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4 VIOLÊNCIA E AGRESSIVIDADE CONTRA O IDOSO

4.3 A violência praticada contra o idoso

4.3.7 Os maus tratos e a tortura

Muitos crimes de tortura praticados contra os idosos são tratados como maus tratos. E aqui é importante estabelecermos a diferença entre maus tratos e tortura. O delito de maus tratos encontra-se disposto no Código Penal brasileiro, que dispõe em seu artigo 136, caput:

Art. 136. Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando- a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina.

Pena: detenção, de dois meses a um ano, ou multa.

O delito de maus tratos pressupõe como ação, a exposição a perigo, o abuso do jus corrigendi para fins de educação, tratamento ou custódia. É delito comum, qualquer pessoa pode praticá-lo, sendo que o elemento volitivo é o desejo de corrigir, embora o meio empregado seja desumano ou cruel (DELMANTO, 2007, p. 402).

A Rede Internacional para a Prevenção do Abuso ao Idoso – INPEA , organização não governamental fundada em 1997, afiliada à Organização das Nações Unidas, define maus tratos como “a ação única ou repetida ou a falta de resposta apropriada, que ocorre dentro de qualquer relação onde exista uma expectativa de confiança, que cause dano ou angústia a uma pessoa idosa” (INPEA, 2001).

O INPEA traz na definição de maus tratos, além das expressões já comentadas (como força física, omissão, coação etc.) o aspecto “relação da confiança” que de certa forma une agressor e idoso agredido.

O Código Penal brasileiro dispõe sobre o delito de maus tratos em seu artigo 136, caput:

Maus tratos

Art. 136. Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando- a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina.

Pena: detenção, de dois meses a um ano, ou multa.

O delito de maus tratos, portanto, da forma como se apresenta na legislação penal, pressupõe como ação, a exposição a perigo, o abuso do jus corrigendi para fins de educação, tratamento ou custódia. É delito comum, qualquer pessoa pode praticá-lo, sendo que o elemento volitivo é o desejo de corrigir, embora o meio empregado seja desumano ou cruel (DELMANTO, 2007, p. 402).

O Estatuto do Idoso, por sua vez, quando trata do tema de maus tratos, não o traz sob essa epígrafe, embora reproduza em seu artigo 99, de forma quase idêntica o disposto no artigo 136 do Código Penal:

Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado:

Pena – detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa. § 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§ 2º Se resulta morte:

Pena – reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.

Percebe-se que o artigo 99 do Estatuto do Idoso prevê em seu caput a exposição ao perigo à integridade física e mental do idoso através de submissão ao mesmo de condições desumanas com privação de alimentos e cuidados indispensáveis, e ainda a sujeição ao idoso de trabalho inadequado ou excessivo.

Portanto, a conduta prevista no artigo 99 do Estatuto do Idoso, trouxe a fusão de dois tipos penais: o do artigo 132, que trata do perigo para a vida ou saúde de outrem; e a do artigo 136 que dispõe sobre maus tratos.

Veja-se o que dispõe o artigo 132 do Código Penal:

Perigo para a vida ou saúde de outrem

Pena – detenção, de 3 (três) a 1 (um) ano, se o fato não constitui crime mais grave.

Houve, assim, uma mistura refinada dos dois dispositivos penais, e uma fusão de dois módulos comportamentais trazendo como vítima específica o idoso (VILAS BOAS, 2014, p. 184).

Entretanto, o artigo 99 do Estatuto do Idoso não possui a finalidade específica de educação ou reeducação, prevista no art. 136 do Código Penal, que o configura e o diferencia. Tampouco possui a finalidade de praticar o sofrimento físico ou mental por poder, prazer, ódio do cuidador contra o idoso, em se tratando de tortura, como se falará a seguir.

Dessa forma, entende-se que o artigo 99 do Estatuto do Idoso é mais amplo que o dispositivo penal, porque não exige finalidade específica, restando configurado e devendo ser aplicado quando ocorrer qualquer das condutas ali dispostas, em se tratando de vítima idosa, não importando a finalidade ou vontade do agressor. Contudo, em se tratando do crime de tortura contra idosos, a legislação específica, a Lei Antitortura é a que deve ser aplicada.

