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Capitulo II – Referencial teórico

5. As TIC no processo de ensino e de aprendizagem a mudança expectável

5.4. Emergência das comunidades virtuais

As primeiras comunidades virtuais surgiram nos anos 80 (por exemplo a UseNet), a partir do momento em que as tecnologias de comunicação tornaram possível a troca de mensagens entre vários utilizadores (Illera, 2007).

Segundo Coll (2004) o termo comunidade, no contexto educativo, desenvolveu-se nos últimos dez a quinze anos comprovando as limitações que a educação formal apresenta perante os desafios da sociedade atual e, por consequência, a necessidade de uma inovação educativa. Neste sentido, o termo “comunidade” é cada vez mais usual, sendo igualmente comum a sua junção com uma série de expressões diferenciadas, como comunidade de aprendizagem, comunidade de prática, comunidade online e comunidade de investigação, entre outras. Assim, este termo é considerado amplo e polissémico (Cabero, 2006, Meirinhos e Osório, 2009) e, segundo este último autor, relaciona-se com as histórias das realidades sociais e organizacionais.

Com base em vários investigadores (entre os quais Palacios, 1998, Donath, 1999, Smith, 1999, Wellman e Gulia, 1999 e Paccagnella, 1997), Recuerdo (2005) refere que um dos primeiros autores a utilizar o termo "comunidade virtual" foi Rheingold (1996); considerando-a um agregado social existentes na internet, que promove discussões durante um determinado tempo, revelando a existência de sentimentos, o que origina a formação de redes de relações pessoais no ciberespaço.

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De acordo com Dias (2007) as comunidades virtuais são a “expressão da partilha de um conjunto de valores, normas e intencionalidade social, história e identidade do grupo, e objetivos que se projetam no futuro, sustentados pela rede de interações entre os seus membros” (p. 31). A sua principal característica reside na mediação colaborativa e tecnológica, através da qual a comunicação virtual surge dos processos de negociação dos objetivos e atividades do grupo para a construção de conhecimento. A mediação também constitui um meio para a participação e colaboração resultantes das interações que mobilizam a comunidade. A Educação e Formação são desafiados à adoção de novas perspetivas, assentes nos processos colaborativos, no fácil acesso e contextualização das aprendizagens, na redução das distâncias sociais e na construção de interações sociais refletidas em comunidades virtuais. Estas comunidades apresentam-se como mediadores no desenvolvimento de aprendizagens para a inovação, dado o seu intrínseco caráter de partilha e colaboração.

A vivência numa comunidade assume-se como uma aventura coletiva, em que se constroem conhecimentos, em que se constata que o conhecimento que todos possuem é uma mais-valia, em que a partilha de uns é importante para os outros, em que todos são membros importantes. Desta feita, o futuro de uma aprendizagem enriquecida pelo recurso às tecnologias da informação deixa de se espelhar apenas na transmissão de conhecimentos e passa a realizar-se em ambientes ativos, culturalmente ricos (Figueiredo, 2002).

É nesse sentido que acreditamos que o grande desafio da escola do futuro é o de criar comunidades ricas de contexto onde a aprendizagem individual e coletiva se constrói e onde os aprendentes assumem a responsabilidade, não só da construção do seu próprio saber, mas também da construção de espaços de pertença onde a aprendizagem coletiva tem lugar (Figueiredo, 2002, p. 2).

5.4.1. Tipos de comunidades virtuais

Com base em Henri e Pudelko (2003) que consideram como característica fundamental de uma comunidade a intencionalidade e a coesão que se estabelece entre os seus membros, elaborámos o quadro sobre os tipos de comunidades virtuais existentes (Quadro 17) a partir da síntese elaborada por Meirinhos e Osório (2009).

