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G RÁFICO 5.1 – E VOLUÇÃO DO INVESTIMENTO EM RELAÇÃO AO PIB, DESPESAS TOTAIS E RECEITAS LÍQUIDAS Valores correntes em %

No documento Um estudo sobre a guerra fiscal no Brasil (páginas 143-146)

No período indicado, houve dois momentos de contração (2003/2001 e 2007/2006) que implicaram perda acumulada de 47,08%, ante três ciclos ascendentes (2001/2000, 2006/2003 e 2010/2007), resultando em crescimento, também acumulado, de 189,88%, de modo que, ao final da década, o saldo líquido foi uma progressão de 53,41% em proporção ao PIB. É necessário prestar atenção no fato de que tal elevação ficou concentrada nos três últimos anos da série, quando os investimentos tiveram forte incremento de 91,98% sobre o nível de 2007, cujo patamar foi 20,09% inferior ao de 2000. Essa recuperação se torna ainda mais expressiva se for observado que o montante real invertido na década somou R$ 305,38 bilhões, dos quais uma fração de 39,56%, ou R$ 120,82 bilhões, foi aplicada somente entre 2008 e 2010. Um fator que contribuiu para performance tão favorável foi o suprimento extraordinário de crédito propiciado pelo governo federal aos estados no biênio 2009/2010, no bojo de um conjunto de medidas adotadas para atenuar os efeitos adversos da

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crise internacional, como foi comentado oportunamente. O ponto importante a sublinhar, por ora, é que a trajetória dos investimentos demonstrou que, sobretudo quanto às despesas de caráter discricionário, as possibilidades de sustentação de gastos estiveram circunscritas aos estreitos limites demarcados pela disponibilidade efetiva de recursos. Vale dizer: essa categoria de dispêndio, mais facilmente controlável, foi a principal variável de ajuste e a primeira que viria a ser inevitavelmente acomodada às cambiantes condições de financiamento existentes.

Os serviços da dívida, ao contrário, assumiram estatuto de despesa obrigatória no âmbito do orçamento, visto que o refinanciamento dos passivos amparado na Lei 9.496/1997 (artigo 4º) afastou o risco de inadimplência dos governos estaduais, ao estabelecer a vinculação compulsória e automática de receitas próprias e de recursos oriundos do Fundo de Participação ao pagamento dos compromissos financeiros assumidos no bojo do processo de renegociação. É importante considerar tal aspecto porque, até a conclusão das operações individualizadas de reestruturação das dívidas, os gastos com juros, encargos e amortizações eram quase que meramente contábeis, pois o procedimento habitual dos estados era o de promover a rolagem continuada dessas obrigações, incorporando-as ao estoque de seus passivos, de modo que não representavam ônus financeiro efetivo. Os termos contratuais impostos pela a União como condição ao refinanciamento dos passivos estaduais colocaram fim a essa prática, estabelecendo um fluxo permanente de desembolsos, que alcançaram média anual de 1,08% do PIB no período pós-acordo (1999/2010).

Nos mesmos anos, os serviços da dívida foram declinantes, acumulando redução de 38,35% relativamente ao PIB. Essa evolução esteve condicionada também pelos termos contratuais do refinanciamento, principalmente no diz respeito à indexação ao IGP-DI, fortemente influenciado pela variação cambial, e à fixação de teto para as parcelas mensais devidas, que variou de 11,5% a 15% da receita líquida real, como explicado na seção anterior. Assim, a ocorrência de acentuadas desvalorizações cambiais – como as de 1999 e 2002 – resultava no incremento dos serviços da dívida. Os desembolsos efetivos, contudo, ficavam quantitativamente limitados ao teto previamente definido, de modo que o excedente vinha a ser incorporado ao estoque da dívida. O mesmo acontecia na eventualidade de queda das receitas, implicando valores menores passíveis de serem empenhados com as despesas de juros e amortização. De diferente modo, nos casos de apreciação cambial, como as observadas entre 2003 e 2010, a carga financeira sobre os orçamentos era amenizada.

