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A nacionalização dos partidos e do sistema partidário

No documento BID APolíticadasPolíticasPúblicas (páginas 54-59)

Uma última característica dos sistemas partidários que pode afetar o funcionamento da de- mocracia e dos resultados das políticas é o seu grau de nacionalização. O sistema partidário nacionalizado pressupõe que os partidos, em termos gerais, têm abrangência nacional e ten- dem a expressar-se e agir com uma orientação nacional comum, em vez de se dividir segun- do questões regionais ou subnacionais e concentrar-se nelas. Em sistemas partidários alta- mente nacionalizados, as questões nacionais costumam ser primordiais para a carreira dos legisladores. O Executivo pode ter maior capacidade de forjar coalizões legislativas centra- das em questões de cunho nacional, dada a necessidade de negociar com apenas alguns poucos líderes partidários nacionais. Em condições de nacionalização partidária baixa, a li- derança central do partido terá menos condições de falar em nome do partido como um todo e de prestar apoio legislativo.

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 Argentina Bolívia Guatemala Nicarágua Honduras Costa Rica Peru Panamá El Salvador Equador Venezuela Paraguai Uruguai México Colômbia República Dominicana Chile Brasil : Jones (2005). Fonte

Nota: O índice é uma soma simples de seis componentes individuais. O intervalo teórico do índice vai de 6 a 18.

FIGURA 3.3 Índice de centralização partidária (2005)

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Diferenças no nível de na- cionalização também podem ter conseqüências sobre as políticas públicas. Quando a base de apoio de um partido é relativamente constante nas unidades geográ- ficas, haverá mais chances de que todas as unidades recebam tratamento igual com respeito a decisões relativas a questões como transferências a unidades subnacionais, reforma adminis- trativa, investimentos públicos e subsídios. Em contrapartida, quando seu apoio apresenta grande variação de uma unidade geográfica para outra, é maior a probabilidade de que suas de- cisões baseiem-se no nível de apoio eleitoral que recebe em

determinadas unidades geográficas. Com um sistema partidário nacionalizado, a formulação de políticas públicas tende a ser mais orientada para o bem comum nacional.

Uma abordagem parcial para avaliar o grau de nacionalização dos sistemas partidários é o exame da distribuição do voto popular dos partidos em diversas jurisdições territoriais do

país.25A Figura 3.4 mostra as pontuações em um índice de nacionalização do sistema parti-

dário para países latino-americanos formulado com base nos votos das eleições da Câmara, realizadas próximo a 2002. Com base nessa medida, tem-se a impressão de que os partidos seriam mais nacionalizados em Honduras, Chile, Uruguai e Nicarágua, e menos nacionali- zados no Peru, na Argentina, na Venezuela e no Brasil.

As legislaturas

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As legislaturas são instituições imprescindíveis para o efeti- vo funcionamento de um sistema democrático e do proces- so de formulação de políticas. Espera-se que as legislaturas representem as necessidades e aspirações dos cidadãos na preparação de políticas, que identifiquem problemas e for- mulem e aprovem leis para a sua solução, e que fiscalizem a execução das políticas mediante monitoramento, exame e investigação das atividades governamentais, de modo a as- segurar sua transparência, eficiência e concordância com as leis e regulamentos existentes.

0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 Fonte: Jones (2005). Honduras Chile Uruguai Nicarágua Costa Rica República Dominicana El Salvador Panamá México Guatemala Equador Paraguai Bolívia Brasil Venezuela Argentina Peru

FIGURA 3.4 Índice de nacionalização do sistema partidário (com base em dados das eleições mais próximas de 2002)

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Essa medida não permite a avaliação correta da nacionalização do sistema partidário se os diretó- rios regionais dos partidos apresentarem diferenças de orientação programática ou de bases de apoio.

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Esta seção se baseia amplamente em Saiegh (2005).

As legislaturas da região não existem apenas para aprovar automaticamen- te as decisões do Poder Executivo.

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O alcance e a natureza do papel desempenhado pelas legislaturas no processo de formu- lação de políticas variam de forma expressiva de país para país. No extremo mais proativo e construtivo do espectro, legislaturas como o Congresso dos Estados Unidos, são capazes de formular propostas legislativas próprias e assim participar, com o Poder Executivo da condu- ção do programa de governo. Tendo em vista seus recursos para a formulação de políticas, es- sas legislaturas também costumam ser ativas e eficientes na fiscalização da implementação

das políticas.27No outro extremo, as legislaturas podem ser atores puramente marginais,

atuando como aprovadores automáticos das propostas legislativas do Executivo, com pouca

capacidade ou disposição para controlar a conduta do governo.28Entre esses dois extremos,

há uma ampla área em que as legislaturas podem manifestar diferentes graus de atividade, seja pela mera obstrução de boa parte do que o Executivo propõe, seja pela reformulação e/ou emenda a suas iniciativas. Entre essas legislaturas, pode haver também considerável varia- ção na intensidade e na eficiência com que desempenham a função de fiscalização.

