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A experiência do olhar A perceção para além do objeto

No documento Reinventar a paisagem na era digital (páginas 44-64)

2. Revelar

2.4 A experiência do olhar A perceção para além do objeto

Sabemos que o olhar, em si mesmo, detém já um poder determinante capaz de iniciar experiências ricas e dotadas de significado, potenciadoras portanto de uma perceção efetiva do mundo. Existem várias modalidades e patamares no ato do olhar. É possível por isso começar por identificar um olhar que não induz a um envolvimen- to, um olhar vago e indiferente que povoa tantos quotidianos. Mas, no outro extremo, o olhar pode revelar-se uma observação arguta, uma perceção que se entrega e con- centra naquilo que avistou, prenúncio ou abertura para uma experiência estética. Se começa assim por ser possível avistar paisagens sem grandes exigências percetivas, a observação pode intensificar-se alcançando uma perceção da paisagem eivada de sig- nificado. Por outro lado, não é preciso, por exemplo, representar ou pintar uma paisa-

gem para captar a sua tipologia específica. Como reconhece Malcolm Andrews, uma paisagem, muito antes de ser reconhecida como obra de arte é já artifício. “Mesmo se

estamos apenas a olhar, já estamos a configurar. (...) Mesmo que nunca se traduza numa fotografia ou pintura, já aconteceu certamente alguma coisa de significante, a partir do momento que a terra é percecionada como paisagem”29. Segundo Malcolm

Adrews, quer sejamos ou não artistas, este processo de construção da paisagem tem existido há séculos. Esta evolução tem sido acompanhada por contributos vários da tradição visual da representação da paisagem, quer seja artística, quer pertença a outra ordem pictórica mais convencional.

O olhar que, com efeito, entra na esfera que nos interessa, no âmbito estético, não invalida que se compreenda os vários patamares. No contexto da experiência estética, John Dewey distingue precisamente um mero olhar que faz um simples re- conhecimento, com base em estereótipos, no qual “damos um passo atrás para o

domínio de esquemas concebidos previamente”. Por outro lado “a perceção substitui o simples reconhecimento. Existe um acto, um fazer reconstrutivo, e a consciência torna-se vigorosa e viva”30. Dewey estabelece portanto, de forma clara, uma distinção

entre diferentes patamares no ato de ver e olhar, um primeiro que não se carateriza por um grande investimento por parte do agente e um segundo no qual se verifica uma verdadeira entrega. No contexto da visualização da paisagem é importante compreen- der esta distinção, na medida em que consideramos que, em ambos os casos, se pode avistar uma paisagem, ainda que a perceção estética tenha lugar, sobretudo no segun- do caso, no qual se verifica uma perceção efetiva com envolvimento do observador.

Discordamos por isso, em parte, de Javier Maderuelo, uma vez que para este teórico, “quando num dado momento, num território ou num sítio, indicamos que se

trata de uma paisagem, é porque o estamos a contemplar com olhos estéticos”31. É

certo que a noção de paisagem surgiu, em grande medida, com o contributo da arte, e em particular no período do Renascimento, mas a par da consolidação deste conceito através da estetização da natureza, a própria paisagem expandiu-se, sobretudo nos tempos modernos, em formatos diversos que não suscitam necessariamente a contem- plação de pendor artístico e nem sequer uma experiência estética (veja-se o exemplo da paisagem turística ou informativa por ex.). Portanto, neste caso, verificam-se per-

29 Andrews, M. (1999). Landscape and Western Art, Oxford University Press, p. 1. 30 Dewey, J. (1980). Art as Experience, Perigee Books, p. 53.

ceções mais banais de paisagens, ou apreensões convencionais mais formatadas ou, quanto muito, de uma ordem diversa daquela que a arte contempla. Dewey explica de forma incisiva os contornos da experiência estética informada pela perceção que solicita uma verdadeira participação do observador:

“ A estética ou a fase de passagem da experiência é recetiva

implica entrega. Mas a cedência adequada do eu é possível apenas através de uma actividade controlada que é eventual- mente intensa. Em muitos dos nossos encontros com o meio que nos envolve nós recuamos, por vezes com medo, nem que seja por receio de despender indevidamente as nossas ener- gias, por vezes devido a outras preocupações como no caso do reconhecimento. Perceção é o ato de projetar energia de modo a receber, por seu turno uma energia que não se auto- -conserva. Para ir ao encontro de uma substância temos de mergulhar nela. Quando somos apenas passivos a respeito de uma cena, ela ultrapassa-nos e, por falta de capacidade de resposta, não compreendemos aquilo que nos rebaixa. Temos de evocar energia e conduzi-la para um ponto que encontre eco com vista à assimilação”32.

