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2.2 O PERFIL DO EDUCANDO COM NECESIDADES EDUCACIONAIS

2.2.6 Adaptações física, curricular e material

No tocante aos aspectos pedagógicos, o atendimento aos educandos com deficiência visual em classe comum de ensino deverá preencher, aproximadamente, determinados requisitos em relação tanto aos números de educandos comuns, quanto aos educandos com deficiência visual. Estes também poderão receber atendimento especializado para que lhes seja assegurada uma complementação específica de aprendizagem. Tendo por base as orientações do MEC (BRASIL, 1995, p. 26) e nossas práticas, para uma média de 25 educandos, dois deles poderão ser de educandos cegos. Para uma turma de igual número, podemos contar com, no máximo, quatro educandos com visão subnormal. Vale ressaltar que

este número é aproximado e que vários fatores determinam o número de acesso dessas pessoas em grupos de educandos comuns: espaços físicos, disponibilidade de equipamentos, autonomia dos educadores, características de todos os envolvidos, perfil da disciplina, entre outros.

Segundo a Proposta Curricular para Deficientes Visuais,

enquanto a vida de uma criança normal [comum] se desenvolve, no sentido de incluir um campo de estimulação cada vez maior, a criança cega deve encontrar a própria estimulação dentro do âmbito corporal. Daí em diante ela constitui a maior parte do seu meio ambiente. E encontra em si mesma o que a criança dotada de visão encontra no meio ambiente visualmente objetivo: estímulo e motivação para a ação (BRASIL, 1979a, p. 23).

Desde que se usem os recursos de uma tecnologia pedagógica que atendam devidamente às características da sua limitação física, o educando com deficiência visual pode superar problemas de aprendizagem, pois a sua condição não implica menor capacidade intelectual, nem comprometimento da sua área cognitiva, que o coloque em posição inferior em relação aos educandos videntes. Devemos sempre conceber que estes educandos estão em posição diferente, específica, particular, ou não generalizada.

As adaptações devem ser traçadas em vários sentidos: horizontal, vertical e inclinado. No sentido horizontal, obedecendo ao crescimento progressivo do educando, assim como o conhecimento cumulativo das informações. No sentido vertical, estas adaptações devem vislumbrar, também, outros conhecimentos paralelos e pontuais, e vivências extramusicais que compõem o campo do conhecimento único, imprescindível para a compreensão dos conteúdos musicais ora trabalhados. No sentido inclinado, pontuamos conhecimentos diversificados e não sequenciados aos horizontais e verticais, mas que antecipam, completam ou enriquecem os conhecimentos intrínsecos e extrínsecos à música.

As adaptações físicas devem acontecer desde o acesso dos educandos no portão de entrada da escola ou do local das aulas até o seu acesso à sala de aula, não se esquecendo dos espaços comuns: área de lazer, corredor, sanitário, cantina, diretoria, secretaria e outros. Em sala de aula, esta adaptação deve acontecer de forma sólida, segura e combinada entre os envolvidos, para atender às necessidades de orientação, mobilidade, acessibilidade e do bom andamento do processo educacional.

As adaptações curriculares precisam ser traçadas de forma progressiva, cumulativa, participativa, e também aleatória, sempre abertas às mudanças. Em especial, o currículo de um programa de música inclusivo precisa envolver, obrigatoriamente, vivências, segundo todas as percepções possíveis.

Preferencialmente, as atividades práticas devem anteceder às de caráter teórico. Aquelas serão mais bem apreendidas se fizermos uma conexão com as vivências anteriores de cada educando, sejam musicais ou extramusicais. As adaptações materiais necessitam ser ricas e variadas, no sentido de possibilitarem a apreensão dos conceitos musicais. Estes, por serem abstratos, fazem jus a exemplos que envolvam uma variedade de representações segundo todas as percepções.

Em geral, na prática da educação musical comum, apenas utilizamos os materiais perceptíveis à visão e à audição. Mas, para que todas as pessoas, incluindo aquelas com deficiência visual, possam se envolver mais significativamente com a música, os exemplos musicais e extramusicais, também representados por diversas vias – tátil, gustativa, olfativa, sinestésica e cinestésica –, são de extrema riqueza e eficácia. Devemos utilizar todos os recursos sonoros, livro falado, mapas e cartões táteis, os recursos da informática, seções de degustação e de experimentação olfativa, técnicas de dramatização, criação de materiais didáticos tridimensionais, utilizando objetos alternativos e tantas outras representações que surgirão como ideia e modelo em sala de aula.

Repensando a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência/200677 (vide Decreto 6.949/2009), devemos promover todos os ajustes necessários, coerentes e razoáveis em prol da eficácia do ensino-aprendizagem, conforme o preconizado nas definições (art. 2)

"Ajustamento razoável" significa a modificação necessária e adequada e os ajustes que não acarretem um ônus desproporcional ou indevido, quando necessários em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam desfrutar ou exercitar, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais (BRASIL, 2009).

Ao realizar o curso de Especialização em Educação Especial (1999-2000) e, mais tarde, com os estudos e práticas inclusivas mais apurados, concluímos que, como educadores e defensores do ensino de música no contexto da educação contemporânea, temos a obrigação de conhecer os documentos nacionais e internacionais referentes à inclusão e à preservação dos valores de arte e cultura, assim como as disciplinas específicas do ensino da pessoa com

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A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência adaptada na Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova Iorque, no dia 13 de Dezembro de 2006, foi alvo de intensos trabalhos e negociação por um período de 5 anos, tendo sido aprovada, até à data, por 127 países. Trata-se de um marco histórico, representando um importante instrumento legal no reconhecimento e promoção dos direitos humanos das pessoas com deficiência e na proibição da discriminação contra as estas pessoas em todas as áreas da vida, incluindo ainda previsões específicas no que respeita à reabilitação e habilitação, educação, saúde, acesso à informação, serviços públicos etc.

deficiência visual. Todos estes estudos oferecem suportes para o êxito de ações educacionais, pois ampliam os conhecimentos geral e específicos, ao desenvolver as diferentes percepções e por contribuir para melhor compreensão das ações dos educandos.

Sob esse aspecto, o ensino de música de qualidade no contexto inclusivo se faz presente, assim como a promoção da erradicação da “discriminação por motivo de deficiência”. 78

Não devemos nos esquecer de Boaventura de Souza Santos ao afirmar que “[...] temos o direito a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito a ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades” (SANTOS, 2003, 56).