A atuação da legislatura quanto às funções de elaboração de políticas pode surtir um importante efeito sobre a natureza dos resultados das políticas. Se a legislatura for um ator marginal, o Poder Executivo terá total liberdade para sancionar as mudanças que julgar ne- cessárias. Mas a falta de deliberação do Poder Legislativo durante a formulação das políticas e a debilidade da fiscalização podem indicar que as políticas adotadas são mal concebidas em termos técnicos, mal ajustadas às necessidades reais ou reivindicações dos interesses or- ganizados e da sociedade, carecendo, assim, de consenso e, portanto, politicamente insus- tentáveis, e/ou de execução ineficiente ou injusta. Por outro lado, as legislaturas com parti- cipação mais intensa na elaboração de políticas de modo construtivo podem contribuir para a adoção de políticas mais sustentáveis, já que são embasadas por um consenso social e polí- tico mais amplo e fiscalizadas mais de perto em termos técnicos. Ademais, em uma legisla- tura construtiva, a supervisão efetiva da execução das políticas deve aumentar a probabili- dade de as políticas cumprirem os objetivos pretendidos, em vez de serem conduzidas de modo a beneficiar determinados indivíduos, grupos ou setores.

No entanto, as legislaturas com capacidade limitada de desempenhar um papel cons- trutivo na formulação de políticas podem ser importantes atores no sentido de obstruir ou vetar muitas das propostas do Executivo. Tais legislaturas apresentam vários dos traços ne- gativos em potencial das legislaturas mais marginais, no que tange à elaboração de políticas, e podem também impedir o Poder Executivo de levar adiante uma agenda positiva de refor- ma política. Tendo em vista sua capacidade limitada, é também improvável que essas legis- laturas desempenhem um papel efetivo na fiscalização da execução das políticas.

Tendo como pano de fundo o histórico de regimes ditatoriais e o presidencialismo da região, os estudiosos costumavam considerar as legislaturas dos países latino-americanos, em grande medida, irrelevantes ao longo de boa parte do século XX e indignas de ser estuda- das. Algumas experiências notórias nas últimas décadas, como o fechamento da legislatura pelo Presidente Fujimori, no Peru, e o freqüente recurso do Presidente Menem, na Argenti- na, ao poder de governar por decreto continuaram a reforçar a visão generalizada de que as legislaturas latino-americanas não raro abdicam (ou são forçadas a abdicar) de suas prerro- gativas constitucionais em favor do Executivo. Contudo, recentes estudos sugerem que, em-

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Morgenstern (2002).

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Uma legislatura marginal pode ser a contraparte de um presidente ou chefe do Poder Executivo do- minante, ou ver-se em uma situação em que as políticas são formuladas mediante a discussão entre o Executivo e os legisladores do partido da situação, sem que a legislatura como um todo participe com um papel significativo.

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bora as legislaturas da região, em geral, possam não ter forte envolvimento na formulação e defesa de reformas de políticas, elas são, não obstante, relevan- tes para os resultados das polí- ticas. As legislaturas de alguns países têm uma participação ativa na formulação de políticas pelo poder de veto direto, po- dendo bloquear leis propostas pelo Poder Executivo. Outras, porém, participam da negocia- ção de políticas nos bastidores com o Executivo, seja emen- dando ou reformulando as ini- ciativas legislativas do Exe- cutivo.

O fato de as legislaturas da região não existirem apenas para aprovar automaticamente as decisões do Executivo fica evidente em dados sobre as ta- xas de sucesso das iniciativas le- gislativas do Executivo. Como indica o Quadro 3.3, o índice de

aprovação das iniciativas do Poder Executivo varia de um nível baixo de 41% na Costa Rica,

no período de 1986 a 1998, até 96% no México, no período de 1982 a 1999.29Mas esses indi-

cadores aproximados têm valor limitado na avaliação da plena influência da legislatura sobre a formulação de políticas. Além de propor ou destruir legislações, as legislaturas po- dem aprovar projetos de lei com grande quantidade de emendas. Também podem exercer influência, fora da arena legislativa formal, por meio de negociações bilaterais entre os líde- res legislativos e os representantes do Executivo quanto a que projetos de lei são apresenta- dos e à forma que essa legislação assume. Além do mais, para não ter que enfrentar a humi- lhação de uma derrota legislativa, o Poder Executivo pode antecipar a reação da legislatura

pela forma com que elabora as propostas de políticas.30Assim, a tarefa de analisar a função

de elaboração de políticas da legislatura, em qualquer país, é bastante difícil e exige o estudo detalhado de casos específicos.