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Quadro 17 - Tipos de comunidades virtuais (adaptado de Meirinhos, 2009, p. 48-52)

Tipos de Comunidade

Níveis de Coesão social e

intencionalidade Descrição

de interesse Nível inferior (muito

baixo) Os seus membros são provenientes de culturas e meios variados e perseguem objetivos que não se integram numa dinâmica colaborativa. A sua dinâmica enquadra-se mais no campo

da entreajuda para a resolução de problemas individuais.

de interesse

inteligentes Nível inferior (baixo) Tal como a anterior, forma-se em torno de um interesse em comum, Existe uma grande heterogeneidade de competências entre os seus membros. É através das suas competências que os seus membros são escolhidos, em função dos objetivos do trabalho final.

de aprendizagem Nível superior (alto) As CoA e de CoP apresentam algumas similaridades entre si, nomeadamente pelo facto de se fundamentarem em processos colaborativos, de interação social, e de resolução de problemas assentes em teorias de aprendizagem construtivista e sócioconstrutivista. Todos os membros devem participar, partilhar na construção de novo conhecimento.

O formador ou tutor desempenha um papel de grande relevo, já que deve elaborar as atividades de acordo com o nível de desenvolvimento dos membros e as condições do contexto institucional.

Estas comunidades emergem num contexto institucional e são constituídas por membros (alunos, formandos, professores) de uma ou

várias instituições que podem ser

geograficamente dispersas. As comunidades de aprendizagem são mais direcionadas para contextos académicos de aprendizagem e formação.

de prática Nível superior (muito

alto) As comunidades de prática desenvolvem-se entre pessoas que exercem a mesma profissão

ou partilham as mesmas condições de trabalho. O desafio para uma CoP é desenvolver e enriquecer a atividade profissional partilhando, auxiliando e reunindo conhecimento entre os seus membros.

As comunidades de prática (CoP) baseiam-se no quadro teórico social da aprendizagem, desenvolvido por Wenger que é considerado o “pai” das comunidades de prática (Meirinhos, 2010). Wenger et al. (2002) define comunidades de prática como "grupos de pessoas que compartilham um interesse ou paixão por algo que fazem e aprendem como fazê-lo melhor à medida que interagem regularmente" (p. 4). Isto é, uma CoP resume-se a um conjunto de pessoas que partilham desafios comuns; que interagem regularmente; que aprendem umas com as outras; e que, desta forma, melhoram a sua capacidade de lidar com os desafios (Wenger, 2004).

Tal como referido anteriormente, no quadro 17, o objetivo de uma CoP é a melhoria das condições no exercício de uma profissão, ou seja, tem como pretensão o desenvolvimento profissional. Segundo Ortiz (s/d) as CoP procuram essencialmente “a ação (prática) (…) e permitem a inovação e a aprendizagem (aprender fazendo)” (p. 37).

Pelas características que as Comunidades de Aprendizagem (CoA) apresentam, é usual considerar-se que todas as CoP são CoA. Para melhor se compreender as diferenças existentes entre este tipo de comunidades, Cabero (2010) apresenta as suas diferenças fundamentando-se em Zhu e Baylen (2005). Enquanto as CoA são constituídas por professores e estudantes que pretendem partilhar objetivos académicos, as CoP têm como objetivo o desenvolvimento profissional dos estudantes e o conhecimento da prática de uma atividade profissional. Por sua vez, a organização de aulas com recurso à constituição de comunidades, permitem a construção de práticas docentes inovadoras, distantes dos modelos transmissivos,

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oferecendo exemplos de como se podem processar aprendizagens significativas e culturalmente relevantes para os seus membros (Coll, 2004).

De seguida, destacamos o Modelo de Garrison e Anderson, por este se nos afigurar como o modelo mais adequado, para a análise de conteúdo realizada à comunidade de prática criada durante este estudo, e que se encontra detalhado no capítulo 4.

5.4.2. Comunidade de investigação – Modelo de Garrison e Anderson

As tecnologias de e-learning têm, entre outras, a capacidade de estabelecer conexões entre pessoas pelo que se devem criar experiências educativas criativas de modo a potenciar a reflexão e o discurso. Ao planificar e estruturar uma experiência de aprendizagem por esta via, existem três elementos que devem ser considerados, para que a aprendizagem e o ensino ocorram, são eles (figura 19) as presenças social, a cognitiva e a de ensino (Garrison e Anderson, 2005).

