• Nenhum resultado encontrado

As exigências das soluções positivas em matéria do Direito Civil

CAPÍITULO I: DA CLÁUSULA (DOUTRINA) MEDIEVAL ‘REBUS SIC STANTIBUS’ ÀS

1.5. A SOLUÇÃO BRASILEIRA

1.5.2. As exigências das soluções positivas em matéria do Direito Civil

Pouco diferente é, entretanto, a solução para os contratos civis, oriundos das relações paritárias, entre iguais. No tocante às relações civis, o tratamento é trazido pelos artigos 317 e 478 a 480 do Código Civil. Dimana do artigo 478 do Código Civil a possibilidade de resolver ou modificar por onerosidade excessiva superveniente os contratos bilaterais de duração, os quais podem ser caracterizados como de execução continuada ou instantânea, porém diferida. O mesmo decorre do artigo 317 do Código Civil, na medida em que o dispositivo utiliza a expressão «desproporção manifesta entre o valor da prestação e do momento da sua execução», o que faz entender não se tratar de contrato de execução imediata141.142

Embora seja a legislação silente no que toca ao abarcamento do instituto da onerosidade excessiva aos contratos aleatórios de execução continuada, predomina no contexto brasileiro a aceitação da extensão da regra para estas contratações. Desde que o evento superveniente, extraordinário e imprevisível não se relacione com a álea tipicamente respeitante ao contrato, consoante

140 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa..., 2008, p. 165; KHOURI, Paulo Roque A. Direito...,

2013, p. 118.

141 KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 33.

142 A disciplina dos referidos dispositivos assim se perfez, pois, contratos de duração não se

consumam no próprio ato da celebração e, nesta medida, o cumprimento da prestação está situado em momento cronologicamente distante da conclusão contratual. Situação que deixa a economia do contrato suscetível de ser abalada por eventos supervenientes (FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 614).

dispõe enunciado nº 440 do Centro de Estudos Judiciários143/144. Ou seja, desde que o fato causador de onerosidade não implique os mesmos riscos que o contrato atribuiu às partes e esteja fora da álea contratual específica, principalmente porque estes também podem sofrer com a incidência de evento que torne o seu cumprimento excessivamente oneroso145.146

De mais, conforme prevê o artigo 480 do Código Civil, poderá também haver revisão dos contratos unilaterais147 para eliminar a ocorrência de onerosidade excessiva superveniente. Para, com relação a estes, incidirem os efeitos da norma, caberá também a comprovação cumulativa dos demais pressupostos atinentes à onerosidade excessiva superveniente148/149. Entretanto, relativamente aos contratos unilaterais, cumpre esclarecer que o intento da regra não é o de remediar o desequilíbrio superveniente entre duas prestações, mas possibilitar que a prestação efetuada no momento da celebração do contrato se relacione com o sacrifício exigido ao tempo do cumprimento da prestação150.151

143 Dada a pluralidade de instituições jurídicas brasileiras, públicas, privadas e aventureiras,

confere uma breve nota acerca do Centro de Estudos Judiciários. Este Centro funciona junto ao Conselho de Justiça Federal e assume importante papel no que toca ao aperfeiçoamento da Justiça Federal, eis que promove cursos, seminários, encontros e debates sobre questões judiciais e administrativas relevantes, com a participação de especialistas de renome nacional e internacional. Detém um programa editorial voltado para a área jurídica e realiza pesquisas e diagnósticos que identificam e propõem soluções para os problemas que afetam a instituição. Confrontar informações em: JUSTIÇA Federal: Conselho da Justiça Federal. Centro de Estudos Judiciários. http://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/centro-de-estudos-judiciarios- 1.

144 Enunciado nº 440 do Centro de Estudos Judiciários: «Art. 478: É possível a revisão ou resolução por excessiva onerosidade em contratos aleatórios, desde que o evento superveniente, extraordinário e imprevisível não se relacione com a álea assumida no contrato». 145 Pela aplicabilidade da onerosidade excessiva aos contratos aleatórios posicionam-se

doutrinadores como: FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 786; GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008, p. 217-218.

146 Entendendo pela inaplicabilidade do instituto da onerosidade excessiva aos contratos de swap

porque a alteração não estava fora dos riscos próprios daquela contratação: TRIBUNAL de Justiça do Estado do Paraná. Acórdão nº 7662493 PR 0766249-3. Julgamento em 15 de junho 2011.

147 Contratos unilaterais, também denominados negócios jurídicos unilaterais, são assim

classificados porque, no tocante a formação do negócio, há apenas uma declaração de vontade (Cfr. FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 262).

