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No século XIX a construção da imagem de uma Capital Moderna

O século XIX impôs mudanças profundas ao estilo de vida da população de São Paulo. Desde seu início, antes mesmo da independência do país, o processo de industrialização já acenava para a adesão brasileira ao ideário do capitalismo industrial vigente na Europa. Nas cidades européias, neste período, já era possível verificar que o ideário capitalista, além de influenciar diretamente o modo de produção e estruturação da economia, exigia também alterações na morfologia da cidade, tanto pela atração de população, quanto pelas necessidades impostas pela indústria para a expansão de suas atividades.

Apesar deste tímido início da atividade industrial nas primeiras décadas do XIX, foi com a implantação da Academia de Direito, em 1828, e a expansão da atividade cafeeira no interior do estado, que São Paulo adquiriu novos hábitos, novas atividades econômicas e, enfim, passou a respirar de fato ares urbanos.

A implantação da Academia de Direito constituiu um importante marco na história social e política brasileira, pois, a partir desta implantação, o Brasil deu

início ao ensino superior e à formação de uma elite intelectual local. A mudança estrutural nas bases sociais e intelectuais do país instalou-se nas cidades de São Paulo e Recife – primeiras cidades a receberem uma escola de nível superior no Brasil. Com a implantação da Academia de Direito na cidade, foi reservado à São Paulo importante papel nesta mudança estrutural do país e na abertura rumo à modernização das estruturas políticas e sociais, já que a cidade passou a ser dominada por bacharéis e fazendeiros, inclusive na organização territorial urbana.

E assim, a partir da segunda metade do século XIX, São Paulo passou a crescer, industrializar-se e a receber importantes investimentos oriundos da lavoura cafeeira, formando uma aliança interestadual, integrando o Porto de Santos com a produção cafeeira do interior e a capital da Província como entreposto comercial, a partir da década de 1860, com a implantação do transporte ferroviário, conhecido pela história econômica como complexo cafeeiro.

Com a implantação da ferrovia, a comunicação do Estado foi facilitada e São Paulo passou a concentrar todo o aparato burocrático necessário ao funcionamento da capital da Província, atraindo também novas modalidades de serviços urbanos e atividades comerciais. Também atraiu fluxo migratório dos chamados barões de café, que, com a facilidade introduzida pela ferrovia em locomover-se até suas fazendas no interior, passaram a preferir morar na capital da província, formando assim uma elite burguesa paulistana. Porém, não só setores da elite influenciaram a intensificação do processo de urbanização da cidade de São Paulo. Com o incremento da indústria, foi necessário atrair também a mão de obra para o trabalho operário, o que fez com que a cidade, nas últimas décadas do XIX, crescesse de maneira intempestiva e sem limites, agravando os problemas de ordem urbanística, como a falta de moradia e saneamento básico, abrindo espaço para a atuação dos engenheiros sanitaristas.

Décadas 1860 1872 1886 1890 1900

População 27.900 31.385 47.697 65.000 240.000 Tabela 1

Gráfico 1

Em vermelho, a população paulistana; em verde, os imigrantes; Em azul, a população total de São Paulo.

Fonte: SAES, 2004 e SINGER, 1958

Foi neste período, a partir de meados do século XIX, e neste contexto de crescimento populacional e econômico acelerado, que verificamos o marco inicial da urbanística paulistana, abrindo espaço para intervenções pontuais e generalistas, frente à tentativa de resolução de problemas e enfrentamento das questões de ordem urbana, para acomodar os ares desenvolvimentistas, presentes no discurso da recém formada elite empresarial paulistana.

Assim, ao longo do século XIX, implantou-se na cidade um anseio pela modernização do espaço urbano paulistano e um primeiro movimento no sentido de alinhamento com as demais capitais de províncias brasileiras, enquanto no campo político ocorria a oposição de idéias entre os chamados liberais e conservadores, sendo os primeiros mais voltados ao alinhamento com a modernização e os outros mais resistentes. Para se ter uma idéia de como a cidade de São Paulo ainda não se impunha enquanto força importante, as lutas e conflitos no campo ideológico visavam sempre a conquista do governo da Província e não da capital paulista.

A rede viária que apontamos anteriormente foi um fator estruturador da ocupação urbana não só da cidade, mas também da província de São Paulo. Este fato ocasionou o desenvolvimento intraurbano da cidade, sobretudo na

152001270027900 193471203831385 389978700

47697 65000

240000

área conhecida atualmente como central, ponto em que os cinco caminhos convergiam. Deste modo, verificamos que nas primeiras décadas do século XIX, São Paulo era uma cidade com estrutura bastante concentrada, cortada apenas pelos cursos d’água e linhas divisórias que serviam aos caminhos de passagem.

Figura 2

Recorte do Mapa da área central paulistana no final da década de 1860, com destaque para as ruas por onde passavam os principais fluxos de viajantes e tropeiros.

De acordo com a planta da cidade de 1868, pode-se verificar que na metade do século, a estrutura viária de São Paulo concentrava-se próximo aos divisores de água. Simões Jr. (2004) analisou as mudanças urbanísticas da área central no período e aponta para a seguinte configuração urbana: as ruas da Liberdade e Vergueiro no divisor de águas entre o Tamanduateí e o Anhangabaú, a rua da Consolação, acompanhando o divisor de águas entre os vales dos rios Anhangabaú e Pacaembu; a avenida São João que se dirigia até o rio Tietê; a Florêncio de Abreu no espigão entre o Anhangabaú e o Tamanduateí e a rua do Carmo que buscava o caminho descendente em direção à várzea do Tamanduateí até o Brás, conforme podemos verificar na planta de 1881.

Figura 3

Planta da Cidade de São Paulo em 1881, mostrando a expansão da cidade próxima a área central, e a demarcação das estradas viárias e da recém implantada linha do trem. Fonte: Departamento de Patrimônio Histórico do Estado de São Paulo

Como mostra a figura anterior, a configuração do desenho urbano do território da capital paulista, foi rompido com o crescimento populacional, o aumento das atividades industriais e a implantação do traçado ferroviário, a partir da década de 1860, percebendo-se em 1890 o início da dispersão para novas áreas da cidade.

Figura 4

Planta da Cidade de São Paulo em 1897, mostrando o crescimento espraiado e disperso adquirido a partir da última década do século.

Fonte: Departamento de Patrimônio Histórico do Estado de São Paulo