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Capitulo II – Referencial teórico

2. A Educação para o Desenvolvimento Sustentável – caracterização

2.4. Elementos chave para a prática da EDS – componentes do núcleo da EDS

Os elementos chave para a prática da EDS traduzem-se no estimular os alunos a vislumbrarem um futuro mais positivo, a colocarem questões críticas, a participarem na tomada de decisões, a estabelecerem

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parcerias e a pensarem de forma sistémica. Podem também constituir uma reorientação para a realização de atividades e/ou projetos, daí que Tilbury e outros autores como Tilbury e Wortman (2004); Tilbury e Cooke (2005); Tilbury e Ross, (2006) nos facultem estes elementos, apresentados de forma mais detalhada em seguida.

a) Aprender a vislumbrar um futuro melhor, mais positivo. Sobre este processo Tilbury (2011) refere que o mesmo diz respeito à reflexão sobre o futuro e que ajuda as pessoas a descobrirem quais são as suas possibilidades ou preferências futuras. Ajuda na descoberta de crenças e dos pressupostos que fundamentam as visões e escolhas realizadas, permitindo que as pessoas examinem as situações, os problemas e os obstáculos.

Imaginar um futuro melhor é um processo que envolve as pessoas na forma como se relacionam com o futuro que consideram ser o ideal, em que se incluem os valores, os sonhos e a esperança. Proporciona, assim, “planos de ação para a mudança de rumo para um futuro mais sustentável” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 11). Tal assenta, e de acordo com a autora supramencionada, no seguinte processo de idealização: i) Proporciona um espaço que permite a compreensão do verdadeiro alcance da sustentabilidade no presente e no futuro; ii) Fornece um impulso para a ação, motivando as escolhas do presente e permitindo, ainda, que se observe e enfrente os problemas e obstáculos; iii) Contribui para o refinamento de sentido de pertença e do impacto que as atuais ações têm ou poderão assumir no domínio da responsabilidade de trabalhar para um futuro melhor; e iv) Promove a partilha de perspetivas, de diálogo e ação, almejando um futuro mais positivo.

Considera-se que a perspetiva de futuro é importante para melhorar a qualidade de vida e abordar as questões de sustentabilidade porque fornece: i) Tempo - para conceber um futuro melhor através da busca de objetivos de mudanças sociais, tomando decisões participativas para o DS; ii) Alternativas - num processo que vise identificar possíveis, prováveis e preferidas alternativas individuais e coletivas de um futuro; iii) Holismo - propiciando um espaço para a interpretação da sustentabilidade, bem como a oportunidade de ligar esses elementos numa direção comum; iv) Motivação e planos - para agir e participar na concretização de planos, contribuindo para um mundo sustentável; v) Escolha para ajudar as pessoas a tornarem-se mais ativas na perspetiva de um futuro desejado, dando-lhes um largo espetro de imagens e ajudando-as a escolher a configuração que o futuro deve ter, de forma a que elas se possam mover na direção certa (Tilbury e Wortman, 2004).

Relativamente ao elemento chave – capacidade de pensamento crítico - para a prática da EDS, debruçamo- nos com mais detalhe na sua explanação, uma vez que é objetivo deste estudo promover nos professores a compreensão da sua importância no atual contexto educativo.

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b) Capacidade de pensamento crítico (PC) - O interesse por esta temática teve origem na década de oitenta, altura em que “educadores e investigadores e diretores escolares de todos os níveis de ensino manifestaram uma preocupação e um interesse crescente pelo desenvolvimento das capacidades de pensamento crítico dos alunos” (Tenreiro-Vieira e Vieira, 2000, p. 13). Efetivamente, o pensamento crítico é “ hoje considerado o ideal central da educação e a base social para se adquirirem os mesmos direitos e as liberdades cívicas, no âmbito dos países liberais democráticos” (Tenreiro-Vieira e Vieira, 2009). Os mesmos autores explicam que a importância atribuída ao pensamento crítico se deve ao facto de este constituir “uma pedra basilar na formação de indivíduos capazes de enfrentarem e lidarem com a alteração contínua dos cada vez mais complexos sistemas que caracterizam o mundo atual” (p. 14) e, acrescentam, que “o pensamento crítico desempenha um papel fundamental na adaptação, com êxito, às exigências pessoais, sociais e profissionais do século XXI” (idem).

A existência de cidadãos com capacidades de pensamento crítico, interventivos e capazes de atuar constituem o mote para o “êxito de qualquer sistema democrático” (Tenreiro-Vieira e Vieira, 2009, p. 15). Estes autores complementam esta ideia realçando que um cidadão de uma democracia “deve ser capaz de sustentar debates abertos sobre questões e tópicos, de ponderar argumentos complexos, de estabelecer conclusões e atuar sobre elas” (idem).

