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Capitulo II – Referencial teórico

1. Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável – contexto emergente

1.2. A génese da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável

O sentimento de uma “autêntica emergência planetária” (Zaragoza, 2010, p. 172) surge da necessidade de se atuar de modo célere para se assegurar um futuro sustentável. Esta emergência resulta, entre outros fatores, de um crescimento económico que não considera os seus impactos sociais e ambientais (Vilches e Pérez, 2011) e é caracterizada por uma série de evidências que afetam o planeta e, consequentemente, aqueles que nele habitam. São elas, segundo Vilches e Pérez (2008, 2003), a contaminação uniforme e global que afeta todos os ecossistemas; o esgotamento de recursos não renováveis e a deterioração dos recursos renováveis, fruto de uma exploração desmensurada, com implicações diversas e em particular na biodiversidade; a urbanização crescente e desordenada, com efeitos nefastos e diversificados, mas com maior ênfase nos solos e no consumo de recursos; a degradação quase generalizada dos ecossistemas nativos bem como a constatação de graduais e extremas mudanças climáticas; desequilíbrios extremados entre ricos e pobres e o aumento do efetivo populacional do planeta; e uma crescente instabilidade suscetível de gerar conflitos pela posse de recursos naturais. A situação de emergência planetária caracteriza-se, como se pode confirmar pela apresentação dos problemas enumerados anteriormente, “por um conjunto de problemas estreitamente relacionados e que se potenciam mutuamente” (Vilches e Pérez, 2007, p. 12) e que não consideram pertinentes as consequências para os outros e para as futuras gerações, visando apenas o benefício pessoal e imediato.

Novo (2010) refere mesmo que a “obsessão pelo crescimento contínuo foi, historicamente, uma das causas da crise que vivemos atualmente” (para. 3). Reconhece que existe uma inter-relação entre os interesses

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económicos, o conhecimento e tecnologia, verificando-se que estas interdependências se têm ampliado, dando lugar a um modelo que entende o mundo e a ação sobre ele, ignorando os valores em benefício dos interesses de mercado. Salienta mesmo que “o mercado move-se em tempos curtos e a natureza fá-lo em tempos largos” (Novo, 2010, para. 3).

Filho (2009) realça que, na generalidade, as pessoas ignoram de onde proveem os bens que consomem, e são desprovidos de uma consciência ecológica que lhes permita compreender a importância dos ecossistemas e da sua contaminação. Salienta ainda que a população tem uma crença errada de que o desenvolvimento económico exija o sacrifício do meio ambiente. E ainda, mais importante, é que na generalidade dos casos as pessoas “têm a ideia de que são as empresas industriais e não a soma de todas as atividades humanas – todas as decisões diárias, individuais e coletivas – que estão a modificar de forma irreversível a Terra” (p. 267).

Assim, a emergência da EDS ganhou a relevância necessária, face ao contexto crescente de insustentabilidade planetária, na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), enquanto fórum internacional, em que se abordaram as questões da sustentabilidade1 do

planeta (UNESCO, 2007 p. 6). O resultado desta conferência traduziu-se num compromisso, assumido pelos governos dos diferentes países da ONU, com vista à promoção do DS através da Agenda 212. A Agenda 21

estipula um protocolo baseado em compromissos e ações a serem desenvolvidos e implementados no século XXI, visando atingir o DS e assegurar a sobrevivência humana, preservando a saúde e os recursos naturais do planeta para as presentes e futuras gerações.

A destacar que é nesta conferência, Cimeira da Terra - 1992, que se faz pela primeira vez um apelo a todos os educadores, de todas as disciplinas, para a situação de emergência planetária em que vivemos (Vilches e Pérez, 2003). O principal propósito da referida conferência, consistiu em sensibilizar os cidadãos para uma participação baseada na cidadania que permita a tomada de decisões, assim como a mudança necessária de comportamentos, para evitar que as condições de vida da espécie humana não se degradem de forma irreversível.

1 “Significa o uso racional dos recursos escassos da Terra, sem prejudicar o capital natural, mantido em condições de sua

reprodução, em vista ainda ao atendimento das necessidades das gerações futuras que também têm direito a um planeta habitável” (Boff, (2011a).

2 A Agenda 21 solicita a todos os países que elaborem estratégias e planos de ação a favor da Educação para o Desenvolvimento

Sustentável (EDS) e reorientem os programas e sistemas educativos nesse sentido. Possui quarenta capítulos, os quais foram distribuídos, para a sua liderança e monitorização, pelas várias agências das Nações Unidas. À UNESCO coube a responsabilidade de implementar o Capítulo 36. Este capítulo salienta a importância que a educação tem na “capacitação e na tomada de consciência pública do processo que permite aos seres humanos e às sociedades desenvolverem as suas potencialidades” (CNUMAD,1992) in http://www.un.org/esa/sustdev/documents/agenda21/english/Agenda21.pdf.

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Apesar das boas intenções, a verdade é que, apenas dez anos decorridos da Cimeira da Terra, a UNESCO reconheceu que os seus propósitos não lograram o sucesso expectável, uma vez que admitiu que nesta conferência não foi dada a devida importância à educação, tendo sido mesmo negligenciada (Mulà e Tilbury, 2011). É então, na Conferência de Joanesburgo, que surge a proposta de uma Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (Década) com o objetivo de se impulsionar a implementação da EDS nos planos nacionais e internacionais (Mulà e Tilbury, 2011). Reconheceu-se que a educação potencia a colocação de questões relacionadas com a sustentabilidade, no centro do contexto educativo, daí que os governos, membros da ONU, tenham concordado em reorientar os sistemas nacionais de educação de acordo com a EDS.

