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Análise de conteúdo das entrevistas utilização do programa Atlas.ti.

Capítulo III: Metodologia do Estudo

3.2 Fases do estudo e metodologia.

3.2.2 Fase de aprofundamento: quatro entrevistas biográficas 1 Seleção da amostra.

3.2.2.4 Análise de conteúdo das entrevistas utilização do programa Atlas.ti.

Antes de iniciar a análise de conteúdo propriamente dita, e após se proceder à conversão dos documentos do formato Word para o formato Rich Text Format (RTF) criou-se para cada entrevista uma unidade hermenêutica, uma vez que à partida pretendíamos conhecer os percursos individuais de cada interveniente. No âmbito do

programa Atlas.ti73, cada unidade hermenêutica contém para além do protocolo de entrevista e de outros documentos sobre as práticas (fotografias, planos de aulas e projetos) todas as categorias, sub – categorias, anotações e redes conceptuais construídas ao longo do processo de análise.

Dado que a socialização profissional dos professores de educação especial constitui um tema recente na investigação, tivemos como preocupação central a análise aprofundada e reflexiva de cada entrevista de forma a viabilizar, numa posterior análise conjunta, a identificação das categorias com maior densidade na narrativa e a criação de hipóteses ou de ideias que permitissem compreender o fenómeno em causa.

Tal preocupação vai ao encontro dos pressupostos de que uma “grounded theory”, isto é, aquela que “deriva indutivamente do estudo do fenómeno que representa” (Strauss e Corbin, 2008:23), o que significa que as hipóteses de investigação decorrem da análise dos dados, não sendo, portanto, formuladas a priori.

Importa notar que este programa para além de disponibilizar informação sobre a frequência de cada categoria, (o que constitui uma dimensão habitualmente considerada na análise de conteúdo), faculta também informação sobre a respetiva densidade, referindo-se esta dimensão ao número de relações de dada categoria com outras ao longo da narrativa. E, uma vez que a densidade elevada significa que a categoria em causa apresenta um alto grau de densidade teórica, o investigador pode estabelecer hipóteses explicativas dos fenómenos que estuda, considerando as categorias que apresentam essa maior densidade.

Estas virtualidades do programa constituem em nosso entender uma mais-valia significativa em relação à análise de conteúdo tradicional, sobretudo em questões face às quais o conhecimento existente é escasso, como é o caso da socialização profissional dos professores de educação especial.

No programa em análise, a interpretação dos dados envolve diversos procedimentos de tratamento do texto, os quais são habitualmente designados por três tipos de codificação: aberta, axial e seletiva (Fernandes e Maia, 2001; Flick,2005). Estes procedimentos constituem diferentes maneiras de tratar o material textual, entre os quais o investigador se move e que combina quando necessário.

73 Flick (2005, p, 261) refere que este programa foi desenvolvido por Muhr (1991,1994) num projeto de pesquisa da

Universidade Técnica de Berlim e que se baseia na abordagem da teoria enraizada e na codificação teórica de Strauss (1987). Tem sido classificado no âmbito de programas “construtores de redes conceptuais”(Weitzman,2000, p.809), mas sobretudo no grupo de “construtores de teorias baseadas na codificação”.

Neste contexto, a codificação pode ser definida como o conjunto de “ operações

pelas quais os dados são divididos, conceptualizados, e reagrupados de forma diferente. É o processo linear de construção das teorias a partir dos dados” (Strauss e

Corbin, 1990, p. 57). Nesta perspetiva, envolve processos constantes de comparação dos dados empíricos, dos conceitos e das categorias, bem como a formulação de questões dirigidas ao texto.

É, pois, a partir dos dados e através de um processo de abstração progressivo que é possível chegar à elaboração de hipóteses teóricas. Para tanto, é necessário atribuir ao material empírico conceitos e códigos, formulados primeiro o mais próximo possível do texto e, seguidamente, de forma cada vez mais abstrata (Flick, 2005, p.180).

