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As novas bases legais e conceituais da EEI: a atuação do MEC

3. A OCUPAÇÃO DAS TERRAS INDÍGENAS DO ALTO SOLIMÕES: O CONTEXTO

3.5. AS AÇÕES EDUCATIVAS DA SOCIEDADE CIVIL

3.6.2. As novas bases legais e conceituais da EEI: a atuação do MEC

Esse contexto de forte mobilização social acompanhava de perto as mudanças que se faziam no Estado brasileiro desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 - marco de especial importância para os povos indígenas na medida em que delimitou o fim da tutela e o início do direito à manutenção de suas línguas e cultura, de se manterem índios

com suas formas próprias de organização social, do usufruto de suas terras tradicionais e de educar seus filhos considerando seus modos próprios de ensinar.

Em 1991 ocorreu a transição do atendimento à Educação Escolar Indígena da Funai para o MEC durante o curto governo Collor, revelando tanto a enorme crise e descrédito do órgão indigenista junto aos pesquisadores, antropólogos e educadores que atuavam nessa área, como também apontava para a fragilidade do lugar que ela passava a ocupar na estrutura do MEC.

O Decreto No. 26/91 que transferia para o MEC a tarefa de coordenar a educação escolar indígena o fazia nos mesmos moldes em que se dava a educação dos não-índios, ou seja, a execução ficava a cargo dos estados e municípios. Se as críticas à atuação da Funai junto aos povos indígenas eram antigas e generalizadas, especialmente motivadas pela delegação de suas funções aos missionários do SIL, como acreditar que a situação da EEI melhoraria se promovida pelos gestores que representavam os grupos locais e setores sociais que lutavam contra os direitos indígenas? Essa transferência para as secretarias estaduais e municipais contrariava a expectativa de que o Ministério seria o gestor das escolas no âmbito da educação escolar indígena; mais do que isso, era o rompimento de um princípio que norteara a política indigenista até então, ou seja, sua execução por órgãos federais para se contrapor às forças locais. A leitura de textos da época expressa o conflito latente: apesar desses graves e conhecidos problemas, como ser contra o decreto estando a Funai tão enfraquecida? 143

Ao Decreto No. 26/91 seguiu-se a Portaria Interministerial 559/91 que rompeu com o caráter integracionista das escolas para índios144. Essa Portaria reconhecia a EEI como fundamentada no respeito às línguas, costumes, organização social e processos de transmissão do saber e manutenção da própria cultura, mas não delegava aos índios a responsabilidade pela elaboração dos currículos e programas específicos de EEI. Essa

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Em relatório elaborado em 1974, Coelho dos Santos já apontava como fator positivo de mudança a entrada do MEC na discussão sobre a educação escolar indígena, porque poderia favorecer a criação de um corpo técnico especializado em educação bilíngüe, e propor às universidades pesquisas sobre a problemática indígena que ampliariam o repertório sobre os povos indígenas. Entretanto o tempo passou e até hoje o MEC não criou um corpo técnico especializado em educação escolar indígena, sofrendo com falta de pessoal, de estrutura, além da enorme dificuldade de articulação interna entre as secretarias. Se há universidades que desenvolvem linhas de pesquisa sobre os povos indígenas, não o fazem por estímulo do Ministério da Educação.

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O modelo de escola integracionista é preconizado no Estatuto do Índio (Lei 60001/73), estando ainda em vigor, em decorrência da paralisação ao longo dos anos do processo de aprovação do Novo Estatuto do Índio, proposto de modo coerente com a inspiração democrática da Constituição Federal de 1988.

mesma Portaria criou no Ministério da Educação a Coordenação Nacional de Educação Escolar Indígena (Ferreira, 2001), composta por técnicos do MEC e especialistas em educação escolar indígena com a responsabilidade de coordenar, acompanhar e avaliar as ações de educação escolar indígena em andamento. Estabeleceu ainda a tarefa prioritária de formar professores indígenas, criar condições para a regularização das escolas indígenas com calendário e material específico, e também orientou a criação dos Núcleos de Educação Escolar Indígena (NEI) nas secretarias estaduais e municipais de educação, contando com a participação de representantes indígenas, das organizações governamentais e não-governamentais e universidades afetas à EEI.