Vieira (2003) retoma o testemunho recolhido de Hare (1999) e apresenta os fatores que justificam a emergência do pensamento crítico enquanto ideal educacional:

(i) o facto de muitos relatórios publicados revelarem que persistem nas salas de aula as rotinas, nas quais os estudantes são incapazes de aplicar o que conhecem na solução de problemas e não são tratados com o respeito que merecem pessoas capazes de independência intelectual; (ii) o reconhecimento de que os enviesamentos, a inveja e a intolerância necessitam do pensamento crítico para uma educação moral das sociedades plurais que querem evitar a tradicional doutrinação; e (iii) uma crescente perceção de que os estudantes terão de enfrentar um futuro incerto com empregos em transformação rápida que exigem adaptação, recursos e autonomia (p. 35).

Acerca do conceito de pensamento crítico propriamente dito, optámos por apresentar a definição de Ennis (1985), citado em Tenreiro-Vieira e Vieira (2000), uma vez que, e na perspetiva destes autores, a sua teoria foi a que mais se impôs na educação: “o pensamento crítico é um pensamento racional, reflexivo, focado no decidir em que acreditar ou o que fazer” (p. 27). Ressalvamos que muitos são os autores que definem o pensamento crítico de formas diferenciadas.

O pensamento crítico constitui-se como uma das capacidades a desenvolver em matéria de EDS. Tilbury e Wortman (2004) atestam que John Huckle (1996) é considerado um dos maiores defensores do PC na EDS e sustentam que, para que ocorram as mudanças necessárias, que permitam colmatar a insustentabilidade do Planeta, é indispensável estarmos consciencializados de que o mundo não pode ser alterado se não

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existir uma adequada interpretação dos problemas. Significa isto que o PC desafia os alunos a examinarem a forma como interpretam o mundo, o que constitui, portanto, um processo profundo que envolve o exame às causas da insustentabilidade e exige que os alunos reconheçam os preconceitos e pressupostos presentes no seu próprio conhecimento, perspetivas e opiniões (Tilbury, 2011).

O PC constitui um componente chave da EDS, porque nos permite estarmos conscientes de que a sociedade da informação e do conhecimento coloca à nossa disposição um enorme manancial de informação, através de diferentes vias (Internet, jornais, media, entre outros) que acabam por influenciar a forma como “percecionamos o mundo e o que consideramos como prioridades na nossa vida” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 36).

Decidimos apresentar de forma sistematizada e simplificada as palavras intrínsecas ao PC, tendo sempre como referencial o exposto por Tilbury e Wortman (2004). O PC faculta a capacidade de compreensão dos problemas complexos, “podemos começar a desconstruir as nossas visões sociais do mundo (p. 36)”; ou seja, desafia a que se faça um exame à maneira como interpretamos o mundo e como o conhecimento e as opiniões, pressupostos e preconceitos das pessoas são moldados.

O PC coloca questões profundas sobre o mundo em que vivemos e leva à procura de respostas. Assim, pode descobrir-se como as nossas estruturas, processos sociais, políticos e económicos podem ser modificados rumo à sustentabilidade. Pode ajudar a fazer escolhas, nomeadamente potencia a participação em movimentos sociais e na comunidade que apoiem a mudança, tanto individual como coletiva, bem como permite desenvolver a capacidade de entender que a cultura e os valores interagem moldando os nossos conhecimentos e perceções.

O PC, na perspetiva da EDS, pode também ajudar a compreender “quando estamos a ser coagidos e manipulados pelas pessoas que nos rodeiam” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 36). Consciencializados deste facto, podemos usufruir da nossa própria opinião sobre o significado de sustentabilidade e optar, ou não, por uma melhor qualidade de vida.

O PC ajuda a desenvolver a capacidade de indagar, nomeadamente a questionar e explorar as relações de poder nas nossas comunidades, nas escolas, nos locais de trabalho e no mundo. O objetivo é que se percebam as motivações existentes por detrás das hierarquias e lideranças e compreender quais são as decisões que afetam as nossas vidas.

O PC envolve uma reflexão pessoal acerca da adequação dos modelos mentais que tradicionalmente conduzem o nosso pensamento e as nossas ações. Desta feita,” podemos ter competências para pensar e agir de forma genuinamente racional e autónoma” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 37).

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O pensamento crítico reflexivo é concomitante ao processo de clarificação de valores, pois, “está intrinsecamente ligado com o processo designado de clarificação de valores” (p. 39).O PC pode ainda ajudar a descobrir como a cultura pode influenciar os valores e as crenças, de modo a que a complexidade cultural, profissional e pessoal em torno do DS possa ser entendido.

O processo é fundamental para garantir que os indivíduos e grupos são capazes de contribuir para a sustentabilidade de formas verdadeiramente autónomas e autênticas: “o pensamento crítico e a clarificação de valores ajuda-nos a agir de forma verdadeiramente autónoma num caminho rumo à sustentabilidade” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 50).