O que interessa destacar é que o declínio verificado nos serviços da dívida, embora propiciando certo alívio conjuntural ao caixa dos estados, traduziu-se no aumento do estoque dos passivos, contribuindo para persistência de uma delicada situação financeira, como será discutido mais

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adiante. E a própria evolução da composição dos serviços reforçou igualmente essa tendência expansionista do estoque da dívida. Basta verificar o distinto comportamento dos dispêndios com juros e com amortização entre 1999 e 2010. A despeito de ambos terem reduzido seus pesos proporcionais ao PIB (20,80% e 50,33%, respectivamente), os desembolsos feitos para quitar os juros mantiveram tendência de alta até 2006, engrenando movimento claro de baixa somente depois desse exercício fiscal. As amortizações, diferentemente, passaram por acentuado recuo em 1999/2001 e permaneceram em relativa estabilidade desde então, com moderadas variações, tendencialmente negativas. Diante de tal dinâmica diferenciada, a participação dos juros foi crescente no âmbito das despesas com serviços da dívida: saltou de 40,59% para 52,14% entre 1999 e 2010, resultando numa média anual de 55,53%. As amortizações, que representavam 59,41% em 1999, caíram para 48,50% em 2010 e se situaram na média de 44,47% ao longo do período. Isso teve implicações importantes para o endividamento dos governos estaduais, uma vez que foi possível evitar a expansão desordenada dos passivos como no passado recente, sem, no entanto, equacionar seu portentoso estoque, mesmo sendo empenhando parcela substantiva de recursos com as obrigações financeiras.

A magnitude alcançada pelas obrigações com a dívida pode ser mensurada pela trajetória da necessidade de financiamento bruta (NFB). Os superávits primários obtidos desde 2000 não bastaram para fazer face às despesas com juros, encargos e amortização, exigindo, complementarmente, a contratação de empréstimos, a alienação de ativos e/ou o protelamento da quitação efetiva de gastos. Os dados da Tabela 5.1 mostram que somente as operações de crédito e a alienação de ativos (FF¹) foram incapazes de assegurar a suficiência financeira (SF¹/IF¹) dos governos estaduais, o que só foi possível em 2007 e 2008, mesmo assim em patamar bastante modesto. Considerando nas fontes de financiamento a conta de “restos a pagar” (FF²), cujos dados disponíveis são posteriores a 1999, a situação foi alterada, indicando que o expediente de adiar o pagamento de despesas para exercícios seguintes foi decisivo para os estados conseguirem cobrir as suas insuficiências financeiras (SF²/ IF²).

A título de síntese provisória, deve ser enfatizado o esforço empreendido pelos governos estaduais no sentido de ajustar a estrutura de gastos às novas exigências fiscais e financeiras fixadas no bojo da renegociação das dívidas e da LRF. As dificuldades não foram triviais e apontaram para a persistência de problemas de complexo equacionamento, como a rigidez das despesas correntes – principalmente as de pessoal ativo e inativo. O controle alcançado dessa categoria de dispêndio, incluindo custeio, não foi negligenciável, mas esbarrou em limites bem demarcados, implicando o acompanhamento mais severo dos investimentos, que permaneceram em níveis modestos e instáveis,

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de modo a contribuir com a geração dos superávits primários necessários para servir a dívida, cujas obrigações financeiras ganharam estatuto de despesa obrigatória no âmbito do orçamento. Mais do que isso, a carga de juros e amortizações drenou fração importante de recursos, em magnitude superior aos superávits primários obtidos, requerendo a contratação de crédito, a alienação de ativos e a inscrição de gastos em “restos a pagar” como expedientes complementares a fim de propiciar cobertura à continuada deficiência financeira das contas estaduais.

A evolução do endividamento dos estados, evidentemente, refletiu esse quadro antes descrito, como fica claro a partir do exame das informações reunidas na Tabela 5.3, que fornece indícios a respeito da persistência de alguns problemas em aberto, ainda à espera de solução mais efetiva e duradoura. Cabe salientar, inicialmente, a trajetória discrepante que a dívida líquida do setor público (DLSP) descreveu frente à dos passivos dos estados (DLSPE). No acumulado do período em foco, o estoque da primeira cresceu tanto em termos reais quanto proporcionalmente ao PIB, enquanto a DLSPE teve incremento absoluto menos acentuado, permitindo, inclusive, que sua posição relativa nominal decrescesse. Entretanto, esse descompasso, denotando uma situação financeira aparentemente mais confortável e consistente dos governos estaduais, deve ser melhor explicado, a fim de evitar conclusões indevidas.

TABELA 5.3–EVOLUÇÃO DA DÍVIDA LÍQUIDA E DE PASSIVOS RENEGOCIADOS DOS ESTADOS

No documento Um estudo sobre a guerra fiscal no Brasil (páginas 143-146)

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