Nesta sequência, é a 20 de dezembro de 2002, na 57.ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, que é aprovada a Resolução 57/254 e se proclama oficialmente a Década, a decorrer no período de 2005-2014, sendo a UNESCO o organismo responsável pela sua promoção e pelo desenvolvimento de uma estratégia para a sua implementação.

De acordo com o documento final do Plano de Aplicação Internacional da Década (PAID) (UNESCO, 2005a), esta assenta na intenção de instituirmos um mundo mais justo “onde todos tenham a oportunidade de beneficiar da educação e de aprender os valores, comportamentos e modos de vida exigidos para um futuro sustentável e para uma transformação positiva da sociedade” (UNESCO, 2005a, p. 16, 2005b, p. 6).

A proclamação da Década resulta dos imensos desafios colocados à sociedade contemporânea em três dimensões principais (ambiental, sócio-cultural e económica), da perceção de que é urgente abandonar os modelos de desenvolvimento dominantes e, também, de acordo com Wals (2009), de percebermosr que o DS implica a inter-relação com o tempo (passado-presente-futuro) e o espaço (perto-longe).

Relativamente à ideia subjacente à Década, Tilbury (2010) apresenta-nos uma definição, proposta por Elias (2006): “uma plataforma global que busca incorporar o DS em todas as esferas de aprendizagem, reorientando a educação e desenvolvendo iniciativas que podem mostrar o papel especial de educação para o desenvolvimento sustentável” (p. 102).

A Década enuncia, como objetivo geral, a integração dos princípios, valores e práticas do DS em todas as formas da educação e da aprendizagem. O esforço educativo procura potenciar mudanças de comportamento que se repercutam na criação de um futuro mais sustentável em termos de integridade ambiental e de viabilidade económica, e uma sociedade mais justa para as gerações presentes e futuras (UNESCO, 2005a).

Os objetivos principais da Década enaltecem o papel de extrema importância que a educação e a aprendizagem possuem na contribuição para o DS, ressaltando com veemência a existência de espaços de

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oportunidades para a promoção da qualidade do ensino e da aprendizagem, utilizando estratégias adequadas. O próprio conceito de DS deve ser acionado através da aprendizagem formal, não formal e informal, e de uma adequada sensibilização para a necessidade de se estabelecerem e criarem contactos, conexões e intercâmbios entre os diversos intervenientes na EDS (UNESCO, 2005a).

Tilbury (2011) expõe, com base no PAID, que a necessidade de adaptar os sistemas e as práticas educativas para o DS é uma prioridade da Década. Na prática, trata-se de adotar novas formas de refletir sobre o ensino e a aprendizagem nos contextos referidos anteriormente (formal, não formal e informal), implicando ativamente os alunos neste processo e potenciando as capacidades e os conhecimentos através da exploração e da oferta de oportunidades para a compreensão e o envolvimento com o DS. Tibury (2011) sugere, também, a necessidade de se alterarem as políticas educativas, os currículos e o desenvolvimento profissional dos educadores e professores.

No sentido de se averiguar, de acordo com Tilbury (2011), de que forma se implementaram os pressupostos e os objetivos, e qual o potencial impacto da Década, após a conclusão da sua primeira metade, a UNESCO formou um Grupo de Especialistas – DESD Monitoring and Evaluation Expert Group (MEEG) para a monitorizar e avaliar, publicando os resultados sob a forma de três relatórios.

O primeiro destes relatórios, publicado em 2009, foca o contexto e as estruturas de trabalho em EDS dos Estados-Membros (Fase I) e resultou da Conferência de Bona3, com o objetivo de rever as estratégias e

realizações da primeira metade da década e propor ações para a segunda metade; o segundo, publicado em 2011, tem como foco os processos e iniciativas de aprendizagem relacionados com a EDS (Fase II) e o terceiro, a ser publicado em 2015, terá por objetivo apresentar o legado, os impactos e os resultados da Década, após o seu término (Fase III).

Segundo a UNESCO (2008a), o plano de avaliação e monitorização foi concebido para: i) Sensibilizar os principais atores para a importância da Década; ii) Proporcionar oportunidades de reflexão e de aprendizagem; iii) Supervisionar o progresso de diferentes setores, entre os quais, a educação formal, a comunidade, o governo e as empresas; iv) Avaliar as mudanças no contexto, nas estruturas, nos processos de aprendizagem e quais os resultados e o respetivo impacto; v) Analisar o progresso a nível regional e global; e vi) Avaliar a contribuição da UNESCO para a Década e as lições aprendidas durante o processo de implementação.

Os progressos da primeira metade da década foram analisados na Conferência Mundial da UNESCO, que se realizou em Bona, em 2009, tendo-se concluído que, apesar de muitos países e regiões de todo o mundo

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terem desenvolvido estratégias e estabelecido metas sobre a EDS, nenhum deles havia “conseguido integrar o desenvolvimento sustentável nas suas estruturas ou sistemas” (Mulà e Tilbury, 2011, p. 12).

A declaração de Bona insiste na formulação e ajuste das políticas e metas da EDS, com o propósito de orientar a implementação da EDS em todos os setores da educação (UNESCO, 2009a), o que se comprova com os documentos de avaliação da Década, que a seguir se apresentam.