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CAPÍTULO 2: UNIVERSIDADE E TRABALHO: o trabalho e suas relações com

3.2 CONCEPÇÕES DE UNIVERSIDADE E A MATERIALIDADE DE

3.3.3 Universidade tecnológica

Com o intuito de compreender como a concepção de universidade tecnológica materializa-se na realidade das universidades Brasileiras, cita-se, como exemplo, o processo de mudança que enfrentaram no sentido de ofertar educação, ou seja, de constituir-se Instituição de Ensino Superior, assim como o processo de criação da Universidade Federal Tecnológica do Paraná.

Ramos (2006) retoma a discussão de Santos (1995) acerca da articulação entre a função social da universidade e um “projeto de país”, ou melhor, um projeto de nação, considerando que na “transformação da ciência em forças produtivas” tem se buscado o

“valor de troca”, ou o lucro, em detrimento do “valor de uso” em nossa sociedade, sob a égide do capital. Assim, as mudanças no mundo produtivo, determinadas pelo neoliberalismo, revelam um processo de crescimento do setor de serviços, marcado por vínculos empregatícios precários e pela hegemonia do capital financeiro sobre o capital produtivo, ampliado principalmente pelas exorbitantes margens de lucros de bancos públicos e privados no Brasil e no mundo.

Nesse sentido, Ramos (2006) diz que:

[...] Situando a produção industrial como marco da transformação da ciência em força produtiva, cujo desenvolvimento se orientou pela produção de valores de troca e pela geração de lucro mais do que pela produção de valores de uso necessários à vida humana, concluímos que um projeto contra hegemônico implica intensificar a produção de ciência e tecnologia na esfera pública. Condição sine qua non para isso é a existência de espaços institucionais dessa natureza, sustentados pelo fundo público, cujas prioridades se orientem também pelos interesses públicos. (RAMOS, 2006, p. 139).

Entretanto, não é isso que ocorre na sociedade brasileira, que optou por um movimento inverso, pois, sintonizado com as mudanças de um contexto de crise do capital, o Estado Brasileiro tem plasmado a sociedade brasileira por meio de “pseudopolíticas públicas”, que não passam de ajuntamento de projetos, sustentados por um conjunto de legislações desconectadas, acarretando várias mudanças para atender à necessidade e às exigências de produção e reprodução do capital. É o caso, por exemplo, da reforma universitária, reforma agrária, reforma política e previdenciária, que não chegaram a se concretizar, conforme defendiam os trabalhadores.

No caso específico, as reformas implementadas nos CEFET’s, não possibilitaram uma homogeneização dos mesmos. Mas, foi esse processo que gerou condições para que houvesse a criação recente das experiências de Universidade Tecnológica no Brasil, fruto da transformação dos CEFET’s em IFET’s. Ramos (2006) afirma que:

[...] A identidade dessas instituições se fortaleceria por meio de um projeto público que unificaria organicamente a formação de trabalhadores de nível médio e superior para a ciência e tecnologia, tendo como base uma formação integrada e politécnica. A produção de ciência e tecnologia nessas instituições não se resumiria aos processos de adaptação de tecnologias produzidas em países centrais do capitalismo, nem a formação profissional de nível médio e superior teria o propósito de formar pessoas para o trabalho simples, características próprias de países de capitalismo dependente. O projeto que estaria em jogo, de fato, seria um projeto de nação cujo desenvolvimento econômico e social se voltaria não para o mercado, mas contra ele, em benefício da sociedade. (RAMOS, 2006, p. 139-140).

Com o objetivo de compreender como se forjou no Brasil o conceito de Universidade Tecnológica, foi analisado o seu conceito e a legislação respectiva e investigada a história do processo de transformação dos CEFETs em IFETs no Brasil, destacando o caso específico de transformação do CEFET do Paraná em Universidade Federal Tecnológica do Paraná.

O Decreto n. 6.095, de 24 de abril de 2007, “[...] estabelece as diretrizes para o processo de integração de instituições federais de educação tecnológica, para fins de constituição dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia – IFET, no âmbito da Rede Federal de Educação Tecnológica”.

O Capítulo I do referido Decreto, que trata “[...] da reorganização e integração de Instituições Federais de Educação Tecnológica”, estabelece em seu art. 1º que o “[...] Ministério da Educação estimulará o processo de reorganização das Instituições Federais de Educação Profissional e Tecnológica, a fim de que atuem de forma integrada regionalmente”.

