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Aspectos do envelhecimento humano: quem está idoso?

2 O IDOSO E O CONTEXTO CONTEMPORÂNEO DO

2.3 Aspectos do envelhecimento humano: quem está idoso?

O que é idoso? O que é velhice? São questões que encontram uma gama de significados e depende de alguns critérios para sua compreensão. Pois assim como uma pessoa pode ser considerada maior de idade em uma determinada sociedade e em outra não, uma pessoa pode ser considerada velha em uma determinada sociedade e não o ser em outra.

Nessa perspectiva é que, seguindo um critério puramente etário, a Organização Mundial de Saúde considera idosas as pessoas com 60 (sessenta) anos ou mais, nos países em desenvolvimento, e com 65 (sessenta) anos ou mais, em se tratando de países desenvolvidos (UNFPA, 2012)3.

O limite etário permite então agrupar indivíduos em sociedade considerados crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Nessa linha divisória é que o Brasil, como país em desenvolvimento, considera idosa aquela pessoa que completa 60 (sessenta) anos, como já referido.

Sabe-se inclusive, que com sessenta anos muitos estão gozando de boa saúde, física e mental, são autônomos, plenamente capazes de desempenhar suas atividades diárias, mas,

3 A diferença adotada no critério da OMS foi evidenciada nas pirâmides etárias brasileira e francesa no início do

como a norma brasileira é taxativa, desejando ou não, com essa idade a pessoa adquire o status de idoso.

O II Plano Internacional de Viena traz as categorias: idosos, os de idade acima de 60 (sessenta anos); e os anciãos, entendidos estes os que alcançaram a idade de 80 (oitenta) anos ou mais, sendo atualmente o grupo que cresce mais rapidamente (ONU, 2003, p. 28-29).

Convém mencionar que, cada pessoa envelhece de forma diferenciada, isto é, cada organismo reage diferentemente às ações do tempo e do meio ambiente, pois o corpo apresenta diversos mecanismos de defesa. Nessa linha de raciocínio, pode-se falar em dois critérios para se compreender o termo idoso: o biológico e o psicológico.

O envelhecimento biológico é o considerado natural, no qual o corpo humano vai apresentando os sinais das alterações funcionais e envelhecimento das células. Em verdade, a cada dia pode-se perceber o envelhecimento biológico. A pele que reveste o corpo humano, por ser externa, é a que menos esconde e a que demonstra os sintomas do envelhecimento do corpo humano. A pele, o maior órgão complexo do corpo humano, é a primeira a demonstrar os sinais da idade.

Corrobora-se com Ashley Montagu quando afirma:

A pele é o espelho do funcionamento do organismo: sua cor, textura, umidade, secura, e cada um de seus demais aspectos refletem nosso estado de ser psicológico e também fisiológico. [...] Quando vamos avançando em idade, começamos a descobrir qualidades da pele, como cor, firmeza, elasticidade, textura, que não havíamos absolutamente notado até começarmos a perdê-las (1988, p. 30).

Além da pele, as deficiências funcionais vão demonstrando os sinais de envelhecimento ao longo dos anos. Estudos evidenciam que o cérebro humano vai envelhecendo a partir da segunda década de vida, de forma lenta e progressivamente, culminando com a diminuição de seu volume (MORAES; et. al. 2010, p. 68).

O envelhecimento psicológico ou amadurecimento, por sua vez, depende do esforço e aceitação pessoal de cada indivíduo de que aceita as transformações ocorridas com o seu corpo ao longo dos anos, com maturidade para conviver com esse fato irreversível.

O amadurecimento é conquista individual, e a pessoa idosa torna-se sábia o suficiente para aceitar e tolerar a realidade (MORAES; et. al., 2010, p. 70).

O curioso é que o ser humano almeja viver muito, mas não deseja envelhecer. A não aceitação do envelhecimento gerada pelo medo de envelhecer, e como consequência o medo

da morte torna-se um fator complicador que pode levar o idoso a frustações ou mesmo a quadros depressivos.

Deve-se ter em mente que o processo de envelhecimento é natural e que velhice não está associada a decrepitude ou senilidade, necessariamente. Mas deve-se explicar que senilidade e senescência constituem termos de diferentes significados.

