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Os primeiros anos na educação especial – desafio e vontade de aprender.

Capítulo IV: Apresentação e Análise dos Resultados

4.3 Trajetórias de Professores de Educação Especial 1 Lourenço, 35 anos de idade.

4.3.1.4 Os primeiros anos na educação especial – desafio e vontade de aprender.

Gostar de desafios, ter vontade de aprender coisas novas e ter prazer em refletir sobre a sua ação são características pessoais de Lourenço que, associadas às aprendizagens realizadas durante a formação inicial facilitaram a entrada na educação especial. Para além destes aspetos, a cultura organizacional das equipas de educação especial onde se integrou, as possibilidades que teve de desenvolver uma intervenção diversificada e as fontes de satisfação profissional que experimentou e que narra foram fatores que em muito contribuíram para a socialização, nesta fase do seu percurso

De facto, contrariamente ao que acontecera no início da profissão, apesar da falta de experiência, a entrada para a educação especial constituiu para Lourenço, pelas circunstâncias envolvidas, fonte de satisfação e de desenvolvimento profissional.

Como sublinha na sua narrativa teve a “sorte” de fazer parte de uma equipa de coordenação dos apoios educativos (ECAE) constituída por professores de educação especial com muitos anos de experiência e onde existia a preocupação de apoiar, de ajudar e de transmitir aos mais novos no “ofício” os saberes e as práticas da profissão. Esta preocupação era evidente nos colegas especializados com quem Lourenço trabalhou e até em alguns coordenadores das referidas equipas, uma vez que também eles visitavam as escolas e os professores de apoio recentes, no sentido de identificar eventuais dificuldades ou necessidades (Cf. figura 8).

Este apoio dos colegas especializados foi, no entender de Lourenço, fulcral para a sua adaptação e integração na profissão, uma vez que proporcionou o acesso a recursos e referências bibliográficas fundamentais, e facilitou o contacto com exemplos de boas práticas que Lourenço adotou. As reuniões de equipa, porque organizadas de modo a

facilitar o trabalho de todos, constituíram oportunidades únicas de formação e de aprendizagem.

Figura 8. Socialização prévia na educação especial – fatores facilitadores

Mas, para além desta formação que foi realizando de forma continuada, teve ainda oportunidade de participar em ações de formação com temáticas e modalidades as mais diversas que, como sublinha no excerto seguinte, foram importantes pois permitiram dar resposta às diferentes necessidades formativas dos professores.

(…) Eu penso que foi muito importante, isto foi numa primeira fase houve estes grupos

de trabalho, numa segunda fase houve mesmo ações de formação. Creditadas. Havia colegas especializados que tinham a formação de formadores e com o intercâmbio com o centro de formação profissional (…) conseguiu-se encontrar quatro ações de âmbitos diferentes, desde o seminário, à ação com 25 ou 50 horas, à oficina de formação também… (…) E as pessoas inscreveram-se no que quiseram (…) e permitiu às pessoas terem formação. Mais simples ou uma formação mais complexa (…).

A cooperação com os professores do ensino regular, nomeadamente através do trabalho realizado em conjunto, quer dentro da sala de aula, quer no exterior, constituiu também um dos fatores da cultura organizacional de escola que facilitou a sua integração na profissão. Por sua vez, a boa relação que conseguiu estabelecer com os pais dos alunos com NEE contrasta de forma evidente com as dificuldades narradas a este nível no início da profissão docente e, por isso, integra uma das fontes de satisfação profissional associadas a esta fase. Procurando explicações para este fenómeno

Lourenço considera que os pais dos alunos com NEE têm uma atitude diferente face ao professor:

(…) O professor de Educação Especial, eu penso que para alguns pais, quase para a maioria, é visto como uma ajuda preciosa. Alguns em demasia … atribuem-nos quase um valor terapêutico. Este senhor vai ajudar o meu filho a ficar melhor! (…)

Este valor terapêutico atribuído aos professores de educação especial permitiu o desenvolvimento de uma boa relação de trabalho com os pais, verificando com prazer a assiduidade e participação daqueles nas reuniões que convoca. Como assinala na sua narrativa: (…) Consegui, ao contrário da primeira fase, consegui nesta fase uma boa

relação com os pais. Tão boa, que no final desse ano, fizeram uma carta para que pudesse continuar o trabalho no ano seguinte (…).

E, este primeiro reconhecimento do seu trabalho por parte dos pais dos alunos com NEE, uma vez que envolveu uma hetero - perceção francamente positiva, configura-se como um momento sobremaneira importante para a sua auto -estima e para a identificação com a profissão.

Perante este cenário, justifica-se que, na sua narrativa, Lourenço transmita uma imagem francamente positiva da equipa de educação especial onde começou a trabalhar e onde, pela cultura organizacional existente, pode aprender a ser professor neste domínio.

Esta aprendizagem envolveu o desenvolvimento inicial de práticas pedagógicas caracterizadas pelo improviso, pela tentativa e pelo erro, pela intenção de melhorar ação, numa postura constante de experimentação e de verificação de resultados no desempenho dos alunos.

Desenvolver uma intervenção holística considerando competências e dificuldades, intervir não apenas nas áreas curriculares, mas em todas as dimensões do desenvolvimento humano e proporcionar aos alunos uma diversidade de experiências são aspetos narrados que revelam o modo como foi evoluindo em termos de prática. A planificação, embora algo rígida no início, constituiu e constitui ainda hoje para Lourenço fonte segurança, na intervenção desenvolvida, como se percebe no excerto seguinte:

(…) Tentei primeiramente estabelecer um plano muito rígido de trabalho com eles… por uma questão de segurança… E eu ainda faço isso hoje no Jardim de Infância

porque é um sítio onde não me sinto muito à vontade. E planifico muito. Muito. Todos os dias. (…)

Por sua vez, a recolha de informação junto de colegas, a criação de rotinas com os alunos, a realização de atividades simples, a adaptação de tarefas, a utilização das tecnologias de informação e comunicação (TIC), a realização de projetos e o encaminhamento de alguns alunos constituem outras dimensões reveladoras do carácter diversificado da intervenção.

Intervenção que, pela forma sustentada como foi evoluindo, justifica o balanço positivo que Lourenço faz sobre os primeiros anos na educação especial, aos quais associa sempre a ideia de crescimento profissional: (…) E essa foi uma fase, esses dois

anos seguidos foram uma fase de crescimento grande em termos formativos e em termos de Educação Especial (…).

Para além destes aspetos, a evolução os alunos com NEE, o desenvolvimento de uma boa relação com os pais, a articulação com outras instituições e o conhecimento de outros técnicos constituíram também fontes de satisfação profissional que em muito contribuíram para a socialização prévia na educação especial.

Muito embora estes dois primeiros anos tenham sido francamente positivos, Lourenço não deixa de assinalar outras situações que posteriormente vivenciou e onde é possível identificar fatores que dificultaram a sua integração na profissão, a saber: as características dos alunos e a cultura organizacional. Com efeito, perante uma mudança de escola e de ECAE, depara-se com um grupo de alunos com problemáticas substancialmente mais graves e face ao qual experimenta sentimentos de receio e de dúvida; no entanto, nesta situação a cultura organizacional é bem diversa da anterior… e a falta de disponibilidade dos professores do ensino regular na escola e a falta de apoio da equipa em que está integrado justificam as dificuldades sentidas na intervenção e, consequentemente, nesta etapa de socialização profissional.

4.3.1.5 A formação especializada – entre o desejo de aprender metodologias de