148 GOMES, Orlando. Contratos..., 2008, p. 216.

149 Como bem explica KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 34-38, a simples alegação

de onerosidade excessiva superveniente não pode ensejar a revisão dos contratos unilaterais, na medida em que a leitura do artigo 480º não pode se dar de forma divorciada do artigo 478º.

150 FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Contrato..., 2011, p. 623.

151 Nos termos do referido dispositivo, a modificação designada pode se dar quantitativamente,

quando houver redução na prestação, bem como qualitativamente, na medida em que houver alteração no modo que a prestação será executada (KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 34-38). Ademais, o requerimento para que decorra alteração da prestação deve ser feito

Nos termos do Código Civil, a onerosidade excessiva capaz de fundamentar a incidência dos artigos 317, 478 a 480, além de ter de ser superveniente à conclusão contratual, é vinculada a ocorrência de um evento extraordinário e imprevisível. No que toca a superveniência do evento, significa dizer que o fato que causou a onerosidade excessiva não pode estar presente aquando da celebração do contrato. É, todavia, irrelevante o tempo que decorreu após a celebração do contrato para eclodir o acontecimento. Importa apenas que tenha resultado após a celebração, tendo em vista que repentinamente é possível a ocorrência da superveniência de um fato causador de excessiva onerosidade152.

Este evento não pode ter sido causado pelo sujeito que invocou a modificação ou a resolução do contrato. Deve ser o próprio evento superveniente a causa que prevaleça a fim de desencadear a onerosidade excessiva ou então a causa única, neste sentido153. Ainda, deve o evento superveniente afetar o contrato em sua integralidade.154

Carece também seja extraordinário o evento capaz de justificar a intervenção heterónoma do Estado-juiz no seio do contrato. Extraordinariedade esta que deve ser lida na medida em que represente um risco impróprio para o contrato, ou seja fora do seu âmbito, fora de seus riscos normais.155

Consoante já dito, todo contrato possui sua álea normal, a qual é determinada em razão do tipo legalmente definido, pela função que comporta, pelo fim visado e pelas cláusulas que foram nele moduladas para delimitar sua amplitude. E é esta álea que acaba por estabelecer os riscos respeitantes a contratação156. Quando uma situação superveniente estiver, então, fora desta álea contratual típica, porque objetivamente estranha ao contrato à luz de todas

judicialmente (DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 401).

152 Refere-se AGUIAR JUNIOR, Ruy de. Comentários..., 2011, p. 898-899, ao bloqueio dos

depósitos bancários ocorrido por força do Plano Collor que inviabilizou cumprimento de prestações contratuais.

153 Comporta haver um nexo causal entre o fato superveniente e a onerosidade excessiva. 154 AGUIAR JUNIOR, Ruy de. Comentários..., 2011, p. 902.; MARTINS-COSTA, Judith.

Comentários ao Novo Código Civil. vol. V. Tomo I. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 310- 311.; KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 52.

155 FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 616.

156 Definição teórica de álea normal do contrato, tendo em vista que o Código Civil brasileiro não

as suas peculiaridades, é que será ela anormal para o contrato e por isto extraordinária.

A mais, o evento a relevar deve ser, do mesmo modo, imprevisível. Acerca da definição da imprevisibilidade do evento existe, no contexto jurídico brasileiro, discussão no que toca {a sua definição157/158. Entretanto, deve prevalecer o entendimento de que à imprevisibilidade procede uma análise objetiva, independente da aferição da situação psíquica das partes aquando do fecho do contrato. Eis que, em uma perspectiva objetiva, a vontade não tem praticamente nenhuma contribuição, já que o que está em causa é o conteúdo

157 A primeira vertente identificada aceita a teoria da imprevisão, de matriz francesa, para tratar

do elemento imprevisibilidade. Esta, em regra, recusa encarar o fato imprevisível tendo como parâmetro o mercado e assegura que deve sê-lo feito tendo como parâmetro as partes da contratação. Nesta medida, considera ser imprevisível aquilo que está fora da cogitação das partes aquando da contratação (Cfr: TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 6. ed. São Paulo: Editora Método, 2016, p. 660-661.; AGUIAR JUNIOR, Ruy de. Comentários..., 2011, p. 899.; DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro. v. 3. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 399-400; ainda, pese embora reconheça que os artigos 478º a 480º incorporaram à Ordem Jurídica brasileira a teoria da onerosidade excessiva, entende que para determinação do elemento imprevisível deve-se recorrer da teoria da imprevisão: GOMES, Orlando. Contratos..., 2008, p. 215). Esta corrente, pondera decisivo para definir a imprevisibilidade a previsão ou não do evento pelas partes, o qual é avaliado de forma subjetiva. Isto implica considerar que uma situação extraordinária pode ser imprevisível. Mas, para esta, os elementos imprevisibilidade e extraordinariedade não são equivalentes e, portanto, não se confundem (Cfr: AGUIAR JUNIOR, Ruy de. Comentários..., 2011, p. 899; ao explicar a questão: ASCENSÃO, José de Oliveira.

