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A análise química aplicada à agricultura, de modo geral, foi amplamente divulgada em “O Auxiliador”, como ocorreu já no seu primeiro ano de circulação, no artigo de Barbosa (1833, n. 9, p. 1-6), que destacou a importância da química na análise dos terrenos destinados ao cultivo agrícola em geral, uma vez que a sua fertilidade dependia das moléculas, da sua quantidade e da relação, determinando qual a proporção de sais e estrume deveriam receber.

Barbosa destacou que a química usada pela agricultura como uma ferramenta “ilumina a teoria” (1833, n. 9, p. 6) e concluiu, após a leitura de diversos artigos sobre a Química Agrícola, publicados no “Jornal dos Conhecimentos Usuais”, que a análise química, os estudos e experiências que ela fomenta, portanto, indicariam a dose ideal de determinados nutrientes que deveriam ser devolvidos aos terrenos. Isso explicaria, por exemplo, o fato de existirem terras improdutivas, mas que ao receberem as substâncias indicadas pelas análises químicas, voltariam a produzir diversos tipos de cultivos (BARBOSA, 1833, n. 9, p. 1-6).

Em uma tradução da França Industrial, Barbosa (1837, p. 221-224) destaca a capacidade que tem os vegetais de absorver as espécies químicas, do solo e do ar, provenientes da decomposição química, de se apropriar dos diferentes tipos de estrumes e que se deve atentar para dar à planta o tipo de estrume que seja mais adequado a ela. O autor ressalta, também, a dependência que tem a agricultura da química, pois a análise química dos mais variados tipos de estrumes, por exemplo, só deixa claro que a diferença entre eles está apenas nas quantidades de Hidrogênio, Nitrogênio e Carbono.

A análise química aplicada ao cafeeiro foi divulgada em “O Auxiliador” de diferentes formas, mas, de modo geral, os artigos publicados destacaram o uso da química na caracterização das substâncias orgânicas e inorgânicas presentes no café cru (ainda na forma de fruto maduro, despolpado ou não), torrado, nas cinzas do grão de café e das folhas do arbusto.

As informações obtidas pelas análises químicas serviram para diferentes objetivos, como: traçar o perfil orgânico e inorgânico do café nas suas diversas formas de exposição; apresentar aos leitores do periódico, quais as substâncias e as suas quantidades numa determinada porção de café; elucidar as propriedades medicinais atribuídas a sua bebida; primeiro, sugerir, mas segundo evitar, que as folhas do café fossem utilizadas para a

fabricação de outra bebida, também muito importante naquele período histórico, o chá, fato que poderia ter mudado o rumo do desenvolvimento das lavouras cafeeiras no Brasil, a partir do início da segunda metade do século XIX.

Os dados sobre as análises químicas do café apareciam diluídos em “O Auxiliador”, que divulgou informações uteis sobre esse tema em diversos números, como aconteceu com os artigos de Rebelo (1833, n. 5, p. 1-19) e de “O Auxiliador” (1848, n. 9, p. 333-343). Era comum encontrarmos citações de autores, químicos, sem a respectiva referência bibliográfica, como aconteceu, por exemplo, com o artigo “Café”55 (O AUXILIADOR, 1848, n. 8 e 9, p. 293-303 e p. 333-344), que trouxe uma série de resultados de análises químicas e determinação de substâncias orgânicas presentes no café, realizadas por Schrader, Cadet, Payen, Piaff, Grindel, citados no artigo, cujo conteúdo se encontra no livro “Nuevo tratado de Farmacia: Teorico y Practico”, (SOUBEIRAN, 1847), que discute sobre a cafeína e o café, suas propriedades e composição química, respectivamente.

Em todos os artigos do periódico, analisados nesta tese, de 1833 a 1896, apenas um, de fato, dedicou-se, exclusivamente, à análise das substâncias químicas do café. O artigo foi publicado em 1865, tendo como título “Análise química do café, chá, mate e guaxima pelo Dr. Glasl”, ou seja, tinha as palavras café e química já na abertura do texto, contudo isso não diminuiu a importância dada a esse assunto em “O Auxiliador”. O Dr. Karl Glasl56 teve uma série de análises químicas publicadas em “O Auxiliador” a partir de abril de 1865, nas seções de Química Agrícola (GLASL, 1865, p. 147).

Foram diversas análises químicas de diferentes gêneros agrícolas, dentre eles o “algodão” e a “cebola” (GLASL, 1865, p. 147-149), o “café, chá, mate e guaxima” (GLASL, 1865, p. 197-199) e o “aipim” (GLASL, 1865, p. 276-277). Também foram publicadas suas análises químicas das terras destinadas ao cultivo agrícola (GLASL, 1865, p. 147-149, p. 231- 236, p. 276-277).

O grão de café foi reduzido a cinzas, em seguida, teve seu conteúdo químico analisado, segundo Glasl (1865, p. 197), como pode ser visto pelos resultados expostos na

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O artigo “Café”, publicado em “O Auxiliador” de número 8 e 9 (1848, p. 293-303; p. 333-344) discute brevemente sobre a caracterização das substâncias químicas presentes no café cru e torrado, fala especialmente da cafeína, suas propriedades medicinais e usos, e do ácido clorogênico, ora combinado com a própria cafeína ou às vezes com a potassa. Devido à semelhança entre o texto do artigo “Café” e o livro “Nuevo tratado de Farmacia: Teorico y Practico”, publicado um ano antes, é possível que o autor do artigo em “O Auxiliador” tenha se baseado no livro mencionado.

