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A FORMAÇÃO INICIAL DOS PROFESSORES NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

2 A PRÁTICA SOCIAL INICIAL DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES: PROPOSTA DA LEC E REALIDADE DOS PROFESSORES-ALUNOS

2.2 A FORMAÇÃO INICIAL DOS PROFESSORES NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

O debate acerca da formação de professores no Brasil, nos últimos 20 anos, concentra-se em duas dimensões:a necessidade da formação inicial do professor e a qualidade dos cursos de licenciatura que conduzem a formação inicial dos docentes do Brasil.

No que se refere à formação inicial, a Lei nº 9394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB) – que está em vigência –, regulamenta a formação inicial mínima exigida para exercício do trabalho docente, conforme texto do Artigo 62°.

Art. 62º. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. (BRASIL, 1996, p. 22).

Apesar dessa lei ter dado permissão aos professores formados em cursos de magistério para continuarem exercendo suas atividades na Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental, ela também estabeleceu o prazo de 10 anos de tolerância, após a sua promulgação, para que estes professores se adequassem ao que foi estabelecido. Contudo, cabia às unidades federativas e aos municípios constituírem parcerias com universidades e instituições de ensino superior para cuidar da formação inicial dos docentes que já estavam inseridos no quadro do magistério e que não tinham formação adequada à lei. Tal prazo já foi revisado duas vezes. A última dilatação foi instituída em 12 de março de 2013, estendida por mais seis anos.

Os dados do Censo Escolar (BRASIL, 2013) indicam que o percentual de professores da Educação Básica com ensino superior completo é de 74,8%. Isso indica que um quarto dos professores que estão atividade não tem formação superior. Além disso, segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), dentre os professores que declararam ter ensino superior, apenas 65,4% possuem licenciatura.

Os dados do INEP indicam que o Brasil ainda possui aproximadamente 2.142 professores em efetiva regência de classe que não têm o ensino fundamental completo e 4.300 docentes que só tem o ensino fundamental. Já no que se refere aos professores que possuem

formação no ensino médio, nota-se que houve um decréscimo no período analisado, mas ainda há a representação de aproximadamente 25% dos docentes.

Os dados referentes à formação inicial do professor no ensino superior indicam que há um número expressivo de professores se qualificando, mas, diante dos dados apresentados pelo próprio INEP, muitos professores ainda precisam da formação inicial. Contudo, nos últimos anos, a postura do governo brasileiro frente às demandas estruturais exigidas pelo mercado tem sido de retirada dos investimentos em educação, anunciando um corte de verbas que seriam destinadas às políticas sociais. Assim, está previsto o corte de 20% do pouco que é destinado para a educação.

Isso permite considerar que a postura política neoliberal adotada pelo governo brasileiro, por meio da minimização do Estado e da maximização do capital, está interferindo na realidade da formação de professores no Brasil. Entende-se que os interesses do capital estão no centro da política econômica brasileira; enquanto isso, os interesses da classe trabalhadora são subjugados. Essa realidade pode ser analisada no demonstrativo da aplicação dos recursos da União no ano de 2014, explicitado no Gráfico 3.

Gráfico 3 – Demonstrativo de distribuição dos recursos da União (2014)

Os dados quantitativos são produzidos a partir da análise de processos sociais. Sendo assim, eles indicam a representação numérica que oferece subsídios para explicitar uma posição política de uma relação social. Nesse caso, nota-se que, no ano de 2014, assim como foi em anos anteriores, a maior parte do orçamento da União foi destinada para o capital, ou seja, aplicou-se mais de 42% dos recursos para pagar os juros e a amortização da dívida. O Estado brasileiro tornou-se refém do capital, pois enquanto fortaleceu o pacto neoliberal destinando altos valores para este setor, aplicou irrisórios 4,22% na saúde, 3,49% na educação, 2,86% na assistência social, 1,03% na agricultura e 0,22% em organização agrária.

Nesse sentido, o que será destinado para as políticas sociais, no ano de 2016, será ainda bem menor do que foi planejado para 2015. Portanto, o corte de verbas para a educação afeta todos os campos, inclusive o da formação de professores.

Outra conclusão, que pode ser tirada acerca dos dados referentes à formação inicial do professor no Brasil, diz respeito ao fato de que muitos desses professores estão em cursos oferecidos por instituições na modalidade à distância e nos programas de formação de professores que ocorrem de forma modular ou nos finais de semana, como os que são promovidos pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por meio do Plano Nacional de Formação de Professores (PARFOR). Trata-se de formação aligeirada, concentrada e por modalidade de ensino que não prima pelo conhecimento teórico. Todavia, mesmo com o crescimento desse tipo de formação, a demanda ainda é muito grande.

