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A transcrição das comunicações e o auto circunstanciado

O TRATAMENTO JURÍDICO DO MONITORAMENTO DAS COMUNICAÇÕES

1.5. A interceptação das comunicações telefônicas sob a égide da Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996.

1.5.5. A transcrição das comunicações e o auto circunstanciado

Todos os elementos colhidos no curso do monitoramento das comunicações, bem como os registros e dados pertinentes a eles, que interessarem à investigação ou ao processo, deverão ser objeto de um documento denominado auto circunstanciado.

Nos termos do § 2°, do artigo 6º, da Lei de Interceptação Telefônica83, caberá à

autoridade policial encaminhar o resultado da medida ao juiz competente, acompanhada de “auto circunstanciado”.

Nos termos do artigo 14, da Seção VII, (Dos pedidos de Prorrogação de Prazo), da Resolução nº. 59 do Conselho Nacional de Justiça, impõe-se à autoridade policial responsável pela condução da medida, a apresentação em cada período de monitoramento, de mídia,

Peluso, DJe 26.3.2010; HC 83.515/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Nélson Jobim, DJ 4.3.2005; e HC 106.129, Rel. Min. Dias Toffolli, DJe 26.3.2012.” (STF. RE 625263 RG/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, m.v., j. 13/06/2013, pub. DJU de 09/09/2013).

80 Vide tópico 1.6.2.

81 Nos termos do Projeto de Lei nº. 1156/1995, a Emenda nº 04, que alterava o artigo 5º do referido projeto, visava proporcionar um prazo maior à escuta, contudo a Comissão quando da votação do Projeto original, rejeitou a proposta de Emenda, uma vez que entenderam estabelecer um limite à escuta. Possibilitar que ela pudesse ser indefinidamente renovada seria permitir ao poder judiciário imiscuir-se na intimidade das pessoas, o que só se pode admitir por exceção. Se for regra, certamente haverá o óbice inarredável da inconstitucionalidade. 82 Vide tópico 1.6.2.

83 Lei nº. 9296, de 24 de julho de 1996: “Art. 6° Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar a sua realização. [...] § 2° - Cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas.”

contendo a integralidade dos áudios, ou seja, o inteiro teor das comunicações interceptadas, bem como a transcrição das conversas relevantes à investigação.84

Nesse sentido, nos termos da Lei, corroborada pela Resolução 59 do CNJ, o auto circunstanciado conterá a transcrição das conversas relevantes à investigação, além dos demais elementos correlatos à medida, como por exemplo, o registro de dados pertinentes à identificação dos usuários das linhas telefônicas, horário, duração da chamada, entre outros elementos.

Conforme expusemos acima, apesar da previsão do parágrafo segundo do artigo 6º da Lei de Interceptação Telefônica, na prática, o delegado de polícia que conduz o procedimento de monitoramento, ao realizar nova representação, apontará os elementos de fato e de direito que embasam eventual pedido de prorrogação, ou mesmo, a inclusão de novos sistemas de comunicação identificados no curso da investigação, acompanhado do auto circunstanciado, além da respectiva mídia, contendo a integralidade das conversas e mensagens captadas no curso do procedimento de interceptação das comunicações.

Com o advento dos novos sistemas informáticos de monitoramento, o fluxo das comunicações passou a ser gravado e armazenado em meio digital. Essa nova tecnologia propiciou uma maior segurança na manipulação do conteúdo dos áudios e dados produzidos no curso da medida excepcional de monitoramento das comunicações, além de facilitar a própria cadeia de colheita de provas.

Entretanto, mesmo com as facilidades que a tecnologia proporcionou em matéria de autenticidade e segurança na obtenção da integralidade dos elementos produzidos no curso de um monitoramento, ao permitir a gravação e registro desses elementos em meio digital, ainda encontramos opiniões doutrinárias e jurisprudenciais desconexas ao cenário tecnológico contemporâneo.

Os próprios Ministros do Supremo Tribunal Federal apresentam opiniões divergentes em seus votos quanto à necessidade de transcrição integral.

84Resolução 59 do Conselho Nacional de Justiça: “Artigo 14. Quando da formulação de eventual pedido de prorrogação de prazo pela autoridade competente, deverão ser apresentados os áudios (CD/DVD) com o inteiro teor das comunicações interceptadas, as transcrições das conversas relevantes à apreciação do pedido de prorrogação e o relatório circunstanciado das investigações com seu resultado. [...] § 2º. Os documentos acima referidos serão ser entregues pessoalmente pela autoridade responsável pela investigação ou seu representante, expressamente autorizado, ao Magistrado competente ou ao servidor por ele indicado.”

