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APRECIAÇÃO CRÍTICA DA HIPÓTESE DA „ AUTONOMIZAÇÃO ‟

No documento Um estudo sobre a guerra fiscal no Brasil (páginas 54-66)

Um procedimento inicial na análise da hipótese da autonomização deve ser o reconhecimento prévio de que a sua validade depende, sobretudo, de uma condição inescapável, talvez a mais importante: a de que os estímulos proporcionados ao investimento privado em disputa não podem ser exagerados, pois, caso contrário, passariam a representar um fardo excessivamente elevado a ser acomodado no orçamento de modo imediato, assumindo, assim, uma correlação mais direta e instantânea com a situação fiscal corrente do governo estadual. Isso fica claro na seguinte observação de Prado (1999, p. 28):

Vale chamar a atenção para o fato de estarmos aqui discutindo exclusivamente a relação entre guerra fiscal e equilíbrio orçamentário [...] O que está em questão é se o processo [...] introduz um viés deficitário nas contas públicas [...] na medida em que sejam evitadas políticas extremadas de concessão de benefícios [...] é possível que o resultado líquido a médio e longo prazo seja positivo para estados individuais.

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É nesse mesmo sentido que Franco & Jorge Neto (2001, p. 776) sustentam que um quadro institucional restritivo para a gestão orçamentária poderia ser útil para coibir a guerra fiscal: “à primeira vista, um mecanismo de disciplinamento fiscal parece ser a alternativa mais plausível”. Entendimento próximo ao de Varsano (1997, p. 11), segundo o qual, “um programa de ajuste fiscal requer, entr e muitas outras medidas, que o governo central adote uma posição frontalmente contrária à guerra fiscal entre os estados, buscando coibi-la por todos os meios que estiver ao seu alcance”.

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Sob tal perspectiva, o aspecto fundamental diz respeito, principalmente, ao custo dos programas de incentivos e, nesse sentido, a questão central a ser avaliada é se as iniciativas estaduais de fomento assumem teor perdulário apenas em circunstâncias episódicas e excepcionais da guerra fiscal, tornando-se, efetivamente, menos sujeitas a restrições de gastos. Ou, ao contrário, políticas dispendiosas são habituais e configuram a norma padrão gestada pela própria dinâmica da competição subnacional, de modo que a sua conexão com as condições orçamentárias dominantes talvez seja maior do que a que vem sendo considerada pela hipótese da autonomização. Como será demonstrado nos próximos parágrafos, a segunda alternativa prevalece largamente sobre a primeira, uma vez que é inerente aos conflitos interestaduais a conformação de onerosos subsidiamentos a fim de influenciar a decisão locacional dos empreendimentos privados que estão sendo disputados.

Convém, portanto, começar a discussão tratando de certos pontos relacionados ao processo decisório de alocação espacial dos investimentos, partindo da argumentação original de Prado & Cavalcanti (2000). A suposição básica é a de que os agentes privados são racionais e sempre fazem as melhores escolhas locacionais possíveis, levando em conta um conjunto amplo de fatores, entre os quais a dotação de infraestrutura, a distância dos mercados consumidores e das fontes de matéria- prima, a disponibilidade de mão-de-obra qualificada e de fornecedores, o grau de organização sindical dos trabalhadores, etc. Esse método seletivo rigoroso, pautado por diretrizes otimizadoras, seria capaz de identificar aquele sítio que detivesse os atributos locacionais mais apropriados, possibilitando maximizar as taxas de retorno sobre os capitais invertidos. Qualquer modificação nos parâmetros anteriormente elegidos como os mais adequados para comportar o investimento em causa resultaria no afastamento da localização ideal, redundando num custo adicional para a empresa e na redução de sua rentabilidade projetada. Esse deslocamento, no entanto, somente seria sancionado se algum elemento novo viesse contrabalançar o ônus envolvido na alteração espacial. E que elemento seria este? O incentivo fiscal e outros benefícios ofertados pelo governo estadual para compensar a possível mudança territorial. Ocorre que esse conjunto de vantagens tributária, financeira e infraestrutural deve não apenas cobrir, mas também superar o “custo de distanciamento”, pois, caso contrário, sem auferir ganhos, a empresa não seria encorajada a renunciar à localidade antes selecionada como a posição geográfica ótima a favor de outra com atributos julgados inferiores. Assim, além de abarcar o “custo de distanciamento”, os incentivos devem contemplar um prêmio para estimular a empresa a rever a sua decisão locacional, conforme sintetizado na seguinte expressão:

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Ig = Cgd  Cgd = Cd + Ploc  Ig = Cd + Ploc onde:

Ig = Incentivos governamentais Cgd = Custo global de distanciamento Cd = Custo de distanciamento

Ploc = Prêmio de localização

Os comentários precedentes permitem evidenciar que o custo fiscal (Cgd) embutido nos incentivos (Ig) são intrinsecamente maximizados, uma vez que não incorporam somente aquelas vantagens que visam equilibrar eventuais deficiências locacionais existentes (Cd), mas criam igualmente em complemento uma categoria camuflada de “lucro extraordinário” (Ploc) para dissuadir as empresas a abdicar de suas pretensões originais de localização17.

O custo fiscal necessário para lograr o afastamento da empresa em relação à locação preferencial que ela adotaria na ausência dos incentivos [...] nas condições vigentes no Brasil [é] maximizado (Prado, 1999, p. 8).

Um aspecto subjacente importante aos argumentos antes expostos refere-se à diferenciação espacial do custo global de deslocamento. A ideia desenvolvida por Prado & Cavalcanti (2000) prediz que esse custo obedece a uma escala crescente, atingindo valores superiores à medida que a empresa se afasta da posição territorial preferida em direção a outro sítio que, comparativamente às demais alternativas geográficas disponíveis, apresentaria debilidades e insuficiências nos atributos locacionais exigidos para a execução de seu projeto de investimento. Tal gradiente de localizações consubstanciaria aquilo que os citados autores denominam de “mapa de áreas de equivalência”, demarcando as diversas possibilidades de localização, cada qual com o seu custo global de deslocamento.

Quanto pior a posição de um estado – em geral, dos seus municípios mais atraentes – no ranking da empresa, maior o custo global envolvido em benefícios fiscais para obter o afastamento da empresa perante a alocação „ótima‟ decorrente da sua avaliação prévia (Prado, 1999, p. 15).

Acontece que esse “mapa de áreas de equivalência”, no qual são coordenadas a localização ótima e as demais alternativas espaciais da empresa, é desconhecido pelos governos estaduais em luta para acolher o investimento planejado. Na verdade, a autoridade pública não apenas ignora como

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Outro fator inerente à guerra fiscal que contribui de forma importante para maximizar o custo dos incentivos é provavelmente a escala das firmas envolvidas nas disputas interestaduais, normalmente de grandes proporções. Como advertem Prado & Cavalcanti (2000, p. 34), os incentivos requeridos para estimular a empresa a modificar suas opções espaciais seriam incrementados à medida que aumentassem o montante do investimento e a complexidade operacional do projeto em causa: “em princípio, quanto maior a dimensão de sunk costs envolvidos na inversão, maior a ponderação de fatores de ordem estrutural na seleção e mais elevados os montantes de compensa ção que a empresa exigirá para se afastar da escolha preferencial”.

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também é incapaz de perscrutar as escolhas locacionais efetivas das empresas, o que tem implicações de suma importância para a modelagem dos incentivos e, consequentemente, para a determinação da magnitude de seus custos. Alguns esclarecimentos suplementares clarificam melhor essa questão. De início, pode ser percebido muito facilmente que a empresa tem como estratégia intencional manter ocultas as suas preferências locacionais, de modo a instigar a competição entre diversas localidades pretendentes a hospedar o empreendimento econômico e, com isso, extrair as maiores vantagens possíveis. Ao não revelar as opções territoriais preliminarmente estabelecidas, a empresa passa a comandar integralmente o processo de cálculo e fixação dos custos globais de deslocamento e, portanto, o “pacote” de incentivos governamentais, resultando num processo em que duas forças não equipotentes se interagem em desequilíbrio. Interessa à empresa constituir uma arena negocial nesses moldes assimétricos e concorrenciais a fim de transformar as tratativas com o poder público em um verdadeiro leilão de benefícios, magnificando, assim, os ganhos extraordinários passíveis de serem obtidos18.

Os governos estaduais não conhecem o perfil das preferências alocativas das empresas. É elemento essencial da estratégia privada na guerra fiscal construir a imagem do „empate‟ entre locações alternativas, de forma a remeter para a competição entre incentivos o papel decisório final. Isso determina, na ausência de uma instância superior com capacidade política de interferir, que o setor privado detenha em geral a iniciativa no processo interativo que leva à decisão. Em geral, isso reduz as possibilidades de que algum estado, por confiar nas suas „vantagens competitivas naturais‟, abra mão de uma participação agressiva no leilão de incentivos (Prado & Cavalcanti, 2000, p. 36).