Podemos então compreender como as convenções sociais e culturais, que carac- terizam o reconhecimento de paisagens, e que se inscreveram no homem ao longo da História, não são mesmo assim suficientes para garantir a perceção e uma experiên- cia estética. Esta acomodação a um modelo estabilizado de paisagem não é contudo suscitado apenas pelo observador. Se em parte são os artistas que inauguram novos modos de perceção também é a arte e sobretudo a cultura visual que estabelece voca- bulários e mantém certas convenções pictóricas.

Como notou Merleau-Ponty acerca da perceção de paisagens: “Quando um pin-

tor é confrontado por exemplo com uma paisagem, ele escolhe retratar na sua tela uma representação inteiramente convencional daquilo que vê.”33

32 Dewey, J. (1980). Art as Experience, Perigee Books, p. 53.

A nosso ver, Merleau-Ponty descreve este processo de representação pictórica em sintonia com a visão que tem por base a ótica da perspectiva central, cuja sistema- tização teve origem na Renascença. Este método, revolucionário na época, aprimo- rou-se ao longo de séculos, refletindo-se em muitas representações pictóricas na arte ocidental, e consolidou-se portanto numa convenção, nem sempre em sintonia com a perceção solicitada pelas mudanças na lógica cultural em determinados momentos históricos. Mas Merleau-Ponty prossegue na descrição deste processo, no qual o pin- tor adere criteriosamente à convenção paisagista.

“Ele observa uma árvore na sua proximidade, então dirige o seu olhar mais além, para a estrada, antes de olhar finalmen- te para o horizonte, a dimensão aparente dos objetos muda sempre que olha para um ponto diferente. Na tela, organiza os elementos, de modo que aquilo que representa não é mais do que um compromisso entre estas várias impressões visuais: ele esforça-se por encontrar um denominador comum para todas estas perceções retratando cada objeto, não com o seu tama- nho, cores e aspeto que apresenta diante do pintor quando este fixa sobre eles o olhar, mas com um tamanho convencional e aspeto que iria apresentar a um olhar dirigido a um ponto de fuga específico no horizonte, um ponto em relação ao qual a paisagem é ordenada ao longo de linhas que vão do pintor até ao horizonte. Paisagens pintadas assim têm uma aparência pacificante, um aspeto de decência respeitosa, que advêm de serem captadas através de um olhar orientado para o infini- to. Estas permanecem a uma distância e não envolvem o ob- servador. São companhias gentis, o olhar passa sem entraves através de uma paisagem que não oferece resistência para este movimento de enorme simplicidade, mas não é assim que sur- ge o mundo quando o encontramos na perceção”34.

Através de uma análise com maior detalhe do que a de Dewey sobre a dinâmica

do olhar no processo percetivo, Merleau-Ponty descreve o que constitui uma perce- ção mais “verdadeira”. Para o autor, a experiência do olhar traduz-se num movimento que, percorrendo o nosso entorno, é induzida, ao mesmo tempo, a fixar-se ou a adotar determinados pontos de vista, “e estas sucessivas fotografias instantâneas de quais-

quer áreas da paisagem não podem ser sobrepostas uma sobre a outra. É apenas interrompendo o processo normal da visão que o pintor consegue dominar esta série de impressões visuais, e extrair uma única, e inalterável, paisagem a partir dessas imagens”35. Merleau-Ponty sublinha o carácter minucioso deste processo, aludindo a

recursos do artista no que se refere, por exemplo, a fixar proporções ou medidas, como ocorre quando o artista corrige um comprimento com o lápis, esticando o braço e se- mi-cerrando o olho. Mas esta abordagem que pretende fixar e recorrer ao mensurável, parece afastar-se da perceção viva.

