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As redes sociais virtuais como atividade de lazer.

SOCIABILIDADES, PRÁTICAS CULTURAIS E LAZER NOS TEMPOS LIVRES DOCENTES

4.1.3. As redes sociais virtuais como atividade de lazer.

Nos dias de hoje, tal qual acontece com outras categorias de trabalhadoras/es, a socia- bilidade das/os professoras/es vai além das interações face a face, embora sua forma virtual seja distinta na experiência dos/as colegas da pesquisa.

A professora Janine, por exemplo, associando essa questão ao seu tempo, relatou:

Não tenho tempo. Rede social? Só para falar com meus irmãos no facebook, mas coisa rápida. Dei noticia, soube noticia, partiu (risos) (Entrevista conce- dida por Janine, em 10 de setembro de 2013).

De um modo geral, nos tempos cotidianos docentes, podemos constatar a relação dos indivíduos na chamada “cidade virtual”, mediados pelo computador, pelo telefone celular, i- pode, smartphone, tablete e outros equipamentos eletrônicos. Contudo, muito mais por uma necessidade de contatar familiares distantes, filhas/os que estudam em outras cidades, e/ou conversar com as/os amigas/os, já que os encontros presenciais não são tantos. Desse modo, as redes sociais aproximam mais as/os amigas/os e familiares, pelo menos para deixar e rece- ber notícia e “partir”, como diz a professora Janine, de modo tão fluido e efêmero.

As professoras e professores pesquisadas/os dizem aproveitar as frações de tempo que sobram, geralmente no horário de almoço ou aula vaga, nas escolas que têm wifi, para entrar nas redes sociais, principalmente para ficar em contato com as famílias distantes, como é o

189 caso da professora Élida, que destacou em seu relato: (...) “Fiquei no facebook para saber as novidades da família que mora no sul” (Mensagem de Élida, pela internet, em 13 de Janeiro de 2013).

Também tivemos relatos de professoras/es que não têm acesso à informática, e até re- pudiam o uso desta tecnologia. Quando precisam digitar um trabalho, pagam em uma lanhou- se ou pedem às/aos filhas/os para fazê-lo. O percentual desses sujeitos é equivalente a 22,2% (de ambos os sexos) que não usam ou usam raramente o computador. Do mesmo modo, exis- tem professoras/es que não estão conectadas/os às redes sociais e que não fazem nem questão de acessá-las. Esse é o caso, por exemplo, da professora Nil. Quando solicitamos que falasse sobre seus tempos nas redes sociais, declarou: “Eu sou anti-isso, nem sei se essa palavra exis-

te (risos)”. Outras/os docentes preferem outras tecnologias, permanecer com as relações pre-

senciais, como declara a professora Mary, ou ainda aquele que acessa as redes sociais, não para bater papo, como é o caso do professor Adilson:

Eu tirei o computador que era do meu quarto e botei no quarto da minha fi- lha, e como eu ainda não mudei a instalação, já que no quarto dela não tem, aí ele fica desligado. Sem falar que tem horas que eu não tenho muita paci- ência, de tá em rede social, entendeu? Eu gosto de falar, ouvir a voz, negócio de tá digitando (risos) não é comigo não, gosto de ouvir a voz (...) Também, não sinto falta não. Meu negócio é aqui oh, (mostra o celular) celular! Ligar e ouvir (Professora Mary, Grupo Focal nº 4, em 14 de maio de 2013)

Eu não gosto muito de rede social, por causa do bate papo, na realidade eu não gosto de bater papo com ninguém, porque às vezes a pessoa (pausa) sei lá, tem gente que se prolonga muito. Minha conversa é rápida, ou às vezes até eu fico lá, invisível, pra ninguém perceber que eu estou ali. (Professor Adilson, Grupo Focal nº 06, em 30 de maio de 2013).

Embora o processo de inserção nas redes virtuais seja diferenciado entre as/os profes- soras/es da pesquisa, Manuel Castells (1999) auxilia na compreensão desta nova questão pre- sente nas formas de sociabilidade no mundo contemporâneo, no qual, segundo o autor, as re- des representam traduções da organização de nossas sociedades diante da cultura da globali- zação. Elas são mutantes, abertas, capazes de aumentar infinitamente seu conteúdo, também são capazes de adaptar-se a novas realidades, sempre buscando a sua sobrevivência e o seu equilíbrio. As redes alteraram os processos de sociabilidade quando a internet se converteu em uma alavanca de transição para uma nova forma de sociedade, a sociedade-rede, modifi- cando as formas de estruturação dos grupos sociais.