Essa incapacidade do agente governamental de desvendar e ter pleno acesso às predileções territoriais das empresas leva, portanto, à concessão de vantagens inevitavelmente superestimadas e, não raras vezes, desnecessárias para influenciar efetivamente a alocação espacial dos investimentos,

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Essa estratégia empresarial de dissimular as preferências locacionais prévias é bastante reconhecida e documentada nos estudos da área. Oman (2000, p. 10 e 11), por exemplo, sustenta que “evidências dos efeitos dos incentivos sobre as decisões de alocação espacial dos investimentos reais das corporações, particularmente para novos projetos de grande porte, são consistentes com a visão de que a decisão é normalmente um processo de duas etapas (ou multifásico) em que os investidores elaboram inicialmente uma lista restrita de si tes aceitáveis com base em „fundamentos‟ econômicos e políticos de locais alternativos, independentemente, em grande parte, da disponibilidade de incentivos fiscais e financeiros ofertados pelos potenciais governos hospedeiros; só mais tarde, após a pe quena lista ser elaborada com base nos „fundamentos‟ do investimento, os investidores examinam – e muitas vezes requerem – incentivos para o projeto inversor, colocando, frequentemente, os governos candidatos uns contra os outros nesta fase da sua decisão de localização”. Tal procedimento estratégico das empresas, que redunda numa espécie de “corrida armamentista”, visa extrair ganhos extraordinários derivados de benefícios excessivamente aumentados, conforme exposto por Clarke, Gaile & Saiz (1999, p. 59): “as [políticas de incentivo] tradicionais [são] implementadas em meio à incerteza, pois os governos competem entre si sem saber que ofertas alternativas estão recebendo as empresas; isso os deixa em situação de „prisioneiro‟, que tomam decisões sub-ótimas; como a maioria segue está estratégia, todos se debilitam [...] Esta situação leva a uma espécie de „corrida armamentista‟ em que todas as localidades oferecem incentivos, pois temem os resultados de não fazê-lo, ainda ignorando os custos marginais. Desta maneira, as empresas captam uma „renda corporativa‟ proveniente do conhecimento de sua estrutura de custos [...] e como resultado os governos locais subsidiam o investimento privado de maneira excessiva”.

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fazendo com que a política de incentivos incorpore elevada redundância e tenha, em consequência, custos fiscais inúteis e desmesurados, como anotaram Wells Jr. & Allen (2001, p. 22)19:

Se os incentivos fiscais são dados apenas aos investidores que não teriam vindo de outra maneira e são exatamente no montante necessário para atraí-los, então não há nenhuma perda de receitas provenientes dos incentivos – redundância nula. Por outro lado, se os incentivos vão para os investidores que teriam vindo de qualquer maneira, há redundância e as receitas recebidas dos incentivos redundantes representam um custo ao Tesouro [...] Há possivelmente também uma fonte suplementar de redundância. Se os incentivos para alguns investidores [...] exceder o montante necessário para atraí-los, o incremento também é um custo para a economia.

É possível depreender, de tal linha de raciocínio, que todo programa de atração de investimento contém incentivos redundantes, dada, principalmente, a impossibilidade mencionada de as preferências locacionais privadas serem reveladas e integradas previamente ao conhecimento dos agentes governamentais, que, caso fosse suscetível de ocorrer, seria um artifício consistente para evitar ou, pelo menos, mitigar substancialmente os custos inerentes aos programas de fomento subnacional.

Embora uma quantidade potencialmente significativa de receitas fiscais seja concedida a fim de atrair investimentos, o custo fiscal é zero desde que os investimentos induzidos nunca tivessem sido feitos na ausência de incentivos fiscais. Para estimar o custo de um determinado conjunto de incentivos fiscais, portanto, é necessário poder determinar os investimentos que recebem incentivos fiscais, mas que teriam sido feitos sem eles. Estes investimentos não são induzidos por incentivos fiscais e, portanto, as receitas fiscais concedidas representam um custo real para o governo, uma vez que teriam sido capturados mesmo se não fossem subsidiados (Reside, 2006, p. 11, itálico e grifo no original).

