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Analisando a Estrutura Urbana da Aglomeração Paulistana

Fundador do Mouvement Économie et Humansisme

5.1. Analisando a Estrutura Urbana da Aglomeração Paulistana

Para Lebret, coordenador da pesquisa sobre a Aglomeração Paulistana, a integração de saberes e experiências entre os diferentes agentes envolvidos no trabalho de pesquisa, era necessário, e para alcançar este objetivo, formou- se uma equipe interdisciplinar a fim de reunir profissionais capazes de identificar as demandas paulistanas e também constatar a realidade social existente na cidade. Fator que diferenciava o método de pesquisa da SAGMACS dos métodos correntes na época, é que enquanto estes partem da cidade e de seus elementos construídos para considerar a população e a região, o estudo da Aglomeração Paulistana, parte da região e da população para identificar as aglomerações e as condições de vida urbana.

Pois o urbanismo que não leva em conta a sociologia, variável de povo para povo, de clima para clima, de estruturação – étnica e social – para outra estruturação, comete, fatalmente, erros graves quando pretende aplicar ‘no varietur’ um zoneamento dito funcional, no qual zonas industriais, zonas comerciais, zonas residenciais, zonas de recreação são ligadas umas às outras sem que o tecido urbano total tivesse sido pensado em função da vida coletiva. (SAGMACS: 1958: Parte V – p. 38).

O texto mencionado acima está inserido na Parte V do relatório da pesquisa realizada pela SAGMACS, onde o estudo faz suas conclusões e sugestões para o planejamento futuro da cidade. Esta explicitação do ideário Lebretiano sobre o urbanismo e sua atividade interdisciplinar, que se integra às disciplinas das ciências humanas – tais como a sociologia, a geografia e a economia – ocorre na parte final do relatório, embora seja nítido que a integração do urbanismo com as outras ciências acontece desde as primeiras páginas do estudo. Deste modo se constituiu a metodologia de trabalho da equipe coordenada por Lebret, apontando que a função do urbanista deveria ser:

Capaz de fazer a síntese das exigências geográficas, econômicas, sociológicas e propriamente urbanísticas. Ultrapassando necessariamente o plano municipal e intermunicipal a fim de estudar os problemas desse plano em função das exigências de espaços mais amplos, espaços regionais, o que equivale a postular a necessidade de uma ‘ordenação regional do território’ (idem, Parte I, p. 13).

Podemos também entender esta visão integrada, na maneira de se pesquisar a cidade, como certa crítica de Lebret à metodologia empregada em trabalhos urbanísticos anteriores aos anos 1950, tanto para São Paulo como para as demais cidades do Brasil e do mundo. Esta crítica é pertinente aos planos arraigados do discurso modernista e funcionalista, defendidos por Le

Corbusier, Robert Moses, Prestes Maia e outros urbanistas que visavam apenas

o ordenamento funcional do espaço82, discutindo o tecido urbano e a

necessidade de intervenções para sua melhoria, sem levar em consideração às necessidades da população e sequer discutir seus principais problemas83.

Assim, Lebret deixa claro sua diferenciação na compreensão do que seria elaborar soluções para a cidade, em relação aos demais urbanistas de sua época, pautando a obrigatoriedade de inserção dos estudos sociais aplicados à população para se alcançar os dados referentes a realidade vivida pelos habitantes da cidade, invariavelmente de classe social ou localização regional. Pois, a partir deste trabalho de pesquisa social, seria possível se estimar as

82 O zoneamento funcional para as cidades foi difundido na segunda metade do século XIX para

as cidades alemãs e estudado por Franco Mancuso. Já nos anos 1930, Le Corbusier reeditou as diretrizes do zoneamento funcional com a Carta de Atenas, dividindo as funções urbanas em áreas de circulação, de lazer, de trabalho e de moradia.