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O Dr. Karl Glasl era professor de agronomia em Viena, na Áustria, quando foi contratado pelo governo do Brasil, em setembro de 1863, tendo tomado posse como diretor do Jardim Botânico, no mês seguinte daquele ano, onde montou, também, um laboratório de química (RODRIGUES, 1893, p. 209-223). Disponível em: https://repositorio.enap.gov.br/bitstream/1/3771/1/1983%20RSP%20ano40%20v111%20n4%20Out-

Figura 13, que mostra que em 6,129 gramas de cinzas de café, avaliados, foram encontrados diferentes proporções de ácidos, tais como, o carbônico, sulfúrico, silícico e fosfórico, além dos derivados de minerais, de potassa, magnésia, argila e os óxidos de ferro e cloro, indicando a diversidade de substâncias no produto dos cafezais.

Figura 13: Resultado das análises químicas do grão de café extraída do artigo de “O Auxiliador”

Fonte: Glasl (1865, p. 197)

No fim da circulação de “O Auxiliador” já se conhecia grande parte do conteúdo das cinzas do café, dentre outros gêneros agrícolas, determinados pela aplicação de diferentes metodologias de dosagem e caracterização, como foi destacado no artigo de Peligot (1888, n. 9, 207-208), que revelou alguns desses métodos adotados para o “ácido carbônico; sílica e carvão; fosfato de ferro; cal; magnésia e ácido fosfórico; alumina; ácido sulfúrico e cloro; potassa; e soda”.

Outro artigo, publicado na seção de “Química Agrícola”, de “O Auxiliador”, mostrou resultados de análises, de diferentes produtos agrícolas, incluindo, também, três amostras de café (das regiões do Yemen, Martinica e Bourbon), além de chocolate, cogumelo, aspargo, realizadas por diversos químicos, dentre os quais destacaremos apenas os dados do Sr. Payen, sobre o café, Figuras 14 e 15 (O AUXILIADOR, 1888, n. 11, p. 254), indicando que havia, por parte da ciência agrícola, um interesse pelas propriedades e características físico-químicas do produto dos cafezais.

Figura 14: Resultado da análise química de três amostras de café

Fonte: O Auxiliador (1888, p. 254)

Figura 15: Resultado da análise química das cinzas de três amostras de café

Fonte: O Auxiliador (1888, p. 254)

Os resultados determinados e apresentados por Payen (Figuras 14 e 15), extraídos do periódico, foram divulgados em “O Auxiliador” em formato de tabelas, nas quais

destacaremos apenas duas, que tratavam exclusivamente sobre o café (1888, n. 11, p. 254). Pode-se observar a diversidade e a quantidade de substâncias presentes nas cinzas dessas amostras, que dependem diretamente da disponibilidade desses compostos nos terrenos onde foram encontrados esses arbustos e coletadas as amostras analisadas.

Os resultados de análises de cinzas do café divulgados em “O Auxiliador”, a exemplo também, do artigo de título “Princípios fixos extraídos do chá, café e mate”, que destaca algumas substâncias determinadas nesses três produtos agrícolas, Figura 16, extraída de “O Auxiliador” (1889, n. 1, p. 16), poderiam auxiliar os produtores de café nos aspectos relativos à manipulação dos terrenos destinados aos cafezais, com o objetivo de manter sua plena produtividade.

Figura 16: Princípios fixos extraídos do chá, café e mate

Fonte: O Auxiliador (1889, p. 16)

O periódico mostrou, desde o início da sua circulação, que daria muita importância ao conteúdo mineral das cinzas do café, evidenciado nas Figuras 13, 14, 15 e 16, pois a caracterização das substâncias químicas presente no café, nas suas diversas formas de apresentação, elucidaria parte da interação dessa planta com o terreno onde estão formados os cafezais, o tipo e a quantidade de estrume que deveria ser adotado no trabalho de adubação, bem como, a possibilidade de recuperação dos cafezais que se encontravam envelhecidos e com baixa produtividade de frutos.

Segundo “O Auxiliador” (1846, n. 1, p. 13-19) era importante estabelecer uma relação entre a determinação dos minerais dos cultivos agrícolas necessários para o seu pleno desenvolvimento e o conhecimento dos minerais disponíveis na terra, segundo a necessidade

de cada tipo de cultivo e que a caracterização das cinzas de cada planta indicaria qual a quantidade e a identidade de cada nutriente que a terra deveria receber.

Nos anos de 1864 e 1865 “O Auxiliador” divulgou uma série de relações importantes entre a composição química de um determinado cultivo agrícola, como exemplo o algodão, e a sua relação com as substâncias químicas presentes no terreno e no estrume, para que se utilize uma quantidade e qualidade de estrume capaz de restituir as substâncias necessárias ao pleno desenvolvimento do produto agrícola determinado (HURE, 1864, p. 54, 194, 270; 1865, p. 53).

Essa ideia de divulgação dos componentes químicos de um determinado cultivo agrícola tem início no periódico já no seu primeiro ano de circulação de “O Auxiliador”, quando Rebelo (1833, n. 5, p. 1-19) trouxe os resultados das análises químicas do grão, feita por dois químicos, primeiramente Cadet, que encontrou em 64 partes da amostra oito partes de goma, duas partes de um extrato resinoso e amargo, 3,5 partes de ácido gálico, 43,5 partes de um extrato indissolúvel e sete partes de um resíduo com indício de albumina e, em segundo, Crell, que ao analisar e comparar amostras de café de Moka e Martínica, encontrou os mesmos componentes em diferentes proporções.