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Nos tempos livres, velhos, novos e novíssimos amigos

SOCIABILIDADES, PRÁTICAS CULTURAIS E LAZER NOS TEMPOS LIVRES DOCENTES

4.1.1 Nos tempos livres, velhos, novos e novíssimos amigos

As/os professoras/es pesquisadas/os valorizam muito as interações, não somente entre as/os velhas/os amigas/os, aquelas/es constituídos na infância, no período da graduação, na escola onde trabalham, mas também entre as/os novas/os amigas/os, as/os recém chegadas/os à escola, na rua onde moram, constituídas/os nos cursos de pós-graduação. Há, também, as/os novíssimas/os amigas/os, apresentadas/os pelos amigas/os mais antigas/os, são as/os recém chegadas/os ao grupo, também aquelas/es que se encontram nas festas, na praia e noutros lu- gares da cidade, conforme explica o professor Jonas:

181 Moço, eu gosto muito de conhecer pessoas, olha que eu não saio muito. Eu tenho meus amigos que já faz cinco, dez anos que os conheço, que são como irmãos. Também tem aqueles que os conheci na escola, olha, eu trabalho na mesma escola há dez anos, como não fazer amizade? Ainda tem aqueles que entram e saem da escola, principalmente os contratados, que vão e vem, por causa da situação em que vivem. Além disso, Gigio, ainda tem aqueles que a gente encontra na praia, conversa, troca uma ideia, sabe? Ou na rua, em uma festa, troca telefone, e-mail, procura no facebook; com uns a gente continua a amizade, com outros é só aquele momento, mas que vale muito. É uma sa- tisfação muito grande conhecer o outro, saber do outro, sabe? E tem mais (rsrsrsrsrs), ainda tem uma porrada de gente que vem chegando com esse povo, todo dia eu sou apresentado a novas pessoas, não para nunca, mas é muito prazeroso (Professor Jonas, mensagem pela internet, em 30 de julho de 2013).

Este relato do colega Jonas, e outros que escutamos, remetem-nos às discussões de Norbert Elias e Eric Dunning (1992), ao observarem que os indivíduos podem se reunir, sem necessariamente ter qualquer afinidade, pois no momento do encontro o que é mais importan- te é conhecer uns aos outros, especular sobre os desconhecidos, desfrutar da companhia uns dos outros, ações que elevam o nível do calor emocional. A presença de pessoas conhecidas, menos conhecidas ou desconhecidas, aguça a curiosidade humana, a qual provoca a integra- ção social, de forma divertida, sem obrigações sérias e sem os riscos inerentes a elas.

Segundo tais autores, essas interações são estimuladas, mas não necessariamente serão duráveis, podem acabar no primeiro encontro, como também podem durar anos, como relata o professor Jonas, quando fala dos novíssimos amigos. Também nos encontros, as pessoas po- dem levar sentimentos da esfera séria da vida, contidos nos tempos de não-lazer, como, por exemplo, a repulsa, o ódio e a amizade, o medo e o riso, a simpatia e a antipatia, a ansiedade, o amor, a paixão, sentimentos e emoções que podem interferir nos processos de sociabilidade. Ao encontrar com pessoas diferentes, o indivíduo pode não se estimular a conhecer o outro. Desse modo, se fecha para qualquer interação, mesmo assistindo de longe as ações, gestos e modos de ser dessas pessoas, que são observadas a distância, como podemos observar nos diálogos a seguir:

Professora Jose: A maioria dos meus amigos são professores, eu não me

sinto bem às vezes com os amigos do meu marido, por exemplo, eu não me sinto bem com os amigos dele, não é por nada não, eu não sei o porquê. Eu recebo bem, eu converso tal e tal, mas, os amigos dele, as amigas dele, não são os meus amigos.

Professora Alice: Mais pode se tornar. Eu já sou assim, o que eu não gosto

de estar só em ambientes de professor, eu gosto de estar em outros ambien- tes, pra eu conhecer outras pessoas e falar sobre outras coisas.

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Professora Jose: É, sim, mas... (interrompida por Mary)

Professora Mary: Mas na sua casa você pode receber pessoas que não seja

só do seu meio profissional ou do seu vínculo de amizade. Tipo,lá em casa, às vezes rola churrasco, vamos fazer isso aqui na piscina? Vamos. Aí vai o vizinho, vai a namorada do vizinho, vai num sei quem, vai o amigo do meu amigo, são pessoas que não têm nada haver com a educação, né? Agora eu prefiro, eu gosto de curtir esses encontros.

Professora Jose: Eu sei que eu, os meus amigos, a maioria são da educação,

não importa se é professor se é secretario, se é cozinheira, se é merendeira, a maioria faz parte da educação, claro que eu tenho outros amigos, claro, né? Mas não tem pra onde correr, maioria são da educação, são da educação! Agora, eu posso até encontrar outras pessoas, trato bem e tudo, como é o ca- so dos amigos e amigas do meu marido, mas não são meus amigos (Grupo Focal nº4, em 14 de maio de 2013).

