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Capacidade de formulação de políticas e o papel do Congresso

No documento BID APolíticadasPolíticasPúblicas (páginas 182-185)

Brasil e Equador diferem substancialmente na capacidade de formulação de políticas de seus Congressos e no papel que eles desempenham no processo de formulação de políticas, ape- sar das importantes semelhanças nas regras eleitorais para o preenchimento das cadeiras do Legislativo.

Brasil

No Brasil, os deputados e senadores são eleitos para um período de quatro e oito anos, res- pectivamente, por meio de um sistema de representação proporcional com lista aberta. Ter uma lista aberta significa que os eleitores podem votar em um candidato individual dentro da lista do partido e ajudar a definir os candidatos que serão eleitos. Esse sistema eleitoral geralmente oferece incentivos para que os legisladores reajam de acordo com as preferên- cias e reivindicações de seu eleitorado, em vez de responder aos desejos dos líderes do parti- do. Não é surpresa que as suas chances de reeleição dependam crucialmente de sua capaci- dade de atender a essas reivindicações.

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Como foi discutido no Capítulo 6, vários desses fatores são determinados conjuntamente. Além disso, esses fatores são endógenos a outros fatores importantes como renda, grau de fracionamento étnico e a estrutura econômica do país, dimensões em que Brasil e Equador diferem de forma signifi- cativa. De acordo com os objetivos deste relatório, a discussão que se segue deixará de lado essas questões e considerará, em vez disso, o papel de instituições políticas e processos de formulação de políticas para a explicação dessas diferenças nos resultados econômicos e políticos.

3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 : Stein e Tommasi (2005). Fonte Br asil (escala de 1-4) Equador (escala de 1-4) Estabilidade Adaptabilidade Coordenação e coerência Índice de políticas Eficiência

Consideração do interesse público Aplicação e implementação

Nota: A linha reta está em um ângulo de 45 graus; os pontos acima dessa linha representam as características em que o Brasil tem uma pontuação mais alta do que o Equador.

FIGURA 7.4 Características-chave das políticas públicas (Brasil e Equador)

(escala de 1–4)

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No Brasil, no entanto, essas forças eleitorais descentralizadoras são compensadas por outras características que levam a uma maior disciplina partidária. Os líderes dos partidos têm o poder de indicar e substituir os membros dos comitês legislativos, que desempe- nham um papel relativamente importante na formulação de políticas públicas. Talvez mais importante ainda, as interações entre o Executivo e os legisladores não ocorrem indi- vidualmente, mas pela mediação dos líderes partidários, que atuam como intermediários nas trocas políticas. Assim, ao controlar o acesso de parlamentares individuais aos benefí- cios que podem vir a afetar as suas chances de reeleição, os líderes partidários podem fazer com que os legisladores votem de acordo com as preferências do partido, o que resulta num grau relativamente alto de disciplina partidária. É por isso que, apesar das regras elei- torais “descentralizadoras”, os partidos políticos no Brasil tendem a ser fortes e coesos dentro da arena legislativa, o que amplia as possibilidades de trocas cooperativas inter-

temporais.23

Vários outros fatores contribuem para a capacidade de formulação de políticas do Con- gresso brasileiro. As taxas de reeleição dos parlamentares são relativamente altas, pelo menos na perspectiva regional. Cerca de 70% dos legisladores da Câmara dos Deputados tentam a reeleição e cerca de 70% dos que concorrem são reeleitos. Desse modo, aproximadamente 50% dos congressistas têm experiência legislativa anterior, o que contribui para o acúmulo de conhecimentos na área de políticas públicas e para um enfoque de prazo mais longo.

A capacidade técnica da legislatura para fins de formulação de políticas é auxiliada tam- bém pela presença de uma grande equipe técnica que oferece apoio legislativo (ver a discus- são sobre os atores do conhecimento no Capítulo 5). Mais de 500 funcionários proporcio- nam auxílio técnico às duas Casas legislativas, a maioria deles especialistas em diferentes áreas de políticas públicas. Eles têm um alto nível de formação, são bem remunerados e ob- têm os cargos por meio de um processo de seleção altamente competitivo. Esses departa- mentos de apoio legislativo, desenvolvidos principalmente durante a década de 1990, aju- daram a melhorar o nível técnico das deliberações no Congresso, além da qualidade das po- líticas que são ali discutidas. Nessa dimensão, o Brasil está na posição mais elevada entre os países da América Latina.

Como resultado desses fatores, o Brasil está bem classificado dentro da região quanto às capacidades de formulação de políticas do Congresso, ficando atrás apenas do Chile. Essas capacidades permitem que o Congresso brasileiro desempenhe um papel construtivo na formulação de políticas, caracterizado por uma relação funcional com o Executivo, apesar do alto nível de fragmentação política. Os mecanismos pelos quais o Executivo consegue manter a coalizão unida e promover a sua agenda de governo são discutidos mais detalhada- mente abaixo.