190 Em relação à inserção das/os docentes nas redes sociais, mais especificamente, consta- tamos dois fatos importantes: o primeiro é que 56,7% das professoras pesquisadas costumam acessá-las mais eventualmente do que sempre, enquanto 31,7% usam a rede com maior fre- quência durante a semana. Em relação aos professores, há uma inversão da prática, pois a- queles que costumam acessar sempre equivalem a 43,8%, enquanto os que só acessam even- tualmente são o equivalente a 40,6%. Também constatamos, como destacaram os relatos, que 15,6% deles e 11,7% delas não participam das redes sociais, conforme o gráfico a seguir:

Gráfico 42: Acesso às redes sociais – por sexo

Em relação à frequência das/os docentes nas redes sociais, podemos constatar que, mesmo acessando evetualmente, as professoras permanecem mais tempo nessa atividade. Podemos destacar três grupos principais de frequência: o grupo daquelas/es que permanecem por até uma hora por semana, no qual professoras e professores estão equiparadas/os, ou seja, o equivalente a 20% das/os pesquisadas/os; o segundo grupo é composto por aquelas/es que permanecem de 1 a 5 horas por semana, sendo 50% dos docentes e 56,4% das docentes pesquisadas; o terceiro grupo é constituído por aquelas/es que passam de 5 a 10 horas por semana, onde há um crescimento significativo no grupo dos homens (26,7%) em relaçao às mulheres (7,3%). Além disso, 12,7% das professoras pesquisadas permanecem entre 10 e 15 horas semanais, e 3,6% delas permanecem entre 20 e 30 horas semanais, conforme o gráfico a seguir:

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Gráfico 43: Frequência com que participam das redes sociais – por sexo.

Vale ressaltar que os tempos nas redes sociais não são lineares, são tempos cortados, fragmentados, ou seja, são uma soma aproximada das frações de tempos, distribuídas desde o acordar até a hora de dormir. Deve-se destacar, ainda, que professoras e professores fazem duas, três ou mais atividades ao mesmo tempo. Desse modo, é comum que estejam fazendo planos de aula, assistindo à TV, ouvindo música e acessando às redes sociais ao mesmo tempo, em um processo simultâneo. Deixam o seu facebook aberto, para ler os post no mural, ver fotos e vídeos, postar alguma novidade e até desabafar: “hoje o dia foi pesado, partiu... vou dormir, conforme palavras de uma professora.

Quanto às redes mais acessadas pelas professoras, podemos destacar em ordem crescente, dentre as que foram mais citadas pelas docentes pesquisadas, o facebook (89,1%), MSN (61,8%), Orkut (21,8%), seguidas das demais: skype, chat, twitter, dentre outras, conforme ilustra o gráfico a seguir.

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Gráfico 44: Redes sociais mais acessadas pelas professoras – por sexo

.

Em relaçao às escolhas das redes sociais pelos professores, dentre as que foram mais citadas, em ordem crescente, são: a opção pelo facebook (96,6%), MSN (43,3%), orkut (33,3%), blog (23,3%), seguidas das demais: skype, twitter dentre outras, conforme ilustra o gráfico a seguir.

Gráfico 45: Redes sociais mais acessadas pelos professores – por sexo

Observando os resultados, tanto dos professores quanto das professoras, podemos inferir que, mesmo com a hegemonia do facebook, as redes novas e anteriores coexistem entre

193 as/os docentes e ainda são muito utilizadas por elas/es. Também podemos verificar que os homens acessam mais redes do que as mulheres, mesmo porque o seu tempo livre não é tão expropriado como o tempo delas.

De um modo geral, a função da internet e das redes sociais nos tempos cotidianos docentes é muito distinta. Para alguns constitui tempos de trabalho, para outros, de lazer, ainda para alguns as duas coisas, sendo que a experiência das mulheres é marcada muito mais por trabalho do que entretenimento, como podemos observar nos relatos das/os docentes pesquisadas/os.