Independentemente de como as interações se configuram, a maioria das professoras e professores pesquisadas/os vivem com seus amigos e amigas, constituem novas amizades e novos grupos, como já dissemos. Além disso, mesmo diante a um turbilhão de trabalhos e responsabilidades, conseguem mobilizar estratégias de encontro, seja nos intervalos das aulas, no turno oposto, nos finais de semana. Há sempre uma parcela do tempo livre para as/os ami- gas/os, como podemos observar no gráfico a seguir:

183 Podemos observar no gráfico, que tanto as docentes quanto os docentes, independen- temente da sua jornada de trabalho e escassez de tempo, já mencionados neste trabalho, dedi- cam entre uma e cinco horas por semana aos amigos e amigas, sendo, respectivamente, 86,6% das professoras e 80% dos professores pesquisadas/os.

Vale ressaltar que, os encontros, na maioria das vezes ocorrem nos finais de semana, geralmente nas sextas-feiras, quando os sábados não são letivos, e nos sábados não letivos e domingo durante o dia, pois, como lembra a professora Zilma: diversão para professor no domingo, só programa em família, ou alguma coisa leve até umas duas horas, porque na se- gunda cedo tem trabalho logo cedo.

Dedicar, nesse contexto, significa encontrar para bater papo, passear pela cidade, ir à praia, ao shopping, aos bares, dentre outros lugares nos seus tempos cotidianos. Os encontros ocorrem com mais frequência porque, segundo a professora Jose, o ciclo de amizades docen- tes geralmente é entre colegas da mesma escola, então é mais fácil para programar alguma coisa juntos, às vezes até sair do trabalho para um bar, um restaurante ou festa. Além dos en- contros festivos, também existem os encontros para aconchegar, acalentar em horas difíceis, como demonstra a Professora Alicinha, que saiu do bairro onde mora para outro distrito, para estar com uma amiga e colega de trabalho: “Na terça, fiz uma visita a uma colega em Arraial, que fez cirurgia e estava carente da minha visita, que na verdade foi muito bom. Ela ficou muito contente, brincamos, rimos, almoçamos juntas, retornei final da tarde”. (Professora

Alicinha, mensagem pela internet, em 16 de janeiro de 2013).

Os encontros com as/os amigas/os muitas vezes não são agendados, são aproveitadas as frações de tempo, que vão sobrando no cotidiano: a liberação de uma aula mais cedo, o final de um encontro pedagógico, o final de tarde de um sábado letivo, conforme podemos observar nos relatos, dentre outros, do professor Jonas e da professora Élida:

Ontem foi um dia muito legal. Eu e alguns colegas saímos da escola e fomos para um barzinho tomar cerveja e conversar. É lógico que não deixamos de falar de escola, acho que qualquer grupo de profissionais, fala do seu traba- lho, claro que professor é demais (kkkkkk). Conversamos, rimos, jogamos sinuca. Foi muito divertido (Professor Jonas, mensagem pela internet, em 06 de maio de 2013).

O meu tempo é assim, não tem como sair, às vezes quando tem encontro do EJA, quando pego carona (companhia) com algumas colegas, aí eu tomo uma cerveja e só. Isso quando tem alguma reunião à noite, às vezes aprovei- to para sair com colegas (Professora Élida, mensagem pela internet, em 10 de março de 2013).

184 Podemos observar, também, durante a conversa com as/os docentes pesquisadas/os, que a maioria das/os professoras/es tem os seus vínculos de amizade constituídos entre as/os colegas de trabalho, embora isso não anule a possibilidade de ter outras/os amigas/os fora da profissão. Segundo a professora Jose, isso torna mais fácil a interação entre elas/es, e princi- palmente é uma forma de aproveitar melhor o tempo, pois no próprio trabalho podem marcar as atividades de lazer, ou sair de lá mesmo, extemporaneamente, sem programar. Outras/os docentes aproveitam o dia ou a noite sozinhas/os ou com amigas/os, mas não deixam de apro- veitar os tempos que lhes sobram para se divertir, como é o caso da professora Alice:

Tenho amigos para tudo quanto é tipo de programa, sabe? (kkkkk) Eu me ar- ticulo bem em todos os grupos. Durante o dia ou à noite, geralmente têm en- contros de amigos, colegas de trabalho: churrasco, outros tipos de encontro, mas em casas (...) Na praia sempre, geralmente no final de semana, no verão bem mais, porque aí, não estou trabalhando, aí fica mais fácil de poder está saindo mais. Durante o ano a frequência é menor. À noite eu vou sempre pa- ra o Bombordo, para Estação 22, vou para lambada, eu vou para vários luga- res, depende muito com quem estou e qual a direção que vou seguir. Se não tiver alguém, eu vou sozinha. Eu gosto muito de sair. Se não for assim eu não consigo trabalhar (Professora Alice, mensagem pela internet, em 14 de abril de 2013).

A professora Alice, como se pode observar em seu relato, consegue se articular em to- dos os grupos, seja entre as/os colegas de profissão, seja entre amigas/os de outras áreas, e gosta de conhecer pessoas novas. Além disso, ela tem grupos de amigas/os para fins distintos: aquelas/es que são da noite, outras/os que são da praia, outras/os que são de festa em casa, contudo há sempre uma repetição de uma/um amiga/o ou outra/o, nos grupos. Ela está sem- pre “colada” nelas/es, pois o lazer está em primeiro lugar em sua vida. Sem os tempos de lazer e diversão, ela não conseguiria trabalhar, reiterando o que ela nos dizia.