83 No mesmo período em que se realizava a pesquisa da estrutura urbana da Aglomeração

Paulistana, atuava junto à Secretaria de Obras da Prefeitura paulistana a Comissão do Plano Diretor dirigida por Carlos Lodi, que divergia do trabalho empreendido pela SAGMACS. Pois, segundo Feldman (2005: p. 100) “Lodi contrapõe a pesquisa qualitiativa como instrumento essencialmente técnico, quantitativo. Sendo a pesquisa urbanística ampla e constante, para ele, o fundamento do planejamento, antecedente para qualquer estudo, mas, deve se constituir, fundamentalmente, por elementos estatísticos e planimétricos.”

demandas populares e construir um plano integrado de intervenção urbanística para toda a cidade.

O ideário urbanístico Lebretiano, impõe aos técnicos sua maneira de conceber uma enquête social, e ao contrário do que fora feito em trabalhos urbanísticos que nos referimos anteriormente, a SAGMACS visa aprofundar o reconhecimento dos problemas e das demandas populares na cidade de São Paulo, para assim, poder orientar o processo de planejamento urbanístico na cidade.

Assim, é possível verificar que o trabalho se deu de maneira distinta ao discurso dominante do período, que exalava vislumbre frente à modernização da cidade e de seu crescimento populacional e importância econômica, frente às demais regiões do país. De forma que, a pesquisa urbana empreendida pela SAGMACS, visava estudar a cidade e conhecer profundamente suas especificidades, para posteriormente preconizar a transformação de São Paulo em uma cidade humana, que segundo o relatório, se pautaria pelos princípios do desenvolvimento harmônico84, apontando que “o equilíbrio harmonizado entre a aglomeração e os diversos espaços regionais do Estado, exigirá, sobretudo, uma série de medidas restritivas à circulação” (idem, ibid, Parte V, p. 59).

Fazendo assim mais uma vez, alusão a integração das ciências humanas e dos estudos sociais aplicados ao planejamento urbano da cidade.

Esta integração com as ciências humanas no ideário urbanístico Lebretiano pode ser conferido na importância dada ao trabalho de reconstituição histórica da formação da cidade de São Paulo. Ao contrário da negação da história – expressão utilizada por Lebret no “Manual de Encuesta Social” – faz- se o uso desta disciplina como procedimento metodológico para expor as matrizes do desenvolvimento da cidade, no primeiro capítulo da I Parte do estudo, chamado “Da Capela de São Paulo à grande metrópole industrial”, onde se utilizou principalmente como referências os geógrafos Pierre Monbeig, Deffonteines e Aroldo de Azevedo e dos economistas Roberto Simonsem e Simões de Paula.

84

Conforme Perroux a política do desenvolvimento harmônico “é controvérsia a uma acumulação sem ordem” (1967: p. 547).

Porém, não se estuda uma cidade ou região somente sob a óptica das ciências humanas. De forma que, para se compreender os fenômenos de configuração espacial e estruturação social, são necessários utilizar-se de métodos mecanográficos e gráficos, como mapas, levantamentos físicos territoriais, elaboração de questionários, construção de diagramas e tabelas, etc. Fator este que para nós consistiu no que vimos insistindo enquanto inédita integração de saberes e áreas de conhecimento.

Assim, se houve espaço para a inovação no planejamento urbano através das pesquisas e estudos sociais aplicados, além da utilização das ciências humanas – história, sociologia e economia – o trabalho da SAGAMACS mantém-se tradicional ao encampar as ferramentas gráficas até então utilizadas por geógrafos85 e engenheiros no período.

Para efeito de melhor compreensão dos aspectos presentes no relatório elaborado pela SAGMACS enquanto resultado do “Estrutura Urbana da Aglomeração Paulistana”, apresentaremos a seguir nossa impressão analítica dividida em quatro partes, assim como se deu a apresentação do estudo para a prefeitura. Cabe salientar que não incluímos a terceira parte do estudo, referente a Análise Sociológica, pois conforme já expusemos esta parte não foi concluída e sequer publicada.

5.2. Parte I – Um estudo introdutório sobre os aspectos