No inciso primeiro desse artigo, fica estabelecido que a:

[...] reorganização referida no caput pautar-se-á pelo modelo de Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia – IFET, definido por este Decreto, com natureza jurídica de autarquia, detentores de autonomia administrativa, patrimonial, didático-pedagógica e disciplinar, respeitadas as vinculações nele previstas. (in verbis).

O inciso segundo desse mesmo artigo define a natureza dos IFETs, como:

[...] instituição de educação superior, básica e profissional, pluricurricular e multicampi, especializada na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino, com base na conjugação de conhecimentos técnicos e tecnológicos às suas práticas pedagógicas, nos termos do modelo estabelecido neste Decreto e das respectivas leis de criação. (in verbis).

Esse Decreto prevê, também, como será o processo de integração das Instituições Federais de Educação Profissional e Tecnológica para a formação dos IFETs. Destaca, em seu art. 3º, que:

[...] o processo de integração terá início com a celebração de acordo entre instituições federais de educação profissional e tecnológica, que formalizará a agregação voluntária de Centros Federais de Educação Tecnológica – CEFET, Escolas Técnicas Federais – ETF, Escolas Agrotécnicas Federais – EAF e Escolas Técnicas vinculadas às Universidades Federais, localizados em um mesmo Estado. (in verbis).

Trata-se, portanto, de instituições que devem pautar a elaboração dos seus Planos de Desenvolvimentos Institucionais (PDIs) nas ações a seguir relacionadas, para a sustentação da sua vocação institucional:

[...] I - ofertar educação profissional e tecnológica, em todos os seus níveis e modalidades, formando e qualificando profissionais para os diversos setores da economia, em estreita articulação com os setores produtivos e a sociedade; II - desenvolver a educação profissional e tecnológica, como processo educativo e investigativo de geração e adaptação de soluções técnicas e tecnológicas às demandas sociais e peculiaridades regionais; III - orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação e fortalecimento dos arranjos produtivos locais, identificados com base no mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico no âmbito de atuação do IFET; IV - constituir-se em centro de excelência na oferta do ensino de ciências, em geral, e de ciências aplicadas, em particular, estimulando o desenvolvimento de espírito crítico, voltado à investigação empírica; V - qualificar-se como centro de referência no apoio à oferta do ensino de ciências nas instituições públicas de ensino, oferecendo capacitação técnica e atualização pedagógica aos docentes das redes públicas de ensino; VI - oferecer programas de extensão, dando prioridade à divulgação científica; e VII - estimular a pesquisa aplicada, a produção cultural, o empreendedorismo, o cooperativismo e o desenvolvimento científico e tecnológico. (in verbis).

Dispõe o inciso 2º do art. 4º que:

[...] no plano acadêmico, o projeto de PDI integrado deverá se orientar aos seguintes objetivos: I – ministrar educação profissional técnica de nível médio, prioritariamente em cursos e programas integrados ao ensino regular; II – ministrar cursos de formação inicial e continuada de trabalhadores, objetivando a capacitação, o aperfeiçoamento, a especialização e a atualização de profissionais, em todos os níveis de escolaridade, nas áreas da educação profissional e tecnológica; III – ofertar, no âmbito do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA, cursos e programas de formação inicial e continuada de trabalhadores e de educação profissional e técnica de nível médio; IV – realizar pesquisas aplicadas, estimulando o desenvolvimento de soluções técnicas e tecnológicas, estendendo seus benefícios à comunidade; V – desenvolver atividades de extensão de acordo com os princípios e finalidades da educação profissional e tecnológica, em articulação com o setor produtivo e os segmentos sociais e com ênfase na difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos; VI – estimular e apoiar processos educativos que levem à geração de trabalho e renda, especialmente a partir de processos de autogestão, identificados com os potenciais de desenvolvimento local e regional; VII – ministrar em nível de educação superior42. (in verbis).

Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia constituem-se em Instituições Federais de Educação Profissional e Tecnológica, com estruturas multicampi, com gestão orçamentária e financeira descentralizada. Nesse modelo de organização acadêmica, cada campus corresponderá a uma unidade descentralizada. São consideradas estruturas dotadas de autonomia, nos limites de sua área de atuação territorial, para a criação e extinção de cursos, mediante autorização do colegiado superior competente para a matéria

acadêmica. Isso significa que, para efeito da incidência das disposições que regem a regulação, avaliação e supervisão das instituições e cursos da Educação Superior, os IFETs serão equiparados a universidades e poderão, nos termos da lei, registrar diplomas dos cursos por eles oferecidos.

