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Alcances e Desafios para a viabilização das ZEIS 3 pelo novo Plano Diretor

O novo Plano Diretor de São Paulo trouxe avanços signiicativos para a viabilização de moradia para as famílias de baixa renda: ampliou de 964 para 2.542 o número total de perímetros de ZEIS e de 145 para 478 os perímetros de ZEIS 3, destinados quase que exclusivamente para famílias com renda de até 3 s.m. e, o mais importante, criou mecanismos que permitem a criação de um banco de terras para a produção de (HIS), através da Cota de Solidariedade, dos recursos advindos das Operações Urbanas Consorciadas e da destinação dos recursos do FUNDURB. O estabelecimento de mecanismos para fomentar a criação de um estoque fundiário para a produção habitacional é um dos maiores avanços da proposta do Novo Plano Diretor, já que eles permitem enfrentar uma das maiores diiculdades da gestão habitacional, que é adquirir terra bem localizada, e por isso altamente valorizadas, para a construção de moradia. Mas, na prática, como garantir a produção de habitação de interesse social nas ZEIS?

As áreas demarcadas como ZEIS se destinam a garantir a permanência da população de baixa renda em seus locais de origem e a reservar porções de terra por todo o perímetro urbano para a produção de habitação social, sobretudo nas áreas centrais, onde o preço da terra inviabiliza o acesso à moradia para a população mais pobre. Contudo, durante os dez anos de implementação das ZEIS pelo PD de 2002, a produção de habitação social em áreas bem localizadas somente beneiciou as famílias com renda inferior a 3 s.m. quando esteve associada a programas habitacionais públicos, porém produzidos em pequena escala. Já o mercado privado, que foi responsável pela produção de empreendimentos combi- nados de HIS e HMP em ZEIS, limitou o atendimento para as famílias com renda entre 5 s.m. e 6 s.m. já que não havia um percentual obrigatório para atender as famílias de rendas mais baixas.

Com o novo Plano Diretor, foram criadas duas faixas de renda de interesse social: HIS 1 (0 s.m. a 3 s.m.) e HIS 2 (3 s.m. a 6 s.m.) e priorizadas no mínimo 60% da produção habitacional (em ZEIS 1, 2, 3 e 4) para HIS 1, a im de garantir o atendimento habitacional para os mais pobres, que são majo- ritariamente os que habitam os perímetros de ZEIS e o maior percentual do déicit habitacional. Em relação ao mercado privado, a criação da ZEIS 5 com foco na produção de HMP conseguiu atender a demanda dos incorporadores privados que já atuavam no ramo do mercado de renda média e, de certa forma, contribuíam com o processo de urbanização das áreas centrais. Em uma nova entrevis- ta realizada após a aprovação do novo Plano Diretor com a Engelux Engenharia, Mário Lambertti Junior airmou que, apesar da produção em ZEIS 3 ter se inviabilizado para a produção privada, a ZEIS 5 conseguiria atender as incorporadoras com ainda mais vantagens, já que os 20% de áreas não residenciais, a chamada “faixa livre”, entra como área não computável, o que faz com que, na conta inal, o coeiciente de aproveitamento passe de 4 para 4.8, possibilitando um número maior de área construída e, por consequência, de rentabilidade do empreendimento. A demarcação das ZEIS 5 também foram consideradas bem razoáveis, com estoque suiciente para atender a demanda existen- te, fazendo com que o nicho de mercado de empresas como a Engelux continue sendo incentivado, porém mantendo as demais ZEIS como prioritárias para as rendas mais baixas.

Ainda assim a camada mais vulnerável da população, com renda inferior a 1 s.m., pode não ser con- templada no atendimento habitacional caso a gestão pública não assuma este comprometimento, já que não há um percentual mínimo destinado a ela nos perímetros de ZEIS. Este foi um debate corrente durante a revisão do PD que icou de fora da proposta pela diiculdade em se mensurar esta

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demanda. Trata-se de uma população que vive no cortiço, na favela, na rua e está no limite da infor-malidade. Esta demanda exige uma política habitacional especíica que não a do inanciamento ha- bitacional com transferência da propriedade, a im de que seja revertida sua condição de abandono. Considerando que a efetividade da produção de HIS em ZEIS para as faixas de menor renda não se concretizou nos últimos dez anos, e que a revisão do Plano Diretor buscou unir esforços para tal , focando a atribuição do poder público neste processo, ica a dúvida se a aplicação dos recursos con- forme proposto pelo Plano aprovado virá responder a esta nova expectativa. Se foi feito um grande esforço em demarcar novos perímetros de ZEIS 3 em áreas ociosas, subutilizadas ou ocupadas por habitação precária com potencial para a produção de HIS, deveriam estar previstos recursos para a aquisição destas terras e sua produção. Os recursos da Cota de Solidariedade e das Operações Urba- nas não estão priorizados para serem aplicados em áreas de ZEIS. Já os recursos do FUNDURB são destinados para aquisição de terras “preferencialmente em ZEIS 3”, mas não obrigatoriamente. Os instrumentos indutores da função social da propriedade estão indicados para serem aplicados em ZEIS 2, 3 e 5, e também em sete outras localidades, como no perímetro da Operação Urbana Centro, áreas de inluência dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana, OUCs e seus perímetros expandidos, etc., conforme descrito no Artigo 91 do PD aprovado.