Segundo o professor Adilson (Grupo Focal nº 6, 2013), por exemplo, na internet ele gosta, quase sempre, de ficar off line, postando as fotografias que ele mesmo faz de diversos pontos da cidade, em um site que ele construiu especialmente para isso, além de postar os seus desenhos feitos à mão e escaneados ou densenhados por ele, no próprio computador. Em relação às redes sociais, Adilson falou que as frequenta muito pouco, somente quando alguém deixa recado no in box, dizendo que deseja falar com ele on line, e marca um horário para o encontro virtual, isso se for uma pessoa interessante e para uma conversa interessante. A maior parte do seu tempo livre, segundo o professor, ele fica na rede, cuidando da sua arte e/ou preparando aulas: escolhendo textos, assistindo a filmes que possam ser usados como suportes pedagógicos na sala de aula, fazendo cursos on line, dentre outras atividades.

Diferentemente dele, a professora Ana (Grupo Focal nº 2, 2013) conta que só possui facebook, porque sua filha abriu uma conta. Segundo ela, não se identifica muito com as redes sociais. Quando chega a entrar no facebook é pra ver se tem alguém com quem precisa falar on-line, ou para deixar um recado. Mesmo assim, isso só ocorre quando não tem bônus ou créditos pra ligar. Na verdade, a função da internet para a professora é para saber das noticias ou fazer alguma pesquisa voltada para a área de trabalho na escola.

Já a professora Lúcia (Grupo Focal nº 5, 2013), relata que acessa as redes sociais e o endereço eletrônico, porque faz um curso de mestrado, e o material todo vem através da inter- net, sendo assim a principal função é estudar, buscar textos. Ela declara que gosta muito de conversar com suas/seus amigas/os pelo facebook e também com a sua família. Segundo ela, hoje em dia é mais fácil falar com alguém pelo face do que presencial, pois ninguém tem tempo, desse modo as redes sociais ajudam muito nesse sentido.

As professoras Maria (Grupo Focal nº 3, 2013), Lucy (Grupo Focal nº 3, 2013), Dulce (Grupo Focal nº 6, 2013) e outras mais, usam a rede para conversar com amigas/os e familia- res, mas isso ocorre, quase sempre, enquanto estão pesquisando algum conteúdo para a sala de aula. Desse modo, ficam sempre divididas entre uma coisa e outra. Além disso, não demo-

194 ra muito tempo, apenas acessa o que interessa, verifica se tem algum recado, confere a caixa de e-mails e permanece online não mais que 30 minutos.

Nos tempos livres do professor Victor, ele costuma participar das redes mais no perío- do de férias, recessos e feriados. Segundo ele, já participou muito de redes sociais, principal- mente debatendo temas. Já o professor Kleber, acessa constantemente, quando pode, quando tem tempo. Por exemplo, no dia da AC, enquanto ele está fazendo as tarefas da escola. Parti- cipar das redes para ele é uma forma de reencontrar colegas que muitas vezes só são vistas/os nas reuniões. Segundo ele, às vezes até acontecem situações nas quais a pessoa pode tomar até um susto: fica tempos sem ver a pessoa, sem conversar, de repente está postado no face que está doente, morreu ou coisa parecida.

Encontramos, ainda, na experiência relatada por uma professora e um professor, uma especificidade da rede: namorar, como narrado no diálogo a seguir:

Professora Maria: Também uso para namorar, quando meu amor está dis-

tante, ou não pode vir em casa.

Professor Adilson: Mas também, todo dia?(risos)

Professora Dulce: É, isso também, assim, essa experiência também é muito

boa, né?

Professora Maria: Agora que eu tenho um namorado carnal, né? (risos).

Mas de vez em quando o namoro virtual é bom.

Pesquisador: Como é esse namoro virtual, esse encontro pela internet? Con-

ta pra gente.

Professora Maria: Olha, a diferença é que você não está com a pessoa do

seu lado, mas é bom. Se traduz em palavras, um fala de um lado, outro fala do outro. Não precisa estar muito longe, às vezes no mesmo bairro, mas não teve tempo de se encontrar, aí se encontra na net (Grupo Focal nº 6, em 06 de maio de 2013).

