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TEORIAS E MODELOS DE ORGANIZAÇÃO MILITAR

CAPÍTULO 4 – O ESTUDO DA ORGANIZAÇÃO MILITAR

3. A cultura organizacional no Exército

3.1. A Socialização Organizacional

Numa organização como a militar, o processo de aprendizagem e progressão na carreira é sobretudo um processo de socialização, em que uns têm mais facilidade que outros em se adaptar.

“A socialização organizacional consiste no processo através do qual o indivíduo

adquire os conhecimentos e as perícias necessárias para assumir determinado papel dentro dessa organização e a análise desse processo é feita por observação das mudanças que ocorrem no indivíduo. Este, por sua vez, exerce determinada acção sobre a própria organização, designada por processo de personalização” (Wanuos, 1980:29), cuja

análise se encontra fora do âmbito deste trabalho.

O processo pode ser rápido, conduzido e regulado pelo próprio ou assumir uma natureza mais complexa e demorada, incluindo longos períodos de educação e treino.

Para conhecer determinada organização e agir dentro dela, o indivíduo terá que desenvolver princípios de actuação e formas de interpretação de senso comum, as aceites pela organização.

“O processo fornece ao indivíduo uma visão ordenada do ambiente que lhe serve

mantém com os restantes membros da organização. Quando desenvolvida, essa perspectiva transcende o seu comportamento exclusivamente na organização, influenciando todos os actos da sua vida” (Van Maanen & Shein, 1979:40).

Os motivos de ingresso na carreira das armas podem ser instrumentais, tais como o desejo de vir para a cidade, de ganhar dinheiro ou ter novas experiências.

Como refere Boene “o que essas razões condicionam é a aceitação, pelo

indivíduo, daquilo que é a vida militar (ou o que ele pensa que é). O pretendente ao regime de contrato no Exército predispõe-se, assim, a aceitar o processo de socialização militar, quer porque concorda com ele, quer porque o aceita como um meio justificado pelos fins” (1981:36).

A transmissão dos valores e perícias, a um novo membro da organização, é realizada fundamentalmente pela influência directa de colegas, superiores e subordinados e não por iniciativas figurativas, tipo regulamentos ou imagens publicitárias (estas mais influentes na socialização antecipada, ou seja a que o indivíduo executa na preparação para a entrada na organização).

Também a passagem de determinadas fronteiras dentro da organização, como por exemplo a subida na hierarquia, pressupõe maiores problemas de ansiedade do indivíduo e, portanto, de vulnerabilidade à pressão institucional.

Van Maanen (1985) vem acrescentar as tácticas de socialização organizacional, isto é, os modos através dos quais as experiências (formais ou informais) dos indivíduos, em movimento dentro da organização são estruturadas pelos outros.

As tácticas colectivas versus individuais referem-se ao acto de confrontar o grupo de recém chegados com um conjunto de experiências padronizadas que todos têm de realizar, como, por exemplo, os períodos de educação ou treino na organização.

Os efeitos dos processos colectivos são mais fracos e, sobretudo, mais difíceis de controlar que os individuais, já que nos colectivos a «socialização oficial» é susceptível de se chocar com a «socialização dos colegas», em que

acaba por prevalecer a primeira (numa escola a política anunciada é «estudar», enquanto que os alunos mais velhos defendem a de «divertir»).

Quanto mais formal o processo, maior a pressão da influência sobre atitudes e valores. Na maior parte dos casos, os que utilizam processos formais (sobre as atitudes e perícias gerais), utilizam também processos intermédios, sobre a forma de estágios ou tirocínios, em que a acção se exerce preferencialmente sobre comportamentos específicos, regras é inerente ao papel a desempenhar pelo recém-chegado.

Jones (1986) menciona que os níveis elevados de conflito de papéis estão associados com desempenhos inovadores e que, quanto mais institucionalizado for o processo de socialização, maior é a satisfação no desempenho e menor a intenção de sair da organização.

Reichers (1987) defende a necessidade de analisar os vários subgrupos ou segmentos organizacionais, com os quais o indivíduo é confrontado durante o processo de socialização.

Enoch (1989) conclui sobre o facto de que o processo de socialização regride, no período que se segue ao da educação formal (frequência da Universidade ou Academia), voltando o profissional aos seus valores de origem e a identificação a ser feita relativamente ao grupo de referência, que possuía antes de iniciar o processo.

Aqui também fica patente a necessidade de verificar, no estudo, as eventuais diferenças de atitude de indivíduos que foram sujeitos a uma «praxe» inicial intensa, em relação aos que o não foram, bem como ao papel das colocações profissionais dos recém-saídos do Exército.

Outra perspectiva importante, discutida por Wanuos, examina o que está a montante do processo de socialização e que começa por um processo de escolha da organização, por parte do indivíduo, que pode ser racional ou irracional.

No primeiro caso, o indivíduo procura activamente informação acerca da organização, decidindo em função dela; no segundo caso, o indivíduo persegue

um ideal que o impede de procurar informação relevante e decidir em conformidade.

Neste último caso (irracional), o indivíduo tem mais probabilidades de só depois de entrar na organização se aperceber de eventuais conflitos entre as suas expectativas e capacidades e a realidade da organização.

Assim, ou o conflito origina insatisfação, menor empenho e intenção de saída, ou o indivíduo opta por racionalizar o conflito, para justificar a decisão que tomou.

Existem militares para quem o ingresso na organização resulta de um processo de raciocínio lógico, onde os factores objectivos (salário e benefícios sociais, prestígio, área geográfica de residência, garantias de progressão na carreira) têm mais peso e o processo mais do tipo vocacional, em que o indivíduo persegue um ideal de profissão.

Não sendo mutuamente exclusivos, sugerem determinadas diferenças quanto ao modo como o indivíduo é susceptível de aceitar as imposições ditadas pela organização.

Wanuos apresenta ainda a discussão relativa à adaptação entre o indivíduo e a organização poder constituir fonte de insatisfação com o trabalho e de menor empenho com a organização, se a mesma não consegue satisfazer as necessidades desse indivíduo.

Segundo este autor, a satisfação está directamente relacionada com a intenção de saída e com o trabalho em si, enquanto que o empenho na organização se refere mais à identificação com a organização e a aspectos fora do trabalho propriamente dito.