Por senilidade entende-se o envelhecimento patológico, isto é, as modificações determinadas por afecções que acometem os idosos; já a senescência ou senectude, constitui o envelhecimento normal, isto é, as alterações orgânicas, morfológicas e funcionais que decorrem do processo de envelhecimento (CARVALHO FILHO, 1996, p. 62).

O envelhecimento patológico, portanto, se caracteriza pelo acometimento de doenças na velhice que comprometam a autonomia do idoso, ou seja, que afetam diretamente o desempenho de funções básicas pelo idoso. Citam-se como exemplo o acidente vascular cerebral ou o mal de Alzheimer, que comprometem as funções do corpo humano e tornam o idoso dependente diretamente de outra pessoa.

No processo de senectude, o II Plano de Ação Internacional sobre o Envelhecimento traz em seu artigo 12 o termo “envelhecimento ativo”, que consiste na participação dos idosos na vida econômica, política, social e cultural de suas sociedades, como se lê no art. 12:

Artigo 12

As expectativas dos idosos e as necessidades econômicas da sociedade exigem que possam participar na vida econômica, política, social e cultural de suas sociedades. Os idosos devem ter a oportunidade de trabalhar até quando queiram e de serem capazes de assim o fazer, no desempenho de trabalhos satisfatórios e produtivos e de continuar a ter acesso à educação e aos programas de capacitação. A habilitação de idosos e a promoção de sua plena participação são elementos imprescindíveis para um envelhecimento ativo. É preciso oferecer sistemas adequados e sustentáveis de apoio social a pessoas idosas.

A Organização Mundial de Saúde, da mesma forma, também faz alusão ao termo “envelhecimento ativo”, definindo-o como a promoção de uma melhor qualidade de vida ao idoso, com sua inserção e participação na comunidade em que vive.

A palavra “ativo” refere-se à participação contínua nas questões sociais, econômicas, culturais, espirituais e civis, e não somente à capacidade de estar fisicamente ativo ou de fazer parte da força de trabalho (OMS, 2014). Ainda nessa perspectiva, o Ministério da Saúde, através de Portaria nº 2.528 de outubro de 2006, aprovou a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa – PNSPI, destacando

como uma de suas diretrizes a promoção do envelhecimento ativo e saudável, definindo-o como “envelhecer mantendo a capacidade funcional e a autonomia” (PNSPI, 2006).

É importante salientar que o envelhecimento também se reveste de caráter social, pois a sociedade é capaz de ditar a forma de como a pessoa é identificada e tratada como idosa cronológica e normativamente.

Nas sociedades antigas, devido às condições escassas da ciência e da tecnologia à época, poucos chegavam a uma idade mais avançada, e dessa forma ser velho significava uma posição de destaque e de respeito perante os outros.

Uma das primeiras representações gráficas do envelhecer, traduz-se no hieróglifo que significa “velho” ou “envelhecer”, encontrado nos anos 2800-2700 a.C, onde aparece uma figura humana deitada representando fraqueza muscular e perda óssea. Na Grécia, em meados do século V a. C, Hipócrates registrou observações sobre o envelhecimento como distúrbios respiratórios doenças renais, derrame, catarata etc. (LEME, 1996, p. 14-17).

Registre-se que em Esparta havia o Conselho de Anciãos ou Gerusia, composto por 28 espartanos maiores de sessenta anos (CARRACEDO, 2007, p. 34) que eram respeitados não só pelo fato de representarem certo poder, mas também pelos seus conhecimentos. Honravam-se em Esparta os velhos por se entender que neles residiam o entendimento, a razão e os bons conselhos.

Em Roma, o Senado deriva seu nome do senex que significa idoso, numa forma de valorização à experiência desses cidadãos que o compunham (LEME, 1996, p. 17).

Muitos povos ainda valorizam em suas culturas os mais velhos, como, por exemplo, os aborígenes, os hindus, os indianos e os chineses. Os ensinamentos, lições de vida, valores socioculturais são repassados de geração em geração aos mais jovens pelos mais velhos.