Ademais, ressalta-se que, se da conduta prevista no caput do artigo 99 do Estatuto do Idoso resultar lesão corporal de natureza grave ou morte, há um aumento considerável no quantum da pena.

No que diz respeito à tortura, objetivando coibi-la, foi adotada pela Resolução nº 39/46 da Assembleia Geral das Nações Unidas, em dezembro de 1984, a Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.

Em 1985 foi adotada, pela Organização dos Estados Americanos – OEA, a “Convenção Interamericana para prever e punir a tortura”, sendo somente ratificada pelo Brasil em 20 de julho de 1989.

No Brasil, o Congresso Nacional aprovou a “Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes” por meio do Decreto Legislativo nº 4, em maio de 1989, sendo promulgada pelo Decreto nº 40, em fevereiro de 1991.

No plano constitucional, a atual Carta Magna estabelece em seu artigo 5º, inciso XLIII, que a prática da tortura é crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia. Na íntegra o dispositivo constitucional:

Art. 5º. [...] [...]

XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

Em consonância com o dispositivo constitucional, foi editada em abril de 1997, a Lei nº 9.455, que define os crimes de tortura e dá outras providências.

A Lei nº 9.455/97, também chamada lei antitortura, dispõe em seu artigo 1º, inciso II, parágrafos 3º e 4º:

Art. 1º. Constitui crime de tortura: [...]

II - submeter alguém, sob sua guarda poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Pena – reclusão, de dois a oito anos. [...]

§ 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos; se resulta morte, a reclusão é de 8 (oito) a 16 (dezesseis) anos.

§ 4º Aumenta-se a pena de 1/6 (um sexto) até 1/3 (um terço): [...]

II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos.

A tortura é, portanto, sofrimento físico ou psíquico provocado pelo sujeito ativo contra vítima indeterminada, com um fim específico de aplicar castigo ou medida de caráter preventivo. Existe um desejo específico do agente ativo do crime, em fazer sofrer por sentimento de poder, prazer, ódio etc.

Nota-se que o artigo condena de forma mais grave, com aumento da pena de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço) aquele que praticar tortura contra o maior de sessenta anos.

Os maus tratos e a tortura contra idosos são também coibidos pelo Estatuto do Idoso: Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado:

Pena – detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa. § 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§ 2º Se resulta morte:

Pena – reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.

Ressalta-se que maus tratos e tortura acabam acarretando muitas doenças ou traumas de origem física ou psicológica ao idoso, levando-o inclusive, a óbito, como revela a norma.

E o que se torna mais grave é o fato de que, “a violência e maus tratos contra a pessoa idosa são tratadas como uma forma de agir ‘normal’ e ‘naturalizada’, ficando ocultas nos usos, nas ideias, nas crenças e nas relações entre as pessoas” (SARAIVA; COUTINHO, 2012, p. 115).

Verifica-se o quão se entrelaçam agressividade e violência, e o quanto a legislação tenta coibir tais ações com penas cada vez mais severas.

Percebe-se a amplitude da classificação e subdivisão que a violência e a agressividade podem comportar, ressaltando a imprevisibilidade do potencial ofensivo que pode ser revelado nas diversas expressões do comportamento humano.

Na expressão de Vicente Faleiros:

A violência contra a pessoa idosa está situada nesse contexto estruturante de negação da vida, de destruição do poder legitimado pelo direito, seja pela transgressão da norma e da tolerância, seja pela transgressão da confiança intergeracional, pela negação da diferença, pela negação das mediações do conflito e pelo distanciamento das realizações efetivas dos potenciais dos idosos ou ainda pelo impedimento de sua palavra, de sua participação (2007, p. 36).

Como se pôde observar, os maus-tratos, a tortura e as demais formas de violência contra o idoso, descritas neste capítulo, são condutas criminosas, motivadas por diversas causas, que integram as relações familiares e sociais da atualidade, numa expressão de exclusão do idoso no que diz respeito à sua integridade física, liberdade, individualidade, sociabilidade, cidadania, vida e dignidade.

4.4 A motivação e o dolo na prática da violência contra o idoso: o tratamento na