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O Estado brasileiro no atual contexto político-econômico

LEC/UFBA

3 A PROBLEMATIZAÇÃO DAS PRÁTICAS SOCIOESPACIAIS FRENTE AO DESAFIO DE FORMAR PROFESSORES PARA EDUCAÇÃO DO CAMPO

3.4 A POSTURA DO ESTADO BRASILEIRO FRENTE À QUESTÃO AGRÁRIA E AO PROJETO DE EDUCAÇÃO DA CLASSE TRABALHADORA

3.4.1 O Estado brasileiro no atual contexto político-econômico

No cenário econômico mundial dominado pelo modo de produção capitalista, o Estado sempre foi alicerçado com base no pensamento liberal. Trata-se de uma corrente de pensamento que tem como centralidade a defesa dos interesses da burguesia. Por isso, seus desdobramentos se fundamentam no entorno do conceito de liberdade – obviamente, na dimensão do que é liberdade para a burguesia.

Por isso, enquanto Marx compreende o Estado burguês como reino da força e da opressão, os liberais entendem o Estado como espaço de liberdade. É o Estado, a partir do aparato jurídico-político e dos aparelhos coercitivos, que garante a liberdade burguesa. A liberdade se expressa na garantia do individualismo, ao mesmo tempo em que restringe ao máximo a esfera do poder coletivo.

De acordo com Harvey (2011), os Estados são reificações das concepções mentais. Sendo assim, as teorias sobre a formação do Estado deram/dão muita atenção ao que as pessoas estavam/estão pensando sobre como deve ser a relação com o Estado. Por isso, quando há mudanças nas concepções mentais, elas são acompanhadas por pressões para transformar o funcionamento do Estado.

Desse modo, o capital se reorganiza numa outra estratégia de produção por meio do que Harvey denomina de acumulação flexível.

A mudança tecnológica, a automação, a busca de novas linhas de produção e nichos de mercado, a dispersão geográfica para zonas de controle do trabalho mais fácil, as fusões e medidas para acelerar o tempo de giro do capital passaram ao primeiro plano das estratégias corporativas de sobrevivência em condições gerais de deflação. (HARVEY, 2008, p. 139-140).

Em virtude das mudanças na organização do capital, ele próprio passou a exigir mudanças também no direcionamento da política do Estado. É por isso que, na atualidade, o pensamento que tem direcionado tanto o capital como o Estado parte das ideias Hayek (1990), aquele que é considerado mentor do neoliberalismo. Tais ideias foram assim sistematizadas: “qualquer intervenção estatal na economia, mesmo procurando a justiça social, significaria uma afronta à liberdade econômica, e onde não há liberdade econômica também não pode existir liberdade e política” (MONTAÑO; DURIGUETO, 2011, p. 61). Nada se pode atingir a liberdade, pois, para estes autores, qualquer política consagrada que leve a um ideal substantivo de justiça distributiva leva à destruição do Estado de Direito, pois, para

proporcionar resultados iguais para pessoas diferentes, é necessário tratá-las de maneira diferente.

É nessa concepção que está a centralidade da política do capital neoliberal que prega a privatização e a redução, ao máximo possível, das políticas sociais. Nessa conjuntura, coloca- se em jogo o pouco que se avançou no desenvolvimento da democracia, bem como nas leis trabalhistas, com o intuito de minimizar as questões postas pelo capitalismo à sociedade. Assim, o Estado neoliberal tem se estruturado a partir de três pilares: “a) a ofensiva contra o trabalho e suas formas de organização e luta; b) a reestruturação produtiva; c) a (contra)reforma25 do Estado” (MONTAÑO; DURIGUETO, 2011, p. 192-193).

No que se refere à ofensiva neoliberal contra o trabalho, destaca-se a postura do capital e do Estado na não negociação de direitos dos trabalhadores em greve e repressão das lutas dos trabalhadores, dilatando as greves para enfraquecer o poder do movimento. Além disso, ambos tentam desprestigiar as lutas da classe trabalhadora frente à opinião pública, tentando desqualificar e até criminalizar os movimentos de luta. Igualmente, propagam a ideia de crise, a fim de desmotivar os trabalhadores para não reivindicarem direitos garantidos ou novos direitos e também enfraquecer os movimentos, uma vez que a própria classe trabalhadora pode acabar concluindo que, por falta de recurso, não atingirá o objetivo. Outra situação que marca a política neoliberal é a desregulamentação do mercado de trabalho e a precarização do emprego com automação da produção e a terceirização da produção.

Na reestruturação produtiva, por sua vez, tem-se a sociedade com menos emprego, pois o trabalho é realizado em diversos lugares, em decorrência do desmonte das linhas de montagem e da exploração da mão de obra barata dos países subdesenvolvidos que têm legislação trabalhista e ambiental frágeis, do mesmo modo que as organizações sindicais.

Enquanto isso, a (contra)reforma do Estado foca em privatização de empresas públicas, redução dos custos de produção com a redução dos salários, reformulação da previdência social por meio de redução ou esvaziamento dos direitos trabalhistas, redução do funcionalismo público e redução dos gastos públicos com os serviços de proteção social, precarizando as políticas e os serviços sociais. Desse modo, o Estado sucateia o serviço público e transfere a responsabilidade de execução do serviço para instituições filantrópicas e organizações não governamentais.

Assim, o Estado é acionado pela burguesia para cumprir a tarefa de produzir o consenso social, ideologicamente induzido para a legitimação e reprodução da ordem social

25 Entendido pelos críticos como supressão ou redução dos direitos e garantias sociais. As reformas são vistas

vigente. Portanto, retomando o pensamento de Marx e Engels, nota-se que a superestrutura, por meio do aparato jurídico-político, é determinada pelas decisões tomadas pela burguesia. Quando é de interesse do capital ser amparado pelo Estado, usa-se o Estado, mas quando a política pública for uma ameaça para o capital, retira-se o papel do Estado. Desse modo, de acordo com Netto e Braz (2007), o objetivo real do capitalismo não é reduzir o papel do Estado em si, mas apenas aquelas funções do Estado voltadas para a satisfação dos direitos sociais – um Estado mínimo para o trabalho e máximo para o capital. Tal fato pode ser muito bem percebido no Brasil contemporâneo, ponto que será analisado no próximo item.

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