Equador

No Equador, as regras eleitorais para a legislatura passaram por uma série de mudanças. Até 1997, o país usava um sistema eleitoral misto para o seu Congresso unicameral. Enquanto

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Boa parte da literatura de ciências políticas que trata do Brasil no início da década de 1990 cen- trou-se em como os incentivos derivados do sistema eleitoral e partidário, incluindo o sistema eleito- ral proporcional e de lista aberta, poderiam conduzir a dificuldades para o Executivo na obtenção de aprovação para a sua agenda de governo (Ames 1995, 2001; Mainwaring 1997). Em contraste, uma onda subseqüente de estudos abordou como as regras e estruturas que organizam o processo legislati- vo e o poder do Executivo moldam o comportamento da legislatura e resultam em um processo de to- mada de decisões mais centralizado (Figueiredo e Limongi 2000; Pereira e Mueller 2004).

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os deputados “nacionais” eram eleitos em um único distrito por um período de quatro anos, os deputados “provinciais” (que compunham mais de 80% do total) eram eleitos em distri- tos provinciais com representação proporcional por um período de apenas dois anos. Até 1994, a reeleição imediata era proibida pela constituição. Como resultado, a experiência le- gislativa dos legisladores equatorianos era, de longe, a mais baixa da região. Esses mandatos reduzidos resultavam em legisladores com horizontes curtos, sem capacidade de formula- ção de políticas e sem incentivos para desenvolvê-la.

As eleições intermediárias para deputados provinciais tinham outro inconveniente im- portante. Elas costumavam diminuir ainda mais o tamanho da base de apoio do governo no Legislativo, dificultando a construção de uma coalizão vencedora que permitisse ao presi- dente aprovar a sua agenda de governo. Como exemplo, durante a administração Rodrigo Borja (1988–92), a parcela de cadeiras controladas pelo partido governante, a Izquierda De- mocrática, caiu de 42,3% na primeira metade do mandato para 19,4% depois das eleições intermediárias. Durante a administração Sixto Durán-Ballén, a parcela correspondente ao Partido Unión Republicana caiu de 15,6% para apenas 3,9%. De modo mais geral, o tama- nho da coalizão de apoio ao presidente no Congresso declinava substancialmente ao longo do mandato presidencial, com as eleições de meio de mandato sendo responsáveis por uma porcentagem importante do declínio.

Em anos recentes, as regras eleitorais para o Congresso sofreram uma série de mudan- ças. A proibição de reeleição imediata foi revogada em tempo para a eleição de 1996. O siste- ma eleitoral foi alterado para o uso de listas abertas em 1997. As eleições legislativas no meio do mandato presidencial foram abolidas e o mandato dos deputados provinciais aumentou para quatro anos na reforma constitucional de 1998. Nas eleições de 2002, os deputados fo- ram eleitos apenas nos distritos provinciais. Além disso, as regras para a eleição presidencial também foram alteradas em 1998, numa tentativa de proporcionar ao Executivo uma base de apoio maior no Congresso. Os episódios recentes de interrupções democráticas sugerem que o impacto dessas mudanças foi insuficiente. A base de apoio dos presidentes equatoria- nos no Legislativo continua a ser muito pequena; apenas uma pequena porção dos legisla- dores (cerca de 27%) é reeleita, o que significa que eles ainda tendem a concentrar-se no cur- to prazo e a ter fraca capacidade de formulação de políticas.

Como resultado do apoio escasso no Legislativo, em particular quando se aproxima o fim do mandato presidencial, o Executivo tem recorrido com freqüência ao uso de seus con- sideráveis poderes constitucionais para aprovar a sua agenda de governo. Essas tentativas de passar por cima do Congresso levaram a uma relação bastante antagônica entre o Executivo e o Legislativo, com o presidente muitas vezes tentando legislar por decreto, e o Congresso ameaçando abrir processos contra membros da equipe de governo.

Os papéis contrastantes das legislaturas no Brasil e no Equador refletem-se no grau de êxito do Executivo na aprovação de seus projetos de lei, conforme apresentado no Ca- pítulo 3. Enquanto os presidentes brasileiros têm conseguido aprovar no Congresso 72% de suas iniciativas, os presidentes equatorianos têm obtido sucesso em apenas 42% das

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Embora os presidentes de ambos os países tenham um poder considerável, a natureza desse poder é diferente. O presidente do Brasil tem poderes de decreto muito fortes, mas poderes de veto fracos. O oposto acontece no Equador. Essas diferenças também podem contribuir para explicar as diferentes taxas de êxito.

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