Figura 19 - Modelo de uma comunidade de investigação (Garrison e Anderson, 2005, p. 49)

A presença social reflete a capacidade que os participantes têm na comunidade de se projetarem social e emocionalmente através do instrumento de comunicação em uso. Assim, uma comunidade será tanto mais coesa quanto os participantes possuam objetivos em comum e revelem a existência de amizade entre eles; assim, a comunidade manter-se-á enquanto os participantes sintam as suas necessidades e objetivos satisfeitos. A presença social constata-se na resolução de atividades colaborativas, embora não garanta o desenvolvimento de uma linguagem crítica, uma vez que, para que tal suceda, se torna imprescindível desenvolver a presença sócio-emocional e as relações pessoais. Para que se desenvolvam os relacionamentos, numa comunidade online, é necessário tempo para que se atinja um nível de conforto, de confiança e um sentimento de pertença. O objetivo da presença social no contexto educativo é promover a existência de condições para que a investigação aconteça e que as interações se revelem de qualidade com

Presença Social Presença Cognitiva Presença Ensino (Estrutura/processo) Promover o discurso Criar um clima adequado Experiência Educativa Seleção de Conteúdos

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caráter reflexivo e um bom encadeamento de ideias. Para fins educativos a presença social não pode estar dissociada da presença cognitiva e presencial.

Polhemus et al. (2000) cit por Palloff e Pratt (2007) também apresentam a presença social como um elemento que se traduz na expressão de sentimentos, na partilha social, na utilização de diferentes tipos e cores de letra e na utilização de símbolos ou carateres de expressão. Para além destes indicadores, que demonstram que efetivamente se criou uma comunidade online na turma, existem outras evidências que ajudam a perceber que se trata efetivamente de uma comunidade online, como:

i) a interação ativa envolvendo o conteúdo do curso e da comunicação pessoal; ii) aprendizagem colaborativa evidenciada pelos comentários dirigidos principalmente aos colegas; iii) o que se constrói socialmente é evidenciado pelo acordo ou questionamento com a intenção de alcançar um acordo sobre as questões; iv) partilha de recursos entre estudantes; v) apresenta expressões de apoio e encorajamento entre os estudantes, bem como, avaliar criticamente o trabalho dos outros (Paloff e Pratt, 2007, p. 31).

A presença cognitiva diz respeito aos resultados educativos pretendidos e conseguidos, ou seja, revê-se na construção e compreensão de significados, na promoção da análise através da reflexão contínua. Esta presença está relacionada com a capacidade de pensamento crítico, uma vez que esta capacidade é criada como um processo de reflexão de alto nível. “O estabelecimento da presença cognitiva permite a todos os participantes obter uma apreciação metacognitiva do que estão a fazer e porque o fazem” (Garrison e Anderson, 2005, p. 94). Para a operacionalização da presença cognitiva Garrison et al. (2001) cit. por Garrison e Arbaugh (2007), apresenta um modelo prático que se realiza em quatro fases com o propósito de se alcançar o conhecimento (figura 20). “Estas fases são cruciais para descrever e compreender a presença cognitiva (Garrison e Anderson, 2005, p. 88): 1 - evento desencadeador, em que se identifica um problema ou questão para posterior investigação; 2 – exploração, em que os alunos exploram a questão, de forma individual ou coletiva através da reflexão crítica e do discurso, e pode fazer-se através de atividades de grupo e sessões de brainstorming; 3 - integração, em que os alunos constroem significados a partir das ideias desenvolvidas na exploração, contando com a presença do professor para apoio no desenvolvimento das suas ideias de modo a atingirem um nível de pensamento mais elevado, isto é, orientar o processo de pensamento crítico; 4 - resolução, em que os alunos aplicam os conhecimentos adquiridos a novos cenários educativos ou a determinados trabalhos.

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119 Figura 20 - Modelo de investigação prática (Garrison e Anderson, 2005, p. 89)

A presença de ensino compreende todo o processo que envolve a criação, planificação da experiência de ensino e de aprendizagem online, bem como o direcionamento de processos cognitivos e sociais, logo exige a presença de um professor competente e responsável.

Considera-se a presença de ensino como um fator decisivo na satisfação dos membros da comunidade, na forma como eles interpretam a aprendizagem e o sentimento de comunidade que demonstram; e também contribui para o aumento da interação, pelo que cabe ao professor “guiar todo o processo de ensino e proporcionar a consciência metacognitiva” (Garrison e Arbaugh, 2007, p. 160).