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2.3 OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA PESQUISA

2.3.5 Quatro pilares da educação para o século XXI

Independente da consciência acerca da necessidade imperiosa de se promover a inclusão social, e da necessidade de estimular as percepções sensoriais e as inteligências múltiplas dos educandos num clima educacional, baseado nas correntes construtivista e sociointeracionista, é imprescindível que não nos esqueçamos do Relatório da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, também mencionada no Capítulo I.

Este relatório afirma que “a educação deve transmitir, de fato, de forma maciça e eficaz, cada vez mais saberes e saber fazer evolutivos, adaptados à civilização cognitiva, pois são as bases das competências do futuro”. Da mesma forma, vislumbra uma educação continuada a ser disponibilizada em qualquer época da vida de uma pessoa, ao afirmar que “é, antes, necessário estar à altura de aproveitar e explorar, do começo ao fim da vida, todas as ocasiões de atualizar, aprofundar e enriquecer [...]” os conhecimentos básicos, adquiridos na infância, e assim, se adaptar constantemente a um mundo em mutação (DELORS, 2004, p. 89).

Em consonância com as nossas práticas educacionais e com os documentos internacionais e nacionais de educação musical, podemos considerar que o ensino de música deve estar disponibilizado em todos os níveis e atender a todas as pessoas, independentemente de suas etapas da vida.

Devemos nos apropriar dos seus quatro pilares (aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser) para a construção de uma proposta educacional contemporânea. A já mencionada Comissão Internacional pensa que cada um destes quatro pilares do conhecimento

[...] deve ser objeto de atenção igual por parte do ensino estruturado, a fim de que a educação apareça como uma experiência global a levar a cabo ao longo de toda a vida, no plano cognitivo como no prático, para o indivíduo enquanto pessoa e membro da sociedade (DELORS, 2004, p.90).

O primeiro pilar, “Aprender a Conhecer”, de caráter intelectual, visa a aquisição de um repertório de saberes codificados e o domínio dos próprios instrumentos do conhecimento, ambos a serem considerados, simultaneamente, como um meio e como uma finalidade da vida

humana. Como meio, significa aprender a compreender o mundo que o rodeia e, como finalidade, significa que o seu fundamento é o prazer de compreender, de conhecer, de descobrir. A Comissão acredita que “o aumento dos saberes, que permite compreender melhor o ambiente sob os seus diversos aspectos, favorece o despertar da curiosidade intelectual, estimula o sentido crítico e permite compreender o real, mediante a aquisição de autonomia na capacidade de discernir” (Ibidem, p. 91).

Transferindo esta aprendizagem para o cerne da escola, em especial, nos níveis médio e superior, “a formação inicial deve fornecer a todos os alunos instrumentos, conceitos e referências resultantes dos avanços das ciências e dos paradigmas do nosso tempo” (ibidem, p. 91). Além do mais, as tendências atuais exigem que o ser humano tenha uma vasta cultura geral e que, ao mesmo tempo, tenha competências para se dedicar com profundidade, em uma determinada área que representa a especificidade do seu campo de conhecimento. “Aprender para conhecer supõe, antes tudo, aprender a aprender, exercitando a atenção, a memória e o pensamento” (p. 92).

O processo de aprendizagem do conhecimento é inacabável e pode enriquecer-se em qualquer tempo, local e ou experiência. Portanto, liga-se cada vez mais à experiência do trabalho, à medida que este se torna menos rotineiro. O primeiro passo da educação pode ser considerado exitoso “se conseguir transmitir às pessoas o impulso e as bases que façam com que continuem a aprender ao longo de toda a vida, no trabalho, mas também fora dele” (p. 92). No nosso caso em particular, o aprender a conhecer é representado, prioritariamente, pelas atividades musicais de Literatura e de Apreciação, em que os conceitos, fatos, eventos, símbolos são trabalhados. Estes devem estar presentes, de forma proporcional, desde o início do processo de aprendizagem. A primeira atividade citada (Literatura) representa fundamentalmente a atividade de apoio ao sentir a música (Apreciação).

O segundo pilar, “Aprender a Fazer”, de caráter físico e motor, visa agir sobre o meio envolvente e está ligado à questão final da formação profissional. Ensinar os educandos a pôr em prática os seus conhecimentos teóricos e orienta-os a adaptar a educação ao trabalho futuro é uma tarefa imprescindível, pois não podemos prever qual será a sua evolução (p. 93). Este aprendizado está mais relacionado aos procedimentos, ou seja, ao conjunto de ações ordenais e finalizadas. Em especial, busca-se a noção de competência combinando a: qualificação adquirida pela formação técnica e profissional; comportamento social; aptidão para o trabalho em equipe; capacidade de iniciativa; e gosto pelo risco (p. 94). Em adição, este pilar diz respeito também à relação, “cuja matéria e técnica devem ser completadas com a aptidão para as relações interpessoais, cultivando as qualidades humanas e a capacidade de

estabelecer relações estáveis e eficazes entre as pessoas” (p. 95).

Concernente ao ensino de música, o Aprender a Fazer é o pilar que faz a diferença, pois, musicalmente falando, representa: o saber criar um instrumento; saber cantar e tocar algum instrumento; ou o saber criar alguma obra musical e apresentá-la. Portanto, este pilar está intimamente ligado às atividades musicais de Técnica, Criação e Execução.