Alteração..., 2004, p. 9 e ss). Ainda, posiciona-se pela avaliação da imprevisibilidade

acompanhada da ideia de probabilidade. Todavia não uma probabilidade puramente objetiva, mas que envolve subjetivismo dos contratantes. A probabilidade é medida pelas circunstâncias conhecidas pelas partes, conforme o juízo que façam derivado de suas condições pessoais, seus conhecimentos e aptidões, e ainda da experiência que detém. Logo, é imprevisível o fato que notoriamente não seria provável de influir eficientemente sobre a contratação das partes segundo um juízo razoável que façam proveniente da experiência. E, para este juízo de probabilidade do evento devem ser consideradas as condições objetivas do contrato, que seriam definidas pela natureza do contrato, quantidade de contratantes, condições do mercado, e junto a isto, as condições subjetivas das partes. Contudo, esta mesma vertente reconhece que apesar de a distinção teórica entre extraordinário e imprevisível ser identificável, na prática os dois elementos são indistintamente tratados, como se comportassem o mesmo significado (Cfr: AGUIAR JUNIOR, Ruy de. Comentários..., 2011, p. 900-901; AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de. Extinção

dos contratos por incumprimento do devedor: resolução. 2. ed. Rio de Janeiro: Aide Editora. Rio

de Janeiro, 2004. p. 154-160).

158 O que acontece é que a conceção voluntarista e subjetivista do elemento imprevisível,

entende que os requisitos “imprevisível e extraordinário” comportam significados e campo de atuação distintos. Deste modo, o anormal, o extraordinário, podem ser previsíveis, na medida em que a avaliação da presença da previsibilidade não se dá de forma particularizada e objetiva com relação ao contrato em concreto, mas pautada no subjetivismo das partes contratantes, na vontade e psique dos agentes. Nesta medida, pode ser subjetivamente previsível, por exemplo, a ocorrência de acontecimentos anormais, extraordinários como guerras no Iraque, terremotos no Japão, furacões na Flórida, etc. Porém, numa perspectiva objetiva estas mesmas situações podem não ser previsíveis, ou seja, podem configurar-se como imprevisíveis pois, em uma relação contratual específica - mesmo diante da previsibilidade de tais fatos anormais – a ocorrência de determinados acontecimentos é efetivamente extraordinário, anômalo, anormal àquele contrato (Cfr. KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 54-55).

do contrato159/160. E mais, porque atualmente prevalece outra perspectiva de relação negocial, a qual parte da premissa de obrigação como processo em que há um conjunto de atos coordenados que visam o adimplemento e que não mais aceitam que se pretenda colocar na vontade inicial dos contratantes todo o desenvolvimento futuro e progresso que a relação contratual terá161.

Por esta razão é que caberá ao julgador analisar dentro e conforme a dinâmica de uma relação contratual em concreto, de forma objetiva, a imprevisibilidade do fato. E, nesta medida, aferir se para aquele contrato observado em termos objetivos o fato é imprevisível, anormal, anômalo e traz, pela mesma razão, consequências imprevisíveis162. Isto, tendo em vista que, o imprevisível qualifica o fato163, sobretudo se as suas graves repercussões na execução do contrato extrapolam os riscos próprios estabelecidos pelos contratantes e geram um risco extraordinário.164/165

Sendo assim, será imprevisível o que é anormal ao contrato, que foge à álea contratual posta. E daí compreender que os elementos extraordinário e imprevisível se relacionam de forma harmónica e não só se relacionam, mas a extraordinariedade fortifica o que deve ser entendido por imprevisibilidade. E que, somente os riscos absolutamente anormais, que nenhum cálculo racional económico seria capaz de considerar como hábil de desequilibrar a relação contratual, é que podem levar à resolução do contrato166/167.

159 KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 55.

160 Ao comentar o Código Civil brasileiro ASCENSÃO, José de Oliveira. Alteração..., 2004, p. 10,

refere que a eclosão de fato superveniente deve vir a alterar a base negocial, muito embora a codificação brasileira não seja deveras clara neste sentido.