No art. 10, fica definido que a Administração Superior será atribuída ao Reitor, ao Colégio de Diretores e ao Conselho Superior, no âmbito de suas respectivas competências. Complementa, no art. 11, que a nomeação do Reitor e Vice-Reitor será feita pelo Presidente da República, na forma da legislação aplicável à nomeação de reitores das universidades federais, observadas as disposições deste artigo.

No que se refere à gestão de suas unidades acadêmicas, será prevista a administração dos campi por Diretores-Gerais, nomeados pelo Reitor, após processo de consulta à comunidade do respectivo campus.

Com base nos estudos de Lima Filho e Tavares (2006), foram desenvolvidas as reflexões a seguir. Nesse sentido, pode-se afirmar que, no que se refere ao caso específico do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná, devido a um conjunto de especificidades acadêmicas, essa instituição transformou-se em Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).

A UTFPR foi criada pela Lei n. 11.184, de 07 de outubro de 2005, por meio de um Documento assinado por Luiz Inácio “Lula” da Silva, transformando o Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná, o CEFET-PR, em Universidade Tecnológica Federal do Paraná, a UTFPR.

Essa lei estabelece que:

[...] fica criada a Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR nos termos do parágrafo único do art. 52 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com natureza jurídica de autarquia, mediante a transformação do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná, organizado sob a forma de Centro Federal de Educação Tecnológica pela Lei n. 6.545, de 30 de junho de 1978. (in verbis).

Ou seja, “[...] a UTFPR é vinculada ao Ministério da Educação, tem sede e foro na cidade de Curitiba, Estado do Paraná, e detém autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didático-pedagógica e disciplinar”.

Segundo essa Lei, a UTFPR reger-se-á pelos seguintes princípios:

I– ênfase na formação de recursos humanos, no âmbito da educação tecnológica, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, para os diversos setores da economia, envolvidos nas práticas tecnológicas e na vivência com os problemas reais da sociedade, voltados, notadamente, para o

desenvolvimento socioeconômico local e regional; II – valorização de lideranças, estimulando a promoção social e a formação de cidadãos com espírito crítico e empreendedor; III – vinculação estreita com a tecnologia, destinada à construção da cidadania, da democracia e da vida ativa de criação e produção solidárias; IV – desenvolvimento de cultura que estimule as funções do pensar e do fazer, associando-as às atividades de ensino, pesquisa e extensão; V – integração da geração, disseminação e utilização do conhecimento para estimular o desenvolvimento socioeconômico local e regional; VI – aproximação dos avanços científicos e tecnológicos com o cidadão-trabalhador, para enfrentar a realidade socioeconômica em que se encontra; VII – organização descentralizada mediante a possibilidade de implantação de diversos campi, inserindo-se na realidade regional, oferecendo suas contribuições e serviços resultantes do trabalho de ensino, da pesquisa aplicada e extensão; VIII – articulação e integração verticalizada entre os diferentes níveis e modalidades de ensino e integração horizontal com o setor produtivo e os segmentos sociais, promovendo oportunidades para a educação continuada; IX – organização dinâmica e flexível, com enfoque interdisciplinar, privilegiando o diálogo permanente com a realidade local e regional, sem abdicar dos aprofundamentos científicos e tecnológicos; e, X – maximização quanto ao aproveitamento dos recursos humanos e uso da infraestrutura existente pelos diferentes níveis e modalidades de ensino. (in verbis).

No art. 3º, ficou definido que a UTFPR tem, por finalidade:

[...]I – desenvolver a educação tecnológica, entendida como uma dimensão essencial que ultrapassa as aplicações técnicas, interpretando a tecnologia como processo educativo e investigativo para gerá-la e adaptá-la às peculiaridades regionais; II – aplicar a tecnologia compreendida como ciência do trabalho produtivo e o trabalho como categoria de saber e produção; e III – pesquisar soluções tecnológicas e desenvolver mecanismos de gestão da tecnologia, visando a identificar alternativas inovadoras para resoluções de problemas sociais nos âmbitos local e regional. (in verbis).

No que tange aos objetivos da UTFPR, o art. 4º dispõe o seguinte:

[...] I – ministrar em nível de Educação Superior: (a) cursos de Graduação e Pós-Graduação; b) cursos de licenciatura); II – ministrar cursos técnicos prioritariamente integrados ao ensino médio; III – oferecer educação continuada; IV – realizar pesquisas; e V – desenvolver atividades de extensão. (in verbis).