O terceiro pilar, “Aprender a Viver Junto”, de caráter socioeducacional, representa o aprender a participar e cooperar ativamente com os outros em todas as atividades humanas. Há cem anos, no clima da primeira guerra mundial, Maria Montessori já tinha sugerido uma espécie de educação que envolvesse o amor entre as pessoas, em favor da paz mundial. Delors et al. (2004, p. 96-97) apresentam uma interrogação desafiadora: “poderemos conceber uma educação capaz de evitar os conflitos, ou de resolvê-los de maneira pacífica, desenvolvendo o conhecimento dos outros, das suas culturas, da sua espiritualidade?” Neste sentido, os autores sugerem que a educação deve utilizar duas vias complementares: a via da descoberta progressiva do outro e a via da participação, ao longo de toda a vida, em projetos comuns, que parece ser um método eficaz para evitar ou resolver conflitos latentes (DELORS et al., 2004, p. 97).

Refletindo musicalmente, este pilar apresenta de forma enfática a necessidade de ações educacionais partindo do individual para o coletivo, envolvendo conhecimentos musicais do contexto social do educando, assim como dos outros contextos do mundo. Por consonância, na atividade de performance solo e em conjunto, de participação coletiva em eventos musicais criativos e sociais. Como sugestão, compreendemos que todas as atividades musicais CLATEC são condizentes com o perfil deste pilar, desde que sejam repensadas, estruturadas e aplicadas de forma contextualizada, também mediante técnicas de ensino que visam o trabalho coletivo com todos os seus pré-requisitos pertinentes. Mesmo assim, enfatizamos duas delas: Técnica e Criação.

Por fim, o quarto pilar, “Aprender a Ser”, de caráter psicológico e ontológico, comunga todos os três pilares já abordados. Um dos princípios fundamentais da Comissão é que “[...] a educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa – espírito e corpo, inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoa, espiritualidade”. É importante desenvolver sensibilidade, sentido ético e estético, responsabilidade pessoal, pensamento autônomo e crítico, imaginação, criatividade, iniciativa e crescimento integral da pessoa em relação à inteligência. A aprendizagem precisa ser integral, não negligenciando nenhuma das potencialidades de cada indivíduo. Neste sentido, todos nós devemos estar preparados para elaborarmos pensamentos autônomos e críticos e para formularmos os nossos

próprios juízos de valor, de modo a poder decidir, por si, como agir nas diferentes circunstâncias da vida (DELORS, 2004, p. 99). E, este preparo deve ocorrer, por excelência, no ambiente escolar durante a juventude.

Em sintonia com esta comissão é conveniente oferecer às crianças e aos adolescentes, todas as ocasiões possíveis de descoberta e de experimentação, sejam elas – estética, artística, desportiva, científica, cultural e social, desde que “[...] venham completar a apresentação atraente daquilo que, nestes domínios, foram capazes de criar as gerações que os precederam ou suas contemporâneas” (DELORS, 2004, p.100).

Se “na escola, a arte e a poesia deveriam ocupar um lugar mais importante do que aquele que lhes é concedido [...]” assim como “a preocupação em desenvolver a imaginação e a criatividade deveria, também, valorizar a cultura oral e os conhecimentos retirados da experiência da criança ou do adulto” (DELORS, 2004, p.100). Em especial, no nosso caminho de ensino de música, sugerimos que este quarto pilar, esteja intimamente ligado às atividades ou parâmetros de Criação e Execução.

Em uníssono aos documentos internacionais e nacional da ISME, FLADEM e ABEM, referentes à educação musical, observa-se que

o desenvolvimento tem por objeto a realização completa do homem, em toda a sua riqueza e na complexidade das suas expressões e dos seus compromissos: indivíduo, membro de uma família e de uma coletividade, cidadão e produtor, inventor de técnicas e criador de sonhos. Este desenvolvimento do ser humano, que se desenrola desde o nascimento até à morte, é um processo dialético que começa pelo conhecimento de em si mesmo para se abrir, em seguida à relação como o outro (DELORS et al., 2004, p.101).

Como consideração final deste capítulo, registramos nossas contribuições no sentido de fincar os fundamentados do nosso trabalho quanto a: conceitos de inclusão segundo os documentos internacionais e nacionais de caráter social e educacional; perfil das pessoas com necessidades específicas, focalizando as pessoas cegas e suas disciplinas afins.

Em sequência, abordamos o nosso conceito final de inclusão social e educacional, a necessidade e presença das percepções sensoriais na Abordagem Musical CLATEC, os caminhos das inteligências múltiplas, seguido das duas correntes educacionais (construtivista e sociointeracionista). Por fim, apresentamos os quatro pilares da educação do século XXI. Temos a certeza de que estas fundamentações muito contribuíram para o processo de construção da Abordagem Musical CLATEC que será apresentada a posteriori.

3 MÉTODOS E TÉCNICAS DE ENSINO DE MÚSICA

Por não termos encontrado abordagens do ensino de música, específicas para as pessoas com deficiência visual que possam nos servir de referência, optamos por pesquisar e apresentar, neste capítulo os princípios básicos de alguns educadores musicais do século XX que nos foram mais relevantes. Em seguida, mencionaremos as orientações nacionais do ensino de música referente à Educação Básica, pontuando os seus três níveis de escolaridade – Educação Infantil, Ensino Fundamental (1º. e 2º. / 3º. e 4º. Ciclos) e Ensino Médio. Finalmente, faremos as conclusões parciais, traçando os caminhos contemporâneos da nossa Abordagem em consolidação.