A categorização implica habitualmente a existência de muitos códigos (Strauss e Corbin, 1990) sendo portanto necessário, através da comparação constante, agrupá-los e construir categorias que sejam relevantes para a problemática em causa.

Assim sendo, após uma leitura reflexiva de uma das entrevistas realizadas, passámos a análise da informação com vista à sua categorização/codificação, usando os procedimentos de análise sugeridos por Straus e Corbin (2008) no programa Atlas.ti A análise de conteúdo realizada envolveu uma abordagem predominantemente indutiva, como se pode perceber através da figura 1.

Figura 5. Procedimentos de codificação - Programa Atlas Ti – abordagem indutiva

De faco, como o autor que temos vindo a seguir refere, neste processo de análise, o investigador move-se sistematicamente entre o pensamento indutivo e dedutivo que permite aferir a coerência da classificação.

Assim sendo, a análise de cada entrevista envolveu três etapas que passamos a descrever:

- na primeira etapa procedeu-se ao processo de codificação aberta, no qual se examinou cuidadosamente o texto de forma a segmentar/decompor o conteúdo em

unidades de análise (que correspondem às diferentes ideias expressas), de modo a

proceder à sua codificação/classificação; nesta forma de classificação, que tem como objetivo expressar os dados e os fenómenos na forma de conceitos (Flick 2005), procurou-se, desde logo, evitar a mera descrição dos fenómenos, e desenvolveu-se um processo de questionamento dos dados (ex. quem? quando? aonde? o quê? como? quanto? porquê?). Este processo permitiu proceder a uma comparação constante primeiro das sub - categorias e depois das categorias que foram emergindo, tendo-se procurado a sua saturação, de modo a assegurar a conexão entre aquelas e os dados da entrevista e, assim, comparar dados codificados de forma semelhante.

- na segunda etapa procurou-se apurar e diferenciar as sub - categorias e categorias resultantes da codificação aberta, selecionando as que pareciam mais promissoras em termos de elaboração posterior, de modo a desenvolver o processo de

codificação axial; este processo envolveu a aplicação de um modelo de análise dos

dados, no qual se identifica o fenómeno central, as condições causais, os aspetos do contexto e os fatores facilitadores e/ou dificultadores, as estratégias de ação para responder ao fenómeno e, por fim, as consequências, ou seja os resultados dessas estratégias (Strauss e Corbin, 1990). Nesta fase o mais importante foi clarificar e estabelecer as relações entre as categorias e as subcategorias encontradas, podendo essas relações ser de natureza diversa (pertença, associação, causa, contradição, etc.).

- por último, na terceira etapa procedeu-se à codificação seletiva, na qual se procurou identificar determinada categoria ou tema como fenómeno central, relacionando-o sistematicamente com outras categorias e sub-categorias, de modo a ser possível, com base nessa categoria/tema principal, construir/conceptualizar uma história ou, como refere Strauss e Corbin (2008), uma “story line”. A codificação seletiva dá continuidade à codificação axial, no entanto, o nível de abstração é mais elevado, uma vez que o que se pretende é “ formular uma categoria integrativa na qual são agrupadas as outras categorias”(Flick, 2005, p. 185).

Importa salientar que neste processo de análise de conteúdo, as categorias definidas não têm que ser mutuamente exclusivas, podendo existir entre as mesmas relações de causalidade circular facilitadoras da compreensão da globalidade do

fenómeno em estudo e dos respetivos contextos. Deste modo, procura-se atenuar a atomização decorrente das relações de causalidade linear que constituem resquícios do positivismo na investigação em educação e pôr em evidência o carácter sistémico dos fenómenos estudados.

Com efeito, a análise de conteúdo que é possível realizar utilizando o programa Atlas ti permite o desenvolvimento de uma investigação que efetivamente vai ao encontro dos pressupostos das metodologias qualitativas, de natureza holística, onde se procura fundamentalmente a compreensão da realidade como um todo.