• Nenhum resultado encontrado

GLOBALIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

2.1. Sociedade Globalizada e o crime na era digital

2.2.1. O Choque da Globalização

O fim da Guerra Fria e a queda do Muro de Berlim favoreceram o primeiro grande marco da globalização econômica, financeira e jurídica, dirigida, em princípio, pela expansão do Ocidente. Nenhuma outra civilização causou um impacto tão invasivo sobre o mundo – ou o moldou tanto à sua própria imagem.148

Por sua vez, o grande desafio que permeia o Mundo contemporâneo não é mais a disputa pela hegemonia geopolítica e financeira, mas sim, o desafio pela busca constante por uma nova compreensão gerada pelo feroz e incalculável impacto das novas tecnologias, em especial, pela facilidade e velocidade de propagação do fluxo informacional e comunicacional.

Nesse sentido, os acontecimentos econômicos, sociais, culturais e jurídicos caminham em um cenário de profunda desordem, em um momento de obscurecimento da paisagem, cuja ausência de controle impacta, consideravelmente, no meio social.

Diante desse contexto, oportuna a observação de Anthony Guiddens, cuja obra descreve, com clareza, o novo paradigma que inverteu a ordem do cenário contemporâneo da globalização, uma vez que sentimos cada vez mais a ausência de uma direção unilateral para esse fenômeno da universalização, cujas estruturas atuam no sentido de uma subversão da ordem.149

Contudo, conforme observa Luiz Sérgio Henriques, as complicações do cenário contemporâneo da globalização, recaem sobre pontos nevrálgicos em todos os Continentes, observando que a lógica bipolar também frequenta o lado dominante da globalização, acirrando dramas que reconfiguram para pior, ao menos temporariamente, a “estrutura do mundo”.

148 Ulrich Beck; Anthony Giddens; Scott Lash. Modernização reflexive: política, tradição e estética na ordem social moderna, p. 148.

Os impactos da globalização na sociedade pós-tradicional geraram uma forte ruptura no modelo de um Estado segmentário, transformação essa que foi fortemente influenciada pelo desenvolvimento da comunicação eletrônica global instantânea.150

Conforme aponta Celso Lafer:

O sistema interestatal vê-se igualmente minado pela porosidade das fronteiras, que enseja na era digital o ciberespaço da instantaneidade e da multiplicidade das interações, que internalizam o “externo” na vida cotidiana dos países.151

Miguel Reale desmistifica que a globalização seria fruto de uma hegemonia econômica e militar, mas sim um produto da sociedade da informação152, diante de uma “nova

era”, conforme trecho abaixo transcrito:

[...] a globalização não resulta do poderio militar e mesmo da hegemonia econômica de dado povo, mas, ao contrário, do progresso das ciências positivas. Foram estas que vieram instaurar uma nova era, caracterizada pela universalização das informações graças aos processos eletrônicos de comunicação, como o demonstra a Internet, processos esses que não se referem a um rei ou a um País, mas representam uma compreensão impessoal de todos para todos, em rápido progresso.153

Desde os ataques terroristas aos Estados Unidos em 2001, seguidos nos anos seguintes da invasão americana ao Iraque e ao Afeganistão, irradiou-se para fora do Oriente Médio uma multiplicidade de tensões.

150 Idem, p. 150.

151 Celso Lafer, Um olhar sobre o Mundo Atual, O Estado de São Paulo, pub. 20 dez. de 2015, Espaço Aberto, p. A2.

152 Nesse sentido, Benjamim Silva Rodrigues menciona documento elaborado pela Comissão Europeia, sobre a “A União Europeia e a Sociedade da Informação”: “A Internet está a mudar o mundo em que vivemos. Esta mudança não é menos importante do que a revolução industrial dos séculos XVIII e XIX. Nas últimas duas décadas, as tecnologias da informação e a Internet transformaram o modo como as empresas funcionam, os estudantes estudam, os cientistas realizam trabalhos de investigação e as administrações públicas fornecem serviços aos cidadãos. As tecnologias digitais revelaram-se um poderoso fator de crescimento econômico e competitividade. Nos anos 90, as empresas e os consumidos nos EUA tiraram rapidamente partido desta revolução digital. Assim, as empresas dos EUA tornaram-se muito mais competitivas e a economia deste país teve um crescimento espetacular e sem precedentes.” (in Direito Penal Parte Especial. Tomo I. Direito Penal

Informático – Digital: contributo para a fundamentação da sua autonomia dogmática e científica à luz do novo paradigma de investigação criminal a ciência forense digital e prova digital, p. 527.