161 FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 617; SILVA, Luis

Renato Ferreira da. Princípios do Direito das Obrigações (p. 46-67). In: Obrigações. Instituto de Direito Privado – IDP. Editora Atlas. São Paulo. 2011. p. 49 e ss.; SILVA, Clóvis do Couto e. A

obrigação como processo. Rio de Janeiro: Editora FGV. 2006. p. 20.

162 FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 618.

163 Neste sentido coloca ASCENSÃO, José de Oliveira. Alteração..., 2004, p. 9 ss, que o

“imprevisível” conforme consta da lei, deve ser efetivamente interpretado como imprevisível enquanto qualificador do fato e não como imprevisto porque não previsto pelas partes, o que descreve o estado de espírito dos agentes.

164 KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 157.

165 De forma a relacionar a extraordinariedade com os riscos impróprios do contrato:

ASCENSÃO, José de Oliveira. Alteração..., 2004, p. 9 ss.; AGUIAR JUNIOR, Ruy de.

Comentários..., 2011, p. 898-903; a considerar a necessidade de eclodir o evento fora dos riscos

próprios do contrato: KHOURI, Paulo Roque A. A revisão..., 2006, p. 56-61.

166 ASCENSÃO, José de Oliveira. Alteração..., 2004, p. 9 ss.

167 São exemplos do que se pretende abarcar dentro dos conceitos de imprevisibilidade e

extraordinariadade: eventos atinentes a fatores políticos, históricos, econômicos, financeiros, legais ou tecnológicos que causam algum tipo de dano econômico aos contratantes, porque,

O referido acima demonstra o alcance geral que devem ter os eventos a serem considerados para o fim de incidência da norma. Assim como, que devem ser estes genericamente aplicáveis a toda e qualquer pessoa que se encontre na posição em que estão as partes do contrato a ser eventualmente alterado168/169.

Por fim, no contexto jurídico brasileiro, no que toca à extraordinariedade e imprevisibilidade dos eventos, estes conceitos não se limitam à ocorrência do fenômeno em si, podendo ser respeitantes ao grau, a quantidade ou a dimensão do fenômeno170. É, destarte, neste sentido exposto que devem ser interpretados alguns dos enunciados do Conselho da Justiça Federal: notadamente, o de nº 366 que define: “O fato extraordinário e imprevisível causador de onerosidade excessiva é aquele que não está coberto objetivamente pelos riscos próprios da contratação”171; e o de nº 175, que assegura: “A menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade, insertas no art. 478 do Código Civil, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gere o desequilíbrio, mas também em relação as consequências que ele produz”172.173

Afora os citados requisitos, o artigo 478 do Código Civil brasileiro ainda dispõe sobre a necessidade da «prestação de uma das partes se tornar

sendo objetivamente extraordinários e imprevisíveis, interferiram na relação contratual das partes (Cfr: GLITZ, Frederico Eduardo Z. Anotações..., 2011, p. 1).

168 GOMES, Orlando. Contratos..., 2008, p. 214-215; FRANTZ, Laura Coradini. Excessiva Onerosidade Superveniente: uma análise dos julgados do STJ. In: MARTINS-COSTA, Judith et

al. Modelos de Direito Privado. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 228.

169 No mesmo sentido: TRIBUNAL de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº 1012500-

48.2015.8.26.0037. Julgamento 24 de maio de 2016.

170 Em voto do Desembargador Adroaldo Furtado Fabrício que a inflação era e após o Plano

Bresser voltou a ser previsível quanto à sua ocorrência, todavia não significa dizer que os índices da inflação são sempre previsíveis pelo homem comum, mediano e que sejam, na dimensão que se apresentaram integrantes do risco do negócio. TRIBUNAL de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível, nº 586053548. Julgamento em 24 de março de 1987.

171 BRASIL. CJF – Enunciados. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2006-nov-

12/cjf_disponibiliza_125_enunciados_jornada?pagina=6>.

172 O enunciado revela que mesmo fatos previsíveis em um contexto como a guerra, alta de

inflação, greve, podem ser qualificados, em uma relação contratual em concreto, imprevisíveis e extraordinários, porque, conforme a dinâmica de um determinado contrato, a intensidade das consequências da eclosão de um evento como estes pode não ser pertinente aquela contratação porque no curso natural das coisas não poderia influir no contrato (Cfr. FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 617-618). Ademais disto, obstante se esteja a falar do CJF, não está em foco qualquer questão relativa aos contratos com a Administração Pública, eis que as especificidades destes não são objeto de estudo no presente trabalho.