Mas além da propensão dispendiosa inata, as políticas de incentivo podem acumular outras características que acabam acentuando esse viés oneroso. Wells Jr. & Allen (2001) enumeraram alguns elementos contemplados por programas de fomento que operariam nesse sentido, cabendo destacar os que permitem firmas locais desfrutar de benefícios similares aos disponíveis às empresas externas à jurisdição, bem como os que admitem o prolongamento dos prazos de vigência das vantagens

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Reside (2006, p. 11) oferece outra forma de tratamento da taxa de redundância: “a redundância também pode ser definida em termos de resultados ex-post dos projetos subvencionados. Se nenhum spillovers ou outras externalidades positivas posteriores podem ser atribuídos à atividade subsidiada, aqueles incentivos são considerados redundantes em seguida e um custo fiscal foi efetuado sem o correspondente aumento no retorno social” (itálico no original). Cabe observar, entretanto, que a mensuração desses custos líquidos das políticas de incentivos, que coteja os impactos econômicos e sociais dos investimentos estimulados e os subsídios proporcionados aos mesmos, reúne as maiores e mais complexas dificuldades empíricas e teóricas. Isso porque não é tarefa fácil e simples identificar com precisão os efeitos que estão direta e indiretamente encadeados aos projetos produtivos que foram agraciados com benefícios. Da mesma forma, é problemática a separação daqueles custos fiscais que decorrem estritamente do subsidiamento e os que têm origem em outros fatores. Ademais, como sustentam Prado & Cavalcanti (2000, p. 123 e 124): “os impactos (no sentido de benefícios) econômicos e sociais gerados pelo investimento assumem, em grande parte, caráter permanente, inclusive no caso em que há total desmobilização do investimento inicial [...] Também os custos fiscais, embora à primeira vista limitem-se ao período de concessão do benefício, podem ter efeitos de mais longo prazo, na medida em que afetem a situação orçamentária, ampliando a dívida pública e gerando atrasos no suprimento de bens públicos essenciais”. Bartik (1996, n.p.), por sua vez, sugere alguns quesitos para que as políticas de incentivos propiciem retornos líquidos positivos à sociedade: “os programas de incentivo ao desenvolvimento econômico são mais propensos a passar por um teste de custo-benefício se (1) o desemprego local for alto, assim os novos empregos são necessários aos residentes locais; (2) os empregos pagam salários mais altos, (3) mais empregos são destinados aos moradores locais”. Os trabalhos aqui citados – Reside (2006), Wells Jr. & Allen (2001, p. 21 a 26) e Prado & Cavalcanti (2000, p. 123 a 129) – tratam de diversos aspectos centrais ligados à questão e propõem metodologias de estimação dos custos das políticas de incentivos.

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ofertadas. Em ambas as circunstâncias, sustentam os citados autores, os custos provavelmente seriam reforçados, uma vez que os incentivos teriam, presumivelmente, uma elevada taxa de redundância, visto que não lograriam a ampliação dos investimentos.

As empresas locais recebem incentivos, mesmo que raramente tenha sido avaliado se o período de isenção fiscal irá aumentar significativamente o investimento doméstico. Estes [incentivos] impõem um custo adicional ao Tesouro [...] Muitos países que oferecem isenções fiscais têm encontrado dificuldades para acabar com elas mesmo quando as mesmas se esgotam para um projeto particular [...] Uma vez que a extensão não é suscetível de afetar o montante dos investimentos, o resultado é a imposição de outra fonte de redundância (Wells Jr. & Allen, 2001, p. 24).

Da mesma forma, programas governamentais sem regras claras pré-definidas, dando espaço para a tomada de ações ad hoc por parte dos gestores da política de fomento, permitiriam perpetrar incentivos redundantes – em volumes excessivos e superiores ao que seria efetivamente necessário tanto para induzir novos investimentos quanto para influenciar a sua alocação espacial. É nesse sentido que Bartik (1996) advoga a adoção de políticas cujo escopo e instrumentos sejam delimitados por normas regulamentadoras precisas, de maneira a coibir métodos decisórios orientados por objetivos exclusivos e personalizados, com a simultânea vinculação a metas macroestruturantes, como a geração de empregos.

Os incentivos ao desenvolvimento econômico devem ser distribuídos com maior dependência em regras e menor em decisões discricionárias. O equilíbrio entre regras e discrição deve variar para incentivos diferentes. Por exemplo, incentivos à formação profissional e infraestruturas devem ser adaptados às necessidades das empresas individualmente e, portanto, devem ser parcialmente discricionários [...] Os incentivos financeiros – créditos ou abatimento tributários, empréstimos subsidiados – poderiam ser regido por regras, sendo incorporados ao código tributário regular (Bartik, 1996, n.p).