A salientar que, e ainda no dizer dos autores Tenreiro-Vieira e Vieira (2000), o PC envolve capacidades (abilities) que se referem aos aspetos mais cognitivos (como por exemplo, identificar assunções, feitas pelo próprio ou por outros; clarificar e focar questões que sejam relevantes para o assunto sob consideração, etc.) e as disposições (dispositions) que se prendem com aspetos mais afetivos (como por exemplo, ter abertura de espírito e respeito pelos outros, etc.). A operacionalização das capacidades de PC pode ocorrer recorrendo-se a diferentes taxonomias (Anexo I) (listas, tipologias ou tabelas) e estão organizadas em cinco áreas, e são elas; i) a clarificação elementar; ii) o suporte básico; iii) a inferência; iv) a clarificação elaborada; iv) as estratégias e as táticas. Por sua vez, cada uma das várias capacidades agrupa-se em diferentes categorias, como por exemplo, a inferência pode ser dedutiva, indutiva e inferência para fazer juízos de valor (Tenreiro-Vieira e Vieira, 2000).

Recapitulamos o que anteriormente referimos sobre os dois elementos chave (vislumbrar um futuro melhor e capacidade de pensamento crítico) para a prática da EDS e continuamos com a apresentação dos três restantes elementos.

c) Participação na tomada de decisão. Segundo Tilbury e Wortman (2004), a formação dos alunos para liderarem e tomarem as suas próprias decisões rumo à mudança e, por consequência, rumo à sustentabilidade, potencia a participação e a envolvência dos alunos. Isto porque, ao possuírem determinadas competências, nomeadamente ao serem capazes de decidir, de fazer as suas escolhas, e de refletir criticamente, os alunos desenvolvem competências que contribuem para a sustentabilidade. Estão, por isso, mais propensos a agir e a ter mais confiança nas suas próprias capacidades, e também “para partilharem conhecimentos, negociar com os outros, desenvolver competências de persuasão, pensar sobre os problemas e praticar a liderança” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 54). Por outro lado, “ajuda os alunos a auto organizarem-se, a tornarem-se mais autoconfiantes e a desenvolverem um forte sentido de identidade comunitária” (idem).

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d) Estabelecimento de parcerias na EDS – A sua importância deve-se ao facto de as parcerias incentivarem o benefício mútuo e o desenvolvimento, criando sinergias entre os parceiros e ajudando na construção do conhecimento. A reflexão sobre os valores, as visões e as missões permitirem criar oportunidades para se trabalhar colaborativamente, por forma a construírem-se visões coletivas.

E) Pensamento sistémico (PS) - pensamento este que Senge (1998) nos apresenta como uma de várias disciplinas que constituem as “learning organization” (organizações que aprendem). Este autor define PS como “criar uma forma de analisar e uma linguagem para descrever e compreender as forças e inter-relações que modelam o comportamento dos sistemas” (para. 8).

Por sua vez, Paiva e Paiva (2010) referem que o PS “consiste em perceber o mundo como um conjunto integrado de acontecimentos e relações” (p. 9), potenciando, assim, uma visão mais global e “uma melhor maneira de entender e gerir situações marcadas pela complexidade” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 71). Pelo mencionado acerca do PS, depreende-se a estreita relação deste com a EDS, daí que Tilbury (2011) o considere importante tanto ao nível pedagógico como para definir e estruturar estratégias e programas de EDS. Acrescenta mesmo, e utilizando as palavras de Mayer et al. (2008), que o PS se constitui “parte integrante do ethos de uma escola sustentável” (p. 35).

O PS é o pensamento relacional e a sua ênfase efetua-se nas abordagens integradoras e nas soluções de longo prazo, daí ser fundamental para abordar as questões relativas à sustentabilidade. Este pensamento incentiva à observação do mundo de uma forma mais abrangente, holística, reconhecendo que as questões e os relacionamentos estão interrelacionados. Um “pensador sistémico aborda as questões para que estas sejam inclusivas e integradoras” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 86).

O PS é um conjunto de princípios, de ferramentas e de técnicas que ajudam a encontrar soluções genuínas para a sustentabilidade, permitindo, ainda, uma envolvência ativa, “explorando e refletindo sobre os nossos valores e competências” (Tilbury e Wortman, 2004, p. 84). Tal como o PC permite considerar e compreender as relações e interdependências entre os seres humanos e a biosfera.

Em resumo, o PS é útil relativamente a três dimensões distintas: i) Perceção – Permite expandir o nosso ponto de vista e os limites das nossas preocupações; ii) Conceção - Ajuda a reconhecer as conexões e os padrões de relacionamento; iii) Ação - Auxilia no planeamento e na ação de uma maneira holística e integradora.

Uma das diferenças entre o PC e o PS deve-se ao facto de, respetivamente, o PC se preocupar com a ideologia, o poder e a justiça; e, por sua vez, o PS se preocupar com suposições, padrões e relações. Considera-se, portanto, que o PS “constitui um complemento essencial para o PC” (idem).

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