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A opção pela educação especial – uma forma de responder a mudanças e necessidades de natureza familiar.

Capítulo IV: Apresentação e Análise dos Resultados

4.3 Trajetórias de Professores de Educação Especial 1 Lourenço, 35 anos de idade.

4.3.2 Madalena, 42 anos de idade.

4.3.2.3 A opção pela educação especial – uma forma de responder a mudanças e necessidades de natureza familiar.

(…) Depois na terceira fase foi a viragem para a educação especial e aí é outra

aprendizagem, é estar do outro lado e perceber também o que são as necessidades educativas especiais na sala de aula (…).

É após os primeiros doze anos de docência no ensino regular que, por razões de natureza familiar, a hipótese de concorrer à educação especial surge. Em termos pessoais e familiares, Madalena decide ser mãe e esta decisão coloca-a perante um conjunto de necessidades que condicionam de algum modo as suas escolhas face à profissão. A necessidade de encontrar colocação numa escola próxima da sua residência de modo a poder dispor de tempo para dedicar ao filho que espera justifica o concurso para o apoio educativo que, por sugestão de uma colega, então realiza.

São, portanto, razões de natureza familiar que fundamentam a decisão de concorrer aos “apoios educativos”, de mudar o seu itinerário profissional, optando por exercer funções docentes na educação especial (Cf. figura 16).

Figura 16. Motivação para ser professor

E, embora esta opção tenha implicado deixar de participar num projeto onde havia trabalhado com imensa satisfação, nessa altura significou uma possibilidade única de trabalhar próximo de casa, usufruindo assim de mais tempo e de maior disponibilidade para cuidar do filho. O fragmento seguinte refere-se a esse tempo e às decisões então tomadas:

(…) Eu fiquei grávida, nesse ano eu fiquei sem turma, fiquei só ligada ao projeto com

outra colega. Foi muito desgastante e quando chegámos a Junho, eu pensei, bom… agora de manhã para vir com o bebé, se eu continuo aqui neste projeto não tenho disponibilidade para estar com o bebé…(…) Diz-me uma colega: - E se nós concorrêssemos todas ao apoio? Foi uma boa ideia. Uma experiência diferente, experimentar o apoio. Pode ser que consiga ficar ao pé de casa, pensei. (…).

Mas, apesar desta satisfação decorrente do resultado do concurso, não existem grandes expectativas face à nova situação profissional: (…) E agora? Eu estou aqui

para apoiar, mas nem tinha muitas expectativas. Eu achava que continuaria a trabalhar a parte académica, ia ajudando a professora (…).

De facto, Madalena parece não ter uma ideia prévia do que significa ser professor de apoio e, nessa medida, perspetiva a sua ação como se continuasse no ensino regular.

É deste modo que nos narra como concebeu o seu papel quando entrou para a educação especial: (…) achava que estava ali… no fundo era um pouco como fazia como

professora do regular. (…) Não tinha muita expectativa… eu achava que continuaria a apoiar os meninos como se apoiasse os alunos que tinha. Era a ideia que tinha (…).

No entanto, posteriormente, quando confrontada com a situação, Madalena manifesta um conjunto de preocupações sobre o tipo de funções a desenvolver enquanto docente de apoio educativo.

O facto de não ter tido, enquanto docente do ensino regular, experiências de integração de alunos necessidades educativas especiais, associado à natureza itinerante da intervenção dos docentes de apoio educativo, permite compreender o desconhecimento que manifesta sobre o tipo de funções a exercer, bem como as dificuldades inicialmente sentidas. Com efeito, é esse desconhecimento inicial que justifica as dificuldades em assumir funções de apoio, ou seja em “negociar” o seu papel junto dos colegas de ensino regular com quem trabalha (Cf. figura 17).

Figura 17. Socialização prévia na educação especial

À partida, encontrar e definir o seu espaço de intervenção junto do grupo/turma foi algo difícil para Madalena, levando algum tempo a perceber onde, quando e junto de que alunos, seria oportuna a sua ação. A perceção de ter pouco espaço de intervenção, de ser de algum modo “intrusa” é bem evidente nos excertos seguintes, nos quais Madalena relembra as primeiras experiências neste domínio:

(…) Primeiro achava que, quando via os colegas de Educação Especial ou de Apoio

Educativo, achava que…não percebia muito bem qual era a posição que ocupavam porque estavam fora da escola. Estavam fora da escola, não é? (…) Eu tinha

dificuldade de realmente me articular com eles, uns dias não estavam, outros dias estavam noutra escola, isto quando eu era professora do Regular (...).

(…) Inicialmente, quando comecei, sentia-me mais fora do percurso, relativamente ao

percurso regular, sentia-me um bocadinho intrusa. Estamos a falar de há 10 anos atrás, hoje já mudou. Intrusa no sentido de procurar o meu espaço naquele percurso. Eu ajudava o professor e andávamos um bocadinho ali à procura de…(…)

(…) Dentro da turma, dentro da turma foi difícil no início, dentro da turma trabalhar

com a professora do regular, para mim foi difícil porque não me conseguia dissociar da turma, tinha que intervir às vezes, achava que eu estava ali também podia ajudar a colega, não é? No fundo também ainda não me tinha posicionado, incomodava-me estar ali com um aluno ou com um grupo de alunos e não poder participar no grande grupo. (…) Pronto eu só posso intervir em determinadas situações (…).

(…) Conheci os pais, fazia as reuniões com a professora,…era sempre apresentada

como professora de apoio que ia ajudar os meninos, mas não tinha muita intervenção. Via os pais nas reuniões necessárias… (…)

Parece-nos interessante assinalar a dificuldade em se afastar de um modelo de intervenção centrado no grupo/turma, para a qual fora formada e que, de algum modo, se insere na prática profissional habitual, e em integrar novas formas de ação centradas na resposta às necessidades individuais.

Para além destes aspetos, a cultura organizacional da escola onde exerceu funções não facilitou a emergência de uma perceção inicial gratificante da profissão. A este propósito, assumem particular relevo na narrativa as referências à falta de apoio dos pais e à dificuldade de desenvolver um trabalho articulado com os professores do ensino regular, sendo ainda assinaladas a falta de resposta dos Serviços de Psicologia e Orientação (SPO) e a falta trabalho em equipa.

Torna-se assim compreensível a insegurança profissional sentida neste período, bem como o sentimento de dúvida sobre a eficácia da sua intervenção enquanto docente de apoio educativo.

Mas, nem tudo foi negativo nesta experiência de Madalena. O facto de apoiar alunos apenas com dificuldades de aprendizagem e não com problemáticas mais severas, associado à possibilidade de exercer as suas funções na sala de aula do ensino regular, constituíram fatores que facilitaram a sua integração nas novas funções. Por sua vez, o apoio que teve da Equipa de Coordenação dos Apoios Educativos (ECAE) e a

aprendizagem que pôde ir realizando com os colegas do ensino regular contribuíram para a progressiva compreensão do seu papel, configurando, em última análise, as fontes de satisfação profissional desta fase.

4.3.2.4 A formação em educação especial – entre o desejo de aprender e a