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CAPÍTULO 1: UNIVERSIDADE E O MUNDO DO TRABALHO: as diferentes

1.1 A CONCEPÇÃO DE TRABALHO NAS TEORIAS LIBERAIS

1.1.3 A teoria do capital humano e a ideia de "capital educacional":

Schultz (1971) introduziu a ideia de "capital educacional", relacionando-o especificamente aos investimentos em educação. Tal ideia foi a base da “Teoria do Capital Humano”, posteriormente desenvolvida por Gary Becker, e inspirou um grande número de trabalhos sobre o desenvolvimento nos anos 1980, motivando investimentos no ensino técnico e vocacional pelas instituições financeiras do Sistema Bretton Woods – como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial.

Schultz (1971) é um dos teóricos do “capital humano”. Na obra, intitulada O Capital Humano: investimentos em Educação são apresentadas, de forma detalhada, as interferências da Teoria do Capital Humano na educação.

O autor analisa o “Investimento em Capital Humano”, onde destaca que muito daquilo a que se dá o nome de consumo constitui investimento em capital humano. Para ele, os gastos diretos com a educação, com a saúde e com a migração interna para a consecução de vantagens, oferecidas por melhores empregos, são exemplos claros.

Para Schultz (1971), os rendimentos auferidos – por destinação prévia, por estudantes amadurecidos que vão à escola e por trabalhadores que se propõem a adquirir um treinamento no local de trabalho – são igualmente exemplos.

Não obstante, em lugar algum, tais fatos entram nos registros contábeis nacionais, pois para Schultz (1971), um investimento dessa espécie é o responsável pela maior parte do impressionante crescimento dos rendimentos reais por trabalhador.

Outro aspecto muito importante, analisado por Schultz (1971), é a recusa dos economistas em considerar o investimento no homem como uma forma de capital e que grande parte do crescimento econômico é advinda do capital humano. Para isso, ele apresenta aquilo que chama de “raio de ação dos investimentos humanos”.

Schultz (1971) defende que para compreender determinadas questões (que são os investimentos humanos? podem ser separados por consumo? pode-se, na verdade, identifica- los e medi-los? e, em que medida contribui para a renda?) faz-se necessário elaborar algumas orientações, onde se diz que o capital humano é a soma dos investimentos do indivíduo em aquisição de conhecimentos (capital este adquirido em sua quase totalidade nas escolas e universidades) e que a qualquer momento se reverte em benefícios econômicos para o próprio indivíduo (por exemplo, na posse de melhores empregos e vantagens na aquisição de novas aprendizagens para o mercado de trabalho). Esse capital, diferentemente do capital econômico, não pode ser roubado ou transferido, vindo a constituir um bem pessoal que acompanha o sujeito durante toda a vida e que, de alguma forma, influencia em sua trajetória social e econômica.

O autor analisa o custo da formação do capital pela educação, onde explicita a sua concepção de educação como mercadoria. Destaca, ainda, a educação, compreendida como “educação escolar” e “educação de grau superior”, explicitando os custos de recursos de educação formal organizada nos Estados Unidos (SCHULTZ, 1971).

Para ele, o fato de se tratar a educação como capital humano nada mais é senão um passo à frente rumo a uma captação consciente de todo o capital. Ou seja, as vantagens em

pensar-se em termos de taxa de rendimento são imperativas, na procura de soluções para o investimento, para a acumulação de capital e para os problemas de crescimento, incluindo-se o problema de uma eficiente adjudicação de fontes de investimento à educação (SCHULTZ, 1971).

Outros aspectos muito importantes dessa obra referem-se à sua análise da taxa de rendimento em destinações de recursos à educação e os rendimentos e custo, provenientes da educação, assim como a sua análise sobre os recursos destinados à Educação Superior.

Vale ressaltar, na visão de Schultz (1971), sustentáculos de uma concepção de universidade subjugada aos interesses do capital. Trata-se de uma instituição que, mesmo financiada pelo fundo público, opera, por meio de seus processos formativos, para a formação e valorização do “capital humano” das empresas e para a ampliação dos seus lucros. Reforça- se, assim, a sua concepção de educação como mercadoria que precisa ser valorizada, a fim de que o mercado possa consumi-la, onde a formação humana ampliada não tem espaço.