Feitas essas observações de ordem genérica sobre a interação entre as decisões locacionais privadas e as políticas de atração de investimentos, devem ser apresentados agora alguns comentários sintéticos visando relacionar os incentivos ofertados e o poder de gasto dos governos estaduais. É oportuno, primeiramente, fazer uma breve distinção dos instrumentos habituais manejados no âmbito da guerra fiscal, começando pelo ICMS, que é a mais importante alavanca de subvencionamento disponível. Do ponto de vista estrito da arrecadação, o entendimento validado por Prado & Cavalcanti (2000), como anotado em outras oportunidades, é de que os benefícios não afetariam o volume corrente das receitas estaduais, porque estariam lastreados em recursos incrementais futuros gerados pelos próprios empreendimentos agraciados. De fato, conforme o caso analisado, o mecanismo consiste, de modo geral, numa operação de diferimento do imposto: a empresa recolhe normalmente o ICMS devido ao Tesouro, que, por sua vez, lhe fornece um crédito no mesmo valor por intermédio de um fundo de fomento específico. Assim, além de não deprimir a arrecadação corrente, o incentivo pode

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permitir ao estado alavancar o recolhimento de ICMS, que alcançaria, findo o prazo de fruição da vantagem fiscal, patamar superior àquele vigente na ausência do investimento capturado para a região através do subsidiamento20.

Outra categoria de atrativos direcionados a estimular inversões privadas contemplaria, por exemplo, aporte direto de capital, doação de terrenos com as devidas benfeitorias e suprimento de infraestruturas econômicas, tais como sistemas de logística, transporte, energia e telecomunicações. Em contraste com os instrumentos de caráter tributário, esses dispositivos guardariam maior dependência em relação à situação orçamentária conjuntural, à medida que exigiriam, para o seu provimento, capacidade de avançar gastos e de contratação de crédito por parte do governo estadual. Mas tal dependência, ainda que reconhecida, não seria suficiente para inibir a oferta dessas vantagens financeiras e infraestruturais na opinião de Prado & Cavalcanti (2000, p. 40 e 41). O argumento parte da suposição de que os investimentos subvencionados teriam efeitos dinâmicos instantâneos sobre a arrecadação, pois o incentivo fiscal não afetaria a receita corrente, como foi esclarecido, mas poderia até mesmo acrescê-la imediatamente por conta do aumento provável da produção local. Nesses termos, possíveis restrições orçamentárias seriam superadas sem grandes dificuldades21.

Com base nas proposições acima, a conclusão dos citados autores apontou para a já explicada hipótese da autonomização, cuja validade, é preciso enfatizar, deriva da seguinte condição colocada aqui em exame: a de que o subsidiamento suprido pelo governo estadual com a finalidade de granjear projetos econômicos privados para a sua região não pode ser exacerbado, pois, caso contrário, tornaria difícil a acomodação dos incentivos no orçamento, estabelecendo uma vinculação mais estreita e direta com a situação fiscal corrente. Isso significa que, além de prudentes, os benefícios concedidos ao investimento alvo de concorrência não devem ser estendidos aos projetos acessórios, favorecendo igualmente os empreendimentos subsidiários à atividade principal. Se, de modo oposto, as vantagens outorgadas forem irrestritas, abrangendo indistintamente os investimentos primários e secundários, a possibilidade da arrecadação de ICMS do estado hospedeiro ter aumento imediato é frustrada e, assim, os custos iniciais seriam magnificados, firmando uma conexão maior com a situação conjuntural das contas públicas – o que tornaria a hipótese da autonomização bem mais problemática. Tal apreciação pode ser melhor elucidada se for considerado o comportamento do impacto fiscal dos incentivos

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“Suponhamos que [...] os benefícios de diferimento estejam esgotados, e a empresa retorne ao nível normal de recolhimento. Nesse caso, a receita efetiva iguala-se à receita potencial, num nível mais alto que a receita possível sem o investimento” (Prado & Cavalcanti, 2000, p. 127).

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“A base orçamentária em que se apoia o incentivo não é previamente dada: ela é afetada pelo próprio objeto do incentivo, dado que aumenta a produção industrial realizada localmente” (Prado & Cavalcanti, 2000, p. 41).

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concebido por Prado & Cavalcanti (2000), que descreveria uma trajetória cuja morfologia se assemelha a um “J”.

Num primeiro momento – que pode se estender por alguns anos – os custos predominariam. A

No documento Um estudo sobre a guerra fiscal no Brasil (páginas 54-66)

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