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A ordenação feminina

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A questão da aceitação da ordenação feminina ao pastorado e oficialato da Igreja na IPI deve ser comparada com os fatos semelhantes acontecidos na denominação americana vistos no capítulo anterior.

Em 1934, a IPI passa a ordenar mulheres ao Diaconato (primeira diaconisa, Albina Pires de Campos, da 1a IPI de São Paulo). Almeida relata:

O entusiasmo tomou conta da ala progressista da Igreja que havia resistido durante quase duas décadas ao patrulhamento dos setores conservadores da IPI. Os fiéis da Igreja passaram a ter vez e voz nas páginas de O Estandarte [sob a direção de Leontino], independentemente de sua opção política. A partir de então, a IPI experimentou uma nova fase, com a reinserção do debate político e do diálogo aberto entre os membros da Igreja. Sob nova direção, a IPI passou a tratar de assuntos como, por exemplo, Teologia da Libertação, eleições diretas, participação política, reforma agrária, entre tantos outros, sob outro prisma, além de inserir na pauta de debates a ordenação de mulheres para o cargo de presbítera e de pastora. Aliás, as mulheres passaram a ter mais liberdade na exposição de suas ideias e reflexões no interior da Igreja. A ala conservadora viu-se desafiada, isso porque ela era absolutamente contrária a que mulheres pudessem ser ordenadas presbíteras ou pastoras na IPI. Os reverendos Laudelino de Abreu Alvarenga, Josué Carvalho Ribeiro e Jayme Jorge pronunciaram-se publicamente contra a ordenação de mulheres, enquanto que Leontino Farias e Ezequias dos Santos defendiam que as mulheres ocupassem esse cargo. [...] A questão da ordenação feminina foi incluída definitivamente na pauta da IPI. Infelizmente, apenas em 1999 a IPI garantiu que mulheres pudessem ingressar ao cargo de pastora e presbítera. (ALMEIDA, 2016, p. 88, 89).

E Almeida continua:

Entretanto, a partir do início dos anos 1980, as mulheres da IPI tiveram seus artigos publicados nas colunas do jornal, onde antes era lugar exclusivo de homens, sobretudo reservado a pastores e presbíteros. E passaram também a atuar em posições de relevância no quadro administrativo da Igreja (ALMEIDA, 2016, p. 91).

Por ocasião dos 15 anos da ordenação feminina na IPIB, Stéfano (2013) traçou um histórico dos acontecimentos que levaram à implantação da ordenação de mulheres na IPI, na revista Alvorada, órgão também oficial, ao lado de O Estandarte, na IPI:

Em janeiro de 2014, a IPIB estará comemorando uma data histórica. Há cerca de 15 anos, mais precisamente nos dias 28 e 29/1/1999, uma reunião extraordinária do então Supremo Concílio – hoje Assembleia Geral –, realizada em Campinas, SP, aprovou significativas mudanças na Constituição da denominação. Entre elas, a ordenação feminina para o Ministério da

