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Nova Luz na gestão Serra: das ‘mega-operações’ de Andrea Matarazzo à Lei de Incentivos Seletivos

Uma nova estratégia de intervenção para o centro: Projeto Nova Luz via

2.1.1 Nova Luz na gestão Serra: das ‘mega-operações’ de Andrea Matarazzo à Lei de Incentivos Seletivos

Após uma série de iniciativas dos governos municipais e estaduais sobre a região da Luz, a prefeitura municipal anuncia o Projeto Nova Luz, mais precisamente sobre algumas dezenas de quadras do distrito de Santa Iigênia, em área vizinha às intervenções culturais fomentadas nas décadas de 1980 e 1990 e início dos anos 2000.2

O Projeto Nova Luz foi iniciado na gestão do prefeito José Serra, eleito pelo Partido da Social Demo- cracia Brasileira (PSDB), após ter derrotado a então prefeita Marta Suplicy, do Partido dos Trabalha- dores (PT). Serra iniciou seu mandato em 2005 com uma série de vistorias sistemáticas na área da Luz, coordenadas pelo então subprefeito da Sé, Andrea Matarazzo em conjunto com as secretarias municipais de Assistência e Desenvolvimento Social, Polícia Militar, Polícia Civil e Guarda Civil Me- tropolitana, além do apoio da CET e de concessionárias como Sabesp e Eletropaulo para combate aos furtos de água e energia. As chamadas “megaoperações” culminaram no fechamento de vários estabelecimentos comerciais com funcionamento irregular, entre eles bares, hotéis e depósitos, as- sim como abordagens policiais que resultaram em prisões, apreensões de drogas e armas, e crianças reconduzidas às suas famílias pela Secretaria de Assistência Social. A ideia era eliminar o estigma da “cracolândia”, que teoricamente seria o responsável pela baixa atratividade da área, e atrair empresas para a região, construindo para isto o cenário de uma governança forte e presente.

Em setembro de 2005, o Decreto 46.291 declarou de utilidade pública para ins de desapropriação imóveis particulares em um perímetro de 105 mil m² no distrito de Santa Iigênia. O decreto apon- tava como inalidade um plano de urbanização a ser desenvolvido com parte dos recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e parte de recursos dos cofres municipais, cujo conteú- do era desconhecido pela sociedade. Em outubro de 2005 a prefeitura iniciou um chamamento de interessados em investir na região que resultou no cadastramento de 23 empresas e na aprovação do Programa de Incentivos Seletivos, lançado em dezembro do mesmo ano com o objetivo de “[...] promover e fomentar o desenvolvimento adequado da área compreendida pelo perímetro iniciado na intersecção da Avenida Rio Branco com a Avenida Duque de Caxias, seguindo pela Avenida Du- que de Caxias, Rua Mauá, Avenida Cásper Líbero, Avenida Ipiranga e Avenida Rio Branco” (PMSP, Lei 14.096/05). A legislação garantia a concessão de dois tipos de incentivos iscais: descontos de até 50% em impostos incidentes sobre imóveis, tais como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis (ITBI-IV); e descontos de 60% sobre o Imposto Sobre Serviços (ISS).

Em março de 2006, Serra renuncia ao cargo de prefeito para se candidatar às eleições do governo do Estado de São Paulo e o vice-prefeito, Gilberto Kassab, do Partido Democrata (DEM), assume a prefeitura e encabeça com força total o Projeto Nova Luz, que passou a ser a “menina dos olhos” da sua gestão.

2 Sobre os projetos recentes para a área da Luz, ver: Políticas Culturais e Negócios Urbanos: A instrumentalização da cul- tura na revitalização do centro de São Paulo (1975-2000), de Beatriz Kara José (2007).