A professora Anita relata que uma das funções da rede, para ela, é se encontrar com o namorado, mesmo quando não está tão distante, quando se encontra no mesmo bairro, impe- dido, por algum motivo, de ir visitá-la. A falta de tempo para o encontro é resolvida através da internet, como também confirma o professor Jonas:

Hoje eu passei o dia inteiro em casa. Geralmente todos os domingos são as- sim. Amanhã preciso trabalhar bem cedo, então o domingo é mais leve. A- proveitei para pesquisar umas coisas na internet, planejar umas aulas e tam- bém namorar (kkkkkk). Lógico, ninguém é de ferro. Minha namorada mora aqui em Porto mesmo, só que ela mora no centro e eu aqui no bairro, no Bai- anão. Então a gente fica namorando pela internet, pelo skype, sabe? Assim, dá pra matar a saudade, a gente se ver no skype, conversa pelo face, é muito bom. Quando a gente fica muito tempo sem se ver, porque ela trabalha na saúde e aí as nossas folgas nem sempre coincidem, então a gente aproveita

195 qualquer tempinho, pelo celular, pela internet, eu sei que nessa brincadeira já estamos caminhando para cinco anos de namoro. Outro dia estava contando isso pra um colega e ele disse: “Rapaz, como é que você aguenta? Não é a

mesma coisa!” Aí eu disse que ele estava enganado, porque o negócio é bom

demais, dá pra rolar até sexo kkkkkkkkkkkk. Desculpe tá falando essas bes- teiras, é para espairecer, mas é verdade. Um abraço, Gigio. (Professor Jonas, mensagem pela internet, em 15 de setembro de 2013).

Às vezes nos falta tempo, não apenas para um encontro amoroso presencial, mas tam- bém para outras atividades dos tempos livres, como as de lazer e práticas culturais, para as quais às vezes falta também o dinheiro, assunto visível no relato abaixo:

A diversão de professor é um pouco complicada, às vezes nos falta tempo, e outras vezes falta dinheiro, porque diversão sem dinheiro tá difícil na socie- dade de hoje. Mesmo assim, busco aproveitar cada momento com a família e amigos... Agora, nas férias fica mais fácil de ir ao encontro dos amigos. Quando estou na lida da profissão, meu tempo fica mais curto, porém, apro- veito os finais de semana e feriados, ou no horário oposto do trabalho. A di- versão se apresenta para mim, algo maravilhoso, pois alegra minha vida, es- tar com pessoas que te fazem bem é importante para o coração. (Professora Vânia, mensagem pela internet, em 02 de fevereiro de 2013).

Esse relato, dentre outros, ilustra o que discutimos com Theodor Adorno (2009) Jur- gen Habermas (1982) e Erich Weber (1969) até o momento, no sentido de que existe um con- junto de atividades de tempo livre, especialmente de lazer. Contudo, elas são vendidas, vira- ram negócio, foram mercantilizadas, causando assim a expropriação desse tempo, como já vimos antes. Isso fica evidente na formulação de uma professora: “para se ter diversão é pre-

ciso ter tempo e dinheiro”.

Outra questão importante no relato da professora Vânia, registrado acima, é a relação entre trabalho e diversão, também já discutida pelos autores citados. Segundo Vânia, nos pe- ríodos letivos os tempos de lazer ficam mais curtos, contudo, nos finais de semana, feriados e turnos opostos ao trabalho, ela faz de tudo para aproveitar, para se divertir. Vale ressaltar que nem todas/os as/as docentes têm esse direito, que parece se transformar em privilégio, princi- palmente porque em Porto Seguro a maioria dos sábados do ano é letivo, existe um número representativo de extensão de carga horária para 60h semanais, como visto anteriormente. Desse modo, os sábados que sobram, o domingo, os feriados e turno oposto, são ocupados com os trabalhos domésticos, o cuidado de si e de outros, o trabalho da docência, que é reali- zado em casa, dentre outras tarefas que se transformaram em rotina.

A professora Vânia encerra esse seu relato, falando da sua alegria e satisfação nos momentos de lazer. Mesmo sendo tempos curtos, alegram a vida. Essa declaração e as outras

196 relatadas pela professora nos remetem a Norbert Elias e Eric Dunning (1992), quando afir- mam que na modernidade, onde as formas de controle externas e internas são cada vez mais permanentes e extensíveis a tudo, a satisfação através do lazer é de suma importância para o bem estar dos indivíduos e da sociedade. Desse modo, ele não pode ser visto apenas como um acessório do trabalho, mas uma porção do tempo livre que é ocupada com entretenimento, diversão, viagens, passeios, roda de conversa, dentre outras ocupações escolhidas pelos indi- víduos, mesmo que para isso tenha que pagar por essas ocupações. E a escolha, por sua vez, acontece porque alguém indicou ou porque eles acham tais ações agradáveis para si mesmos. Dessa maneira, segundo os autores, dentro dos limites sociais, ao escolherem as atividades de lazer os indivíduos levam em consideração o seu próprio prazer, sua própria satisfação.