No mundo atual capitalista, no entanto, o idoso é visto como um produto descartável e que não mais contribui produtivamente para o desenvolvimento da sociedade.

Mas envelhecer não significa doença, tampouco invalidez, ao contrário, reflete avanços consideráveis na ciência, na medicina, na cultura e na educação de uma forma geral. Aliás, esse termo encontra-se defasado para significar amadurecer com sabedoria, como afirma Ashley Montagu:

Envelhecer não é ter uma doença terminal, mas é viver um patrimônio atemporal, uma rica herança. Em nossa sociedade, os idosos são considerados biodegradáveis e supérfluos, ao invés de serem respeitados

pelo que realmente representam: uma elite biológica que, dotada de uma resistente sabedoria, tem muito a oferecer ao mundo. [...] Envelhecer é um termo precário para fazer menção a amadurecer. Devemos encontrar novas definições para termos antigos que já perderam seu significado (1988, p. 369-370).

O II Plano de Ação Internacional sobre o Envelhecimento, sob a mesma ótica, salienta a competência, a experiência e a sabedoria dos idosos:

Artigo 10

O potencial dos idosos constitui sólida base para o desenvolvimento futuro. Permite à sociedade recorrer cada vez mais a competências, experiência e sabedoria dos idosos, não só para tomar a iniciativa de sua própria melhoria, mas também para participar ativamente na de toda a sociedade.

É equívoco também pensar que o idoso é sinônimo de improdutivo ou artigo descartável. A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, XIII determinou a liberdade quanto ao exercício de qualquer trabalho: "Art. 5º. [...] XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer".

No mesmo sentido, o Estatuto do Idoso disciplinou a matéria em seu artigo 26, advertindo para o respeito das limitações físicas, intelectuais e psíquicas, que podem ser encontradas em qualquer idade: "Art. 26. O idoso tem direito ao exercício de atividade profissional, respeitadas suas condições físicas, intelectuais e psíquicas".

A discriminação pela idade é fato inaceitável que deve ser coibido, e o respeito aos idosos e a valorização enquanto pessoa resulta de um processo em vias de desenvolvimento.

Ademais, o Estatuto do Idoso prevê o envelhecimento como direito personalíssimo, ou seja, um direito inato, irrevogável, irrenunciável e incomunicável: "Art. 8º O envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito social, nos termos desta Lei e da legislação vigente".

O envelhecimento é, portanto, um direito e não uma mera expectativa de se viver mais, e que conta com aparato normativo protetivo, embora falhe enquanto efetividade.

É válido ainda relembrar que não há unicidade quanto ao emprego de terminologias para referir-se à pessoa idosa, pelo contrário há formas diversas, tais como: velho, idoso, envelhecido; e eufemismo como terceira idade, melhor idade, mas há quem prefira tratar o tema como envelhecimento ou envelhecente (MOTTA, 2002, p. 37).

Anísio Baldessin fala do envelhecimento mental e espiritual, para identificar os idosos que possuem uma velhice saudável física e/ou mentalmente, e de jovens que possuem uma mente fechada às novas faces do mundo atual:

Há quem envelheça biologicamente, mas rejuvenesce interiormente e transmite vitalidade. E há quem aparenta fisicamente ser jovem, robusto, cheio de juventude, mas já é velho, gasto e cansado interiormente. Podemos falar, portanto, de um envelhecimento mental e de um envelhecimento espiritual. A idade, em última análise, mede-se não pelo número de anos que se tem, mas pelo como a pessoa se sente, como vive, como se relaciona com a vida e com os outros.

- Você é velho não tanto quanto tem uma certa idade, mas quando tem certos pensamentos.

- Você é velho quando lembra as desgraças e as ofensas sofridas e esquece as alegrias e os dons que a vida lhe ofereceu.

[...]

- Você é velho quando continua a louvar os tempos antigos e lamenta toda novidade.

[...]

- Você é velho quando acha que terminou para você a estação da esperança e do amor.

- Você é velho quando pensa na morte como no descer ao túmulo ao invés de subir ao céu.

Se, ao contrário, você ama, espera, ri, então Deus alegra a sua juventude, mesmo que você tenha 90 anos (1996, p. 492).