Segundo o relator do Plano Diretor, Nabil Bonduki, viabilizar terrenos fora de ZEIS ampliaria ainda mais o estoque de terras, já que os terrenos já demarcados como ZEIS, mais baratos, seriam adquiri- dos com maior facilidade por outros instrumentos. Contudo, caso não haja iniciativa pública na pro- dução habitacional em ZEIS, estas terras gravadas podem icar congeladas e ociosas. Teoricamente não seria algo necessariamente ruim, considerando que estas áreas estariam ainda “guardadas” para uma futura produção de HIS. O agravante está em se tratar de áreas com predominância de cortiços e com população em situação precária de moradia, pois esta população continuará sem perspectiva de melhorias nas suas condições habitacionais. Considerando estes aspectos, não deveria haver um maior direcionamento na aquisição destas áreas aos perímetros de ZEIS?

Ainda assim, para a viabilização de terrenos, mesmo que não exclusivamente em ZEIS, temos uma maior oferta de fontes: a Cota de Solidariedade, as Operações Urbanas, o FUNDURB e os próprios instrumentos indutores do uso social da propriedade, como o PEUC, IPTU progressivo e Desapro- priação com Títulos da Dívida Pública, que foram detalhados no Artigo 96, 97, 98 e 99 do PD, tor- nando-se auto-aplicáveis, com deinição dos prazos e sanções cabíveis. No entanto, não há reserva de recursos especiicamente para a produção de novas unidades ou reforma, sobretudo em área de ZEIS, sejam elas para compra ou locação. Ainda que os recursos do FUNDURB, Cota de Solidariedade e Operações Urbanas possam ser destinados para a produção habitacional, sua destinação prioritária no novo Plano Diretor é a aquisição de terras. Uma das justiicativas que se coloca é a necessidade prioritária de se resolver a questão fundiária, já que a produção habitacional pode ser equacionada por outras fontes de inanciamento, como o PMCMV, que tem no preço da terra o maior empeci- lho para a produção de moradia bem localizada, e com um banco de terras este entrave seria então superado. Contudo, há de se buscar inanciamentos não apenas para a aquisição da moradia via transferência da propriedade, ou estaríamos novamente concebendo uma política habitacional de mão única, onde a única modalidade de moradia possível é o inanciamento habitacional, que coloca as unidades à disposição do mercado, podendo ser revendidas e repassadas para famílias de maior faixa de renda. Esta modalidade também se mostra insustentável para as camadas mais vulneráveis da população com diiculdades em atender aos requisitos do inanciamento, arcar com as despesas condominiais e com os novos custos de uma moradia formal ou cuja dinâmica do trabalho exige a mobilidade residencial. Há de se considerar ainda a instabilidade deste modelo em longo prazo, cujas alterações na condição econômica e política podem comprometer a liberação de subsídios e não ga- rantir a segurança da posse dos moradores.

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Uma alternativa possível e prevista pelo novo Plano Diretor para atender a população mais vulnerá- vel e romper a lógica de mão única da “casa própria” é a implantação do Serviço de Moradia Social previsto nos Artigos 295 e 296, que objetiva o atendimento dessas famílias através da locação social ou utilizando instrumentos que garantam a segurança da posse. Essa nova modalidade aperfeiçoaria e daria seguimento ao Programa Locação Social criado em 2002 (analisado com detalhes no Capí- tulo 3), cuja gestão administrativa empregada e a ausência do trabalho social não possibilitaram o alcance dos objetivos esperados, mas que é uma das alternativas possíveis para atender a população que não consegue arcar com os custos do inanciamento habitacional, com as despesas condominiais e está mais vulnerável à expulsão em decorrência dos processos de valorização imobiliária. Contudo, embora a implantação deste programa também seja beneiciada com o estoque fundiário a ser for- mado pela nova proposta de destinação dos recursos, o novo PD prevê a implantação do Serviço de Moradia Social através de “[...] recursos oriundos do Fundo Municipal de Habitação ou por inter- médio de transferências intergovernamentais, entre outras” (PMSP, 2014), que de certa forma amplia o leque de opções de inanciamento, mas não regula nenhum percentual especíico de nenhuma das fontes de recursos. Há de se aguardar a regulamentação do programa, estipulada para o prazo de doze meses da aprovação da lei do Plano Diretor, para que este atendimento possa ser dimensionado adequadamente.

Considerando a inviabilidade do mercado privado em produzir habitação para as faixas de menor renda em áreas bem localizadas, o novo PD reforça o papel do poder público como promotor de HIS nos perímetros de ZEIS, sobretudo ZEIS 2 e 3, revertendo a lógica do PDE 2002, que focou a responsabilidade desta produção pelo mercado privado. Resta-nos entender de que forma e com que programas habitacionais as ZEIS cumprirão o seu papel como instrumento de democratização do acesso à terra. A gestão municipal precisará estar comprometida com a aquisição das áreas demar- cadas como ZEIS e com a aplicação dos recursos para uma produção habitacional de interesse social que não esteja apenas vinculada aos inanciamentos habitacionais, mas também à criação de um parque público que promova o acesso à moradia sem transferência de propriedade e que garanta a permanência dos mais pobres em áreas de valorização imobiliária.

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A ZEIS 3 C 016 (SÉ) INSERIDA NO

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