Manter a educação na Funai era uma idéia indefensável às instituições e especialistas porque a Fundação pouco fizera além de distribuir alguns materiais escolares e recusar-se

em “admitir que o processo de escolarização deveria passar, necessariamente, pela formação de professores indígenas” (Kahn, 1993, p.3). Kahn criticava também a

inexistência no MEC de uma instância que gerisse a EEI, já sinalizava a demanda por formação de professores que cresceu bastante ao longo do tempo. A essa necessidade o Ministério da Educação não foi capaz de responder com a criação de políticas públicas de longo prazo, limitando-se a promover ações e programas isolados que não suprem, até hoje, as necessidades dos povos indígenas. Ao delegar a execução da educação escolar indígena aos estados, teve início um novo campo de conflitos derivado da ineficiência do Regime de Colaboração entre União, Estados e Municípios.

No governo de Itamar Franco, através das Portarias 60/92 e 490/93, o MEC instituiu o Comitê de Educação Escolar Indígena integrado por representantes indígenas das diversas regiões do país, antropólogos, lingüístas, representantes da Associação Brasileira de Lingüística (Abralin), Associação Brasileira de Antropologia (ABA), ONGs, Funai, MEC e de dirigentes estaduais e municipais. O Comitê foi instalado mas sem regimento, sem definição de funções e capacidade de interferir na criação de uma política para a EEI, deixando que as ações ficassem por conta das secretarias municipais e estaduais. Alguns Núcleos de Educação Escolar Indígena já existentes se fortaleceram com a colaboração do Comitê, porém, em muitas regiões eles sequer existiam como ocorre até o presente.

Conforme Grupioni (2008, p.50), “[...] ao assumir a condução do processo de oferta de educação escolar aos povos indígenas, o Ministério da Educação que não tinha qualquer

tradição de atuação nessa área [...]” e acabou abrindo-se à participação de linguístas, professores e organizações indígenas, antropólogos, universidades, associações científicas e ONGs que contribuíam com suas experiências específicas na elaboração da nova linha de política pública. Como bem sinaliza o autor, a chegada e a atuação desses atores marcaram uma nova época, de forte participação da sociedade civil na definição de políticas e diretrizes145.

O rompimento com representantes religiosos e missionários,146 até então aliados à Funai, e a conquista de espaço no MEC pelos novos atores vindos da sociedade civil, fortaleceu a busca pela construção de novos parâmetros para a EEI tendo por base as boas experiências que já eram desenvolvidas pela Comissão Pró-Índio do Acre (CPI/AC), Instituto Socioambiental (ISA) no Xingu e Rio Negro, Centro de Trabalho Indigenista (CTI) entre os Terena e Timbira e a OGPTB/AM no Alto Solimões, além das contribuições dos professores indígenas, demais docentes e núcleos de pesquisas de universidades que atuavam junto a esses povos em diversas regiões brasileiras147.

Para Grupioni (2008), o esforço do grupo foi partir dessas diferentes práticas e chegar a consensos que se traduzissem num novo papel para as escolas indígenas e em novas linhas de ação governamental. Os conceitos propostos, e que acabaram por se tornar paradigmas, são:

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Como veremos adiante, a partir de meados dos anos 2000 esses setores foram afastados e, em seu lugar, os técnicos dos sistemas de ensino assumiram o espaço e o poder junto ao Ministério de Educação marcando o fim desse ciclo.