Para Roberto Senise Lisboa: “‘Sociedade da informação’, também denominada de ‘sociedade do conhecimento’, é expressão utilizada para identificar o período histórico a partir da preponderância da informação sobre os meios de produção e a distribuição dos bens na sociedade que se estabeleceu a partir da vulgarização das programações de dados utiliza (sic) dos meios de comunicação existentes e dos dados obtidos sobre uma pessoa e\ou objeto, para a realização de atos e negócios jurídicos”. Direito na Sociedade da Informação, p.78.

Em poucos anos, a tensão política disseminou-se para diversos países, agravando a clássica lógica do sistema internacional como sistema interestatal, com suas regras formais e informais, comprometidas por Estados falidos (como Iraque, Líbia e Afeganistão) ou em condição pré-falimentar (como alguns países da África).154

A instabilidade econômica, a questão dos refugiados, o antissemitismo, a xenofobia, os fundamentalistas vêm corroendo a política internacional de direitos humanos, inaugurada com a Declaração Universal de 1948. Por sua vez, uma vasta gama dos excluídos foge dos conflitos religiosos e das guerras civis, sem contar a falta de oportunidades daqueles que compõem a trágica categoria dos deslocados no mundo que padecem com a globalização.

Ulrich Beck, Anthony Giddens, Scott Lash, ao comentarem em sua obra o fenômeno da globalização, a descrevem como um fenômeno que não se limita ao mundo econômico, diante dos grandes interesses capitalistas. Assim sendo, ela, hoje, movimenta-se com a mesma velocidade do fluxo de capitais e acaba por interagir, sistemicamente, sobre o meio social, devido à facilidade proporcionada pelas novas formas de comunicação, a interação das mais diversas culturas e pelo conhecimento imediato dos mais variados acontecimentos da vida política em todo o mundo.155

E acrescentam os autores:

A globalização é uma questão do aqui, que afeta até os aspectos mais íntimos de nossas vidas156 [...]. Na verdade, o que hoje em dia chamamos de

intimidade – e sua importância nas relações pessoais – foi criado em grande parte por influências globalizadoras.157

Benjamin Silva Rodrigues comenta em sua obra as implicações dessa nova dinâmica imposta pela velocidade vertiginosa do caráter evolutivo e expansivo da tecnologia

154 Celso Lafer, ibidem.

155 Beck Ulrich; Anthony Giddens; Scott Lash, op. cit. p. 148.

156 A velocidade vertiginosa do caráter evolutivo e expansivo da tecnologia no nosso ambiente social alterou a realidade física de vivência a que os indivíduos estavam habituados. Enquanto partes integrantes dos eventos reais os indivíduos assistiram ao aparecimento de um paralelismo existencial: mundo real versus mundo virtual. Assim, a par do mundo físico limitado pelas fronteiras geográficas emergiu uma nova concepção do mundo, visto como uma aldeia global que MARSHALL McLUHAN teorizou, descrevendo o efeito que os medias tiveram nas relações de alteridade, ao permitirem um contacto mais rápido e mais íntimo, e ao permitirem a

“retribalização” dos indivíduos. Segundo o Benjamim Silva Rodrigues: “a expressão ‘aldeia global’ foi cunhada na obra de: LEWIS, Percy Wyndham, American and the Cosmic Mano, Nicholson & Watson Ltd., 1948.” (op.cit. p. 117-118).

no nosso ambiente social, cujas implicações resultaram em uma nova maneira de interação humana.158

Complementa, ainda, o autor português:

Enquanto partes integrantes dos eventos reais os indivíduos assistiram ao aparecimento de um paralelismo existencial: mundo real versus mundo virtual. Assim, a par do mundo físico limitado pelas fronteiras geográficas emergiu uma nova concepção do mundo, visto como uma aldeia global que MARSHALL McLUHAN teorizou, descrevendo o efeito que os medias tiveram nas relações de alteridade, ao permitirem um contacto mais rápido e mais íntimo, e ao permitirem a “retribalização” dos indivíduos.159

Outline

Documentos relacionados