O caráter do papel desempenhado pelas legislaturas tende a influenciar a opinião que os cidadãos têm a seu respeito. Paralelamente a isso, a probabilidade de investimentos no desenvolvimento de capacidades do Congresso depende do nível de confiança dos cida- dãos. Ademais, nos casos em que o Congresso goza de baixa credibilidade, ele pode ser me- nos eficiente na representação dos interesses da sociedade, proporcionando ao Poder Execu- tivo maiores incentivos para que procure contornar ou minimizar o papel da legislatura no processo de formulação de políticas.

Quadro 3.3 Êxito dos executivos em obter aprovação para suas propostas legislativas

País

Índice de êxito legislativo (porcentagem) México (1982-99) 96 Paraguai (1990-99) 83 Honduras (1990-96) 79 Brasil (1986-98) 72 Chile (1990-2000) 69 Venezuela (1959-88) 68 Peru (2001-2004) 65 Argentina (1983-2000) 64 Uruguai (1985-2000) 57 Colômbia (1995-99) 51 Peru (1996-99) 50 Equador (1979-96) 42 Costa Rica (1986-98) 41 Fonte: Saiegh (2005). 29 Saiegh (2005). 30 Morgenstern (2002).

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Conforme observado no Quadro 3.4, nem a população em geral e nem os executivos de empresas internacionais demonstram um alto grau de confiança no Congresso da maioria dos países da região. Segundo o Latinobarómetro, em média, nos últimos dez anos, a popula- ção em geral tem a opinião mais favorável do Congresso no Uruguai, no Chile, em Honduras e na Costa Rica, e a menos favorável no Equador, na Bolívia e na Guatemala. Em comparação, as pontuações médias atribuídas por executivos de empresas, segundo dados do Fórum Eco- nômico Mundial, atingem os valores mais altos no Chile e no Brasil e os mais baixos na Vene- zuela, na Nicarágua e na Argentina. As diferenças mais expressivas de opinião da população em geral e dos executivos de empresas referem-se à Venezuela e à República Dominicana, onde, em cada caso, a população possui opinião comparativamente mais favorável do que a dos executivos.

Quadro 3.4 Confiança no Congresso

País Confiança no Congresso, média, 1996-2004 (porcentagem) Confiança no Congresso, 2004 (porcentagem)

Efetividade dos órgãos legisladores, 2004-2005 (1 = muito pouco efetivo;

7 = muito efetivo) Chile 36,0 29,7 3,7 Brasil 24,9 34,8 3,1 Uruguai 38,2 30,0 2,7 Colômbia 20,3 24,4 2,7 Honduras 30,8 31,1 2,6 Costa Rica 29,9 35,3 2,2 Paraguai 25,0 19,5 2,2 El Salvador 27,7 21,8 2,1

República Dominicana n.a. 43,6 2,0

México 27,4 23,1 2,0 Panamá 22,5 24,8 1,8 Guatemala 19,9 19,2 1,8 Bolívia 19,9 15,5 1,8 Peru 22,1 14,5 1,7 Equador 13,3 8,3 1,7 Argentina 20,5 20,7 1,6 Nicarágua 23,1 16,1 1,6 Venezuela 27,8 30,6 1,4

n.a.: não se aplica. Como a República Dominicana somente foi incluída na pesquisa de 2004, não há uma média.

Nota: A primeira e segunda colunas mostram a porcentagem média de consultados de 1996 a 2004 e a porcentagem de consultados em 2004, respectivamente, na pesquisa do Latinobarómetro, que declararam ter “bastante” ou “um pouco” de confiança no Congresso. A terceira coluna é a pontuação média dada pelos executivos do setor privado na pesquisa do Fórum Econômico Mundial de 2004-2005 à pergunta “Quão efetivo é o Parlamento/Congresso do seu país como uma instituição legisladora e fiscalizadora?”

Fontes: Latinobarómetro (1996-2004) e Fórum Econômico Mundial (2005).

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Fatores que influenciam o papel da legislatura na formulação

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