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Em Parecer sobre o Summer Institute of Linguistics, encaminhado ao Ministério da Educação, GRUPIONI (1999) defende a adoção de critérios mais rígidos para entrada de missionários em terras indígenas. Critica que a Funai não formou corpo técnico para atuar na formação de professores deixando a educação escolar indígena na mão dos pastores que, usando a escola como canal de entrada, acenam com o ensino da língua indígena escrita. Aponta a desestruturação étnica causada pelos valores e práticas impostos. Revela que, com o objetivo de formar leitores da bíblia e não estudiosos críticos da política e da educação desqualificam a necessidade de demarcar terras, partindo do

princípio que só a palavra da bíblia trará melhores condições de vida, num discurso civilizatório, “reduz o problema

das injustiças sociais, da falta de terra (principal problema dos índios), das desigualdades sociais e de todo tipo de discriminação, ao desconhecimento que os povos indígenas têm dos Evangelhos. Os índios são tidos como primitivos

e impuros por terem se mantido afastados “da palavra”. (Grupioni, 1999, p.10). Afirma também que o tipo de

assistência em saúde e educação oferecidas pelo SIL tem criado um grande problema de concentração da população indígena no entorno desses equipamentos, e consequente escassez de recursos para alimentação. Ao final do texto defende a retirada dos missionários, todos e quaisquer das terras indígenas lembrando que adotar uma religião é direito individual e quem quiser vai buscar, mas a educação no Brasil é laica. Esse posicionamento foi acompanhado de reação por parte dos missionários, ocasião em que o Comitê de Educação Escolar Indígena determinou finalmente o afastamento do SIL das áreas indígenas.

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Sobre a atuação dos movimentos sociais junto aos povos indígenas, a partir da década de 70, consultar MONTE, Nietta Lindember. E agora, cara pálida? Educação e povos indígenas, 500 anos depois. In: Unesco/MEC/Anped.

- Escola como possibilidade de estabelecer relações mais equilibradas e que permita o diálogo intercultural;

- Escola que contribua para valorizar práticas culturais e que mantenha as identidades diferenciadas dos povos indígenas;

- Escola que tenha um bom desempenho por serem os professores indígenas com direito a formação;

- Escola na qual a comunidade tenha papel na definição de objetivos e gestão; - Escola que elabore seu material didático;

- Escola que alfabetize na língua materna.

Ainda em 1993 o Comitê lançou as Diretrizes para a Política Nacional de Educação Escolar Indígena propondo princípios que refletiam as posições e as orientações que os professores indígenas imprimiam em seus debates e encontros mas que ainda não se constituíam em políticas públicas: ensino laico, afirmação da especificidade, valorização das línguas indígenas. A aceitação oficial da especificidade da EEI, inserida no sistema público e a ser universalizada, tornava-se um discurso encampado pelo Estado.

O texto das Diretrizes afirmava que a escola indígena específica e diferenciada referenciava-se nas particularidades culturais de cada etnia e sua história de contato. O currículo deveria ser construído através de pesquisa de equipe interdisciplinar e não imposta uma grade comum às escolas rurais ou urbanas. O professor e o aluno construiriam coletivamente o conhecimento, mantendo estreita relação dialógica entre si e a comunidade. Os materiais didáticos deveriam ser produzidos pelos indígenas, incluindo neles seus conhecimentos específicos, assim como refletiriam a situação sociolinguística de cada comunidade. A organização da escola deveria prever o respeito às datas, práticas e atividades da comunidade. Como todos os envolvidos seriam indígenas, haveria a necessidade de criar a carreira de magistério indígena para formar pesquisadores, redatores, gestores e docentes.

Na introdução, as Diretrizes mantinham a decisão de atribuir à União a responsabilidade pela EEI, cabendo a execução dos projetos aos estados e municípios, assim como a promoção da formação de professores indígenas e dos técnicos e gestores das secretarias de educação, contando com apoio das universidades. Afirmavam que a descentralização

envolvidos”148

(MEC, citado por Inep, 1994, p.174). Como as Seducs e NEIs não recebiam recursos específicos para tal ação, previa-se que deveriam usar os de seus PTAs (Plano de Trabalho Anuais) comuns à educação básica e isso resultou em maior resistência ao desenvolvimento da Educação Escolar Indígena.

Apesar desse posicionamento do MEC sobre a parceria com os demais entes federados na execução da EEI, o início da década de 90 foi marcado pelo otimismo e superação do modelo de escola integradora, tais como os internatos mantidos por ordens religiosas e destinados a retirar as crianças do convívio familiar e do aprendizado das suas língua e cultura, ou das escolas bilíngües da Funai nas quais os professores indígenas eram apenas monitores com o papel de ajudar seus parentes a aprenderem mais facilmente a língua portuguesa e abandonarem a indígena. Estudos e publicações da época, a exemplo da tese Dias da Silva (1997a), reforçavam a certeza de que os índios haviam tomado em suas mãos a escola que fora instrumento de dominação durante séculos.