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2.1.2 Nova Luz na era Kassab

O prefeito Gilberto Kassab iniciou sua gestão com uma sucessão de medidas para encaminhamento do Projeto Nova Luz concentradas, sobretudo na demolição de áreas degradadas e subutilizadas que deveriam ceder lugar à instalação de prédios públicos e empresas privadas. Em 26 de outubro de 2007 acontece a primeira demolição do Projeto Nova Luz. Gilberto Kassab, em pé sobre os escombros do terreno na Rua General Couto de Magalhães, nº 444, que daria lugar à sede da Guarda Civil Metro- politana, anuncia “[...] a construção de uma nova cidade em torno da Estação da Luz” (Portal G1, 17 de Maio de 2007)3. As demolições foram iniciadas no quadrilátero das ruas Mauá, General Couto

de Magalhães, Gusmões e Protestantes. Em menos de um mês, 55 imóveis já haviam sido demolidos. Em meio ao processo de demolições, que atingiria não somente imóveis vazios, mas cortiços e o desa- lojamento de dezenas de famílias que viviam em condições precárias de moradia (do qual falaremos com detalhe adiante), a Prefeitura ampliou a área de utilidade pública de 105 para 269 mil m² e man-

3 Disponível em: <http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL38167-5605,00-KASSAB+DUPLICA+AREA+PARA+- DESAPROPRIACAO+NA+CRACOLANDIA.html>

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Lei de Incentivos Nº 14.096/2005

Decreto de Utilidade Pública Nº 46.291/2005 Perímetro da ZEIS 3C 016 (Sé)

Mapa 2.01: Perímetros das regulamentações incidentes sobre o perímetro original do Projeto Nova Luz. Fonte: Rovena Negreiros, EMURB. Elaboração própria. Base cartográfica: Mapa Digital da Cidade, 2004.

Figuras 2.06 e 2.07: Demolições no perímetro do Projeto Nova Luz Crédito: Camila de Oliveira

teve o cadastramento de empresas interessadas em investir na região. Entre um total de 72 empresas, grandes construtoras como Tecnisa e Gaisa, e empresas de telecomunicações como Telefônica e IBM Brasil, se mostraram interessadas em se instalar na área. Esse interesse culminou no desenvolvimen- to de dois projetos: o do arquiteto Marcos Lupion, a pedido da Construtora Odebrecht e o projeto realizado por Jaime Lerner, a pedido do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Admi- nistração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo (SECOVI-SP). Os dois projetos viriam se agregar ao projeto elaborado pela Empresa Municipal de Urbanização (EMURB), que previa um gasto em torno de 97 milhões de reais com obras públicas, incluindo as desapropriações, projetos e execução de obras, e as áreas destinadas às futuras sedes da Companhia de Processamento de Dados do Município de São Paulo (PRODAM), da Subprefeitura da Sé e da ETEC.4

As notícias sobre as diiculdades com os processos de desapropriações começaram a aparecer na im- prensa em meados de 2007. A Odebrecht apontou diiculdades com as aquisições de áreas da Santa Iigênia devido à estrutura fragmentada do território e a necessidade de negociações com múltiplos proprietários. O Jornal Estado de São Paulo publicou a declaração de Kassab sobre as demoras no processo:

O prefeito Gilberto Kassab (DEM) reconheceu ontem que as desapropriações na região da Cracolândia, centro de São Paulo, estão demoradas. ‘O que existe é uma morosidade compreensível dentro do pro- cesso democrático. As pessoas têm o direito de questionar o valor das desapropriações, têm o direito de negociá-lo’, airmou. (O Estado de São Paulo, Cidades, C6, 15 de setembro de 2007)

A EMURB também indicou incertezas sobre as desapropriações devido ao grande número de imó- veis irregulares, abandonados e tombados, o que tornava o processo de desapropriações demorado e complexo, introduzindo a possibilidade de inserir o empreendedor privado nas negociações.

4 Informação coletada na apresentação de Rovena Negreiros, então superintendente da EMURB, aos alunos de pós-gra- duação da FAU USP em junho de 2008.

Rua Sant a Ifig ênia Av Casper Líber o Av Duque de Caxias Rua Mauá Av Rio Br anc o Av São Jo ão 0 100 200 300 m N

106 107 Mapa 2.02: Primeiras quadras a serem demolidas para a instalação de equipamentos públicos no perímetro original do

Projeto Nova Luz.

Fonte: Rovena Negreiros, EMURB. Elaboração própria. Base cartográfica: Mapa Digital da Cidade, 2004.

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