173 Desta mesma forma cumpre entender os «motivos imprevisíveis» constantes do artigo 317

do Código Civil. Na medida em que não há sentido em recorrer à psique dos contratantes para determiná-los pois, seria voltar ao subjetivismo e voluntarismo que não é o que se pretende neste seio (KHOURI, Paulo Roque A. A revisão…, 2006, p. 31-34).

excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra». O que o instituto visa abarcar neste tocante é a eclosão de um evento superveniente, extraordinário e imprevisível capaz de afetar o sinalagma funcional do contrato e, por esta razão, causar um desequilíbrio económico entre a prestação e a contraprestação determinante para originar uma perda de reciprocidade entre ambas174.

Está aqui em causa o contrato como um todo, desde sua base que comporta as circunstâncias causais da contratação e não as aspirações contratuais de apenas um dos contratantes175. Neste sentido dispõe o enunciado nº 365176 do Conselho de Justiça Federal. Isto, dado que assegura que mesmo não sendo demonstrado plenamente o empobrecimento de uma das partes contratantes e o enriquecimento da outra é possível requerer a resolução contratual invocando a onerosidade excessiva superveniente, porque havendo uma alteração anormal na base do negócio, a qual é comum para ambas as partes, fica claro que a relação contratual como um todo fora afetada e é isto que, em verdade, se pretende evitar.177/178

Daí porque considerar que a onerosidade excessiva para uma parte poderá se verificar quando a prestação ficar muito além daquilo que havia sido

174 FRANTZ, Laura Coradini. Excessiva..., 2014, p. 220-224.; ASCENSÃO, José de Oliveira. Onerosidade..., 2007, p. 528-529; FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 616.; GOMES, Orlando. Contratos..., 2008, p. 215.

175 Ressaltando que não está em causa para a aplicação do instituto da onerosidade excessiva

as expectativas subjetivas dos contratantes e sim a comutatividade da contratação: SUPERIOR Tribunal de Justiça. T3 – Terceira Turma. Recurso Especial nº 977.007 - GO (2007/0189135-0). Julgamento em 24 de novembro de 2009.

176 Enunciado 365 do CJF: «A extrema vantagem do art. 478 deve ser interpretada como elemento acidental da alteração de circunstâncias, que comporta a incidência da resolução ou revisão do negócio por onerosidade excessiva, independentemente de sua demonstração plena». CONSELHO da Justiça Federal. IV Jornada de Direito Civil. Enunciado aprovados. [Em

linha]. Disponível em: http://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/483. Acesso em: 20 de set. 2017.;

177 Neste sentido: FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson. Direito..., 2011, p. 618-

619; e; TARTUCE, Flávio. Manual..., 2016, p. 661.; ASCENSÃO, José de Oliveira. Alteração..., 2004, p. 9 ss.

178 Este entendimento não é unívoco no seio do Direito Civil brasileiro. Por isto é possível deparar-

se com decisões jurisprudenciais e posicionamentos doutrinários que exijam a demonstração, além da onerosidade excessiva para uma parte, da vantagem extrema para a outra, sob pena de não operar a revisão ou resolução contratual por onerosidade excessiva superveniente (Neste sentido: TRIBUNAL de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível, nº 70056528912. Julgamento em 16 de julho de 2015; TRIBUNAL de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70027440049. Julgamento em 14 de abril de 2009; TRIBUNAL de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70026697029. Julgamento em 29 de abril de 2009. TRIBUNAL de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70028802635. Julgamento em 22 de julho de 2010).

objetivamente pactuado179/180. E mais, daí porque não há que, necessariamente, demonstrar ter decorrido vantagem excessiva para a contraparte181.182

Além dos requisitos enumerados, a incidência do instituto da onerosidade excessiva superveniente também não se justifica quando a parte que pede a revisão tiver incorrido em mora (inadimplemento relativo), tratando- se esta de mora culposa, ou estiver definitivamente inadimplente183/184. Este pressuposto não consta expresso na norma, porém o entendimento deve se dar nestes termos: a uma, porque cabe neste tocante seguir a sistemática da regra tradicional constante do Código Civil brasileiro no artigo 399185, primeira parte; a duas, porque inexiste qualquer manifestação, nos preceitos legais que dão origem à revisão por onerosidade excessiva superveniente, de tratar-se de uma exceção quanto à mora186.

Demonstrado, através da comprovação cumulativa dos elementos acima enumerados, que o circunstancialismo do contrato restou desequilibrado, poderá

179 KHOURI, Paulo Roque A. A revisão…, 2006, p. 113.

180 A onerosidade excessiva poderá se verificar porque passou a existir um sacrifício maior para