o ser humano

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SHAKESPEARE, William. Uma peça como você gosta (As you like it). Middlesex: Penguin Books, 1937.

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Guy Debord alarga a esfera da reflexão de Marx por considerar que o espetáculo é o desdobramento, o segundo passo, a conseqüência última do superdesenvolvimento do capital. O espetáculo é o capital em um tal grau de acumulação que ele se torna imagem. DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.

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GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 36.

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WOLF, Mauro. Sociologías de la vida cotidiana. Madrid: Catedra Teorema, 1994, p. 46.

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possui uma necessidade de aceitação no processo de interação é conceber a idéia de que a vontade de ser aceito pode ser a mola propulsora da representação humana.

Para Goffman92, existem táticas na representação cotidiana do eu, conhecidas como práticas defensivas, protetoras ou diplomáticas, que salvaguardam a impressão acalentada por um indivíduo durante o período em que ele está diante de terceiros. Mas, para esse autor, as práticas ou impressões cultivadas sobrevivem porque há um certo zelo na maneira de perceber tanto daquele que representa quanto naquele que recebe a representação, pois ninguém está em melhor condição para observar a representação do eu do que a própria pessoa que a executa. Dessa forma, pode-se entender que a representação social do eu implica em valorizar o corpo, a linguagem verbal e não-verbal, bem como todos os elementos ou práticas estabelecidas na interação humana.

A representação do eu é resultado da forma de domesticação e de enquadramento do indivíduo nas várias profissões e classes. Logo, toda forma de representação ilustra o estilo de vida de uma sociedade. Daí existir uma preocupação nos diversos meios culturais em adequar a efígie da pessoa no que diz respeito à forma de vender uma imagem pessoal, para que o ser humano obtenha maior sucesso no interacionismo simbólico. Essa realidade pode ocorrer em várias esferas, tais como as esferas social, religiosa ou comercial. A prática humana de tirar vantagem na interação simbólica, mediante a imagem pessoal, nos leva ao que Nunes escreveu sobre Erving Goffman, “que ele promoveu uma ciência das aparências”.93 Se o interacionismo simbólico, teoria na qual Goffman trabalha, requer uma “ciência das aparências” no campo social, logo fomentamos a idéia de que, para interagir em qualquer espaço social, é necessário uma construção ideal da imagem. Na Igreja Universal do Reino de Deus existe uma noção de imagem pessoal ideal relacionada com a aparência de sua liderança eclesiástica, altamente sustentada pela idéia da prosperidade.

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Op. Cit. p.22-25.

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José Ricardo Costa de Mendonça94 menciona que o interacionismo simbólico é a maneira que os símbolos se relacionam com a interação simbólica. Já para Nunes95 essa teoria está relacionada com as metáforas e analogias em diversos níveis de abstração que acontecem dentro das ciências sociais, servindo como ponto fundamental para a compreensão das interações humanas por meio dos símbolos. Na perspectiva de Nunes, “os seres humanos agem com as coisas com base nos significados que as coisas apresentam para eles”96 e essa ação os prepara para a interação simbólica no cotidiano. Daí insistirmos que, para haver interação, no meio religioso, é preciso uma preparação dos indivíduos que interagem, a fim de estabelecerem uma imagem ideal, proveitosa, perante o receptor.

Goffman afirma ainda que “é essencial para a manutenção da representação que cada membro possua disciplina dramatúrgica e a exerça ao apresentar seu próprio papel”.97 A criação de uma imagem vantajosa na representação do eu exige disciplina, especialmente no que diz respeito à utilização das práticas defensivas, protetoras ou diplomáticas. Isto é importante porque o mundo, conforme escreveu Goffman, “é uma reunião”.98 O que se espera da representação de um sujeito é que ele saiba se comportar e usar de muito tato nos diferentes encontros sociais. De acordo com Goffman, “o eu, portanto, não é uma coisa orgânica (...) é um efeito dramático, que surge difusamente de uma cena apresentada e o interesse primordial está em saber se será acreditado ou desacreditado”.99 Analisamos que a disciplina e a racionalização das ações do eu, ligados ao contexto cultural do ser humano, determinará o crédito na representação cotidiana simplesmente devido à interação, está aferrolhada no meio social e não unicamente no eu.

Ao considerar que a interação entre as pessoas é fundamentada pelo dinamismo do meio social, reconhecemos existir uma seqüência de acontecimentos no decorrer da interação. Ora, isso acontece por meio da proximidade corporal, da percepção, da expressão facial, da postura e dos movimentos corporais, tais como a posição da cabeça e a direção do

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MENDONÇA, José Ricardo C. Interacionismo simbólico: uma sugestão metodológica para pesquisa em Administração. Universidade Federal de Pernambuco. In: Revista eletrônica de comunicação (REAd). http://read.ea.ufrgs.br/edicoes/resumo.php?cod_artigo=102&cod_edicao=13&titulo_p=I.interacionismo&acao =busca&pagina=1. Acesso em (28 abril 2007).

95 Op. Cit. 96 Op. Cit. p. 25. 97 Op. Cit. p. 198. 98 Op. Cit. p. 41. 99 Op. Cit. p. 231.

olhar, além dos conteúdos verbais e não-verbais, levando o indivíduo a configurar sua representação a partir dos recursos normativos que ele extrai de sua cultura. Esses recursos, ou normas de comportamento são representados, em grande parte, pelo corpo. Uma pessoa apresenta em sua postura e em seus gestos, a educação corporal recebida e comandada pela percepção humana e as estruturas neurais, conforme os escritos de Michel Argyle100. Sugerimos a seguir uma discussão sobre a interação e algumas interfaces.

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