Palavra e dos Sacramentos. Não foi um processo simples. Foram necessários anos de debate, estudo, superação de questionamentos, críticas e preconceitos. Mas desde que a Reva. Lucilêde Pereira foi ordenada pastora pelo Presbitério Distrito Federal, em maio de 2000, diversas outras mulheres têm seguido o mesmo caminho, tornando-se presbíteras ou pastoras, assumindo Igrejas e trabalhos Brasil afora. Hoje, ver uma mulher no púlpito é algo natural para a grande maioria dos presbiterianos independentes. O que não quer dizer que todas as oposições tenham sido vencidas, pois, apesar do longo caminho já percorrido, ainda falta muito para que homens e mulheres tenham condições iguais para trabalhar na obra de Deus. [...] A ordenação feminina não tem ligação com o feminismo moderno. Porém, é inegável que a sociedade mudou e que as mulheres estão se organizando para ocupar espaços. A Igreja é um deles’, explica a Reva. Shirley Maria dos Santos Proença, pastora ordenada pela IPIB em 2000 e uma das principais articuladoras do movimento pela ordenação feminina a partir dos anos 1980. Mais do que um sinal dos tempos, para ela, o grande motivo da mulher ter adquirido importância e chegado às instâncias decisórias da Igreja é uma melhor concepção teológica: ‘Hoje, temos uma leitura mais contextualizada da Bíblia. Quando Cristo deu dons aos seres humanos, chamando uns para pastores, outros para mestres ou evangelistas, não disse que esses dons eram exclusivos do sexo masculino. Acredito que a ordem de Paulo para a mulher ficar calada tenha sido específica ao contexto de Corinto’. [...] Mulheres vinham estudando teologia desde os anos 40, mas não com o propósito de subir aos púlpitos. Não que a discussão não existisse. Ela conta que o assunto estava em pauta desde o final dos anos 60, mas, com o argumento de que a Igreja não estava preparada para aquilo, era sempre engavetado. A partir da década de 80, com apoio do grupo de jovens e da Sociedade Auxiliadora de Senhoras, o debate foi aberto. Criou-se então o Grupo de Reflexão do Ministério Feminino, fizeram-se debates e artigos foram escritos e publicados em O Estandarte, órgão oficial da IPIB. [...] Nesse tempo todo, a Reva. Shirley ouviu argumentos contrários, críticas e gracinhas. No tempo de faculdade, era comum alguns colegas que não lidavam bem com o tema provocarem: ‘O que uma mulher faz por aqui?” ou

‘Só pode estar procurando marido’. Mas a oposição masculina não era a pior. ‘Havia restrições de homens, mas muito mais de mulheres. Essas foram mais

difíceis de serem superadas. Para tanto, tivemos que conversar muito e realizar vários encontros e debates locais e regionais. Na reunião conciliar, o tema não passou com muita folga, mas encontramos muitos pastores e presbíteros favoráveis à causa’, conta ela. Após ser ordenada, a Reva. Shirley trabalhou primeiro em secretarias do Presbitério Santana. Depois, no Presbitério Bandeirantes, pastoreou a 1ª e a 4ª IPI de Guarulhos, e atualmente presta serviço à Faculdade de Teologia de São Paulo (FATIPI) [...]. Uma lição valiosa e que precisa ser aprendida em todas as Igrejas. ‘Há regiões em que não temos ainda nem presbíteras. Em outras, as mulheres até são ordenadas, mas acabam encaminhadas para Igrejas distantes e cheias de problemas. Onde está o apoio dos presbitérios para resolver isso?’, questiona a Reva. Shirley Proença, mostrando que ainda há uma diferença entre a autorização legal e o reconhecimento prático e de fato do ministério feminino. Afinal, mais do que resultado dos tempos modernos, a ordenação de mulheres ao Ministério da Palavra e dos Sacramentos surgiu como aprimoramento do crescimento e da maturidade espiritual da Igreja, com a finalidade de melhor realizar sua missão. [...] Por outro lado, para evitar possíveis divisões, alguns têm optado por posturas mais conservadoras. Recentemente, a Igreja Anglicana na Inglaterra derrubou a proposta pela qual mulheres poderiam ser ordenadas

episcopisas. Enquanto na Austrália, Nova Zelândia, Canadá e Estados Unidos, mulheres já podem ser ordenadas a cargos mais elevados, no berço da Igreja Reformada, o debate entre reformistas e tradicionalistas permanece intenso’ (STÉFANO, 2013, on-line, grifos nosso).

Ao tomar os trechos grifados acima e consultar o caminho tomado para finalmente ter a questão de ordenação dos indivíduos LGBTs aprovada, segundo o histórico dessa discussão (descrita no capítulo 2 da dissertação), vê-se que a linha de argumentação para se chegar à aquela decisão na PC (USA) é muitíssimo similar ao presenciado na descrição de Stéfano acima.

A diferença mais marcante entre os dois casos é a situação da aceitação de LGBTs na sociedade secular brasileira que é, de fato, muito menor do que naquele país, embora alguns direitos já tenham sido reconhecidos por lei em nosso país117. Seria exagero, levando-se em

conta os dados e datas apresentados na tabela no item anterior, considerar-se que é uma questão de tempo para alcançar resultados correlatos à PC (USA) na IPIB?

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