“Ao sujeitar todos estes detalhes à sua visão analítica, ele de-

senvolve na tela uma representação da paisagem que não cor- responde a nenhuma das impressões visuais livres. Esse expe- diente controla o movimento que carateriza o modo como essas impressões se revelam mas também mata a sua vida fremente”36.

Também são esclarecedoras as indicações de Merleau-Ponty acerca de artistas que tentaram afastar-se desta visão analítica, procurando retratar novas abordagens percetivas mais próximas de uma experiência vibrante e encarnada.

“Se muitos pintores desde Cézanne se recusaram a seguir a lei

da perspetiva geométrica, isso deveu-se à sua vontade de re- capturar e reproduzir diante dos olhos o nascimento da paisa- gem. Eles mostraram-se relutantes em contentar-se com uma visão global analítica e esforçaram-se por recapturar o sensa- ção da experiência percetual em si mesma. Por isso, diferentes áreas da sua pintura são vistas de diferentes pontos de vista. O 35 Ibidem, pgs.40-41.

espetador “ocioso” interpretará essas zonas como “erros de perspetiva”, enquanto aqueles que observam mais atentamen- te vão sentir o sentimento de um mundo no qual não há dois objetos vistos simultaneamente, um mundo no qual regiões do espaço estão separadas pelo tempo que demora mover o olhar de um mundo para outro, no qual o ser não é dado mas emerge no tempo.”37

Esta experiência percetiva, descrita por Merleau-Ponty, prenuncia a via fenome- nológica, para a qual o espaço da paisagem não é entendido como um meio em que os objetos são apreendidos simultaneamente por intermédio de um observador absoluto equidistante de todos os objetos. Merleau-Ponty apela a um espaço temporal no qual o “coração sente” que se opõe ao espaço do intelecto puro, sem verdadeiro ponto de vista, sem corpo e sem posição espacial.

Para o nosso estudo, as indicações de Merleau-Ponty são pertinentes, mas, mes- mo assim, é preciso tomar com precaução essa faceta rica da sua obra, que constitui uma espécie de filosofia da pintura. Nos testemunhos deste filósofo existe uma busca que o leva a contrapor a sua interpretação da essência da pintura (inspirada como vimos por um fascínio por Cézanne), a todo um conjunto de obras que recorrem de algum modo à perspetiva central, sobretudo aquelas que se enquadram no Renasci- mento. Parece contudo algo limitativo que para defender uma experiência, se coloque de parte toda uma quantidade de estilos e obras que afinal transcendem os métodos perspetivistas que incorporam38. Além disso, seria excessivo julgar da mesma forma

todas as obras que revelam um conhecimento da perspetiva, uma vez que esse mesmo entendimento se altera, informando abordagens e visões do mundo distintas. Como descortinou Panofsky, cada período histórico da civilização do ocidente formalizou o seu próprio código de representação do espaço, validando, por esse meio, a variabili- dade da própria perspetiva, e a maneira como cada “forma simbólica” reflete a expe- riência do olhar e uma mundividência específica39.

37 Ibidem

38 Cf. Pedroso de Lima, J. T. (1998). Maurice Merleau-Ponty, Paul Cézanne e o Problema da eesência

da pintura, Revista Filosófica de Coimbra nº 13.

39 Cf. Campos, J.L. (2003). Erwin Panofsky e a questão da perspectiva. Espéculo. Revista de estudios literarios. Universidad Complutense de Madrid.

É certo que Merleau-Ponty reconhece na perspetiva geométrica um caráter ana- lítico que restringe, mas essa ferramenta concetual foi de facto determinante para tor- nar possível uma visão espacial com um grande impacto nos caminhos seguidos, em particular a partir do Renascimento. É preciso ter presente, no entanto, que juntamente com o aspeto sistemático das leis da perspetiva, os artistas do Renascimento tomaram consciência das qualidades da luz de forma algo intuitiva em comparação com as leis geométricas, embora de forma igualmente decisiva, uma vez em que a modelação da luz teve também um papel determinante para definir o novo espaço em perspetiva. A compreensão dos fenómenos percetivos como os matizes cromáticos e luminosos, é, além disso, algo subjetiva e ambígua, que contraria a exclusividade do pendor analíti- co e objetivo da visão espacial do Renascimento. A exploração fundamental da variá- vel da luz suscita ainda a impressão de uma pintura encarnada que habita um ambiente e uma profundidade configurada com o auxílio da perspetiva; ora esta conceção está longe da produção meramente intelectual apontada por Merleau-Ponty.