A Ministra Carmen Lúcia, por exemplo, entende pela desnecessidade de se juntar o conteúdo integral das conversas interceptadas, uma vez que se parte das degravações juntadas aos autos, acabam por permitir o embasamento da denúncia e a própria convicção do julgador, não há ofensa ao devido processo legal.85

Em sentido contrário, destacamos o voto do Ministro Marco Aurélio de Mello, cujo entendimento da necessidade da transcrição integral das conversas interceptadas deve ocorrer para atendimento do princípio do devido processo legal.86

Por sua vez, conforme acima relatado, diante da necessidade legal do procedimento cautelar estar embasado com a integralidade, em meio digital, das conversas e mensagens monitoradas no curso de toda a medida, não haverá prejuízo à defesa, uma vez que o juiz competente deverá fornecer à mesma, cópias de todas as mídias produzidas e decorrentes do monitoramento, de modo que não haverá cerceamento.

Os sistemas digitais de gravação e armazenamento permitem a elaboração de relatórios digitais, cujo conteúdo das mensagens de voz e texto são anexados por meio de mídia magnética em conjunto com as transcrições. Por seu turno, os dados referentes às chamadas efetuadas e recebidas, também podem ser discriminados no próprio auto circunstanciado, cujo conteúdo revelará as diligências realizadas no respectivo período quinzenal, nos termos da autorização judicial.

Desse modo, não haverá prejuízo aos investigados ou acusados, cujo acesso às mídias produzidas e juntadas aos autos no curso do procedimento cautelar, propiciará o acesso à integralidade de todas as comunicações monitoradas.

85 Nesse sentido, segue transcrição da Ementa: “HABEAS CORPUS. MEDIDA CAUTELAR. PROCESSUAL PENAL. PEDIDO DE LIMINAR PARA GARANTIR À DEFESA DO PACIENTE O ACESSO À TRANSCRIÇÃO INTEGRAL DAS ESCUTAS TELEFÔNICAS REALIZADAS NO INQUÉRITO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (ART. 5º, INC. LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA): INOCORRÊNCIA: LIMINAR INDEFERIDA. 1. É desnecessária a juntada do conteúdo integral das degravações das escutas telefônicas realizadas nos autos do inquérito no qual são investigados os ora Pacientes, pois bastam que se tenham degravados os excertos necessários ao embasamento da denúncia oferecida, não configurando, essa restrição, ofensa ao princípio do devido processo legal (art. 5º, inc. LV, da Constituição da República). 2. Liminar indeferida.” (STF, HC 91207MC/RJ, Tribunal Pleno, Relª p/ acórdão Minª Cármen Lúcia, j. 11/06/2007, m.v., pub. DJU de 21/09/2007, p. 106).

86 Nesse sentido segue cópia da Ementa da decisão: “Habeas corpus versus recurso - ausência de prejuízo da impetração. O fato de a matéria versada no habeas constar como causa de pedir de apelação não o prejudica. Habeas corpus - objeto. De início, tema veiculado no habeas corpus há de ter sido examinado pelo órgão anterior àquele a quem incumba o julgamento. Prova - interceptação telefônica - fitas - degravação. Consoante dispõe a lei nº 9.296/96, deve-se proceder à degravação de fitas referentes à interceptação telefônica.” (STF. HC 83983/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, m.v., j. 21/05/2008, pub. DJU de 23/05/2008, seção 1, p. 328-341).

Nesse sentido, com o advento das novas tecnologias, dispensa-se a transcrição integral do fluxo das comunicações, ipsis litteris, no papel, de cada palavra falada ou transmitida. É conveniente destacar que, a linguagem falada, em especial, frente aos novos aplicativos e sistemas de comunicação em redes sociais, é completamente diversa, em termos de compreensão e significado, de uma conversa registrada na “letra fria do papel”.

Por sua vez, uma vez encerrado o procedimento, seja pela concretização dos elementos necessários à elucidação do fato criminoso investigado, ou mesmo pela ausência de elementos que demonstrem a necessidade de continuidade da medida de monitoramento, caberá à autoridade policial encaminhar documento ao juiz com suas conclusões em um ou outro sentido.

Conveniente apontar que nos moldes do § 1º, do artigo 14 da Resolução 59 do CNJ87, sempre que possível, de forma a garantir o sigilo da medida, as comunicações e dados

obtidos deverão ser encriptados. Contudo, até o presente momento, não foram definidos pelo Poder Judiciário, nos termos da própria resolução, sistemas de criptografia que permitam o fiel atendimento da referida Resolução.

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