Assim também, em seu discurso na posse dos membros do Comitê de Educação Escolar Indígena em março de 1993, Aracy Lopes da Silva, afirmava que diferentemente dos anos 70 e do predomínio das escolas catequéticas e “civilizadoras”, os anos 90 revelavam a força do movimento e da organização dos professores indígenas, das experiências de escolas e pedagogias e dos encontros regionais e nacionais de reflexão sobre o tema. Porém, com vistas à situação nacional, Silva (1993) já indicava que a incompetência, a falta de formação e o preconceito mostravam o longo caminho que se abria ao protagonismo indígena naquele Comitê. Defendia que os especialistas que atuavam desde a década de 70 nas organizações da sociedade civil eram indispensáveis para assessorar o novo Comitê, transformando as experiências inovadoras e sintonizadas como os interesses dos povos indígenas em diretrizes para as políticas públicas. (Silva, 1993, p.5)

O processo de tramitação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB/1996) contrapôs os planos da sociedade civil e do senador Darcy Ribeiro e contribuiu para que

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Este ponto é crucial para compreendermos como, em que momento, e por que tiveram origem os principais problemas sofridos no campo da educação escolar indígena. Embora, a defesa da transferência de responsabilidade da EEI para o MEC fosse antiga, e apesar das proposições dos encontros da COPIAR (depois COPIAM) apontarem inicialmente para a necessidade de um sistema federalizado, o Ministério da Educação deu o mesmo tratamento à educação dos

povos indígena que oferecia aos demais: delegar sua execução aos entes federados. Entretanto, a maioria dos “agentes envolvidos” nunca assumiu, e outros o fizeram precariamente, as Diretrizes e mesmo as Resoluções e Pareceres que

essa lei pouco ampliasse o que já era reconhecido pela Constituição Federal de 1988; ou seja, assegurava às comunidades indígenas o uso de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem, embora de modo inédito, explicitasse a existência da Educação Escolar Indígena (EEI). Incluiu, nas Disposições Gerais (Artigos 78 e 79) e não em um nível específico de ensino, a obrigação do Estado em oferecer uma educação que fortalecesse a língua e as práticas culturais e sociais dos povos indígenas, favorecendo a recuperação das memórias históricas e reafirmação das suas identidades étnicas. Além disso, determinava que na elaboração dos programas e dos currículos destinados aos povos indígenas, os sistemas de ensino contassem com a intensa participação dessas comunidades, assim como promovessem a formação dos professores e publicassem materiais didáticos específicos. Esse movimento pró-direitos indígenas no Brasil foi reforçado pelo crescimento da importância nacional e internacional de temas relacionados à valorização da identidade étnica e das minorias sociais e lingüísticas149.

As orientações da LDB/96 e da política de municipalização da educação promovida por Fernando Henrique Cardoso, quando na Presidência da República, gerou, especificamente no estado do Amazonas, uma situação bastante crítica para a educação escolar indígena. A Seduc/AM, que sempre teve uma estrutura muito precária no interior, foi estimulada pela política federal de descentralização da educação, delegando aos municípios junto com o ensino fundamental dos não-índios, a EEI.

É também no bojo da elaboração de diretrizes curriculares nacionais para diversos níveis e modalidades de ensino que se insere o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas (RCNEI) de 1998, produzido a partir da mobilização de índios e não-índios. Vários professores ticunas, que na época faziam o curso de magistério, participaram desse processo, defendendo as proposições e experiências discutidas e construídas coletivamente.