Esta importância da luz para a experiência do olhar, foi bem destacada por Javier Maderuelo no seu estudo sobre a génese da paisagem. Concordamos agora com o autor, quando este afirma que por vezes esquecemo-nos da luz como elemento cons- titutivo da paisagem (em favor de um vocabulário sólido, como montanhas, árvores, mares, etc...), interpretando-o, por lapso, apenas como fenómeno que permite ver. Mas “precisamente por esta razão a luz, aquilo que torna visível o mundo, é o elemen-

to que permite que exista a paisagem”40. Não há dúvida que a luz não é apenas uma

variável necessária para que haja visão, uma vez que ajuda a constituir muitos dos va- lores emocionais e plásticos mais poderosos de uma paisagem (através das qualidade cromáticas, intensidades, direção, difusão, etc...). Como indica Maderuelo,

“A definição do espaço tridimensional na pintura renascen-

tista será apenas possível não somente devido à aplicação dos preceitos da geometria, mas pelo uso combinado desta com o tratamento da luz e da sombra. A geometria permitirá situar exactamente os objetos no espaço, enquanto o uso correto dos jogos de luz e sombra os dotará de corporeidade”41.

40 Maderuelo, J. (2007). El Paisaje: genesis de un concepto y Arte, Abada Editores Lectura de Paisages, Madrid, p.144.

É preciso sublinhar ainda que, sem as teorias artísticas do Renascimento, a pin- tura de paisagem não poderia ter-se desenvolvido como a conhecemos, como com- prova o ensaio de referência de Gombrich, acerca da assunção do género da paisagem no Renascimento italiano42. Existe, portanto já uma vida e um espírito que anima o

espaço configurado pela paisagem da perspetiva da Renascença, que também disse- ca ou analisa a realidade procurando supostamente uma tradução realista do mundo. Para além dos formatos que assumiu em Itália, a dimensão intelectual foi visivelmente sublimada por alguns grandes mestres, por exemplo da escola flamenga. É o caso de Hubert e Jan Van Eick, que como revela Jacob Buckhardt, não se ficam pela descri- ção fiel da natureza. “A paisagem tal como eles a compreendem não é unicamente o

resultado dos esforços feitos para reproduzirem a imagem da realidade; tem já um valor poético independente e, se bem que ainda timidamente, uma alma”43. Também

Cosgrove considera que por detrás das capacidades dos pintores da Flandres em retra- tar as povoações ao detalhe, “a história da pintura da paisagem da Flandres estava

mais caraterizada pelo empirismo do que pela teoria intelectual”44. Cosgrove acres-

centa ainda que a proclamação de realismo no Renascimento, com base em regras pictóricas, é na verdade muito mais uma questão ideológica. Portanto a perspetiva, como uma convenção de realismo e objectividade, na verdade apresenta-se como um dispositivo com vista a sugerir uma determinada ordenação do mundo e uma intencio- nalidade que carateriza afinal a experiência estética.

Na atualidade, o arquiteto Branko Mahusier chama a atenção para essa intencio- nalidade artística que, ao selecionar e destacar certos elementos, se encaminha para uma abstração que não deve ser entendida como impessoal ou obra exclusivamente do intelecto. Na sua opinião, os artistas enfatizam, hierarquizam “e até afastam alguns

fatores da perceção. Portanto, abstrair não é despojar, se não pelo contrário ativar uma atitude estética que faz tangível o intangível”45.

A experiência do olhar, mais do que fazer parte de um programa estético com-

42 Gombrich, E.H. (2007). A Teoria da Arte no Renascimento e a elevação da paisagem, in Concerto das Artes, Campo das Letras.