Para Schultz (1971), seria conveniente, de bom grado e, não demasiadamente difícil, partir-se vigorosamente para sustentar uma campanha a favor de mais fundos para a educação de nível superior. Segundo o autor, isso faria com que se preparasse o palco para a Educação Superior universal, com a implicação de que se tornaria mais livre para os estudantes e daria mais relevo à necessidade de apoiar uma carga de maior de quantidade e maior qualidade em todos os quadrantes. Dessa forma, parece que haveria razões de sobra para a constituição de mais fundos federais, preferentemente sem o controle público, e para uma utilização pública que haveria de financiar a todo mundo, pelo que se infere numa perspectiva de modelo gerencial, visto que:

[...] A educação é uma forma de capital humano e as três funções capitais da educação superior são: a descoberta de talentos, a instrução e a pesquisa; - parece haver pouco ou nenhum ganho na produtividade mensurada do trabalho que entra na composição da educação superior; - os rendimentos previamente estabelecidos pelos estudantes representam bem mais da metade dos custos reais da formação de capital humano no campo da educação superior; - as projeções em longo prazo da procura de educação superior são obstadas por todas as formas de incertezas; - a partir do ponto de vista de que a educação é um investimento no capital humano, o conceito econômico central em planejá-la e financiá-la deve ser o da taxa de rendimento em relação ao investimento; - a educação altera a distribuição pessoal de renda (SCHULTZ, 1971, p. 95).

Entretanto, Schultz (1971) busca soluções para essa problemática, em duas dimensões: a primeira parte diz respeito aos recursos destinados à Educação Superior, adjudicados de

acordo com a prova da eficiência econômica; a segunda parte diz respeito às dotações que reduzem a desigualdade na distribuição pessoal da renda.

No bojo dessa discussão sobre o Ensino Superior destaca-se, também, a dotação de recursos para a pesquisa. O autor diz que seu plano é considerar os tributos econômicos da pesquisa, a pesquisa não lucrativa sujeita à procura e oferta, alguns enigmas relativos à adjudicação de dotações, as especificações da demanda em relação às atividades da pesquisa e as especificações dessa oferta.

Várias críticas podem ser realizadas com relação ao pensamento de Schultz (1971), indicando que nem sempre a escolarização é devidamente valorizada, além de questionar a possibilidade de todos terem as mesmas oportunidades de investir em sua escolarização.

Schultz (1971) desconsidera a exclusão social como inerente ao capitalismo. O processo de escolarização não dissipou essa marca indelével do capital, que contraditoriamente acabou se beneficiando da abundância de mão de obra qualificada, para desvalorizar e/ou baratear a mão de obra disponível no mercado. Por isso,

[...] A teoria do capital humano serviu de base ideológica para manter as políticas monetaristas e fiscais de garantias para o capital e frações da burguesia brasileira a preço de brutal endividamento externo e de violência e superexploração da classe trabalhadora. (FRIGOTO, 2006, p. 23).

Essa política econômica, por sua vez, produz implicações no posicionamento do Brasil na divisão internacional do trabalho. Essas mudanças exigem, por sua vez, uma reforma da educação em todos os seus níveis, inclusive nos níveis universitários, visando atender a essas prerrogativas.

Passa-se a exigir, da universidade, outra função na dinâmica da sociedade, a fim de dar sustentação ao capital por meio de formação de mão de obra superqualificada, para ser vendida a baixo custo no mercado de trabalho. Trata-se de formar uma sociedade econômica, social e tecnologicamente dependente de outros países produtores de ciência e tecnologia de alto nível, conforme demonstra Frigotto (2006).

A concepção de universidade, fundamentada na Teoria do Capital Humano, possibilita a criação de modelos institucionais, como exemplo, as universidades tecnológicas que atuam no sentido de camuflar os efeitos perversos das teorias liberais como um todo, sustentando que a “certificação” em cursos cada vez mais especializados, segundo a lógica do “mercado de trabalho” superará a crise do emprego. Ou seja, a universidade, segundo essa lógica, constitui-se em mais uma engrenagem no processo de construção do discurso da empregabilidade.