149 A síntese de alguns instrumentos internacionais aos quais o Brasil aderiu nas últimas décadas e um quadro

comparativo dos avanços jurídicos a respeito do direito dos povos indígenas manterem suas culturas e línguas é encontrada em Grupioni (2008), entre eles: Convenção 169 Sobre Povos Indígenas e Tribais em Países

Independentes adotada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1989 e ratificada pelo Brasil em

2003; Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas aprovada pela ONU em 2007, Convenção Internacional

sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, desse mesmo organismo, à qual o Brasil aderiu

em 1968; Declaração sobre Diversidade Cultural, de 2001; Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação

no Campo do Ensino, de 1960 e Declaração de Princípios sobre a Tolerância, de 1995, todas aprovadas pela

Unesco; Declaração Interamericana sobre Direitos dos Povos Indígenas pela Organização dos Estados

Americanos, ainda em tramitação. A Convenção 169 da OIT tem especial importância na luta dos povos indígenas atualmente por ter instituído o “direito de consulta prévia” livre e informada dos povos indígenas em relação a ações

O RCNEI contou também com a colaboração de Jussara Gomes Gruber, coordenadora e professora de arte do curso ministrado pela OGPTB.

O RCNEI, ao pensar na educação como um processo para formar uma sociedade pautada por valores escolhidos com muita reflexão, é um achado, simples e complexo ao mesmo tempo, resultado de consultas a muitos setores, especialistas, índios e professores. O esforço é aproximar da realidade e do currículo de cada escola indígena os princípios e direitos assegurados pela CF e pelas leis – como vimos avançados. Trata-se de construir modelos e conteúdos pedagógicos, elaborando a diferença, em vez de impor idéias predeterminadas. (Mindlin et al, 2002, p.37)

Se havia a dificuldade de propor um documento nacional que contemplasse as especificidades locais, menor não eram os percalços para atingir também os gestores e técnicos das secretarias de educação que atuavam habitualmente de modo impositivo e desrespeitoso. Com intenção de fortalecer os indígenas e esclarecer os dirigentes, a primeira parte do RCNEI dá ênfase aos direitos e à legislação, seguida de módulos por disciplina, oferecendo orientações e experiências inovadoras de educação intercultural vivenciadas por professores de diversas regiões do país150.

A avaliação feita por Mindlin (2004) da política educacional indígena no período 1995- 2002 oferece um importante estudo das contribuições e limitações do RCNEI151. Expressa o valor do esforço empreendido pelos autores em oferecer propostas de ações concretas nas diversas áreas do conhecimento e incluir a participação indígena nos documentos produzidos pelo governo. Porém, critica o fato do tema da cultura constar de modo transversal e não central ao currículo. Como resultado, as disciplinas da base comum nacional são apenas tocadas pelas questões culturais indígenas, sejam as relacionadas às formas próprias de organização social e política, às concepções de mundo, de cura, de aprendizado, assim como a diversidade de situações socio-linguísticas existentes. Desse

modo, tratados “como tema transversal apenas, assuntos tão densos se diluem e desaparecem” (Mindlin, 1994, p.116).

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Na minha experiência, um dos elementos dificultador do uso do RCNEI nos cursos e escolas indígenas é a linguagem pouco acessível do texto, especialmente para povos que têm a língua portuguesa como segunda língua. Apesar disso, continua sendo defendido pelos povos indígenas que pleiteiam sua continuidade para as demais séries da educação básica, já que o documento existente contempla apenas as quatro primeiras do ensino fundamental.

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O relatório da avaliação independente das políticas e ações do MEC durante a gestão Fernando Henrique Cardoso/Paulo Renato de Souza, foi elaborado pelos antropólogos Betty Mindlin, Hector Muñoz com a colaboração de outros indigenistas mas não foi publicado, assim como outras avaliações e pesquisas que o MEC viabilizou mas nunca levou a público. Parte da referida avaliação compôs o artigo A política educacional indígena no período

O empenho em construir um corpo de documentos que amparasse legalmente a educação escolar dos povos indígenas prosseguiu com a elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Escolar Indígena, aprovada por meio do Parecer 14/99 da Câmara Básica do CNE e normatizadas pela Resolução 03/99152. Esses textos de fundamental importância estabelecem, no âmbito da Educação Básica, a estrutura e funcionamento das escolas indígenas, sua condição específica com normas e ordenamento jurídico próprios,