43 Buckhardt, J. (1983). A Civilização do Renascimento Italiano, Editorial Presença.

44 Cosgrove, D. (1998). Social Formation and Symbolic Landscape, The University of Winconsin Press, p. 21.

45 Mahusier, B. Paisages de abstracción, http://www.fundaciontelefonica.cl/arte/matildeperez/archivos/ BrankoSusa.pdf

partimentado, que caracteriza o fascínio de um filósofo pela obra de um grande pintor, é sobretudo uma noção mais abrangente e dinâmica, e que evolui de acordo com as convenções e mudanças no contexto social e nas orientações ideológicas. Esse olhar, que a obra provoca perante um espetador atento, é já uma antecâmara da criação da paisagem. Mas para superar a mera aparência daquilo que já existe, foi necessário um discurso intelectual que sustentou, na verdade, uma prática artística inventiva. Javier Maderuelo comprova este argumento, a propósito da experiência e da ideia no Renascimento formulada pelos teóricos, que sistematizaram, por exemplo, as leis da perspetiva. “A tarefa mais importante realizada por Leon Battista Alberti foi adotar

um discurso culto e filosófico para certas artes que até então eram consideradas “mecânicas”, como a pintura e a arquitetura”46. As artes aproximam-se assim dos

conceitos abandonando o aspeto mecânico oficinal. Como sintetiza Javier Maderuelo, esta mudança não teria sido possível “se alguns pintores não tivessem estado à altu-

ra “científica” correspondente, superando a mera “mimésis”, proscrita por Platão, para chegar à “invenção” e à “ideia””47. Para voltar a Dewey, e à sua apologia do

caráter inventivo da experiência percetiva,

“Para prececionar, um observador tem de criar a sua própria

experiência. (...)Sem o ato de recriação o objeto não é perce- cionado como obra de arte. O artista selecionou, simplificou, clarificou, abrangeu e condensou de acordo com o seu interes- se. O observador deve pois prosseguir através destas opera- ções de acordo com o seu ponto de vista e interesse. Em ambos, tem lugar um ato de abstração ou seja, de extração daquilo que é significante.”48

Se a experiência do olhar é determinante para haver paisagem de cariz artístico, quer na vista real, quer já na obra pictórica, o modo como essa mesma observação organiza aquilo que capta é uma outra condição importante.

46 Maderuelo, J. (2007). El Paisaje: genesis de un concepto y Arte, Abada Editores Lectura de Paisages, p. 156.

47 Ibidem, p.151.

Para que a paisagem se afirme do ponto de vista percetivo, é necessário alcan- çar uma visão de conjunto para além do objeto, dos detalhes que a compõem, como as rochas, árvores, montanhas, rios ou as nuvens no céu. Portanto está em causa um processo que não elabora objetos, mas sim conexões. Como indica Massimo Ferriolo, acerca do poder do olhar no âmbito do estudo da paisagem:

“Os objetos formam uma trama. A paisagem não é uma acu-

mulação de coisas, um simples recipiente. Os objetos com- põem um todo e valorizam-se mutuamente pelas relações que instauram entre eles, e não por sobreposição recíproca. Se ocorre deslocarem-se, a trama modifica-se. Uma paisagem é uma imagem unívoca com múltiplos elementos; uma imagem com a sua especificidade, com o seu caráter específico, uma imagem determinada pela relação paisagista, é formada pelo lugar que cada objeto tem com base nos outros elementos.”49

Mas como o autor acrescenta, existe ainda uma dimensão imaginária ou invi- sível da paisagem que o olhar já antecipa, própria do ficcional, como veremos mais adiante. “É preciso mostrar a paisagem na sua totalidade imaginária e mítica, com-

plexidade visível e invisível nos seus limites abertos e bordas bem definidas, são as bordas nas quais se juntam uma forma de conhecimento ligado ao facto de ver e à capacidade de distinguir”50.

Concordamos com Massimo Ferriolo quando este fala da necessidade de cons- truir uma boa visibilidade de conjunto, que se cruza com a necessidade de trazer luz ao invisível, de procurar a obra oculta do homem. Ferriolo retoma também a noção de experiência neste contexto. “É preciso criar as condições ótimas para uma experiên-

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