No que se refere à qualidade da formação inicial dos professores brasileiros, há um estudo, de autoria de Claudio Santos (2011), feito com base nos documentos oficiais e nas produções acadêmicas que tratam dessa temática. O estudo concluiu que, de modo geral, tal formação tem sido orientada pelas pedagogias escolanovistas9 a partir do pensamento relativista. Segundo o autor, essa perspectiva pode ser identificada nos fundamentos do construtivismo, na teoria do professor reflexivo, na pedagogia das competências, na “pedagogia” dos projetos e no multiculturalismo. Ele observa que, apesar dessa diversidade pedagógica, há elementos teóricos unificadores de seus fundamentos e práticas nos quais pode ser notada, principalmente, a negação do princípio da totalidade social. Ao negar esse princípio, a realidade deixa de ser vista como sendo composta de frações que se inter- relacionam por meio de determinações histórico-sociais. Ou seja, trata-se de concepções que

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O escolanovismo pode ser entendido como um movimento pedagógico que vê na organização pedagógica e nos pressupostos epistemológicos da pedagogia da escola tradicional as razões da falta de interesse dos alunos, da fragmentação do currículo, da opressão dos professores sobre os estudantes. Sob essa perspectiva, a escola nova defende pesadamente a ideia de individualidade. O conhecimento, então, parte do sujeito – a escola apenas desenvolve as potencialidades.

não se comprometem com a questão social e a luta de classes, bem como não fazem posição política referente ao projeto histórico. Quando a educação não se compromete com a libertação do indivíduo, acredita-se que ela esteja a serviço do opressor (FREIRE, 1994).

A perspectiva relativista entende a realidade como um conjunto de fragmentos casuais e eventuais que não se dão a conhecer de modo racional e objetivo. Os acasos da vida de cada sujeito e o modo como este enxerga a realidade é que constituiriam o que seria ou não relevante para a sua formação. É uma perspectiva que não considera a totalidade, além de levar em consideração os saberes cotidianos, em detrimento do saber científico, e partir do princípio de que o indivíduo aprende na prática, e não no domínio do saber sistematizado.

Na perspectiva relativista, as explicações para os fatos tomam como referência a maneira como cada indivíduo entende e interpreta a realidade. Portanto, considera que todos os conhecimentos são verdadeiros. No pensamento relativista, a ciência deixa de ser o ponto de explicação para a realidade, e esta passa a ser explicada a partir do ponto de vista de cada sujeito. “O relativismo cultural, por sua vez, parte do princípio de que o mundo é formado por inúmeras culturas, não havendo condições de definir a existência de formas universais de cultura humana, tampouco de conhecimentos mais desenvolvidos que outros” (SANTOS, 2011, p. 27). Os defensores dessa concepção compreendem que os conhecimentos e saberes são frutos das culturas e das diversas formas de interpretação que cada grupo cultural dá aos fenômenos.

Isso traz impactos para o trabalho docente e para a formação dos indivíduos na Educação Básica, pois a realidade sobre a formação do professor no Brasil contemporâneo, quando colocada no movimento da prática socioespacial, permite compreender que o problema está posto: o Brasil tem um déficit muito alto na formação inicial do professor. Do mesmo modo, as formações que estão sendo alinhavadas, com o intuito exclusivo de superar esse déficit, vão manter a escola em determinado patamar para que não se permita que o indivíduo da classe trabalhadora tenha acesso ao conhecimento produzido historicamente, haja vista que ele, nessa escola, é o produtor do conhecimento.

Nessa perspectiva de ensino e de formação esvaziados de conteúdo, a concepção que os fundamenta não tem a realidade concreta e a ciência como seus fundamentos. Desse modo, a questão não está só no ato de ter ou de não ter a formação inicial, mas nos fundamentos e nos propósitos em que ela é consolidada. Portanto, a questão não é somente de acessar a formação inicial em nível superior, mas de questionar sob quais condições essa formação vem sendo desenvolvida e as consequências e implicações socioespaciais desse processo para a classe trabalhadora.

2.3 AS IMPLICAÇÕES SOCIOESPACIAIS DA ESCOLA BURGUESA PROPOSTA PARA

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