Essas atividades devem ser desenvolvidas, observando o princípio de indissociabilidade entre o ensino, a pesquisa aplicada e a extensão.

Essa lei estabelece que “[...] os alunos regularmente matriculados nos cursos ora transferidos passam igualmente a integrar o corpo discente da UTFPR”, assim como “[...] ficam redistribuídos para a UTFPR todos os cargos e funções, ocupados e vagos, pertencentes ao Quadro de Pessoal do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná”. Por outro lado,

os “[...] cargos de Diretor e Vice-Diretor do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná ficam transformados nos cargos de Reitor e Vice-Reitor da UTFPR”.

No que tange ao processo de gestão da administração superior da UFTPR, estabelece- se que a administração será exercida pelo Reitor e pelo Conselho Universitário.

O “[...] patrimônio da UTFPR será constituído pelos bens e direitos que integram o patrimônio do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná”.

Os recursos financeiros da UTFPR serão provenientes de:

[...] I – dotações consignadas no Orçamento Geral da União, créditos especiais e transferências e repasses, que lhes forem conferidos; II – auxílios e subvenções que lhes venham a ser feitos ou concedidos pela União, Estados e Municípios ou por quaisquer entidades, públicas ou privadas; III – recursos provenientes de convênios, acordos ou contratos celebrados com entidades e organismos nacionais e internacionais; IV – resultados de operações de crédito e juros bancários, nos termos da lei; V – receitas eventuais a título de retribuição por serviços de qualquer natureza prestados a terceiros; e VI – saldo de exercícios anteriores, observado o disposto na legislação específica. (in verbis).

Para Lima Filho e Tavares (2006), a práxis educacional, pensada e praticada como ato social de reflexão-ação-reflexão é, portanto, um processo mediador de construção social científico, tecnológico, humanista, ético e político, em que se interrelacionam a base cognitiva e a base material da sociedade.

[...] É nesse mesmo quadro de reformas que as instituições da educação técnica e tecnológica vêm passando por profundas transformações, iniciadas em 1996 com a apresentação do Projeto de Lei 1.603, transformado no Decreto 2.208, em 1997. Neste ínterim assistimos ao processo de separação da educação técnica do ensino médio, a extinção dos cursos técnicos integrados, a criação e priorização dos Cursos Superiores de Tecnologia, a transformação das Escolas Técnicas em Centros de Educação Tecnológica e, mais recentemente, a transformação do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (CEFET-PR) em Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), conforme dispõe a Lei no. 11.184, de 07 V.de outubro de 2005 (Anexo ILj/Em discussão nas instâncias 'governamentais encontra- se a criação de novas universidades tecnológicas, compondo perspectivas de um modelo alternativo de educação superior, um anteprojeto de Lei Orgânica da Educação Profissional e Tecnológica - paralelo à reforma universitária em tramitação - e a criação de um Sistema Nacional de Avaliação e Certificação de Competências. Ao lado de todas essas mudanças, quiçá ensejada pelas mesmas, presencia-se uma expansão desmesurada do setor educacional privado em todos os níveis e modalidades. (LIMA FILHO; TAVARES, 2006, p. 10).

Lima Filho e Tavares (2006) destacam que a presente publicação ‘nasce’ desses espaços e movimentos de discussão, de reflexão, de resistência ao empresariamento e à

privatização da educação, e de afirmação e de construção de uma educação verdadeiramente libertadora e transformadora, base de uma sociedade democrática. Concretamente, ‘nasce’ das iniciativas e lutas da Seção Sindical dos Docentes do CEFET-PR, atual UTFPR. Nesse quadro, a SINDOCEFET tem realizado e participado continuadamente, desde os anos de 1990, de discussões e eventos como seminários e congressos locais, regionais e nacionais, cujos resultados têm sido sistematizados em publicações que buscam contribuir para elevar a compreensão e a ação da sociedade e da comunidade educacional frente às reformas em curso e à definição de novas políticas educacionais.

Para Lima Filho e Tavares (2006), no ambiente universitário a preocupação com a comunidade e com suas perdas deve ser permanente. Uma Universidade Pública não é uma pequena escola e também não é empresa privada e nem deve ser “gerenciada” como tal. Entende-se que uma Universidade é muito mais do que isso e a UTFPR pode ser uma grande Universidade, dependente do trabalho de todos e das decisões que forem tomadas.